{"id":48934,"date":"2022-11-18T00:10:00","date_gmt":"2022-11-18T03:10:00","guid":{"rendered":"https:\/\/virusdaarte.net\/?p=48934"},"modified":"2022-11-28T23:16:00","modified_gmt":"2022-11-29T02:16:00","slug":"bipolaridade-x-boderline","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/virusdaarte.net\/bipolaridade-x-boderline\/","title":{"rendered":"BIPOLARIDADE X BODERLINE"},"content":{"rendered":"\n

Autoria de Melissa Silva<\/strong>\"\"<\/a><\/p>\n

Sou sozinha, tornei-me antissocial em raz\u00e3o dos problemas que carrego. Procurei no Google sobre “marido bipolar” e encontrei este site. Eu sou borderline e meu marido \u00e9 bipolar. Os meus pensamentos, ao escrever, fogem um pouco e talvez esteja meio desconexo o texto, espero que entendam.<\/p>\n

No in\u00edcio do namoro foi tudo muito impulsivo e apaixonante. Nenhum dos dois nada sabia sobre esse amor t\u00f3xico. Seu pai morava em Londres, achou uma oportunidade de emprego boa para n\u00f3s e fomos para Camden. Tudo era lindo at\u00e9 a primeira briga, quando ele quebrou alguns m\u00f3veis. Relevei. Depois teve um devaneio. J\u00e1 que trabalhamos com internet, e nada impede o local f\u00edsico de trabalho, fomos para Liberec. Maravilha! Foi lindo. Foi horr\u00edvel tamb\u00e9m. Pouco antes da pandemia explodir, voltamos para o Brasil.<\/p>\n

Em 2010 fui a um psiquiatra. O tratamento \u00e0 base de clonazepam durou um bom tempo. Respondia bem, a\u00ed meu marido achou melhor diminuir a dose e parar. Em 2015 a depress\u00e3o chegou e novamente fui a outro psiquiatra, desta vez diagnosticada com Transtorno Borderline<\/em> devido a outros sintomas e hist\u00f3rico. Novo tratamento, tudo \u00e0 risca e anotado em um bloco de papel os hor\u00e1rios do medicamento. Conseguia executar as tarefas dom\u00e9sticas e ainda trabalhar com \u00e2nimo na empresa. Tudo correndo perfeitamente. Mas nada dura muito. Os psicotr\u00f3picos me maltratam, amortecem o corpo e d\u00e3o alucina\u00e7\u00f5es.<\/p>\n

Meu marido acha melhor parar com o tratamento. Diz que passeios, sol, foco e carinho s\u00e3o a cura. Desisti. Mas permane\u00e7o centrada e atualmente as crises s\u00e3o poucas, mas quando chegam s\u00e3o severas. Eu tentei de todas as formas voltar ao psiquiatra e fazer o tratamento at\u00e9 me estabilizar. Ele me bloqueia, dizendo que eu n\u00e3o tenho nada e m\u00e9dicos s\u00e3o comerciantes. Minha fam\u00edlia acha que ele cuida de mim e “t\u00e1 tudo certo”, pois sempre fui assim, segundo ela. Todas as vezes em que eu tento retornar ao tratamento, esse funciona por meses e logo ap\u00f3s tudo vira uma bagun\u00e7a e ele me impede de prosseguir. Eu aceito, pois acho melhor parar a virar um inferno. Ele n\u00e3o acha que preciso medica\u00e7\u00e3o, pois tudo \u00e9 uma cura pela natureza e preciso somente de \u00e1gua, luz solar e ocupar minha cabe\u00e7a para n\u00e3o deixar minha doen\u00e7a me atacar. Eu caio na dele novamente e entre surtos me machuco.<\/p>\n

