{"id":26944,"date":"2016-02-07T14:13:08","date_gmt":"2016-02-07T16:13:08","guid":{"rendered":"http:\/\/virusdaarte.net\/?p=26944"},"modified":"2016-02-07T15:59:28","modified_gmt":"2016-02-07T17:59:28","slug":"india-jovem-pesquisador-dalit-suicida","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/virusdaarte.net\/india-jovem-pesquisador-dalit-suicida\/","title":{"rendered":"\u00cdNDIA \u2013 JOVEM PESQUISADOR DALIT SUICIDA"},"content":{"rendered":"
Autoria de Luiz A. G\u00f3mez\/ Calcut\u00e1<\/strong><\/p>\n <\/a><\/p>\n \u00cdndia: Suic\u00eddio de jovem pesquisador dalit gera onda de protestos contra discrimina\u00e7\u00e3o por castas. Sem terra, escola ou respeito, \u2018os intoc\u00e1veis’ s\u00e3o discriminados de todas as formas e, na maior parte das vezes, impedidos de buscar qualquer ascens\u00e3o.<\/em><\/strong><\/p>\n Nem a melhoria da situa\u00e7\u00e3o econ\u00f4mica ou o diploma de curso universit\u00e1rio s\u00e3o capazes de acabar com o estigma de ter nascido \u201cdalit\u201d (intoc\u00e1vel) na \u00cdndia. Isto \u00e9 o que nos prova o suic\u00eddio do jovem Rohit Vemula, em raz\u00e3o do rigoroso sistema de castas indiano, num pa\u00eds cheio de deuses e endeusado por muitos, como o centro da espiritualidade no planeta. E este caso \u00e9 apenas\u00a0 mais um dos muitos suic\u00eddios e assassinatos de estudantes dalits. Abaixo a transcri\u00e7\u00e3o do texto de Luiz A. G\u00f3mez, no site Opera Mundi<\/em>:<\/p>\n Na centen\u00e1ria cidade de Hyderabad, antiga capital de reinos mu\u00e7ulmanos e hoje n\u00facleo da ind\u00fastria da tecnologia na \u00cdndia, na noite do dia 17 de janeiro do presente ano, Rohith Vemula decidiu escrever suas \u00faltimas palavras. \u201cAmava a ci\u00eancia, as estrelas, a natureza, e depois amava as pessoas sem saber que elas se divorciaram faz muito tempo da natureza\u201d<\/em>, escreveu o jovem doutorando da Universidade de Hyderabad. \u201cO valor de um homem foi reduzido \u00e0 sua identidade imediata, \u00e0 sua mais pr\u00f3xima possibilidade [de ser]\u201d<\/em>. Rohith organizou suas coisas, despediu-se pedindo n\u00e3o perturbar seus amigos e inimigos e enforcou-se no pequeno quarto da resid\u00eancia estudantil, onde um amigo estava lhe dando alojamento.<\/p>\n Aos 26 anos, pobre e com seus direitos como estudante suspensos, inclusive a bolsa com a qual sustentava e apoiava sua m\u00e3e e seu irm\u00e3o mais novo, Rohith n\u00e3o apenas queria escrever sobre Ci\u00eancia. \u201cComo Carl Sagan\u201d<\/em>, queria mudar o mundo, come\u00e7ando pelo seu entorno: membro do que desde muitos mil\u00eanios atr\u00e1s se conhece na \u00cdndia como as castas mais baixas, os intoc\u00e1veis, o jovem era um conhecido ativista pelos direitos daqueles que, como ele, s\u00e3o discriminados diariamente em todos os \u00e2mbitos da vida p\u00fablica do pa\u00eds. E sua morte come\u00e7ou a sacudir esse pa\u00eds imenso, dividido e cheio de deuses e de religi\u00f5es.<\/p>\n Os dalits (ou \u201cgente maltrapilha\u201d, como seria sua tradu\u00e7\u00e3o direta do hindu) s\u00e3o, na verdade, um conglomerado de grupos sociais, tradi\u00e7\u00f5es e of\u00edcios milenares que, segundo a religi\u00e3o hindu, s\u00e3o formados pelas pessoas que est\u00e3o mais baixo na escala social, religiosa e econ\u00f4mica, sem direito a nada: nem terra, nem escola, nem respeito. Ainda assim, nessa rigidez hier\u00e1rquica, o mais famoso entre eles, o Dr. B. D. Ambedkar, foi o principal redator da Constitui\u00e7\u00e3o indiana e um severo cr\u00edtico de Gandhi, com quem polemizou durante muitos anos. Para sua gente, \u00e9 um her\u00f3i quase m\u00edtico. Por isso, a grande maioria das organiza\u00e7\u00f5es dalit na \u00cdndia t\u00eam Ambedkar em algum lugar, no nome ou no logotipo. Como a Associa\u00e7\u00e3o de Estudantes Ambedkar (ou ASA), da Universidade de Hyderabad, que Rohith Vemula liderou com entusiasmo durante um tempo para ajudar estudantes como ele.