Arquivo do Autor: Lu Dias Carvalho

QUANDO O AMOR FAZ A DIFERENÇA

Autoria de Lu Dias Carvalho

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O blog da minha amiga Cristine Martin, Rato de Biblioteca, em atuação desde 2008, é sem dúvida um dos mais enriquecedores do mundo virtual brasileiro, ao oferecer uma gama de assuntos aos leitores: ecologia, animais, natureza, cinema, vídeo, tevê, livros, música, etc. Tudo ali é bem atual, quentíssimo, pois a Cris anda sempre em dia com as novidades, onde quer que elas apareçam, oferecendo sempre o melhor a seus leitores. Além de possuir mãos de fada, que executam trabalhos artesanais maravilhosos, trata-se de uma excelente escritora. Sua linguagem é rica e saborosa, carregada de um misto de sabedoria e humor, tão necessário aos dias de hoje. Dentre as muitas qualidades dessa mulher incrivelmente talentosa está o seu amor pelos animais, visível em todas as páginas de seu blog. Esta é uma das causas que me fazem admirá-la tanto.

Curtindo o Rato de Biblioteca, eu acabei encontrando o Obie, o cãozinho dachshund, outrora gorduchão, que acima aparece no “antes” e “depois”.  O danadinho, pelo visto, era bom de boca, de modo que tudo que caía na rede tornava-se comida, pois o animalzinho quase virou, literalmente, uma bolota, que mal se aguentava de pé. Mas, para o bem de sua saúde, Obie acabou encontrando um ser divino em sua vida, Nora Vanatta, que o adotou e dele cuidou com muito carinho, seguindo à risca a máxima de que “quem ama cuida”, oferecendo ao animal uma dieta especial. Em oito meses de cuidados, o roliço cãozinho, que já se encontrava em estado de obesidade mórbida, tornou-se esbelto, atraindo os olhares de todas as cadelinhas por onde passa. Não está fácil o danadinho, que já possui até um blog.

Obie é um exemplo de que o amor faz maravilhas, onde quer que ele aterrisse. Bastou encontrar alguém que lhe dirigisse um olhar compassivo, mas acompanhado de ação, para que a vida do animal se transformasse. Como a bondade humana pode fazer a diferença neste nosso mundo tão ególatra! Nós poderíamos fazer tanto pelos animais, pelas plantas, uns pelos outros e pelo planeta como um todo, se assim quiséssemos. Mas não, vamo-nos entocando cada vez mais em nosso mundinho, com medo de tudo. Muitas vezes eu me pergunto, se esse temor doentio, que toma conta de nós, não é também uma maneira de fugirmos de nosso compromisso com a vida? E se este descompromisso não é a causa da ameaça de perigo real ou imaginária que nos assusta e atemoriza, resultando num círculo vicioso, em que um alimenta o outro, numa simbiose suicida?

Parabéns, compassiva Nora Vanatta, por ter dado nova vida ao cãozinho Obie. Que ele lhe traga muitas alegrias e seja um amigo de todas as horas, principalmente nos momentos mais difíceis, quando você achar que se encontra sozinha neste mundo tão complexo, em que os seres humanos desapontam tanto uns aos outros, por se verem tão mergulhados em si mesmos.

A Cris Martin acrescenta mais informações sobre Obie em seu comentário:

“Os antigos donos do Obie eram um casal de idosos que, por excesso de amor e de ignorância, o deixavam comer de tudo e mais do que ele precisava. O resultado está ali na foto da esquerda. A Nora enfrentou uma boa luta para ficar com o Obie, inclusive uma briga judicial com o abrigo que o acolheu depois que ele foi retirado do casal de idosos e que pediu ajuda a ela para cuidar do cão. Só que depois que o cão ficou famoso, aí queriam tê-lo de volta.

Mas para você ver como o amor dela é grande: na última terça-feira, Obie fez uma cirurgia para remover o excesso de pele que ficou após o emagrecimento, e naquela noite a Nora dormiu ao lado dele, dentro do canil, no hospital veterinário. Isso é que é mãe de cachorro!”

