COMO ANALISO MONET

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Autoria do Prof. Pierre Santos

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Ao mirar a pintura, O Terraço em Sainte-Adresse, como de resto os demais quadros de Monet, tenho a impressão de estar vendo a própria vida fluir ante meus olhos. Ora, a vida flui em qualquer lugar e este é tão somente mero anteparo para que ela flua. Assim, não é a realidade que importa, e sim, os patentes sinais da vida a qual ali tem seu lugar, ou seja, que ali acontece. A realidade é sempre passiva, enquanto a vida é a energia que lhe dá sentido e substância. Para o academicismo, é a realidade que importa e somente ela, o mais fotográfico que se possa ser, sem nenhuma interpretação, sem emoção – praga esta, sufocada em equívocos, que continua a grassar no mundo hodierno…

A fotografia é uma espécie de natureza morta, enquanto a energia vital é a natureza viva – e foi esta que o nosso pintor captou. Eis porque seu quadro nunca é uma fotografia, coisa tão pobre, que tanto encantava e ainda encanta acadêmicos. A pintura fotográfica é pintura acadêmica, e o que Monet mais queria era fugir do academicismo. O que ele queria – e, para consegui-lo, teve até que desenvolver uma técnica para tanto própria – era captar a luz da maneira a mais natural que lhe fosse possível. Se a cor é tão somente uma ilusão de ótica derivada da junção da luz solar com a superfície de cada coisa existente, que é feita de pigmentos sensíveis a esta ou àquela tonalidade, e se os raios solares têm em si as três cores puras ou primárias, de cuja mistura as cores secundárias ou binárias derivam, Monet queria, justapondo aquelas, que as cores se fizessem no quadro da mesma forma como se fazem na realidade. Só que os olhos privilegiados de Monet e sua fantástica destreza manual no manuseio dos pincéis foram além desde objetivo, captando a luz em sua integridade e, mais longe ainda, captando a vida.

Nesta ânsia de assim apreender as cores, acabou descobrindo que tudo quanto recebe em si a luz solar, vai mudando, da manhã à noite, de cor, de conformidade com a posição assumida pelos raios solares, na sua transição celeste e na transição natural da vida. Foi essa mudança que ele quis transmitir, quando pintou as suas famosas catedrais.

Há tanta vida nesse pedaço de mundo captado por Monet, que é impossível para esse seu Terraço aí ter um espectador, porque qualquer pessoa que o olhe, de repente é envolvida e se torna participante. Na verdade, porque Monet pegou esse pedaço de realidade e o fixou aí nesse quadro, a energia daquele momento continua aí a funcionar ante nossos olhos atônitos e de tudo que está naquele átimo de tempo, absolutamente atual e espontâneo, sentimo-nos partícipes, muito embora a pintura já seja centenária. E é precisamente nesse jogo de tempo, no transcorrer do qual os acontecimentos se enlaçam, que vamos descobrir o sortilégio dos impressionistas numa paleta que brinca com a realidade e a emoção. Monet era um mágico.

Como, afinal, conseguiu Monet todos esses efeitos em O Terraço em Sainte-Adresse? Simplesmente, levando todos os elementos composicionais, que aí aparecem, a conglomerar-se na dinâmica de sua distribuição, na qual nada deve pesar mais do que deve, sob pena de comprometer o equilíbrio. Nesta matéria, o artista era um mestre consumado. Os recursos aí presentes são óbvios e repletos de naturalidade.

• Para começar, os três tufos à esquerda, com seus pendões e as duas cadeiras da esquerda, compõem com as duas cadeiras e o galho de flores vermelhas em forma de V da direita um arco bem visível, que parece avançar, tal se quisesse abraçar o infinito.

• Por outro lado, é muito importante nesta dinâmica o espaço continente do velho de chapéu panamá, que sói ser o próprio pai do pintor, com a cadeira onde está sentado, pois põe em destaque a base do pé traseiro esquerdo dessa cadeira, que é o ponto rotatório das linhas de força, que formam um leque aberto para a profundidade, como se quisesse envolvê-la na sua expectativa de moção.

• É fácil descobrir aí os elementos componentes desse leque: os tufos com as cadeiras da esquerda formam a parte inicial do leque; o vermelho da bandeira de duas cores, o parquinho de dominância preta, a sombrinha da jovem e a da velha formam o segundo elemento; o velho, o portão acima dele e a bandeira francesa formam o terceiro elemento.

• E, finalmente, as duas cadeiras da direita com as flores em V completam o leque. Estes dados são tão claros e óbvios, que não posso crer não tenha Monet disposto tais formas de propósito e o leque fosse apenas coincidência ou então fruto dos inconscientes ritmos internos do artista…

• Finalmente, se estamos participando do quadro, com presença mesmo, de uma posição logo abaixo do ponto rotatório, chegamos a ter vontade de olhar para trás e cumprimentar Claude Monet, que, virtualmente, deve continuar ali por toda a eternidade (como ante todos os quadros que fez, enquanto viveu), pintando com dedicação e entrega este belíssimo quadro. Isso é pura magia!

Regata em Argenteuil incomoda-me um pouco, porque o lado esquerdo, onde estão os barcos, ao contracenar com o outro lado, onde estão a margem e as construções, perde força, porque o lado direito em vermelho alaranjado nas casas, anormalmente muito aquecido, tem um peso muito maior, em decorrência do que os barcos amarelos, cuja cor, embora seja também quente, é menos do que a outra, alijam-se neste contraste e, perdendo lastro, parece que vão levitar como os pássaros – cuja sensação, está claro, é antinatural. Apesar disso, que coisa encantadora e hipnotizante é esse tremeluzir das ondas, que parece embalar-nos! Assim é Monet: mesmo num dia em que não está lá com essa inspiração e paciência, consegue encantar-nos.

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