{"id":1675,"date":"2013-03-01T14:44:37","date_gmt":"2013-03-01T17:44:37","guid":{"rendered":"http:\/\/virusdaarte.net\/?p=1675"},"modified":"2022-07-26T15:38:23","modified_gmt":"2022-07-26T18:38:23","slug":"india-a-luta-dos-panteras-dalit","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/virusdaarte.net\/india-a-luta-dos-panteras-dalit\/","title":{"rendered":"\u00cdNDIA \u2013 A LUTA DOS PANTERAS DALIT"},"content":{"rendered":"

Autoria de<\/strong> <\/b>Lu Dias Carvalho<\/strong>
\n<\/b><\/p>\n

\"ambdar\"<\/a><\/p>\n

Em Bombaim, o poderoso discurso do dr. Ambedkar<\/i>, ao se converter ao Budismo,\u00a0\u00e9 adotado pelos intoc\u00e1veis instru\u00eddos, num movimento militante que se autodenomina Panteras Dalit<\/em>.<\/p>\n

\u00a0Cansados, ap\u00f3s longos s\u00e9culos de sujei\u00e7\u00e3o a todas as castas, esses dalits<\/i> rebelam-se, usando o mesmo caminho de Gandhi<\/i>: a desobedi\u00eancia civil. Conscientizam-se de que n\u00e3o \u00e9 mais poss\u00edvel aceitar o engodo de que inexistem. Truque usado pela fraqueza das autoridades indianas e pelo poder do bra\u00e7o forte do hindu\u00edsmo, para lhes negar qualquer tipo de direito, quer como cidad\u00e3os ou como seres humanos. N\u00e3o \u00e9 mais poss\u00edvel serem fantasmas<\/i> que necessitam de comida, abrigo, sa\u00fade e educa\u00e7\u00e3o.<\/p>\n

Os Panteras Dalit<\/i> reagem contra o entulhamento subumano em que se encontram nas favelas e cal\u00e7adas das ruas de seu pa\u00eds, fazendo uso da \u00e1gua de esgoto, limpando excrementos humanos, trabalhando como coveiros, lixeiros e vendo seus filhos e idosos mendigarem pelas ruas, sendo enxotados como c\u00e3es sarnentos, onde quer que estejam. Eles possuem agora a consci\u00eancia de que “n\u00e3o” valem muito menos de que uma vaca, um macaco, ou outro bicho qualquer, dentro do pr\u00f3prio pa\u00eds. Reagem \u00e0 cegueira que lhes imp\u00f5e a sociedade indiana em rela\u00e7\u00e3o ao saber, quando os impede de ter acesso \u00e0 educa\u00e7\u00e3o, como se fossem animais soltos no mato.<\/p>\n

N\u00e3o \u00e9 mais poss\u00edvel aceitar viver num pa\u00eds que se diz democr\u00e1tico, sem usufruir dos direitos de cidad\u00e3os livres. \u00a0Lutam para romper com um sistema de servid\u00e3o, que dura mais de 3.000 anos. N\u00e3o d\u00e1 mais para ser “a poeira debaixo dos p\u00e9s de Brahma”, ou o desaguadouro dos dejetos da estupidez humana, que lhes nega at\u00e9 mesmo o acesso aos templos hindus, onde poderiam descarregar suas dores diante do que consideram divino. \u00c9 preciso reagir contra os estupros feitos contra suas mulheres e crian\u00e7as, contra os barracos queimados, porque a cren\u00e7a diz que n\u00e3o podem ter moradia e \u00e9 preciso pagar a d\u00edvida do Karma. D\u00edvida essa, nunca contra\u00edda, mas criada pelos poderosos espertalh\u00f5es das castas altas.<\/p>\n

\u00a0A vig\u00eancia da Constitui\u00e7\u00e3o, em todos os seus artigos, precisa ser efetiva. Chega de leis que n\u00e3o passam de espectros, quando o que vigora de fato \u00e9 o poder dos br\u00e2manes<\/i> e dos x\u00e1trias<\/i> em todo o pa\u00eds, que eles ousam, absurdamente, chamar de democr\u00e1tico. A luta pelos direitos civis dos intoc\u00e1veis encontra motiva\u00e7\u00e3o nas campanhas dos negros americanos e na dos sul-africanos. Se eles podem, os dalits<\/i> tamb\u00e9m podem e devem lutar pela\u00a0 dignidade de serem respeitados como cidad\u00e3os.<\/p>\n

As raposas vorazes n\u00e3o querem dividir o osso, \u00e9 fato, e ainda contam com a cegueira do Ocidente, que age como se fora os tr\u00eas macaquinhos chineses (n\u00e3o ou\u00e7o, n\u00e3o vejo, n\u00e3o falo), optando por n\u00e3o se intrometer. A omiss\u00e3o \u00e9 a resposta certeira dos egoc\u00eantricos. \u00c9 preciso colocar-se em guarda contra a possibilidade de \u201cessa gentalha\u201d<\/i> ter direitos, pensam os fin\u00f3rios encastoados, alegando que essa gente n\u00e3o existe, n\u00e3o ocupa lugar no pa\u00eds, \u00e9 invis\u00edvel, fantasmag\u00f3rica e dever\u00e1 continuar a s\u00ea-lo, pois \u00e9 poeira\u00a0 e no lixo deve ficar. A luta \u00e9 encarni\u00e7ada, com o sangue dos intoc\u00e1veis banhando o solo do pa\u00eds da suposta \u201cespiritualidade<\/i>\u201d, num paradoxo maluco e bizarro sem precedentes na hist\u00f3ria humana.<\/p>\n