Endereço do blog da Cris Martin: www.terracotabolsas.com/rato/

O ERRO PODE SER UMA ALAVANCA

Autoria do Dr. Telmo Diniz

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Ninguém gosta de cometer erros, a não ser que queira passar a vida como um completo fracassado. Erros são comuns e normais, mas não podem se tornar uma frequência. Claro que você pode cometê-los uma vez ou outra, mas se for capaz de aprender constantemente com os mesmos, eles podem impulsionar seu caminho pessoal e profissional. O erro é essencial para nosso auto desenvolvimento. Não desanime com a culpa ou fique arrependido. Faça uma análise de como pode aprender com eles. Evitar os erros a todo custo cria uma barreira psicológica para não assumir riscos. Se você passar a vida com medo de cometer um erro, irá passar a maior parte dela não fazendo nada, ou muito menos do que desejaria. Parafraseando Mario Quintana, “nascer é uma possibilidade, viver é um risco e envelhecer é um privilégio”.

Dando continuidade ao raciocínio, sempre que andamos para frente, entramos em contato com algo desconhecido. Portanto, passível de erro! O que ficou para trás foram os conhecimentos obtidos pela experiência da vivência de erros e acertos, e o que está à frente é totalmente desconhecido e desprovido de conceitos. Logo, não há como antever exatamente o que irá acontecer e que atitudes tomar em cada passo. É essencial seguir em frente, seja qual foi a conduta que tomou. Quanto mais responsabilidade você assume, maior probabilidade tem de cometer erros. Portanto, não perca tempo tentando justificá-los. Temos um instinto natural de tentar justificar nossas ações. Não faça isso! Corrija o que está desalinhado e siga em frente.

Já falei neste blog sobre a resiliência. Ter resiliência é possuir a capacidade de enfrentar, vencer e ser fortalecido ou transformado por experiências da adversidade. É a capacidade de se adaptar à nova realidade e se manter íntegro. Ser resiliente é ser capaz de superar a partir dos obstáculos. Então, veja o erro como um impulsionador. Como uma alavanca da vida. Veja no erro a sua chance de melhorar.

Nossas perdas trazem um medo iminente e até inconsciente. Ninguém quer perder saúde, pessoas amadas, posição social, confiança, etc. Quem vence recebe um status simbólico de sucesso, de perfeição, de êxito. Mas o que está por trás dos dramas, derrotas e desencontros existenciais é o que impulsiona o ser humano para o amadurecimento e para a evolução. Há aquela máxima de que vencer é importante, mas errar é humano. É preciso desmistificar as vitórias e as derrotas. Dar a cada uma sua devida importância para gerar o amadurecimento necessário. Quem não sabe lidar com frustrações e seus medos, acaba estagnando e realiza muito pouco.

Para finalizar, o escritor e filósofo Marquês de Maricá disse: “Os nossos maiores inimigos existem dentro de nós mesmos. São os nossos erros, vícios e paixões.”.

Nota: imagem copiada de edsonmelosintonia.blogspot.com

POR QUE SOFREMOS?

Autoria de Lu Dias Carvalho

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Os erros humanos se diferenciam em grau de culpabilidade, de acordo com a época em que ocorrem. A visão sobre a vida flui a partir da caminhada do homem sobre o seu planeta. E assim não poderia deixar de ser. O sofrer está atrelado ao existir. Nenhum ser está imune a isso. Até as montanhas sofrem com o desgaste do tempo. E o homem, sem dúvida, é o ser mais vulnerável ao sofrimento. Este é o preço pago pela sua capacidade de sentir, refletir e criar.

O humano tem a sua primeira experiência com a dor, mas não como sujeito, mas como objeto, ao sentir o que os outros lhe fazem, ignorando o que faz aos outros. O que é natural em razão da imaturidade que o acomete na juventude. E pior, muitos continuam “jovens” até a velhice, sem se conscientizar do mal que causam a terceiros, pensando apenas no próprio umbigo. São muitos os motivos que levam o ser humano ao sofrimento. Eis alguns:

A ignorância, cuja palavra tem um significado muito mais profundo do que é dado a ela, não diz respeito apenas à falta de conhecimento. Vai muito além. Ignorar significa, também, preferir não ver, não ouvir e não sentir. Tornar-se omisso diante de uma realidade que se posiciona a nossa frente. A ignorância não diz respeito apenas à falta de instrução, como pensa grande parte das pessoas.

