Filme – M – O VAMPIRO DE DÜSSELDORF

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Autoria de Lu Dias Carvalho

Mdul  Mdula

A culpa não é minha (…). Não posso ajudar a mim mesmo. Não tenho controle sobre isto. Esta coisa diabólica entrou em mim: o fogo, as vozes, o tormento. Esta coisa está lá o tempo todo, controlando os meus desejos pelas ruas, seguindo-me, silenciosamente, mas não posso parar. Isto me possui. Quero escapar, quero fugir de mim mesmo, mas é impossível. Não consigo escapar. Tenho que obedecer. E saio pelas ruas perdido. Quero fugir disso, mas como? Sou possuído pelos fantasmas. Fantasmas de mães e das crianças. Elas nunca me deixam. Exceto quando faço isto. Depois leio os cartazes e vejo o que fiz. Como eu fiz isso? Mas não consigo me lembrar de nada. Mas, quem irá me acreditar? Quem sabe o que é isto para mim? Como sou forçado a fazer. Eu não quero, mas preciso. Alguém me ajude! (Hans Beckert)

O acusado está dizendo que não pode ajudar a si mesmo. Ele diz que tem que matar. Neste caso, ele pronunciou a sua própria sentença de morte. Alguém que admite sua impulsão para assassinar, deve ser extinto como um incêndio. Este homem tem que desaparecer, tem de ser eliminado. (O presidente da associação dos marginais)

O meu prezado presidente, que eu acredito ser procurado pela polícia por três assassinatos, disse que meu cliente prenunciou a sua própria sentença de morte. Este impulso, que o leva a matar, prova a sua inocência. Esta obsessão torna o meu cliente um irresponsável. E ninguém pode punir um irresponsável. Digo que este homem está doente. E que não deve ser entregue a um carrasco, mas sim, a um médico. Ninguém vai matar um homem que não é responsável por seus atos. Nem o Estado e nem vocês. O Estado é quem deve tomar as medidas que o tornem inofensivo, para ele deixar de ser perigoso para a sociedade. Todos querem me silenciar. Não permitirei que cometam um crime em minha presença. Eu ordeno que este homem tenha a proteção da lei. (O advogado do réu)

M – O Vampiro de Düsseldorf (1931) foi um dos primeiros filmes sonoros do cinema alemão e o primeiro filme falado do diretor Fritz Lang, o mais famoso diretor do cinema expressionista alemão, que usou nele poucos diálogos, mas transformou a câmara, que percorre ruas e escritórios e espeluncas, numa personagem delatora. O enredo do filme é inspirado num acontecimento real: a conduta de um serial killer, Peter Kurten, de Düsseldorf.

Hans Beckert (Peter Lorre) é um pedófilo atarracado e de olhos esbugalhados, que perambula pelas ruas da cidade alemã, seduzindo crianças com doces, balões e sua falsa amizade, para depois matá-las (os assassinatos não são mostrados no filme). Uma bola largada para trás, ou um prato vazio, ou um balão subindo em meio aos fios da rede elétrica sugere os crimes. Subtende-se que ele molesta as crianças, para matá-las em seguida. Enquanto não é descoberto, as pessoas desconfiam umas das outras, num clima de tensão e medo.

À medida que o número de crianças assassinadas avoluma-se, também cresce a indignação dos moradores da cidade em relação à polícia que demora em prender o malfeitor. Embora a pressão sobre a polícia seja cada vez maior e essa trabalhe dia e noite, vasculhando cada canto do lugar, os resultados são nulos. Os criminosos ressentem-se com a força policial espalhada por toda a cidade, que lhes impede o trabalho marginal. E, para aliviarem a tensão e poderem trabalhar em paz, formam uma rede para capturar o assassino, com a ajuda da associação de mendigos e das mulheres dos bordéis, espalhados por todos os lados. Assim, Hans Beckert (também chamado de Franz Becker) passa a ser procurado tanto pela polícia quanto pelos criminosos.

O diretor Fritz Lang intercala, magistralmente, as reuniões dos policiais com a dos bandidos. É preciso muita atenção do espectador, para saber quando se trata de uns e de outros, pois há muitas semelhanças entre elas, sobretudo as salas sombrias, o tom ríspido e a fumaça de cachimbos que esconde o rosto dos personagens.

