Van Gogh – SUPOSTA LOUCURA E MORTE

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 Autoria de Lu Dias Carvalho pand12

Após a experiência dos ataques repetidos, convém-me a humildade. Assim, pois, paciência. Sofrer sem se queixar é a única lição que se deve aprender nesta vida. (Van Gogh)

Ele nunca deu a impressão de que era um demente. Embora quase não comesse, bebia sempre em excesso. Quando terminava sua jornada diária, depois de passar o dia inteiro sob o sol abrasador e um calor tórrido, costumava se sentar na varanda de um café, já que não tinha um verdadeiro lar. E os absintos e brandies (bebidas) se sucediam rapidamente. Como seria possível resistir. Era o encanto personificado. Amava a vida de forma apaixonada. Era uma pessoa ardente e boa. (Paul Signac)

Existem teorias de que Van Gogh era vítima de demência sifilítica ou que sofria de esquizofrenia. Mas, ultimamente, tem sido reforçada a crença de que era vítima de psicose epileptoide de fundo hereditário, agravada por circunstâncias pessoais, como a possível sífilis, alcoolismo, desnutrição e esgotamento, o que o exime da loucura. Tanto Theo, quanto a irmã Wilhelmina foram vítimas da mesma doença. A saúde de Van Gogh era oscilante. Muitas vezes, ele se mostrava muito bem, vibrante de alegria e entusiasmado com o trabalho, embora tivesse uma alimentação escassa e pobre. Noutras, passava por profundas crises de depressão. Para alguns também era tido como bipolar.

A vida de Van Gogh encheu-se de entusiasmo durante a criação da famosa casa amarela. Pretendia criar um espaço dedicado a um grupo de artistas, onde pudesse discutir a arte, organizar um efetivo esquema de venda das obras produzidas, compartilhar bens materiais e praticar a espiritualidade. Para dar início à comunidade, contava entusiasmado com a chegada do pintor Gauguin, em quem depositava toda a sua crença. Mas a falta de sensibilidade do pintor francês começou a gerar uma enorme tensão entre ambos, principalmente pelas diferenças de personalidade. Gauguin era altivo, prático e mundano, e muito mais preocupado com a venda de suas obras de que com a comunidade. Van Gogh, por sua vez, cultivava hábitos simples, era sensível, apaixonado, terno e totalmente indefeso.

Com o tempo, a convivência entre Van Gogh e Gauguin foi se tornando insuportável. Mas, quando o pintor holandês percebeu que o amigo abandonaria aquele projeto, que lhe era tão caro, e ao qual dispensou gastos e energia, ficou totalmente fora de si. Tentou agredir Gauguin com uma lâmina de barbear e, naquela mesma noite, decepou o lóbulo de sua orelha esquerda, enrolou-o num lenço e o presenteou a uma amiga prostituta, pedindo-lhe que o guardasse com cuidado. Deitou-se como se nada tivesse acontecido, sendo encontrado ensanguentado e sem sentidos. Levado ao hospital, ali permaneceu 14 dias. Ao retornar, pintou o Autorretrato com a Orelha Cortada.

Com a confusão entre os dois pintores, sendo Gauguin francês, foi gerada uma grande polêmica entre os moradores de Arles, que se colocaram contra o pintor holandês. De modo que um grupo pediu a internação de Van Gogh num manicômio, alcunhando-o de “o doido ruivo”. A polícia fechou sua casa com todos os quadros dentro. Rejeitado por Gauguin, por quem nutria grande amizade e admiração, desprezado pelos moradores da cidade e com a certeza da derrocada de seus planos em relação à casa amarela, o estado do pintor tornou-se cada vez mais sério. O casamento do irmão Theo foi a gota d’água, pois ele passou a temer pelo afastamento da única pessoa com quem podia contar, e por quem sentia uma grande amizade. Passou por uma forte crise de insônias e alucinações,  dizendo-se perseguido por alguém que tentava envenená-lo. Mesmo assim, continuou trabalhando incessantemente.

Houve um ciclo na vida do artista holandês em que aconteceram crises, cansaços, recuperações, desânimos, esgotamentos, trabalho árduo e momentos de êxtase. Só que, após o incidente, a parte ruim do ciclo passou a ser uma constante em sua vida. Tanto é que Van Gogh sentiu necessidade de se internar num manicômio e, por conta própria, fê-lo. Ali permaneceu um ano, com altos e baixos. O que pode ser comprovado numa carta enviada a Theo:

Tanto na vida, como na pintura, posso muito bem ficar sem Deus; mas não posso, sem sofrer, ficar sem algo que é maior do que eu, que significa a minha vida inteira: a força de criar.