Ignorar a realidade, deliberadamente, é a maior de todas as formas da estupidez humana, de omissão. Uma pessoa “instruída” pode ser totalmente destituída de bom senso, capaz de enxergar apenas o que lhe interessa, enquanto uma “simplória”, mesmo sem uma educação formal, pode ser capaz de ouvir, sentir e ligar-se a tudo que a rodeia. Portanto, o sentido de ignorância é bem mais complexo.

O desequilíbrio é um dos maiores problemas do mundo moderno. E, como a Medusa, possui infinitas cabeças tomadas pela maldade, que originam tantas outras mais. O desequilíbrio é a raiz de quase todos os males. É a força motriz da injustiça. É o leito de morte da paz. A mesa da incompreensão. A derrocada do homem. O declínio da humanidade. A mortalha do planeta Terra.

O desequilíbrio leva ao rompimento de relações, quando o relacionamento é a essência da vida. Portanto, cortar relações é uma forma de nos desligarmos uns dos outros no seio do universo. É o empobrecimento da existência. É a morte do amor. E, por consequência, a morte da solidariedade e da justiça.

O dualismo é uma visão contorcida da realidade. É a mera divisão de tudo que se processa no Universo em apenas isso ou aquilo. É a falta de percepção de que a vida não é apenas dual. É a incapacidade de se colocar no lugar do outro. É ver apenas duas cores, ignorando as outras centenas de nuances. É o segregacionismo, o preconceito, o acolhimento de uma parte em detrimento do todo. É a ignorância elevada à máxima potência.

O reducionismo, por sua vez, acomoda tudo num único tipo de explicação. Ignora a profundidade, a complexidade e a intensidade de certos sentimentos e de determinados atos. Nivela a vida, como quem nivela uma xícara de farinha de trigo na feitura de um bolo. Não vai além daquilo que mostram os sentidos. Anestesia a razão e o bom senso. Não busca entender mais do que apenas vê.

A falta de paixão é outro complicador da vida humana. É a dificuldade de se doar no que se faz. É o esquecimento, quase que voluntário, do outro. É o descompromisso com quem se divide a vida. É o apagar do fogo que mantém a energia do existir, que brota do contato mais íntimo entre dois seres.

Tomás de Aquino dizia que “O amor está por trás de tudo no Universo – até do pecado”. O amor mal direcionado está, na maioria das vezes, atrás de nossos maiores erros. Apegamos à causa, distanciando-nos da essência. Por mais que se negue, todo ser quer ser abraçado pelo amor. Sem ele, o homem torna-se frágil e ressequido. Pois o amor tem o dom de vicejar, de dar vida.

Ilustração: Cabeça de Medusa (Peter Paul Rubens, óleo sobre painel, c. 1617)

QUANDO A INTERNET VIRA UM VÍCIO

Autoria do Dr. Telmo Diniz

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A internet começou no final do século passado, mas só agora, mais recentemente, veio a acarretar problemas. Um novo vício se originou no século XXI, com a popularização e o fácil acesso ao computador: os ciberviciados. Caso você seja daqueles que vive conectado e não suporta ficar offline, cuidado: é possível que engrosse as estatísticas dos viciados em internet. O problema afeta mais de 50 milhões em todo o mundo, segundo dados de uma universidade norte-americana. Considerada por especialistas norte-americanos uma dependência tão crônica quanto substâncias como álcool e cocaína, o transtorno já é reconhecido pela Associação Americana de Psicólogos como Internet Addiction Disorder ou Transtorno do Vício em Internet, em tradução livre.

