{"id":13789,"date":"2014-08-10T13:01:46","date_gmt":"2014-08-10T16:01:46","guid":{"rendered":"http:\/\/virusdaarte.net\/?p=13789"},"modified":"2015-10-15T13:11:21","modified_gmt":"2015-10-15T16:11:21","slug":"meu-pai-um-exemplo-de-vida","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/virusdaarte.net\/meu-pai-um-exemplo-de-vida\/","title":{"rendered":"MEU PAI – UM EXEMPLO DE VIDA"},"content":{"rendered":"

Autoria de Luiz Cruz<\/strong><\/p>\n

\"cruz1\"<\/a><\/p>\n

Meu pai, Ant\u00f4nio Faustino da Cruz<\/em>, ou Antonio Joanito<\/em>, como era conhecido pelos velhos amigos, nasceu em 1919, em Tiradentes, e faleceu no dia 5 de julho de 2014, em S\u00e3o Jo\u00e3o del Rei. Foi uma das figuras mais queridas de Tiradentes, em sua hist\u00f3ria contempor\u00e2nea, testemunho de diversos fatos e da revitaliza\u00e7\u00e3o da cidade. Dono de mem\u00f3ria privilegiada, conhecia cada fam\u00edlia local e tamb\u00e9m do povoado de Bichinho, onde tinha muitos amigos. Gostava de anotar tudo, com letra desenhada e tra\u00e7o impec\u00e1vel. Tinha o h\u00e1bito da leitura di\u00e1ria. Trabalhou como vendedor, barbeiro, servente, carteiro. Foi enfermeiro pr\u00e1tico, volunt\u00e1rio, e, atrav\u00e9s dessa atividade, salvou muitas vidas.<\/p>\n

Na tenra idade de cinco anos, ele vendeu pastel no cinema e teatro, atualmente Museu Casa Padre Toledo, circulando com um pequeno balaio, antes e durante as sess\u00f5es. N\u00e3o conhecia os n\u00fameros, mas recebia ajuda para lidar com o dinheiro. O ganho era revertido para a fam\u00edlia numerosa. Aos seis anos, tornou-se coroinha, ajudando nas missas. Acompanhou o padre Jos\u00e9 Bernardino em muitas jornadas, tanto na zona urbana de Tiradentes quanto na rural. O transporte usado era o cavalo da par\u00f3quia, denominado Aventureiro<\/em>. Ia \u00e0 garupa. Tornou-se sineiro da Matriz de Santo Ant\u00f4nio. Trabalhou no Hotel S\u00e3o Jos\u00e9, onde muitos dos h\u00f3spedes eram tuberculosos que vinham se tratar no Balne\u00e1rio de \u00c1guas Santas. Com a transfer\u00eancia do hotel para S\u00e3o Jo\u00e3o del Rei, ele o acompanhou. Ali, trabalhou como entregador de mantimentos e servente de pedreiro, juntamente com seu pai, Joanito<\/em>. Os dois iam e voltavam a p\u00e9.<\/p>\n

Aos doze anos, meu pai foi enviado \u00e0 Barbacena para fazer um curso de auxiliar de enfermagem e, ao retornar, assumiu a antiga fun\u00e7\u00e3o de cuidar dos enfermos de Tiradentes e do povoado de Bichinho. Circulava por todos os cantos a p\u00e9 ou de bicicleta, aplicando inje\u00e7\u00e3o e ministrando outros medicamentos, ap\u00f3s seu trabalho. Aprendeu o of\u00edcio de barbeiro e teve um sal\u00e3o durante longos anos. Cuidava dos presos da Antiga Cadeia de Tiradentes, barbeando-os e lhes aplicando medica\u00e7\u00e3o, quando necess\u00e1rio. Foi tentar a vida no Rio de Janeiro, onde teve dificuldade para encontrar trabalho. Tornou-se vendedor de doces. Ao retornar, continuou com suas atividades anteriores, tanto em Tiradentes quanto em Bichinho. E, ao cuidar do senhor Vicente Jos\u00e9 da Costa, o Vicente Firmino, quando doente, e o visitar durante bom tempo, acabou se casando com sua filha mais velha, Ant\u00f4nia Augusta, a Dona Nica<\/em>. O casal teve doze filhos, dos quais sobreviveram dez. Moraram em diversos locais at\u00e9 comprar uma casa na Rua Direita, onde nasceram alguns filhos e a fam\u00edlia vive h\u00e1 mais de meio s\u00e9culo. Enquanto os filhos dormiam, o casal tecia colares e pulseiras em prata, trabalhando at\u00e9 a exaust\u00e3o, o que rendia um complemento or\u00e7ament\u00e1rio para a fam\u00edlia.<\/p>\n