Juntos ao dr. Ambedkar,<\/i> centenas de milhares de p\u00e1rias convertem-se ao Budismo. Muitos outros buscam o Islamismo e mais outros o Cristianismo. E, mesmo ali, ainda sentem o peso velado do preconceito. Pois as tradi\u00e7\u00f5es hindus possuem tent\u00e1culos nas entranhas de toda a sociedade indiana. O sistema, dirigido pelas castas altas, usa suas garras afiadas para n\u00e3o permitir o rompimento dos elos da corrente de a\u00e7o que separam os grandes dos pequenos. H\u00e1 muito poder em jogo. A partilha mudaria a dire\u00e7\u00e3o da correnteza. \u00c9 inadmiss\u00edvel a mudan\u00e7a da ordem das pe\u00e7as do tabuleiro indiano, pensa os grandes. N\u00e3o se permite altera\u00e7\u00e3o no jogo, quando se est\u00e1 ganhando. Rei \u00e9 rei e pe\u00e3o \u00e9 pe\u00e3o. E a rainha (Constitui\u00e7\u00e3o) tem medo de usar sua liberdade de movimento.<\/p>\n

\u00a0A poeira \u00e9 apenas p\u00f3 e pronto! \u00c9 preciso dizim\u00e1-la antes que se transforme numa tempestade como as vistas no Saara. Para isso, o \u00f3dio sai a campo na terra da \u201cespiritualidade<\/i>\u201d, fazendo dezenas de milhares de v\u00edtimas, que novamente voltam ao p\u00f3, de onde jamais deveriam ter sa\u00eddo, pensam eles \u2013 os ricos. Qualquer tipo de atrocidade \u00e9 justific\u00e1vel, para escorra\u00e7ar os c\u00e3es nauseabundos e famintos, de modo que reconhe\u00e7am o lugar que lhes foi reservado h\u00e1 mais de 3.000 anos. \u00c9 muita\u00a0 cara de pau,\u00a0 exigirem o que n\u00e3o\u00a0 merecem, se nada s\u00e3o, como definem os\u00a0 costumes e as tradi\u00e7\u00f5es\u00a0 de um povo t\u00e3o\u00a0 \u201cespiritualizado\u201d.<\/p>\n

Aldeias dalits<\/i> s\u00e3o incendiadas. Mulheres e crian\u00e7as estupradas. Homens dalits<\/i> s\u00e3o aprisionados em emboscadas. Seus l\u00edderes amea\u00e7ados de terem a cabe\u00e7a decepada, se continuarem a insistir na busca por direitos que nunca possu\u00edram. A poeira tenta resistir ao vendaval, invadindo templos, tentando quebrar o elo de milhares de bizarras tradi\u00e7\u00f5es, paridas para tornarem os dalits<\/i>, p\u00e1rias de um pa\u00eds, onde abunda a \u201cespiritualidade<\/i>\u201d, somente vis\u00edvel para os tolos. A poeira torna-se mais densa dando cria a l\u00edderes dalits<\/i> em todo o pa\u00eds.<\/p>\n

\u00a0Dalits<\/i> s\u00e3o queimados, mas do p\u00f3 de seus ossos nasce a coragem de seguir adiante e a certeza de terem sido os primeiros habitantes da \u00cdndia, muito antes da invas\u00e3o do pa\u00eds pela ra\u00e7a ariana. N\u00e3o mais aceitam a inferioridade como uma causa divina, mas como uma cilada preparada pelos descendentes da ra\u00e7a branca em conluio com o hindu\u00edsmo. Tampouco, aceitam a dor e o sofrimento como \u00fanicos direitos que possuem em vida. Exigem o cumprimento da Constitui\u00e7\u00e3o indiana. Mas as castas ricas n\u00e3o arredam p\u00e9. S\u00e3o mais fortes, possuem o comando do pa\u00eds.<\/p>\n

\u00a0Uma tocante \u201cCarta dos Direitos Humanos dos Dalits\u201d<\/i> foi redigida com fortes apelos \u00e0 ONU<\/i> e \u00e0 Comunidade Internacional<\/i>. Acreditavam os intoc\u00e1veis que o mundo, ao tomar conhecimento das atrocidades por eles sofridas, tomaria posi\u00e7\u00e3o.\u00a0 Expectativa que n\u00e3o se consumou. As leis do pa\u00eds continuam imorais, de modo que as senten\u00e7as variam de conformidade com as castas. Tampouco a Constitui\u00e7\u00e3o<\/i> garante aos intoc\u00e1veis os direitos mais elementares necess\u00e1rios a um ser humano.<\/p>\n

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