Recontada por Lu Dias Carvalho
Aqueles eram tempos muito difíceis para os índios, que a cada dia viam a caça desaparecer. Onças, capivaras, cutias, antas, catetos, quatis e tamanduás já não eram mais vistos a correr pela floresta. Tampouco as árvores, com seus frutos pecos, possuíam a companhia dos macacos, bichos-preguiça, araras, gaviões, urutaus, abelhas, urubus, garças, periquitos, jandaias e outros animais. Como se tal sofrimento fosse pouco, os bichos da água também estavam sendo extintos dos rios, lagos e lagoas. Não mais se avistavam botos, peixes-boi, tartarugas, pescadas, ariranhas, sapos, jacarés, pirarucus, tambaquis, arraias e enguias. A cada novo dia, os índios descobriam que dezenas de espécies haviam desaparecido.
Homens, mulheres e crianças das aldeias viviam em permanente tristeza. Até os xerimbabos (animais de estimação) haviam ocultado, ninguém sabe onde, deixando os indiozinhos desconsolados. A fome começava a enfraquecer os mais velhos e os pequeninos. Era impossível sobreviver àquela tribulação. Procurar o Grande Espírito da natureza seria a última saída, ainda que esse exigisse um sacrifício em troca. Dois guerreiros de certa tribo resolveram então procurá-lo. Como não podia ser visto por nenhum ser mortal, ele mandou um mensageiro, que lhes perguntou:
– Por que estais à procura do Grande Espírito? O que dele desejais?
– Nós estamos todos em vias de fenecer, pois as árvores não dão mais frutos, não mais existe caça e tampouco pesca. Nossos velhos estão morrendo e também nossas crianças. Necessitamos de um novo alimento para continuar existindo. – explicou o índio mais velho.
– Bem, tal súplica será atendida, mas terão que lutar comigo, sendo que o mais fraco morrerá. – explicou o mensageiro.
E assim aconteceu. Apenas um dos guerreiros voltou para a aldeia, depois de sepultar, consternado, o amigo. Meses depois, no lugar em que ele fora enterrado, nasceu uma erva poácea (Zea mays), e dela brotaram muitas espigas com seus grãos nutritivos, que podiam ser comidos cozidos ou assados e ainda usados na fabricação de inúmeros alimentos e bebidas. Foi assim que nasceu o milho.
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