<\/p>\n A vida de um estudante de uma casta baixa nessa universidade nunca foi f\u00e1cil. Pulyla Raju, que se suicidou em 2013, ao n\u00e3o poder avan\u00e7ar em seus estudos (perseguido por companheiros e professores), ou Sunitha, que se suicidou gr\u00e1vida, em 2007, quando o jovem de uma casta privilegiada, que a seduzia, se negou a casar-se com ela por ser de outra casta, e zombou dela at\u00e9 depois da morte, sabiam bem disso. Assim como os 10 estudantes dalits que, nos anos 1980, foram suspensos por \u201ccontaminar\u201d as aulas e nunca mais puderam voltar a estudar.<\/p>\n Da mesma forma que acontece em D\u00e9lhi e Mumbai, os estudantes dalits s\u00e3o discriminados sistematicamente na Universidade de Hyderabad. Negam-lhes comer nos refeit\u00f3rios das universidades (para n\u00e3o \u201ccontaminar\u201d os pratos e os copos), batem em seus companheiros de outras castas, e os professores, com boas maneiras, humilham-nos nas aulas explicando que o conhecimento n\u00e3o est\u00e1 ao alcance deles, como revelou uma pesquisa do doutor Narayan Sukumar, acad\u00eamico da Universidade Jawaharlal Nehru, em D\u00e9lhi, que fez seu mestrado em Hyderabad.<\/p>\n \u00c9 comum inscreverem contra eles insultos nas paredes e no Facebook, como fez h\u00e1 alguns meses Susheel Kumar, dirigente estudantil de uma casta alta e sobrinho de um conhecido pol\u00edtico do partido Bharatiya Janata, o partido do primeiro-ministro Narendra Modi. Os insultos de Kumar n\u00e3o passaram despercebidos para Rohith Vemula e os membros da ASA, que o confrontaram com um protesto. O covarde aceitou eliminar seus posts e tudo pareceu voltar \u00e0 aparente normalidade na Universidade de Hyderabad. Mas, no dia 4 de agosto, Susheel Kumar decidiu acusar os membros da ASA de agredi-lo e feri-lo. A den\u00fancia teve uma resposta imediata das autoridades universit\u00e1rias, em particular do vice-reitor Appa Rao. Os cinco estudantes dalits ativistas foram suspensos em agosto de 2015 e a sua \u201cv\u00edtima\u201d seguiu sua rotina, mas Rohith e o seu grupo protestaram at\u00e9 que a universidade formou uma comiss\u00e3o para investigar o caso.<\/p>\n Nada. A comiss\u00e3o universit\u00e1ria n\u00e3o encontrou prova alguma da suposta agress\u00e3o contra Susheel Kumar. Mas isso n\u00e3o importou: alguns meses depois, os estudantes da ASA continuavam suspensos na Universidade de Hyderabad sem raz\u00e3o provada (bom, por fazer o que um estudante faz: protestar). Rohith deixou de receber sua bolsa (e de mandar dinheiro para casa). Os dalits tiveram de sair da resid\u00eancia estudantil e instalaram-se em uma barraca na entrada do recinto. Um retrato de Ambedkar, mantas para se cobrir e alguns livros e pap\u00e9is era tudo o que possu\u00edam. Oprimido pela rejei\u00e7\u00e3o, sem dinheiro nem casa, Rohith tirou a pr\u00f3pria vida. Mas n\u00e3o agiu sozinho, como demonstrariam nos dias seguintes as cartas de um parlamentar, uma ministra do governo nacional e, sem d\u00favida, os protestos dos milhares e milhares de cidad\u00e3os em todos os cantos da \u00cdndia.