O meu marido sofre de bipolaridade desde jovem, mas n\u00e3o aceita medica\u00e7\u00e3o nem terapia. Diz que n\u00e3o existe transtorno mental, que \u00e9 inven\u00e7\u00e3o para os m\u00e9dicos “roubarem” dinheiro, puro com\u00e9rcio. A fam\u00edlia dele em seu \u00faltimo surto alegou que ele n\u00e3o tem nada e fui eu quem o droguei com alguma medica\u00e7\u00e3o minha, resultando da\u00ed o \u201cshow da bipolaridade\u201d. Em certas crises ele se torna compulsivo e deslumbrado. Realiza compras, faz planos, vemos apartamentos fora de nosso Estado como a chance para uma nova vida. Eu me iludo, entro na dele e pesquiso, fa\u00e7o compras e idealizo diversas coisas. De repente tudo muda. As compras j\u00e1 n\u00e3o fazem mais sentido e ficam entulhando cantos da casa, os apartamentos pesquisados viram lixo eletr\u00f4nico no computador. Quantas vezes planejamos as coisas e de v\u00e9spera ele cancela tudo, dizendo que n\u00e3o dar\u00e1 certo, ou que n\u00e3o \u00e9 o momento. Quantos empregos desistidos. Se n\u00e3o fosse o meu sal\u00e1rio n\u00e3o ter\u00edamos mais nada.<\/p>\n

O relacionamento j\u00e1 n\u00e3o presta mais e o sexo \u00e9 raro. Tudo muda da \u00e1gua pro vinho. Juras de amor tornam-se brigas. Abro o celular ou notebook dele, geralmente encontro pornografia escancarada ou conversas com mulheres aleat\u00f3rias de chats de relacionamento. Mas o sexo n\u00e3o existe entre n\u00f3s. Como sou borderline, isso \u00e9 uma linha t\u00eanue. Nosso casamento \u00e9 t\u00f3xico. H\u00e1 dias em que ele me diz que sou a mulher mais linda do mundo, noutro a pornografia toma conta de seu computador e sou um lixo. Mas eu insisto em levar nosso casamento para a frente. Quando ele surta, fica jogado na cama vendo TV a semana toda, ou faz compras e planejamentos fant\u00e1sticos. Quando surto, fico louca, gritando e esbravejando, quebrando as coisas. Como viver assim?<\/p>\n

Filhos \u00e9 imposs\u00edvel devido a minha condi\u00e7\u00e3o e a falta de libido dele. \u00c9 um devaneio ap\u00f3s outro. Eu mergulho em seus planos e assim vivemos, mas depois tudo muda. \u00c9 uma montanha russa. Separa\u00e7\u00e3o? Improv\u00e1vel, morreremos assim. In\u00fameros pap\u00e9is de advogados desfeitos ou rasgados na minha frente. Assinados, depois cancelados. Viagens e passaportes rasgados. Apartamentos com a obra pela metade, depois vendidos por n\u00e3o conseguir morar na pr\u00f3pria obra.\u00a0 Ofertas em trabalhos de multinacionais abandonados por ele dizer que \u201cn\u00e3o est\u00e1 preparado ainda\u201d. Nossa vida \u00e9 feita de diversos percal\u00e7os, devaneios, surtos, vislumbres, altos, baixos, minha agressividade, a impulsividade dele, o amor doentio, o \u00f3dio supremo.<\/p>\n

Estou criando coragem para sumir disso tudo e viver minha vida, meu tratamento. Tenho total consci\u00eancia de que se eu voltasse \u00e0 terapia e \u00e0 medica\u00e7\u00e3o eu seria “normal”. Mas tenho pena de larg\u00e1-lo, pois sei que ele n\u00e3o consegue seguir sozinho, sua vida \u00e9 uma bagun\u00e7a.<\/p>\n

Ao ler meu relato, voc\u00eas podem pensar que isso \u00e9 s\u00f3 fic\u00e7\u00e3o. Quem me dera fosse. \u00c9 o relato de uma mulher de 38 anos com o cora\u00e7\u00e3o quebrado e que j\u00e1 n\u00e3o suporta mais tudo isso! Fica meu recado para que jamais se envolvam com um homem assim. E se envolver por acaso, por favor insista no tratamento, pois ser\u00e1 imposs\u00edvel do contr\u00e1rio viver. Nunca assinem contrato compartilhado, sociedade juntos ou algo do g\u00eanero. Tudo muda no m\u00eas seguinte, quando a fase da doen\u00e7a mental dele muda e isso pode causar danos financeiros e emocionais ser\u00edssimos.<\/p>\n

Ilustra\u00e7\u00e3o:<\/u> A Banheira<\/em>, 1886, obra de Edgar Degas<\/p>\n

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