<\/a><\/p>\nS\u00e1bado \u00e0 tarde. V\u00e9spera do Dia das M\u00e3es. Shopping abarrotado de gente. Sacolas esbarrando umas nas outras. Pra\u00e7a de alimenta\u00e7\u00e3o repleta. Alarido azucrinante de crian\u00e7as. Vontade de tomar um cappuccino. Caf\u00e9 e Arte lotad\u00edssimo. Um casal deixa sua mesinha. Ocupo o espa\u00e7o aguardando a gar\u00e7onete.<\/p>\n
\u00c0 minha frente assenta-se um rapaz de olhos tristes e dedos longos. Pede uma torta de lim\u00e3o \u00e0 gar\u00e7onete que corre de um lado para outro, tentando atender os in\u00fameros clientes. Ele aguarda seu pedido folheando um livro sobre arquitetura. Degusto vagarosamente meu cappuccino, enquanto checo o celular.<\/p>\n
A mocinha aproxima-se balan\u00e7ando as largas ancas. Numa bandeja traz um pratinho com o peda\u00e7o de torta de lim\u00e3o. Deposita-o delicadamente \u00e0 frente do mo\u00e7o de olhos tristes. Ele contempla o peda\u00e7o generoso de torta por alguns segundos. Rodopia o pratinho, escolhendo a melhor posi\u00e7\u00e3o para come\u00e7ar a comer. Cheira a guloseima e, com o garfo \u00e0 m\u00e3o, retira um pequeno bocado. Fecha os olhos, deixando que ele se dissolva em sua boca. Posso notar que um \u201chummm\u201d atravessa seus l\u00e1bios num frouxo ru\u00eddo, acompanhado de um leve balan\u00e7ar de cabe\u00e7a, que traduzi em \u201cQue del\u00edcia!\u201d.<\/p>\n
O mo\u00e7o de olhos tristes parece embebedar-se com aquele peda\u00e7o de manjar dos c\u00e9us, que traz uma delicada camada cremosa branquinha, quase di\u00e1fana, a cobrir-lhe o dorso. Numerosas casquinhas raladas de lim\u00e3o d\u00e3o aroma, sabor e ornamentam a delicada obra-prima, algumas delas salpicando o pratinho branco de porcelana. Na parte inferior da fra\u00e7\u00e3o e em uma de suas laterais, uma camada dourada mais consistente serve de suporte.<\/p>\n
O rapaz de olhos tristes come lentamente, como se nada mais no mundo lhe importasse. Seus olhos, quase sempre fechados, flagram-me duas vezes olhando em sua dire\u00e7\u00e3o. Desvio-me para outro lado, fingindo desaten\u00e7\u00e3o. Mas a verdade \u00e9 que eu estou hipnotizada com a cena e n\u00e3o me desgrudo do mo\u00e7o e de sua torta de lim\u00e3o.<\/p>\n
Minhas pupilas come\u00e7am a dar alarme. Isso mesmo! As meninas dos meus olhos principiam a ficar gulosas, espiando o pratinho do mo\u00e7o de olhos tristes. O olfato entra em ebuli\u00e7\u00e3o, captando um cheirinho extremamente sedutor. As papilas gustativas encharcam minha boca de \u00e1gua. E, para incrementar a avidez, o est\u00f4mago envia-me sinal de que est\u00e1 faminto. E o mo\u00e7o de olhos tristes e dedos longos ali, degustando sua torta que n\u00e3o acaba nunca, fechando e abrindo os olhos, como se fossem um leque.<\/p>\n
Mal o mo\u00e7o de olhos tristes raspa educadamente o \u00faltimo vest\u00edgio de sua torta de lim\u00e3o, limpa a boca e vira-se em dire\u00e7\u00e3o \u00e0 sa\u00edda, aceno para uma das atendentes. Pe\u00e7o-lhe que me traga um peda\u00e7o daquela mesma iguaria. Aquele fora o \u00faltimo, avisa-me ela. Indica-me uma infinidade de outros tipos de torta: amendoim, chocolate, morango, ma\u00e7\u00e3, maracuj\u00e1… Nada h\u00e1 que possa suprir o desejo de degustar um peda\u00e7o de torta de lim\u00e3o.<\/p>\n
Durmo e sonho com o mo\u00e7o de olhos tristes e dedos longos e sua torta de lim\u00e3o. Ele tenta colocar um naco na minha boca, mas o peda\u00e7o sempre cai ao ch\u00e3o. Acordo, ainda mais exasperada, com a boca salivando pela bendita iguaria. Sou a primeira cliente a chegar ao Caf\u00e9 e Arte. Com ansiedade dirijo-me \u00e0 atendente:<\/p>\n
– Mo\u00e7a, dois peda\u00e7os de torta de lim\u00e3o para mim, por favor!<\/i><\/p>\n
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Autoria de Lu Dias Carvalho S\u00e1bado \u00e0 tarde. V\u00e9spera do Dia das M\u00e3es. Shopping abarrotado de gente. Sacolas esbarrando umas nas outras. Pra\u00e7a de alimenta\u00e7\u00e3o repleta. Alarido azucrinante de crian\u00e7as. Vontade de tomar um cappuccino. Caf\u00e9 e Arte lotad\u00edssimo. Um casal deixa sua mesinha. Ocupo o espa\u00e7o aguardando a gar\u00e7onete. \u00c0 minha frente assenta-se um […]<\/p>\n","protected":false},"author":1,"featured_media":0,"comment_status":"open","ping_status":"closed","sticky":false,"template":"","format":"standard","meta":{"sfsi_plus_gutenberg_text_before_share":"","sfsi_plus_gutenberg_show_text_before_share":"","sfsi_plus_gutenberg_icon_type":"","sfsi_plus_gutenberg_icon_alignemt":"","sfsi_plus_gutenburg_max_per_row":"","_monsterinsights_skip_tracking":false,"_monsterinsights_sitenote_active":false,"_monsterinsights_sitenote_note":"","_monsterinsights_sitenote_category":0,"_jetpack_memberships_contains_paid_content":false,"footnotes":""},"categories":[16],"tags":[],"aioseo_notices":[],"jetpack_featured_media_url":"","jetpack_sharing_enabled":true,"_links":{"self":[{"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/827"}],"collection":[{"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/posts"}],"about":[{"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/types\/post"}],"author":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/users\/1"}],"replies":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/comments?post=827"}],"version-history":[{"count":5,"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/827\/revisions"}],"predecessor-version":[{"id":45542,"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/827\/revisions\/45542"}],"wp:attachment":[{"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/media?parent=827"}],"wp:term":[{"taxonomy":"category","embeddable":true,"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/categories?post=827"},{"taxonomy":"post_tag","embeddable":true,"href":"https:\/\/virusdaarte.net\/wp-json\/wp\/v2\/tags?post=827"}],"curies":[{"name":"wp","href":"https:\/\/api.w.org\/{rel}","templated":true}]}}