Ficar conectado por horas está se tornando cada vez mais grave, em especial na população mais jovem, com prejuízos nas relações familiares, afetivas, sociais, escolares, de trabalho etc. O vício em internet pode causar danos físicos, emocionais e comportamentais. Os sintomas físicos mais comuns dos viciados em internet são taquicardia, boca seca, sudorese e tremedeiras, ou seja, são os mesmos sintomas de quando se retira uma outra droga qualquer. O tempo excessivo diante do computador pode provocar comprometimentos que são inerentes ao mau hábito, como problemas de postura, lesões por esforço repetitivo, obesidade ou subnutrição, alem de prejuízos para a visão. Os sintomas psíquicos podem incluir o déficit de atenção, dificuldade para se organizar, definir prioridades e sintomas de angústia, quando a pessoa é privada do uso do celular ou do computador. Em casos extremos, podem ocorrer trombose venosa nos membros inferiores, que pode complicar com embolia pulmonar, culminando em óbito. É isso mesmo, vício em internet pode até matar!

Segundo especialistas do Hospital das Clínicas de São Paulo, os critérios de dependência de internet incluem:

  • Necessidade de estar sempre conectado;
  • várias tentativas de reduzir o tempo de uso da internet sem sucesso;
  • apresentar irritabilidade e/ou depressão;
  • quando o uso da internet é restringido, apresenta labilidade emocional;
  • permanecer mais tempo conectado do que o programado;
  • comprometimento no trabalho e nas relações familiares e/ou sociais pelo uso excessivo da nova tecnologia, bem como mentir aos outros a respeito da quantidade de horas conectadas.

Caso a pessoa apresente cerca de metade deste critérios, sinal vermelho! Abra os olhos e reveja seu comportamento diante da máquina. Quem manda mais, você ou ela?

Nota: imagem copiada de semtranstorno.blogspot.com

A MENTIRA DIMINUI A CONFIANÇA

Autoria do Dr. Telmo Diniz

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Quem nunca contou uma mentirinha? Sempre foi usada como estratégia de defesa ou, ao contrário, para ataques. A mentira faz parte do cotidiano de todos nós. Está sempre nos cercando. Porém, em alguns casos, a mentira pode ser doença. Certos distúrbios psiquiátricos têm como característica o hábito de mentir. São estes casos que devem ser identificados e tratados.

Conceitualmente, mentir é o ato intencional e deliberado de fazer uma declaração falsa. É também conhecida por mitomania ou mentira compulsiva. É alguém que mente por hábito, normalmente desde a infância. A maioria das pessoas mente por medo de que algo possa dar errado, o que é uma forma de defesa. Por outro lado, a mentira compulsiva interfere no julgamento racional, no relacionamento familiar e, especialmente, social. As mentiras podem ser pequenas ou muito elaboradas e cheias de detalhes. Os mitômanos podem esconder a verdade sobre tudo, pois dizer a verdade pode ser extremamente desconfortável para eles.

Não se sabe exatamente a causa da mitomania. Um conjunto de fatores associados pode estar por trás do problema: histórico de vida, relacionamentos, relação parental, genética, etc. Acredita-se que a baixa autoestima, somada à necessidade de atenção e à tentativa de se proteger de situações constrangedoras, marque o início da mitomania.

Há muitas consequências em ser um mentiroso patológico. Mentiras que se perpetuam destroem relacionamentos e amizades. Se a doença continua a progredir, a mentira pode se tornar tão grave que, eventualmente, pode causar problemas de ordem social, psicológica e até legal. A pessoa geralmente é excluída do grupo que frequenta por vivenciar situações sem saída, passar por situações embaraçosas e perder a confiança de todos ao seu redor. Com o tempo, é natural que as pessoas que rodeiam um mitômano percebam a mentira.

Mais importante do que identificar a ação repetida de mentir é reconhecer esse ato como um hábito patológico. Mentira excessiva é um sintoma comum de diversas doenças mentais. Por exemplo, pessoas que sofrem de transtorno de personalidade antissocial usualmente mentem para se beneficiar de outrem. Alguns indivíduos com transtorno de personalidade borderline podem mentir para chamar a atenção, alegando que eles foram mal tratados ou pressionados.

Portanto, o reconhecimento pelo indivíduo dos prejuízos que seu comportamento pode trazer para si e para terceiros é de extrema relevância para o início do tratamento, que geralmente envolve acompanhamento psicológico e, no caso de pessoas que também apresentem outros quadros psiquiátricos (como depressão e ansiedade), o tratamento medicamentoso deve ser considerando. Psicoterapia é um dos poucos métodos para tratar uma pessoa que sofre de mitomania, pois ajuda o indivíduo a desenvolver novos repertórios, reforçando relatos verdadeiros e ignorando os relatos falsos.

