A SECA DO CEARÁ (2ª parte)

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Autoria de Leandro G.de Barros

a sece

O gado urra com fome,
Berra o bezerro enjeitado,
Tomba o carneiro por terra
Pela fome fulminado.
O bode procura em vão,
Só acha pedras no chão,
Põe-se depois a berrar.
A cabra em lástima completa,
O cabrito inda penetra
Procurando o que mamar.

Grandes cavalos de selas
De muito grande valor,
Quando passam na fazenda
Provocam pena ao senhor.
Como é diferente agora
Aquele animal de que outr’ora
Causava admiração,
Era russo hoje está preto,
Parecendo um esqueleto
Carcomido pelo chão.

Hoje nem os pássaros cantam
Nas horas do arrebol.
O juriti não suspira
Depois que se põe o sol.
Tudo ali hoje é tristeza,
A própria cobra se pesa
De tantos que ali padecem.
Os camaradas antigos
Passam pelos seus amigos,
Fingem que não os conhecem.

Santo Deus! Quantas misérias
Contaminam nossa terra!
No Brasil ataca a seca,
Na Europa assola a guerra.
A Europa ainda diz
O governo do país
Trabalha para o nosso bem.
O nosso em vez de nos dar
Manda logo nos tomar
O pouco que ainda se tem.

Vê-se nove, dez, num grupo
Fazendo súplicas ao Eterno.
Crianças pedindo a Deus
Senhor! Mandai-nos inverno.
Vem, oh! grande natureza
Examinar a fraqueza
Da frágil humanidade.
A natureza a sorrir
Vê-la sem vida a cair
Responde: o tempo é debalde.

Mas tudo ali é debalde,
O inverno é soberano,
O tempo passa sorrindo
Por sobre o cadáver humano.
Nem uma nuvem aparece,
Alteia o dia o sol cresce,
Deixando a terra abrasada,
E tudo a fome morrendo,
Amargos prantos descendo,
Como uma grande enxurrada.

Os habitantes procuram
O governo federal
Implorando que os socorra
Naquele terrível mal.
A criança estira a mão,
Diz senhor tem compaixão,
E ele nem dar-lhe ouvido.
É tanto a sua fraqueza
Que morrendo de surpresa
Não pode dar um gemido.

Alguém no Rio de Janeiro
Deu dinheiro e remeteu,
Porém não sei o que houve
Que cá não apareceu.
O dinheiro é tão sabido,
Que quis ficar escondido,
Nos cofres dos potentados
Ignora-se esse meio.
Eu penso que ele achou feio
Os bolsos dos flagelados.

O governo federal
Querendo remiar o Norte,
Porém cresceu o imposto,
Foi mesmo que dar-lhe a morte.
Um mete o facão e rola-o.
O Estado aqui esfola-o,
Vai tudo dessa maneira.
O município acha os troços
Ajunta o resto dos ossos
Manda vendê-los na feira.

Nota:   Criança Morta, Cândido Portinari

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