ÍNDIA – OS NOIVOS CRIANÇAS

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Autoria de Lu Dias Carvalho

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Venha o que vier, precisarei me adaptar, pois as mulheres têm de fazer sacrifícios, porque neste país as coisas são feitas para os homens. (Shobha Choudhary, casada desde os oito anos)

Segundo a lei indiana, o casamento de crianças é proibido, pois legalmente uma moça só pode se casar após completar 18 anos. Mas entre a realidade e a lei jaz uma abissal distância, sendo que em muitas regiões do país, principalmente nos vilarejos, a afronta à lei corre solta, com as autoridades fazendo ouvidos moucos.

O casamento é normalmente arranjado pelos pais, orgulhosos de suas meninas, que consideram como meros objetos de troca. Para burlar qualquer tipo de vigilância, o casório é realizado lá pelas tantas da madrugada, caso não se possa contar com a anuência de um policial corruptível. Pois, caso a cerimônia seja barrada, além de passar pela escaldadura da prisão, a família ainda purgará pelo vexame de ver os preparativos abortados e a filha solteira dentro de casa, tendo perdido a ocasião de casá-la com “uma pessoa respeitável”. Terá então de correr o risco de ver seu pequeno rebento perder a virgindade com outro homem que não é o esposo escolhido pela família tão “zelosa”.

Quando a família consegue burlar a frouxa lei e o casamento é efetuado, a tradição indiana exige que se leve em conta a “gauna” (ocasião em que a nova esposa deixa a sua família, para ir morar com a família do marido). A esposa mirim só deve fazer a mudança após a sua puberdade (Segundo o Aurélio: Conjunto das transformações psicofisiológicas ligadas à maturação sexual que traduzem a passagem progressiva da infância à adolescência). Enquanto isso, ela ficará morando com a própria família. Mas é enganoso pensar que as coisas sempre acontecem assim. A permanência da menina com a própria família é muito curta, pois ao se casar, ela terá que abandonar sua gente e se entregar literalmente à família do marido, tornando-se serviçal da sogra e dela sofrendo maus tratos, na imensa maioria das vezes. As filhas que ainda se encontram sob o teto de seus pais são tidas como “riqueza de outro” (paraya dhan). Triste ironia!

Os moradores de tais regiões carregam a concepção de que, ao casar a filha ainda criança, o pai estará protegendo-a de uma possível desonra, pois ao inseri-la no estado civil de casada, ela se tornará respeitada por todos os homens. Como sempre, a honra da família é a manobra mais comum para justificar e encorajar o casamento infantil. E quanto mais pobre for uma comunidade, menor é a possibilidade de que uma menina ou moça desvirginada venha a se casar. Discriminação que fortalece o casamento infantil, pois o desrespeito à mulher é muito grande, e, portanto, nenhuma garota está livre de ser estuprada.

É muito comum que numa família ocorra o casamento de muitas garotas ao mesmo tempo. Mas existem inúmeras artimanhas para escamotear o casório das menininhas, ainda muito distantes da puberdade. Essas uniões são feitas de modo a não levantar a menor suspeita.  Um dos estratagemas é não colocar o nome das crianças nos convites. E, como as cerimônias são celebradas na calada da noite, as pequeninas são retiradas da cama, ainda dormindo, levadas nos braços e depositadas diante do sacerdote hindu (quando a família pertence à religião hinduísta).  Muitas vezes, o marido é um garotinho de quatro a cinco anos mais velho do que a esposa. O casalzinho, na maioria das vezes, continua dormindo, apesar das reprimendas dos pais.

Embora a Índia faça parte do BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul – países emergentes que se destacam no cenário mundial como nações em desenvolvimento), continua muito atrasada em relação aos direitos da criança e da mulher, sendo o casamento a vitrine mais visível de tal paradoxo. A maioria dos casamentos realizados no país ainda é organizada pelos pais ou parentes mais próximos, sem que a mulher tenha a liberdade de escolha. A suposta importância da família do noivo sobrepõe-se à vontade da futura esposa. Ela deixa de ter qualquer distinção como indivíduo, diante de seu núcleo familiar que alega saber o que é bom para ela. Fato que contribui para fortalecer e perpetuar o sistema de castas e subcastas na Índia.

Fontes de Pesquisa:
National Geographic/ Setembro/2011

Nota:  Rajini e seu pequeno noivo.
Foto retirada da revista National Geographic

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