<\/a><\/em><\/p>\nHoje o samba saiu procurando voc\u00ea\/ Quem te viu, quem te v\u00ea\/ Quem n\u00e3o a conhece n\u00e3o pode mais ver pra crer\/ Quem jamais a esquece n\u00e3o pode reconhecer. (Chico Buarque<\/em><\/strong>)<\/em><\/p>\nMaria Rosa era t\u00e3o linda como o nascer da lua-cheia e t\u00e3o fragrante quanto a flor dama-da-noite, quando se abre, perfumando tudo em volta. Ainda que fosse apenas noite escura, sua voz enchia o ar de m\u00fasica e o seu sorriso perolado alumiava tudo. Nasc\u00earamos no mesmo morro, em ruelas escuras e paralelas. Frequent\u00e1ramos a mesma escola e tamb\u00e9m as mesmas rodas de samba. Mais tarde, l\u00e1 est\u00e1vamos n\u00f3s, como marido e mulher, na quadra de samba do nosso morro: eu como mestre-sala e ela como sambista de uma ala. Eu sempre lhe dizia, ca\u00eddo de benqueren\u00e7a: \u201cVoc\u00ea \u00e9 a mais bonita das cabrochas dessa ala\u201d<\/em>, pois era nos seus passos que eu equilibrava meu entusismo e minha alma. Mas um dia, minha cabrocha ficou diferente, apaixonou-se por um rica\u00e7o e abriu m\u00e3o de nosso amor, nosso filho e nosso barraco. E \u201cHoje a gente nem se fala, mas a festa continua\/ Suas noites s\u00e3o de gala, nosso samba ainda \u00e9 na rua\u201d<\/em>. Como s\u00e3o cru\u00e9is os reveses da vida! \u00c9 como \u00e9 do\u00edda essa minha cr\u00f4nica ferida!<\/p>\nEu ainda me lembro de quando nos prepar\u00e1vamos na quadra da escola, para os desfiles mais importantes do Carnaval, at\u00e9 altas horas da madrugada, cansados e suados por todos os poros. Todos n\u00f3s nos encontr\u00e1vamos extenuados, excetuando Maria Rosa. Perplexo, eu lhe sussurrava em nosso barraco com amor e admira\u00e7\u00e3o: \u201cQuando o samba come\u00e7ava, voc\u00ea era a mais brilhante\/ E se a gente se cansava, voc\u00ea seguia adiante\u201d<\/em>. Mas tudo agora s\u00e3o apenas lembran\u00e7as, pois tudo passou t\u00e3o de repente em nossas vidas. Meu \u00faltimo bilhete a ela dizia-lhe: \u201cHoje a gente anda distante do calor do seu gingado\/ Voc\u00ea s\u00f3 d\u00e1 ch\u00e1 dan\u00e7ante onde eu n\u00e3o sou convidado\u201d<\/em>. \u00c9 verdade, tenho apenas not\u00edcias de seus ch\u00e1s dan\u00e7antes homenageando as grandes damas da alta sociedade. O filho e eu ficamos esquecidos num lugar distante de seu passado. E \u201cQuem n\u00e3o a conhece n\u00e3o pode mais ver pra crer\/ Quem jamais a esquece n\u00e3o pode reconhecer\u201d<\/em>. Numa canhestra maldade, Maria Rosa, a mais perfeita sambista do morro, virou dondoca da fina flor da cidade.<\/p>\nEu, Diego P\u00e9 de Veludo, como me apelidam os que me veem defender minha Mangueira, n\u00e3o \u00a0posso negar que Maria Rosa era a luz dos meus olhos e o sentido de meu viver. \u201cTodo ano eu lhe fazia uma cabrocha de alta classe\/ De dourado eu lhe vestia pra que o povo admirasse\/ Eu n\u00e3o sei bem com certeza por que foi que um belo dia\/ Quem brincava de princesa acostumou na fantasia\u201d<\/em>. Os amigos dizem que tudo foi culpa minha. Mas eu sempre queria v\u00ea-la na maior formosura, ainda que fosse uma deusa apenas por um dia. Como eu amava Maria Rosa, como me enlouquecia essa Maria!<\/p>\nHoje \u00e9 mais uma noite de Carnaval. A verde e rosa parece mais bela do nunca, pois entrar\u00e1 na avenida homenageando o cantor e poeta maior deste pa\u00eds \u2013 Chico Buarque de Hollanda. Estarei com corpo e alma na apresenta\u00e7\u00e3o. Ensaiei os passos mais bonitos, alguns at\u00e9 desconhecidos, para fazer a Mangueira brilhar nessa homenagem ao brasileiro mais genu\u00edno deste pa\u00eds, cuja honra alguma alcan\u00e7ar\u00e1 seu merecimento. Para Maria Rosa mando apenas o recado: \u201cHoje eu vou sambar na pista, voc\u00ea vai de galeria\/ Quero que voc\u00ea assista na mais fina companhia\/ Se voc\u00ea sentir saudade, por favor n\u00e3o d\u00ea na vista\/ Bate palmas com vontade, faz de conta que \u00e9 turista\u201d<\/em>.