Na realidade, na doença de Pinóquio, a mentira não aumenta o nariz, apenas diminui a confiança.

A SUPERVALORIZAÇÃO DAS APARÊNCIAS

Apresentado por Lu Dias Carvalho rs

O brasileiro Roberto Shinyashikyi figura entre os grandes nomes deste país na atualidade. Ele é médico psiquiatra, conferencista, empresário e escritor. Dentre os seus temas prediletos estão a qualidade de vida e a motivação presentes na vida das pessoas. Dono de um pensamento lógico e bastante convincente, ele deu uma entrevista excelente à revista ISTO É, em que questiona os valores existenciais de nosso tempo, destacando a supervalorização das aparências. Para ele, nós temos autoestima em demais e o que nos falta é competência. Repasso parte da entrevista para os leitores deste blog, como forma de reflexão:

Isto É Quem são os heróis de verdade?

RS – Nossa sociedade ensina que, para ser uma pessoa de sucesso, você precisa ser diretor de uma multinacional, ter carro importado, viajar de primeira classe. O mundo define que poucas pessoas deram certo. Isso é uma loucura. Para cada diretor de empresa, há milhares de funcionários que não chegaram a ser gerentes. E essas pessoas são tratadas como uma multidão de fracassados. Quando olha para a própria vida, a maioria se convence de que não valeu a pena, porque não conseguiu ter o carro, nem a casa maravilhosa. Para mim, é importante que o filho da moça que trabalha na minha casa possa se orgulhar da mãe. O mundo precisa de pessoas mais simples e transparentes. Heróis de verdade são aqueles que trabalham para realizar seus projetos de vida e não para impressionar os outros. São pessoas que sabem pedir desculpas e admitir que erraram.

Isto É – O Sr. citaria exemplos?

RS – Quando eu nasci, minha mãe era empregada doméstica e meu pai, órfão aos sete anos, empregado em uma farmácia. Morávamos em um bairro miserável em São Vicente (SP) chamado Vila Margarida. Eles são meus heróis. Conseguiram criar seus quatro filhos, que hoje estão bem. É pena que a maior parte das pessoas esconda suas raízes. O resultado é um mundo vítima da depressão, doença que acomete hoje 10% da população americana. Em países como o Japão, a Suécia e a Noruega, há mais suicídios do que homicídios.

Isto É – Por que tanta gente se mata?

RS – Parte da culpa está na depressão das aparências, que, por exemplo, acomete a mulher que, embora não ame mais o marido, mantém o casamento, ou o homem que passa décadas em um emprego que não o faz se sentir realizado, mas o faz se sentir seguro.

Isto É – Qual o resultado disso?

RS – Paranoia e depressão cada vez mais precoce. O pai quer preparar o filho para o futuro e mete o menino em aulas de inglês, informática e mandarim. Aos nove ou dez anos a depressão aparece. A única coisa que prepara uma criança para o futuro é ela poder ser criança. Com a desculpa de prepará-los para o futuro, os malucos dos pais estão roubando a infância dos filhos. Essas crianças serão adultos inseguros e terão discursos hipócritas. Aliás, a hipocrisia já predomina no mundo corporativo…

Isto É – Temos um modelo de gestão que premia pessoas mal preparadas?

RS – Ele cria pessoas arrogantes, que não têm a humildade de se preparar, que não têm capacidade de ler um livro até o fim e não se preocupam com o conhecimento. Muitas equipes precisam de motivação, mas o maior problema no Brasil é competência. Cuidado com os burros motivados. Há muita gente motivada fazendo besteira. Não adianta você assumir uma função para a qual não está preparado. Fui cirurgião e me orgulho de nunca um paciente ter morrido na minha mão. Mas tenho a humildade de reconhecer que isso nunca aconteceu graças a meus chefes, que foram sábios em não me dar um caso para o qual eu não estava preparado. Hoje, o garoto sai da faculdade achando que sabe fazer uma neurocirurgia. O Brasil se tornou incompetente e não acordou para isso.

