Vidas Secas – O ANJINHO (1)

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Autoria de Lu Dias Carvalho

cap baleia

Afadigada e esfomeada a família caminhava,
após se resfolegar pelas areias do rio peco,
em desassossegada busca por uma sombra,
mas só havia galhos secos na caatinga rala.

Sinha Vitória coo filho escanchado no lombo,
menino mais velho e a cachorra Baleia atrás;
Fabiano, cambaio e coo aió a tiracolo, levava
cuia presa ao cinturão e espingarda no ombro.

Na praino vermelho, os juazeiros na vastidão
zombavam: abeiravam, recuavam e sumiam.
Caçada desesperada da família por sombra,
lasso, o guri mais velho aboletou-se no chão.

A caatinga salpicada por ossadas brancas,
urubus voando perto dos bichos moribundos.
Eles desencarnando de cansaço, sede e fome
no desalmado oritimbó do miserável mundo.

– Anda, condenado do diabo – gritou Fabiano.
Mas o guri no acomodamento fechou os olhos.
– Anda, excomungado –  gritou o pai enfezado.
O menino não se mexeu no seu padecimento.

Fabiano, irado, pensou em matar seu pixote.
O coração ia carregoso de desespero e ódio.
Queria incriminar alguém por sua desgraça.
A seca e a obstinação da criança o irritavam.

Poderia imolar a cria naquele descampado,
mas matutou nos urubus, ossadas e na seca.
Acochou-se e arrebanhou o petiz pelo pulso.
Não iria deixar o anjinho pros bichos do mato.

Entregou a velha espingarda a Sinha Vitória,
botou o filho no cangote, agaturrou os braços,
finos como cambitos, caídos sobre seu peito.
A viagem seguiu mais arrastada e silenciosa.

Caros amigos, tomei para mim uma tarefa quase impossível, que é contar Vidas Secas (Graciliano Ramos)a através de versos. Desculpem-me a pedantice, mas vou tentar.

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