No manicômio, Van Gogh perdeu o medo da loucura, doença que ele mesmo admitia sofrer, demonstrando grande ternura pelos internos. E assim se expressou sobre eles:

Antes, esses seres me repugnavam e eram algo desolador para mim, pensar que tanta gente de nosso ofício tinha terminado assim (…). Agora, penso em tudo sem temor; isto é, não considero isso mais atroz do que se essas pessoas tivessem sucumbido por outras razões, como tuberculose ou sífilis.

Já no final de sua vida, Van Gogh aceitou a proposta de um amigo para ir morar em Auvers-sur-Oise, perto de Paris, para ser tratado pelo Dr. Paulo Gachet. Aceitou-a, e se instalou na hospedaria Ravoux. Mostrava-se animado e trabalhava intensamente, até que uma carta de Theo, descrevendo as dificuldades pelas quais passava, assim como a sua debilidade física e a da esposa, acabou com a sua tranquilidade. Mesmo depois de visitar o irmão querido, ele não conseguiu se acalmar. Rompeu relações com seu médico. Sozinho no campo, Van Gogh teve um novo surto de depressão e atirou contra seu estômago, vindo a falecer, dois dias depois, nos braços de Theo.

Após a morte do irmão, Theo ficou inconsolável. Acalentava muitos projetos para os dois. Passou a sofrer de depressão e ansiedade.  Com a saúde cada vez mais frágil, foi levado para a Holanda, onde veio a falecer de “demência paralítica” (neurossífilis), seis meses após o irmão. Willemina, irmã de Van Gogh, era esquizofrênica, e viveu durante 40 anos internada, e Cornelius, outro irmão, cometeu suicídio aos 33 anos de idade. Van Gogh e seu irmão Theo encontram-se enterrados lado a lado, como sempre estiveram em vida.

Ao acompanharmos a vida de Van Gogh, percebemos que a arte foi-lhe de muita valia, para dar vazão à sua vida emocionalmente turbulenta, que ia do arrebatamento à  depressão, da imobilidade aos ataques de loucura, inclusive, fez inúmeros autrorretratos com a finalidade de encontrar em si a razão do próprio desespero. Contudo, a arte não conseguiu impedir que, num ato de total desequilíbrio, ele desse fim à própria vida, aos 37 anos, privando o mundo de um homem terno e compassivo e de um dos maiores talentos da pintura.

Era um homem honesto e um grande artista, e, para ele, só havia duas coisas: a compaixão e a arte. A arte era para ele o mais importante de tudo e é nela que ele estará vivo. (Dr. Gachet – seu médico em Auvers)

Nota:  Autorretrato com a orelha cortada (1889)

Fontes de pesquisa:
Mestres da Pintura/ Editora Abril
Grandes Mestres da Pintura/ Coleção Folha
Van Gogh/ Editora Taschen
Para Entender a Arte/ Maria Carla Prette

2 comentaram em “Van Gogh – SUPOSTA LOUCURA E MORTE

  1. Marcos Antonio M. Vidinha

    Lu
    Como a vida é complicada! Como pode um ser humano receber ao mesmo tempo um dom maravilhoso (arte) e uma vida emocionalmente muito complicada? É a existência conjunta da genialidade e da inquietação mental. Será este o equilíbrio da vida (convivência do bom e do ruim) e o desafio de administrarmos essa desigualdade? Não deve ser fácil administrar a genialidade! Um lado bom de tudo isso é que além de ser um grande gênio das artes foi também um ser humano de bom coração.
    Fique com Deus.

    Abraços

    Marcos Vidinha

    Responder
    1. LuDiasBH Autor do post

      Marcos

      É realmente impressionante essa junção. Eu também me pergunto se a vida complexa de Van Gogh não foi a responsável para que seu talento aflorasse com tanta força. Além dos problemas mentais, doenças hereditárias, a vida exterior foi muito cruel com ele. Ainda assim, seu coração era carregado de bondade. Sempre que sua história povoa minha mente, sinto, além da ternura, uma grande tristeza pelo que ele passou. Não merecia tanto sofrimento.

      Abraços,

      Lu

      Responder

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