Isto É Está sobrando autoestima?

RS – Falta às pessoas a verdadeira autoestima. Se eu preciso que os outros digam que sou o melhor, minha autoestima está baixa. Antes, o “ter” conseguia substituir o “ser”. O cara mal educado dava uma gorjeta alta para conquistar o respeito do garçom. Hoje, como as pessoas não conseguem nem “ser”, nem “ter”, o objetivo de vida se tornou “parecer”. As pessoas parecem que sabem, parece que fazem, parece que acreditam. E poucos são humildes para confessar que não sabem. Embora a autoestima esteja baixa, fazem pose de que está tudo bem.

Isto É Por que nos deixamos levar por essa necessidade de sermos perfeitos em tudo e de valorizar a aparência?

RS – Isso vem do vazio que sentimos. A gente continua valorizando os heróis. Quem vai salvar o Brasil? O Lula. Quem vai salvar o time? O técnico. Quem vai salvar meu casamento? O terapeuta. O problema é que eles não vão salvar nada! Tive um professor de filosofia que dizia: “Quando você quiser entender a essência do ser humano, imagine a rainha Elizabeth com uma crise de diarreia durante um jantar no Palácio de Buckingham”. Pode parecer incrível, mas a rainha Elizabeth também tem diarreia. Ela certamente já teve dor de dente, já chorou de tristeza, já fez coisas que não deram certo. A gente tem de parar de procurar super-heróis, porque se o super-herói não segura a onda, todo mundo o considera um fracassado.

Isto É O conceito muda quando a expectativa não se comprova?

RS – Exatamente… A gente não é super-herói nem superfracassado. A gente acerta, erra, tem dias de alegria e dias de tristeza. Não há nada de errado nisso. A crise será positiva se elas entenderem que a responsabilidade pela própria vida é delas.

Isto É Como as pessoas podem se livrar dessa tirania da aparência?

RS – O primeiro passo é pensar nas coisas que fazem as pessoas cederem a essa tirania e tentar evitá-las. São três fraquezas: A primeira é precisar de aplauso, a segunda é precisar se sentir amada e a terceira é buscar segurança. Os Beatles foram recusados por gravadoras e nem por isso desistiram. O que as escolas deveriam fazer é ajudar o aluno a desenvolver suas próprias potencialidades.

Isto É Muitas pessoas têm buscado sonhos que não são seus?

RS – A sociedade quer definir o que é certo. São quatro loucuras da sociedade:
A primeira é instituir que todos têm de ter sucesso, como se eles não tivessem significados individuais. A segunda loucura é você ter de estar feliz todos os dias. A terceira é você ter que comprar tudo o que puder. O resultado é esse consumismo absurdo. Por fim, a quarta loucura: Você ter de fazer as coisas do jeito certo. Jeito certo não existe. Não há um caminho único para se fazer as coisas. As metas são interessantes para o sucesso, mas não para a felicidade. Felicidade não é uma meta, mas um estado de espírito. Tem gente que diz que não será feliz enquanto não casar, enquanto outros se dizem infelizes justamente por causa do casamento. Você pode ser feliz tomando sorvete, ficando em casa com a família ou com amigos verdadeiros, levando os filhos para brincar ou indo à praia ou ao cinema…

Quando era recém-formado, em São Paulo, trabalhei em um hospital de pacientes terminais. Todos os dias morriam nove ou dez pacientes. Eu sempre procurei conversar com eles na hora da morte. A maior parte pega o médico pela camisa e diz: “Doutor, não me deixe morrer. Eu me sacrifiquei a vida inteira, agora eu quero aproveitá-la e ser feliz”. Eu sentia uma dor enorme por não poder fazer nada. Ali eu aprendi que a felicidade é feita de coisas pequenas. Ninguém na hora da morte diz se arrepender por não ter aplicado o dinheiro em imóveis ou ações, mas sim de ter esperado muito tempo ou perdido várias oportunidades para aproveitar a vida.

Nota: quem quiser ler toda a entrevista, acesse:
RobertoShinyashikihttp://www.istoe.com.br/assuntos/entrevista/detalhe/12528_CUIDADO+COM+OS+BURROS+MOTIVADOS