A \u00e9tica consiste em p\u00f4r nossa liberdade a servi\u00e7o da camaradagem vital que nos aparenta como semelhantes em desespero e alegria. […] A morte pode apagar o que somos, por\u00e9m n\u00e3o o fato de que fomos e ainda estamos sendo. […] Afirmar alegremente a vida \u00e9 d\u00e1-la por boa, embora isso n\u00e3o equivalha a considerar bom cada um dos epis\u00f3dios e fatores que incidentalmente participem dela. (Fernando Savater)<\/em><\/strong><\/p>\nAinda em tenra idade, a crian\u00e7a trava relacionamento com a morte. Mas essa ainda se mostra t\u00e3o irreal e ficcionista como se fosse parte de suas hist\u00f3rias infantis, onde todos os personagens \u201cmaus\u201d, seres humanos ou animais, morrem em raz\u00e3o de suas maldades. Como ela julga a si mesma, sua fam\u00edlia e coleguinhas s\u00e3o pessoas do \u201cbem\u201d, portanto, a morte nunca ir\u00e1 rond\u00e1-los. \u00c9 fato que vez ou outra a crian\u00e7a quer que algu\u00e9m morra, mas apenas no sentido de \u201cdesaparecer\u201d de perto de si e de deix\u00e1-la em paz durante algum tempo. Entretanto, o ser humano adulto v\u00ea a morte como uma realidade cada vez mais pr\u00f3xima, em cada ente familiar, colega, amigo ou conhecido que vai embora para sempre.<\/p>\n
Ningu\u00e9m tem a compreens\u00e3o real do que \u00e9 morrer, ainda que as religi\u00f5es apregoem isso ou aquilo. Todo indiv\u00edduo sabe que vai morrer, contudo, nada conhece sobre a morte. E \u00e9 esse paradoxo que envolve todos n\u00f3s, acostumados que estamos com a Ci\u00eancia que vem desvendando as mais complexas indaga\u00e7\u00f5es. Excetuando a morte. Nossa caminhada ao encontro dela \u00e9 inexor\u00e1vel. O caminhar di\u00e1rio em dire\u00e7\u00e3o a ela, ciente de que nada interromper\u00e1 esse destino, joga as pessoas numa desesperan\u00e7a latente. Algumas delas n\u00e3o aceitam a finitude como regra geral. Querem se conservar a todo custo, viver eternamente, criar exce\u00e7\u00f5es como sempre o fizeram ao longo da vida, \u00e1vidas por riqueza e poder, sem jamais se importar com os que est\u00e3o nos degraus inferiores da pir\u00e2mide social.<\/p>\n
Os indiv\u00edduos ganciosos pensam que encontram no ac\u00famulo de bens um escudo contra a transitoriedade da vida. E passam a querer sempre mais, de modo que a \u201csanta muerte\u201d passe longe deles. Pensam que haver\u00e3o de amedront\u00e1-la. Negam para si que a aniquila\u00e7\u00e3o final n\u00e3o diz respeito a eles e aos seus. Ledo engano! O fim \u00e9 o mesmo para todos: p\u00f3. Sempre o p\u00f3! Eles n\u00e3o sabem que n\u00e3o h\u00e1 nada como a \u00e9tica para assegurar a nossa “imortalidade”, pois ela impede que nos transformemos em prisioneiros da morte, mas “semelhantes em desespero e alegria”<\/em>, como argumenta o fil\u00f3sofo Fernando Savater.<\/p>\nQuanto mais prepotentes, avaras e torpes forem as pessoas, mais dificuldades ter\u00e3o em aceitar a morte, porque sempre se julgaram invulner\u00e1veisa tudo. Morrer sem desfrutar de tanta fortuna acumulada \u00e9 uma injusti\u00e7a \u2013 pensam elas. E esbravejam como se a morte fosse um de seus asseclas, partid\u00e1rios ou sequazes. A \u00fanica maneira de contrapor a esta certeza latente de que se vai morrer um dia \u00e9 viver da melhor maneira poss\u00edvel, a cada dia, apesar de todos os contratempos que possamos encontrar pelo caminho.<\/p>\n
Viver mal \u00e9 morrer duas vezes. Ainda que sejamos perseguidos pela nossa finitude, devemos procurar viver com satisfa\u00e7\u00e3o, valorizando a nossa passagem por este planeta chamado Terra. Somente assim somos capazes de aliviar a nossa condi\u00e7\u00e3o humana de seres finitos. Enquanto estamos vivos temos mais \u00e9 que celebrar a vida, mas com a maior dignidade poss\u00edvel.<\/p>\n
Nota:<\/u> A Fam\u00edlia Enferma<\/em>, obra de Lasar Segall<\/p>\nSugest\u00e3o de leitura:
\n<\/u>Desperta e L\u00ea\/ Fernando Savater<\/p>\n
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Autoria de Lu Dias Carvalho A \u00e9tica consiste em p\u00f4r nossa liberdade a servi\u00e7o da camaradagem vital que nos aparenta como semelhantes em desespero e alegria. […] A morte pode apagar o que somos, por\u00e9m n\u00e3o o fato de que fomos e ainda estamos sendo. […] Afirmar alegremente a vida \u00e9 d\u00e1-la por boa, embora […]<\/p>\n","protected":false},"author":1,"featured_media":0,"comment_status":"open","ping_status":"closed","sticky":false,"template":"","format":"standard","meta":{"sfsi_plus_gutenberg_text_before_share":"","sfsi_plus_gutenberg_show_text_before_share":"","sfsi_plus_gutenberg_icon_type":"","sfsi_plus_gutenberg_icon_alignemt":"","sfsi_plus_gutenburg_max_per_row":"","_monsterinsights_skip_tracking":false,"_monsterinsights_sitenote_active":false,"_monsterinsights_sitenote_note":"","_monsterinsights_sitenote_category":0,"_jetpack_memberships_contains_paid_content":false,"footnotes":""},"categories":[9],"tags":[],"aioseo_notices":[],"jetpack_featured_media_url":"","jetpack_sharing_enabled":true,"_links":{"self":[{"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/27813"}],"collection":[{"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/posts"}],"about":[{"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/types\/post"}],"author":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/users\/1"}],"replies":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/comments?post=27813"}],"version-history":[{"count":6,"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/27813\/revisions"}],"predecessor-version":[{"id":47552,"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/27813\/revisions\/47552"}],"wp:attachment":[{"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/media?parent=27813"}],"wp:term":[{"taxonomy":"category","embeddable":true,"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/categories?post=27813"},{"taxonomy":"post_tag","embeddable":true,"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/tags?post=27813"}],"curies":[{"name":"wp","href":"https:\/\/api.w.org\/{rel}","templated":true}]}}