<\/p>\n Nos dias posteriores ao suic\u00eddio de Rohith Vemula, muitos estudantes universit\u00e1rios come\u00e7aram a protestar em Mumbai, D\u00e9lhi, Calcut\u00e1, Madras e outras cidades. O destacado poeta Ashok Vajpeyi, estudante em sua juventude da Universidade de Hyderabad, devolveu seu t\u00edtulo universit\u00e1rio. Centenas de acad\u00eamicos de todo o mundo enviaram cartas de protesto e os meios de comunica\u00e7\u00e3o durante uma longa semana se ocuparam do jovem estudante que morreu se sentindo vazio, desejando \u201cviajar para as estrelas… conhecer outros mundos\u201d.<\/p>\n Come\u00e7aram a aparecer os documentos que provam que essa discrimina\u00e7\u00e3o n\u00e3o apenas \u00e9 comum, mas sistem\u00e1tica. Como na carta do parlamentar Bandaru Dattatreya (de 17 de agosto), que chama os estudantes da ASA de \u201cextremistas\u201d e pede que as autoridades fa\u00e7am algo contra eles. Dattatreya \u00e9 o ministro do Trabalho e Emprego da \u00cdndia. Ou a correspond\u00eancia assinada por altos funcion\u00e1rios do minist\u00e9rio de Recursos Humanos e Desenvolvimento e o vice-reitor Rao, tendo como \u201cassunto\u201d as atividades \u201cantinacionais\u201d na Universidade de Hyderabad e o \u201cataque\u201d ao jovem dirigente Susheel Kumar, e exigiram, em novembro de 2015, que a autoridade universit\u00e1ria resolvesse pessoalmente o problema. Ainda depois de ter sido provada a inoc\u00eancia dos cinco membros da ASA. A ministra de Recursos Humanos e Desenvolvimento, Smriti Irani, alguns dias depois do suic\u00eddio, disse que n\u00e3o se tratava de um conflito entre dalits e n\u00e3o dalits. \u201cHouve uma tentativa maliciosa de projetar o problema como uma batalha de castas. A verdade \u00e9 que n\u00e3o \u00e9\u201d<\/em>, disse Irani no dia 19 de janeiro, anunciado a cria\u00e7\u00e3o de uma equipe de investiga\u00e7\u00e3o para esclarecer o assunto.<\/p>\n O corpo de Rohith Vemula foi cremado de forma quase clandestina. Sua m\u00e3e recebeu as mensalidades da bolsa depois de uns dias. E ainda que ningu\u00e9m tenha sido acusado de nada (e o primeiro-ministro Narendra Modi tenha falado \u201cda dor de uma m\u00e3e que perdeu seu filho\u201d), o vice-reitor Appa Rao deixou seu posto de maneira indefinida e os quatro estudantes da ASA foram readmitidos na Universidade de Hyderabad. Mas os protestos continuam, em Hyderabad e em D\u00e9lhi, entre os estudantes e os milh\u00f5es de dalits que habitam a \u00cdndia. Os quatro companheiros de Rohith Vemula pediram que Appa Rao entregue-se \u00e0 pol\u00edcia e que seja feita uma investiga\u00e7\u00e3o criminal. Porque h\u00e1 dois fatos nesse drama que a \u00cdndia hoje discute: o sistema de castas continua vigente, discriminando cidad\u00e3os em todos os \u00e2mbitos, e Rohith, que estava \u201cdesesperado para come\u00e7ar uma vida\u201d<\/em>, est\u00e1 morto porque era um dalit.”<\/p>\n Leiam mais sobre: Nota:<\/span> Luis A. G\u00f3mez | Calcut\u00e1 – 06\/02\/2016 – 08h00 <\/p>\n Views: 1<\/p>","protected":false},"excerpt":{"rendered":" Autoria de Luiz A. G\u00f3mez\/ Calcut\u00e1 \u00cdndia: Suic\u00eddio de jovem pesquisador dalit gera onda de protestos contra discrimina\u00e7\u00e3o por castas. Sem terra, escola ou respeito, \u2018os intoc\u00e1veis’ s\u00e3o discriminados de todas as formas e, na maior parte das vezes, impedidos de buscar qualquer ascens\u00e3o. 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\nhttp:\/\/operamundi.uol.com.br\/conteudo\/reportagens\/43136\/india+suicidio+de+jovem+pesquisador+dalit+gera+onda+de+protestos+contra+discriminacao+por+castas.shtml<\/p>\n