Autoria de Raquel Araújo
Tive o prazer de ir ao lançamento do livro “Que Ninguém Nos Ouça: Terapia Virtual Entre duas Mulheres”, obra das escritoras Leila Ferreira e Cris Guerra. A noite foi de um bate papo gostoso. A química entre o palco e a plateia era contagiante. Grande Teatro lotado, pessoas vidradas absorvendo cada palavra. Respeito – raro em eventos, ainda mais nos gratuitos – e risos compartilhados. Amei!
Eu não conhecia a Cris Guerra. Ouvi algo sobre ela há algum tempo, mas nunca me interessei pelos seus escritos. E foi uma ótima surpresa. Trata-se de uma mulher incrível: intensa, com humor refinado e raciocínio rápido. Encantadora. E fez um par imbatível com a Leila Ferreira, que é uma ouvinte extraordinária e tem sempre um toque de delicadeza para tratar de tudo, suavizando e, ao mesmo tempo, extraindo aprendizado profundo até dos assuntos mais doloridos ou mais banais.
Essas mulheres, que aparentemente não têm nada em comum, mostraram uma amizade tão gostosa, daquelas com sintonia, de gente que ri e chora junto. Dá pra ver que não é “fake”, que não era manipulação para vender livros. Essas duas mulheres são transparentes. Também não há desejo reprimido. Pode-se ler tranquilamente o livro, sem medo de ter uma declaração de amor ou um convite picante no próximo parágrafo. Sem segundas intenções, trata-se uma amizade verdadeira entre duas mulheres. Uma, de 45 anos, toda tatuada, mãe de um filho – cujo pai morreu no sétimo mês de gravidez – solteira, tendo sido casada por 4 vezes. A outra, uma mineira do interior, mas que ganhou o mundo, agraciada por uma trajetória profissional incrível que lhe permitiu conhecer tantas pessoas e lugares, mas que sempre lutou contra depressão.
Chorei duas vezes. Ri em incontáveis momentos. O que mais me marcou nessa noite foi a lição de ter encantamento com a vida, apesar de sofrida, complicada, incerta. Permitir-se ficar triste e permitir-se ser consolada. Aprender a relativizar os acontecimentos, a ver a vida de outros ângulos por meio dos olhos generosos da amizade. Foi falado que nós, mulheres, valorizamos muito o relacionamento amoroso, que nos fechamos nele. Mas devemos aprender que o mais importante relacionamento do mundo é a amizade. É ele que nos sustenta.
Leila me tocou especialmente falando do seu arrependimento de não ter tido filhos. Que essa é uma ferida que dói, um vazio que incomoda. Que ela sente que o carinho do público é uma compensação. Fiquei pensando se eu terei algum arrependimento no futuro. Hoje não quero. Mas e depois, quando eu tiver 62 anos? Ao final, Leila fez um convite que me fez sentir uma visitante na casa dela, num domingo de tarde. Tinha pão de queijo com café no saguão, enquanto davam autógrafos. Mas achei que a muvuca de mais de 800 pessoas não combinava com o meu estado interno de querer revolver as palavras, de pensar na vida. Saí com água na boca – mais pela dedicatória que pelo cafezinho.
Convido os leitores do blog Vírus da Arte & Cia a lerem o livro em questão. Tenho a certeza de que irão apreciá-lo muito. Vejam o prefácio de Martha Medeiros:
Doçura, inteligência, graça, suavidade – lembra? Também imaginei que estivessem em extinção, mas descobri que seguem vivos nas páginas de “Que ninguém nos ouça”. Não que seja uma literatura para mocinhas inocentes: o assunto muitas vezes é barra. Nem Leila, nem Cris saltaram de um conto de fadas. Porém, mesmo quando confidenciam a parte “trash” de suas trajetórias, a delicadeza continua mantendo o tom. Amargas? Nem que quisessem. Nem que tentassem. É o único talento que elas não têm.
Duas mulheres incomuns e com experiências singulares: só pelo voyeurismo consentido, já valeria dar uma espiada nessa troca de e-mails entre as duas. Porém, basta abrir a primeira página para perdermos a ilusão de que teremos algum controle sobre a leitura. É a Leila e a Cris que seguram o leitor nas mãos: fisgado e rendido, ele ficará preso até a última linha, quando então retornará à vida acreditando novamente na espécie humana.
Ficha técnica
Título: Que Ninguém nos Ouça: Terapia Virtual Entre duas Mulheres
Editora: Planeta do Brasil, 2016
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Raquel
A sua sensível descrição do trabalho de Leila Ferreira e Cris Guerra deixou-me muito interessada na leitura do livro “Que ninguém nos ouça”. Já o coloquei na minha lista para o primeiro trimestre.
Beijos,
Lu
Oi, Lu!
Fico muito feliz por você ter aberto este espaço de troca. Amo seu blog.
Obrigada!
Beijos
Raquel
Ele se encontra sempre à sua disposição. Traga-nos sempre bons artigos como este.
Abraços,
Lu