RAM MUNDA (4) – ÚLTIMOS DETALHES

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Autoria de Lu Dias Carvalho

Ramun IV

O escritor francês Marc Boulet chega a sua etapa final de preparação para viver um dalit (intocável) na Índia. Compra um pano de algodão cru sobre o qual vai se deitar, uma manta de lã áspera, um prato de alumínio para pedir esmolas e um saco de cânhamo grosso, marrom, onde irá guardar suas coisas, como fazem os mendigos espalhados por todos os cantos.

Assumir a identidade de um dalit, numa grande cidade, será bem menos preocupante, uma vez que a mistura da população, ocasionada pelo êxodo rural, pode ser confundido com a massa das mais variadas etnias. Viver numa aldeia seria quase que impossível, pois essas são divididas geograficamente por castas, segundo a tradição do hinduísmo, para evitar a mistura e a “poluição”, e o atraso e a ignorância leva-as a seguirem os preceitos ao pé da letra. A sua vestimenta será a roupa comum de um hindu pobre, composta por:

• sandálias de dedo;
• um lungi xadrez azul e marrom – pano de dois metros de comprimento, enrolado em torno da bacia, um tipo de saia, que indica a casta, a profissão e a classe social;
• uma camisa de material sintético, com listras marrons;
• uma camiseta branca (bem encardida e suja);
• um fular vermelho – mede um metro e meio de comprimento e serve para proteger a cabeça contra o sol, a poeira ou o frio;

Ele não pode se esquecer de que o bigode deve ser grande, assim como é o da maioria dos indianos. É tido como um sinal de virilidade na Índia.

Marc Boulet, como dalit, adota o nome indiano de Ram Munda (será este o nome usado daqui para a frente). Dirá que é originário de uma aldeia distante de nome Bandgav. Para que obtenha sucesso na sua transformação física sabe, também, que é preciso agir de acordo com o comportamento de um indiano, de maneira geral, e com o de um dalit, especificamente. É preciso estar atento a alguns detalhes:

• não pronunciar as expressões: Desculpe!/ Obrigado!/ Por favor!;
• não ser capaz de perceber a própria incivilidade;
• ser descortês
• comer com a mão direita e jamais se esquecer de que a esquerda é usada para lavar as partes íntimas;
• ter destreza para acocorar-se com o lungi, na hora de urinar e defecar, de modo que traseiro e coxas não sejam mostrados;
• acocorar, sempre, com a planta dos pés no chão e não com os dedos dos pés, como fazem os ocidentais;
• andar com os pés abertos, como patos;
• balançar a cabeça da esquerda para a direita, para dizer “sim” (jamais de cima para baixo);
• assoar o nariz com os dedos, apertando uma narina de cada vez, com o polegar e o indicador, jogando o muco longe;
• tirar o que sobrar do muco com as pontas dos dedos, que depois são sacudidos no ar ou limpos numa parede;
• arrotar, escarrar e limpar o nariz em público, sem constrangimento algum;
• coçar os testículos publicamente e ajeitá-los na calça, sempre, em qualquer lugar. (MB vê isso como uma forma de afirmação do macho, numa sociedade falocêntrica).

MB acaba de alcançar uma fronteira sem volta. Sabe que, nem se quisesse, seria capaz de retroceder. Lembra-se do provérbio indiano que diz: “Não se engole de novo o que se escarra”. Sente medo de se tornar um deles definitivamente, perdendo seus gestos, sua aparência física e sua personalidade. Não faz ideia de qual será o novo homem que ressurgirá após esta experiência, pois se transformou num desconhecido total para si. Sabe que na Índia a brancura da pele está ligada à primeira regra de beleza e, que, por isso, passará por todo tipo de humilhação, como acontece com os dalits (intocáveis).,

Hoje, terminou a sua última metamorfose ao pintar o cabelo, as sobrancelhas e o bigode na cor preta. Trabalho que já fora feito nos braços, pernas e rosto. Unta os cabelos e põe as roupas de mendigo, preparadas para parecerem velhas e sujas. Aos 32 anos, Marc Boulet acaba de renascer no corpo de Ram Munda.

O capítulo 5 a seguir…

Nota: Imagem copiada de http://www.instablogs.com

Fonte de pesquisa:
Na Pele de um Dalit/ Marc Boulet/ Bertrand Brasil

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