O grupo de malfeitores logra êxito, ao botar a mão no assassino, embora a polícia já estivesse na pista do homem. Para que o caso não se arraste por mais tempo e, para que os marginais possam voltar à ativa, a gangue opta por julgar Hans, ignorando os trâmites legais. Reúne-se num porão, ambiente opressivo, com a presença de um grande número de pessoas do submundo e com parentes das vítimas. Os criminosos exercem a função de juízes. Nomeia um advogado como defensor do réu e dá início ao julgamento. É neste momento, que Hans confessa estar à mercê de forças superiores e que não controla a sua vontade.

Embora Hans Beckert seja o personagem central do filme, o seu tempo na tela é muito pequeno. Tampouco existe qualquer mistério em torno de sua identidade, pois, é visto logo no início do filme, olhando-se num espelho. A sua fala importante dá-se durante o julgamento, quando se encontra acuado e amedrontado. A maior parte da película é centrada na sua procura. Somente ao final, Hans ganha a oportunidade de se explicar, quando, totalmente lúcido, confessa suas fraquezas e questiona seus perseguidores. Em seu discurso, deixa claro que ele é uma vítima indefesa, enquanto os marginais, ali presentes, tinham tudo para serem diferentes. Eles são livres para cometer seus crimes, enquanto ele não tem escolha. Após sua defesa, Hans Beckert deixa de ser um monstro, para se transformar num homem doente que pede compaixão.

Em M – O Vampiro de Düsseldorf, Hans Beckert, o personagem central da trama, deixa uma interrogação sobre o fato de ser ou não culpado, por carregar uma psicose que o comanda e alucina, retirando-lhe o livre-arbítrio. Ele deixa claro que, qualquer um dos presentes poderia estar no seu lugar, sem direito de escolha. Fica para o espectador a mesma interrogação: E se fosse eu que estivesse no lugar de Hans?

M é inicial de Mörder, assassino, M é também o sinal que todos nós, indistintamente, trazemos nas duas mãos. (Agnaldo Farias)

Cenas imperdíveis:

• Por ocasião dos créditos iniciais do filme, enquanto a tela fica escura, um som aterrorizante é ouvido.

• O primeiro assassinato é sugerido através de uma montagem: o prato vazio da criança, a mãe gritando por ela e seu balão (presenteado pelo assassino) enroscado nos fios da eletricidade.

• A detenção de um velho inocente, suspeito de ser o assassino de crianças. Ele é atacado por uma multidão que o cerca.

• As conferências conspiratórias compostas por homens de rostos sinistros, vistos em meio às sombras e circundados pela fumaça.

• O criminoso observa uma vitrine e vê o reflexo de uma garotinha no vidro, o que traz o seu desejo doentio à tona.

• Uma garotinha mostra ao assassino que ele tem a letra “M” escrita a giz, na altura do ombro esquerdo, na parte de trás do paletó. Um ladrão de rua marcou o assassino para que pudesse ser identificado por seus perseguidores, logo após ter sido reconhecido por um cego.

• O discurso de Hans em sua própria defesa, quando treme de pavor de ser assassinado pelos marginais.

• O filme não possui nenhuma música, a não ser aquela assobiada pelo assassino (Peer Gynt, ária de Grieg), o que realça a dramaticidade do filme. Na cena do julgamento, muitos personagens são marginais de verdade. O assobio era do próprio diretor.

• Lang teve como último trabalho no cinema mudo os filmes Metrópolis (1927) e A Mulher na Lua (1929).

Fritz Lang (1890 – 1976) imigrou-se para os EUA, onde se tornou um famoso diretor de filme noir. Alguns de seus filmes: Vive-se uma só vez; Quando desceram as trevas; Os corruptos; No silêncio de uma cidade; Os conquistadores… Para muitos admiradores do cineasta, M – O Vampiro de Düsseldorf é a sua obra-prima.

O cineasta Fritz Lang queria que seu filme tivesse como título “Os Criminosos estão entre nós”, mas seu título foi vetado pelas autoridades nazistas da época. Segundo alguns críticos, Lang cria o retrato fiel da Alemanha pré-nazista. E, mesmo tendo sido convidado a trabalhar como cineasta oficial do III Reich, ele preferiu deixar a Alemanha. Fugiu primeiro para a França e depois para os Estados Unidos. Largou para trás a mulher Thea, que mais tarde se tornaria nazista, enquanto ele era metade judeu. A temática preferida na obra de Lang era “a luta do homem contra as forças que pretendem aniquilá-lo”.

Fontes de pesquisa:
Tudo sobre Cinema/ Sextante
A Magia do Cinema/ Roger Ebert
Ilha Deserta/ Publifolha

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