Meu pai tornou-se funcion\u00e1rio dos Correios e Tel\u00e9grafos, fazendo o servi\u00e7o sozinho, recebendo e entregando a mala diariamente na esta\u00e7\u00e3o. Tudo chegava e saia via trem. Entregava as correspond\u00eancias e tinha cuidado especial com os telegramas. Entrou na pol\u00edtica e foi eleito vice-prefeito, experi\u00eancia partid\u00e1ria \u00edmpar em sua vida. Ao se aposentar dos correios, reabriu seu sal\u00e3o de barbearia, onde ainda trabalhou v\u00e1rios anos. Paralelamente, fazia colchetes (fechos) para pulseiras e colares e tamb\u00e9m bolinhas para os ter\u00e7os. Adorava futebol, n\u00e3o perdendo uma partida do Aimor\u00e9s Futebol Clube ou do Gr\u00eamio Esportivo, times rivais. Foi fidel\u00edssimo aos amigos. Era chamado pela comunidade de Vitoriano Veloso como “o m\u00e9dico do Bichinho”. Tanto l\u00e1 quanto em Tiradentes fez diversos partos. Al\u00e9m da sa\u00fade f\u00edsica, tamb\u00e9m cuidava da espiritualidade. Preparou muitos enfermos para a passagem desta para a outra vida. Concedeu extrema-un\u00e7\u00e3o. Banhou e barbeou defuntos. Muitas vezes foi a p\u00e9 a S\u00e3o Jo\u00e3o del Rei comprar um caix\u00e3o, trazendo-o nas costas, para fazer um enterro, propiciando um m\u00ednimo de dignidade a muitos conterr\u00e2neos.<\/p>\n

Em sua casa, na Rua Direita, meu pai teve uma farm\u00e1cia. Distribu\u00eda rem\u00e9dios aos doentes. Comprava grandes vidros de comprimidos atendendo aos que o procuravam, dia e noite, pedindo socorro e medicamento. Tornou-se Ministro Extraordin\u00e1rio da Eucaristia, levando a comunh\u00e3o aos enfermos, bem como a palavra de F\u00e9 e Esperan\u00e7a. Participou de quase todos os Jubileus da Sant\u00edssima Trindade, ajudando a coletar as inten\u00e7\u00f5es das missas, apresentando-as ao iniciar as celebra\u00e7\u00f5es. Anualmente, ele preparava os santos protetores do ano, com sua bela caligrafia, e os distribu\u00eda nas primeiras missas de cada ano. Ao final das missas, de que participava, puxava a sua ora\u00e7\u00e3o preferida: Alma de Cristo<\/em>.<\/p>\n

O dia que meu pai considerava mais importante era o de Corpus Christi. Para celebr\u00e1-lo, colocava seu terno branco e se revestia de alegria. Passava o ano todo picando papel branco para enfeitar a rua para a prociss\u00e3o do “Corpo de Deus”, celebra\u00e7\u00e3o que considerava ser o evento mais importante da Igreja Cat\u00f3lica. Devoto fervoroso de Nossa Senhora do Perp\u00e9tuo Socorro, tinha sua imagem em frente a sua cama. Diariamente, rezava tr\u00eas ter\u00e7os. Foi ao Santu\u00e1rio Nacional de Nossa Senhora Aparecida muitas vezes, de onde sempre trazia uma imagem sacra diferente. Gostava de receber visitas e apresentar aos turistas o seu quarto, com seus quadros de santos e imagens. Circulava por lugares inusitados, onde havia amigos. Adorava contar os casos antigos de Tiradentes aos visitantes. No seio de sua fam\u00edlia, soube trilhar o cotidiano, utilizando seu sentido mais refinado, a audi\u00e7\u00e3o. Ouviu cada um com seus problemas. Sempre teve uma palavra e uma ora\u00e7\u00e3o para ajudar. Nunca deu ordem, apenas orientou e ofereceu seus ombros para o consolo.<\/p>\n

Meu pai sempre foi um homem doente. Passou por diversas cirurgias. Sentia prazer em circular pelos quartos do hospital, visitando e rezando com os enfermos. Preparou-se para partir! Em sua \u00faltima noite no Hospital Nossa Senhora das Merc\u00eas dizia que tinha uma viagem marcada. Arrancou os equipamentos e queria se levantar para a viagem. Ap\u00f3s ora\u00e7\u00f5es, acalmou-se. Dormiu e acordou melhor, tomou caf\u00e9, conversou. Depois passou mal, teve duas paradas cardiorrespirat\u00f3rias e partiu. Iria completar noventa e cinco anos. Teve uma vida longa, com uma vasta hist\u00f3ria. Como um dos muitos exemplos deixados por ele, a solidariedade humana \u00e9, sem d\u00favida, o mais forte. Ele foi solid\u00e1rio a muitas pessoas e fam\u00edlias nos momentos de tristeza e de dor. Soube, como poucos, amenizar o sofrimento f\u00edsico e levar o conforto espiritual, atrav\u00e9s da palavra de Deus.<\/p>\n

Adeus, meu saudoso pai! Seu exemplo \u00e9 a maior heran\u00e7a deixada para seus filhos.<\/p>\n

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