Historiando Cartola – ACONTECE

Siga-nos nas Redes Socias:
FACEBOOK
Instagram

Autoria de Lu Dias Carvalho

Ele lhe fizera tantas juras de amor e infindas promessas… Um era o esteio do outro, o sol de cada dia, a chuva caindo docemente sobre a terra, a brisa nas tardes tépidas entrando pela janela. Foram tantos os momentos repartidos, o mundo visto a dois sob os mais diferentes prismas. Mas certo dia, quando a tarde fez-se noite, as estrelas esconderam-se no céu, a lua ocultou-se na face escura da serra e o arco-íris partiu para outras terras…

Ele chegou meio acanhado, assentou-se no mesmo sofá, onde, juntos, uniam seus corpos molhados, e com voz baixa pediu-lhe: “Esquece o nosso amor, vê se esquece/ Porque tudo no mundo acontece/ E acontece que já não sei mais amar”.  Perdida, em meio à frieza daquelas palavras, ela deixou seu pranto rolar, enquanto o mundo desabava em derredor. Indiferente, ele prosseguiu: “Vai, chorar, vai sofrer/ E você não merece/ Mas isso acontece”.

A moça queria uma explicação ainda que frágil. O amor não podia fenecer, assim, como as margaridas arrancadas nos prados, apenas pelo prazer humano de serem desfolhadas. Não se desfia o coração, como quem desmancha crochês e bordados. Não se apaga a ternura e o cuidado, como se fora uma folha rabiscada com o grafite preto de um lápis. Teria sido tudo uma brincadeira inconsequente e sem graça? Mas ele se explicou: “Acontece que meu coração ficou frio/ E nosso ninho de amor está vazio/ Se eu ainda pudesse fingir que te amo/ Ai, se eu pudesse/ Mas não quero, não devo fazê-lo/ Isso não acontece”.

Com os olhos inchados pelas lágrimas e pela noite insone, a moça pôs-se, mal amanhecera o dia, a caminhar pela praia. E não foi preciso muito tempo para que avistasse o ingrato rolando na areia com a nova namorada. A seguir, ela perdeu a razão, não reconhecia mais o que era areia ou água. Foi caminhando em direção ao mar, envolta pela brisa, até ser coberta por um lençol de espumas prateadas. Ainda hoje, não são poucos os que dizem que ela virou sereia, pois seu corpo jamais foi ter à praia. Mas isso acontece! E como acontece!

Obs.: clique no link para ouvir:
ACONTECE

Nota: obra do pintor brasileiro Aldemir Martins

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *