Vidas Secas – OS SERTANEJOS VÃO À FESTA (16)

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Autoria de Lu Dias Carvalho

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Fabiano comprou dez varas de alva fazenda.
Sinha Terta incumbiu-se de coser pra família.
Ela achou o pano pouco e ele fingiu de bobo.
A velha pretendia era lhe roubar os retalhos.
As vestes saíram curtas, cheias de emendas.

O pai vestia roupa de brim, chapéu de baeta,
gravata e botinas de vaqueta e elástico, rígido.
Sinha Vitória usava vestes de ramas coloridas,
tentando se equilibrar nos sapatos de salto alto.
Eles mancavam como bois doentes dos cascos.

Os meninos, vaidosos, usavam calça e paletó,
pois só vestiam camisa riscada ou ficavam nus.
Baleia seguia atrás com medo de ser enxotada,
aos poucos, faceira, incorporou-se ao grupo, e
assim, seguiam os sertanejos pra festa na rua.

No caminho, o pai botou suas meias no bolso,
e retirou  paletó, gravata e colarinho, aliviado.
A mãe tirou sapatos, meias e amarrou no lenço.
Os guris puseram as chinelas debaixo do braço.
Todos se sentiram livres pra acelerar o passo.

Ao anoitecer, perto do riacho, à entrada da rua,
o pai lavou os pés, limpando as gretas de barro.
A mãe arribou a saia, sentada no chão, lavou-se.
Os pixotes esfregaram seus pés e saíram do rio,
botaram as chinelas, atentos às ações dos pais.

A mãe andava aos tombos por causa dos saltos.
Os pixotes sentiam medo dali e pisavam devagar,
receosos de chamarem a atenção das pessoas.
Não imaginavam aquele monte de casas e gente
O mundo agora lhes parecia muito mais alargado.

Eles iriam ganhar puxões de orelhas e cascudos?
Os guris retraiam-se, encostando-se às paredes,
com os ouvidos repletos de sons desconhecidos.
Olhavam tudo, abobados com coisas nunca vistas.
Como botavam na ideia tantos nomes esquisitos?

A família aproximou-se da igreja e foi entrando.
Baleia, inquieta, ficou na calçada, olhando a rua,
Na saída, os guris sentiram falta da cachorrinha.
Como achar a bicha naquele mundaréu de gente?
Devia estar perdida, levando pontapés, coitadinha.

Baleia reapareceu, mostrando seu contentamento.
Os pixotes, ainda nervosos, puseram a lhe explicar:
tinham tomado um susto por causa de seu sumiço,
mas a cadela não deu a menor importância à lição,
apenas sentia os cheiros estranhos e esquisitos.

Baleia quis latir, mostrar o desgosto a tudo aquilo,
mas nunca convenceria Sinha Vitória e seu marido.
A opinião dos guris era igual a dela, tinha sabença.
Esperavam ansiosos voltar pra casa, lá na caatinga,
e deixar aquele mundão feio e sem nenhum sentido.

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