<\/p>\nAlguns amigos ainda me perguntam se j\u00e1 deixei de cultuar minha cabrocha . A verdade \u00e9 que n\u00e3o. Com poderia, se \u201cO meu samba se marcava na cad\u00eancia dos seus passos\/ O meu sono se embalava no carinho dos seus bra\u00e7os\u201d<\/em>. E para completar meu constrangimento, pois n\u00e3o se escamoteia as coisas do cora\u00e7\u00e3o para os amigos, digo-lhes que \u201cHoje de teimoso eu passo bem em frente ao seu port\u00e3o\/ Pra lembrar que sobra espa\u00e7o no barraco e no cora\u00e7\u00e3o\u201d<\/em>, mesmo sabendo que ela jamais me dirigir\u00e1 um olhar, tamanha \u00e9 a sua ambi\u00e7\u00e3o pela nova vida que ostenta, entre vinhos finos, champanhe e gente f\u00fatil, cujo apre\u00e7o \u00e9 povoado unicamente pela sua nova posi\u00e7\u00e3o.<\/p>\nSei l\u00e1, Mangueira, n\u00e3o sei n\u00e3o, se isso \u00e9 tortura, loucura ou expia\u00e7\u00e3o!<\/p>\n
Obs.:<\/u> ou\u00e7am a m\u00fasica QUEM TE VIU, QUEM TE V\u00ca<\/a><\/p>\nNota:<\/span> Mural de Di Cavalcanti<\/em>, no Rio de Janeiro<\/p>\nViews: 7<\/p>","protected":false},"excerpt":{"rendered":"
Autoria de LuDiasBH Hoje o samba saiu procurando voc\u00ea\/ Quem te viu, quem te v\u00ea\/ Quem n\u00e3o a conhece n\u00e3o pode mais ver pra crer\/ Quem jamais a esquece n\u00e3o pode reconhecer. (Chico Buarque) Maria Rosa era t\u00e3o linda como o nascer da lua-cheia e t\u00e3o fragrante quanto a flor dama-da-noite, quando se abre, perfumando […]<\/p>\n","protected":false},"author":1,"featured_media":0,"comment_status":"open","ping_status":"closed","sticky":false,"template":"","format":"standard","meta":{"sfsi_plus_gutenberg_text_before_share":"","sfsi_plus_gutenberg_show_text_before_share":"","sfsi_plus_gutenberg_icon_type":"","sfsi_plus_gutenberg_icon_alignemt":"","sfsi_plus_gutenburg_max_per_row":"","_monsterinsights_skip_tracking":false,"_monsterinsights_sitenote_active":false,"_monsterinsights_sitenote_note":"","_monsterinsights_sitenote_category":0,"_jetpack_memberships_contains_paid_content":false,"footnotes":""},"categories":[41],"tags":[],"aioseo_notices":[],"jetpack_featured_media_url":"","jetpack_sharing_enabled":true,"_links":{"self":[{"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/27563"}],"collection":[{"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/posts"}],"about":[{"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/types\/post"}],"author":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/users\/1"}],"replies":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/comments?post=27563"}],"version-history":[{"count":6,"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/27563\/revisions"}],"predecessor-version":[{"id":34102,"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/27563\/revisions\/34102"}],"wp:attachment":[{"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/media?parent=27563"}],"wp:term":[{"taxonomy":"category","embeddable":true,"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/categories?post=27563"},{"taxonomy":"post_tag","embeddable":true,"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/tags?post=27563"}],"curies":[{"name":"wp","href":"https:\/\/api.w.org\/{rel}","templated":true}]}}