<\/a><\/p>\nSentada \u00e0 minha frente, uma mo\u00e7a, de mais ou menos vinte anos, est\u00e1 me fazendo um relato detalhado da sua forma\u00e7\u00e3o profissional e da sua experi\u00eancia adquirida em trabalhos anteriores. Desta vez n\u00e3o \u00e9 uma paciente, mas uma candidata ao cargo de secretaria, quem estou entrevistando.<\/p>\n
Olhando para ela, eu volto no tempo e me vejo vinte anos mais jovem, sentado no seu lugar, em frente do todo poderoso diretor de um dos maiores hospitais de olhos dos Estados Unidos, onde eu estava fazendo um est\u00e1gio, na esperan\u00e7a de ser admitido como residente.<\/p>\n
Alguns minutos antes, eu havia cruzado com ele, por acaso, no corredor do hospital, quando ele me chamou para uma reuni\u00e3o. Andei at\u00e9 o seu escrit\u00f3rio, onde eu pensava ter com ele uma conversa apenas informal. N\u00e3o sabia que, nesse momento, eu estava me dirigindo para uma das entrevistas mais importantes da minha carreira.<\/p>\n
Na mesa da sua sala havia um livro aberto, provavelmente um romance. Fiquei surpreso pelo fato de n\u00e3o se tratar de um livro de oftalmologia, e tentei descobrir o nome da obra. Ele notou a minha curiosidade e me perguntou se eu j\u00e1 havia lido aquele livro que era um “best-seller” da \u00e9poca. Respondi com ingenuidade que n\u00e3o me sobrava muito tempo para dedicar \u00e0 leitura de livros que n\u00e3o tratassem especificamente de oftalmologia.<\/p>\n
Acabava de fechar, sem saber, uma porta. Ele me fez outras perguntas muito gen\u00e9ricas e das quais eu n\u00e3o me lembro, com exce\u00e7\u00e3o de uma:<\/p>\n
– Voc\u00ea \u00e9 casado?<\/p>\n
N\u00e3o – respondi, e acrescentei, n\u00e3o sei por que – gra\u00e7as a Deus!<\/p>\n
A porta que eu havia fechado agora a havia trancado definitivamente, e jogado a sua chave no lixo. A entrevista terminou com a sua promessa de me chamar quando aparecesse uma vaga dispon\u00edvel. Quantas noites, enquanto aguardava desesperadamente ser chamado, passei sem poder dormir, na solid\u00e3o do meu quarto, revivendo esse epis\u00f3dio vergonhoso da minha vida.<\/p>\n
Precisava eu ter transmitido ao meu interlocutor que, naquele momento preciso, estava com meu destino em suas m\u00e3os? A impress\u00e3o triste e, acima de tudo, falsa de que ele tinha na sua frente um rapaz arrogante, sem nenhum interesse para a leitura e sem o menor respeito para com o casamento? E, consequentemente, com a fam\u00edlia, que \u00e9 a base da vida e representa a mais importante institui\u00e7\u00e3o da nossa sociedade?<\/p>\n
A fim de fugir dessa sensa\u00e7\u00e3o constrangedora, “abandono” a cadeira de entrevistado, onde a minha mente estava “sentada”, deixando-a para minha futura secret\u00e1ria, que est\u00e1 terminando de me convencer que ela \u00e9, sem nenhuma d\u00favida, a pessoa mais qualificada para me auxiliar,<\/p>\n
Como ela, eu poderia ter tentado passar ao diretor do hospital uma imagem um pouco aperfei\u00e7oada da minha personalidade. Poderia ter explicado, por exemplo, que o meu estado de solteiro n\u00e3o fazia de mim uma amea\u00e7a \u00e0 sociedade, e n\u00e3o era motivado pelo fato de ser inimigo do casamento, mas sim pelo fato de n\u00e3o ter encontrado ainda minha alma g\u00eamea. Poderia tamb\u00e9m ter esclarecido que n\u00e3o me dedicava \u00e0 leitura por falta de interesse, mas sim de tempo, t\u00e3o empenhado que estava no momento em “escrever” um cap\u00edtulo muito importante da minha vida, cujo final feliz ou n\u00e3o, dependia da sua decis\u00e3o de me dar uma oportunidade.<\/p>\n
Enquanto analiso os diversos argumentos que eu poderia ter apresentado em meu favor, o meu olhar cai sobre o retrato de uma menina sorridente de oito anos. \u00c9 a minha filha que, a cada dia, traz-me mais felicidade, e aquela entrevista faz-me concluir que, no final, a minha entrevista n\u00e3o poderia ter sido melhor.<\/p>\n
Nota:<\/span> ilustra\u00e7\u00e3o do autor<\/p>\nViews: 2<\/p>","protected":false},"excerpt":{"rendered":"
Autoria do Dr. Ivan T. Large Sentada \u00e0 minha frente, uma mo\u00e7a, de mais ou menos vinte anos, est\u00e1 me fazendo um relato detalhado da sua forma\u00e7\u00e3o profissional e da sua experi\u00eancia adquirida em trabalhos anteriores. Desta vez n\u00e3o \u00e9 uma paciente, mas uma candidata ao cargo de secretaria, quem estou entrevistando. Olhando para ela, […]<\/p>\n","protected":false},"author":1,"featured_media":0,"comment_status":"open","ping_status":"closed","sticky":false,"template":"","format":"standard","meta":{"sfsi_plus_gutenberg_text_before_share":"","sfsi_plus_gutenberg_show_text_before_share":"","sfsi_plus_gutenberg_icon_type":"","sfsi_plus_gutenberg_icon_alignemt":"","sfsi_plus_gutenburg_max_per_row":"","_monsterinsights_skip_tracking":false,"_monsterinsights_sitenote_active":false,"_monsterinsights_sitenote_note":"","_monsterinsights_sitenote_category":0,"_jetpack_memberships_contains_paid_content":false,"footnotes":""},"categories":[16],"tags":[],"aioseo_notices":[],"jetpack_featured_media_url":"","jetpack_sharing_enabled":true,"_links":{"self":[{"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/20754"}],"collection":[{"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/posts"}],"about":[{"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/types\/post"}],"author":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/users\/1"}],"replies":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/comments?post=20754"}],"version-history":[{"count":4,"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/20754\/revisions"}],"predecessor-version":[{"id":25334,"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/20754\/revisions\/25334"}],"wp:attachment":[{"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/media?parent=20754"}],"wp:term":[{"taxonomy":"category","embeddable":true,"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/categories?post=20754"},{"taxonomy":"post_tag","embeddable":true,"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/tags?post=20754"}],"curies":[{"name":"wp","href":"https:\/\/api.w.org\/{rel}","templated":true}]}}