Autoria de LuDiasBH
O Renascimento continuava a todo vapor na Itália, exercendo influências nos mais diversos campos. Entretanto, nos países setentrionais (Alemanha, Países Baixos e Inglaterra) as coisas andavam bem complicadas para os artistas. Enquanto os mestres do sul europeu aprendiam a lidar com as novas descobertas, os artistas do norte defrontavam-se com um problema de extrema gravidade para eles: se a pintura podia e devia existir. Mas o que aconteceu com a arte, sobretudo a pictórica e a escultórica, no norte europeu, tão rico em artífices? A cisão religiosa que tanto abalou as estruturas da arte nos países citados tinha um nome: Reforma. Mais uma vez a religião deixava seu real campo de trabalho para se intrometer em outras searas.
O fato é que — como acontece em todas as comunhões — em meio aos adeptos do protestantismo existiam os extremistas que se opunham à existência de pinturas ou estátuas, principalmente nas igrejas, sob a alegação de que se tratava de idolatria. E mais, os protestantes extremados censuravam até mesmo as decorações alegres nas casas. E essas, quando permitidas em “teoria”, o tipo de construções, assim como o clima local, era impróprio para grandes afrescos decorativos, à maneira daqueles com os quais a nobreza italiana ornamentava seus palácios.
Os artistas de terras protestantes —em razão do rigor religioso — viram cair por terra a sua mais importante fonte de renda: a pintura de retábulos. Restava-lhes tão somente a ilustração de livros (objetos acessíveis a um número limitado de pessoas) e a pintura de retratos, o que era insuficiente para garantir-lhes uma vida decente, possibilitando-os a viver da profissão escolhida. Não foram poucos aqueles que abandonaram seu país em busca de ventos mais libertários, onde pudessem trabalhar mais livremente.
O Renascimento no norte europeu estava ligado a sentimentos nacionalistas e religiosos que acabaram por desaguar na Reforma que, por sua vez, dividiu o mundo cristão em duas partes: católico e protestante. O início da Reforma é geralmente estipulado em 1517 (século XVI), quando Martinho Lutero (1483-1546) — crítico da Igreja Cristã de então — passou a pregar contra seus excessos. Era um ferrenho opositor do preceito de que se podia ganhar a salvação eterna praticando rituais e comprando indulgências, uma espécie de passagem para o Céu. Se Martinho Lutero aos nossos dias voltasse, certamente faria uma nova reforma, ao ver que tudo aquilo que condenava, encontra-se a todo vapor em meio àqueles que se dizem profetas de seus ensinamentos (venda de grãos de feijão, de óleo e sal ungidos, de espadas milagrosas, etc, e os mais bizarros rituais em nome da prosperidade). O rompimento total entre católicos e protestantes aconteceu por volta de 1521.
O humanismo alemão também foi impactado pela Reforma, perdendo grande parte de seu vigor, uma vez que os novos líderes religiosos, embora estimassem a eloquência, a poesia, a habilidade retórica e os conhecimentos clássicos, não o via como um fim em si, mas tão somente como um meio de ocupação dos cristãos protestantes. Em consequência de tantas mudanças bruscas, os primeiros humanistas alemães deixaram de lado o interesse por estudos que vinham fazendo, a exemplo da cabala, do ocultismo e do neoplatonismo. As escolas e as universidades protestantes passaram a só ensinar os textos clássicos tidos como “seguros”, ou seja, aqueles que eram convenientes aos novos mandantes. A arte literária tornou-se predominantemente religiosa. Vemos aqui uma prova de que a história da humanidade é cíclica, pois novamente a religião passa a comandar os caminhos do homem na arte.
Os Países Baixos protestantes tornaram-se independentes nos anos finais do século XVI. O estudo dos clássicos centralizou-se na Universidade de Leiden, onde ainda era possível encontrar tolerância religiosa e abertura intelectual. Muitos eruditos por ali passaram, como foi o caso de Lipsius (1547-1606), dono da obra-prima conhecida como Annales de Tácito. Assim como o teólogo e filósofo humanista Erasmo de Roterdã (1466-1536) — tido como o mais importante humanista do norte europeu — que correspondeu com humanistas e eruditos da Europa.
A Polônia foi outro país do norte europeu que teve comportamento igual ao dos Países Baixos. Recebeu refugiados religiosos, não importando a denominação, assim como permaneceu aberto às novas ideias. Ali, a astronomia distinguiu-se entre todos os ramos do conhecimento, sendo capaz de desafiar os dogmas teológicos legados pela Idade Média, tendo no astrônomo e matemático polonês Nicolau Copérnico (1473-1543) sua maior figura. Foi responsável por desenvolver a teoria heliocêntrica do Sistema Solar, jogando por terra a crença de que o Sol gravitava em torno da Terra, o que abalou os ensinamentos dos teólogos que em seus argumentos religiosos citavam a imobilidade da Terra.
O Renascimento do norte europeu, além de ter sido influenciado pela erudição dos mestres italianos, também teve suas próprias características, como o fato de mostrar-se mais voltado para os temas religiosos e de piedade pessoal, enquanto italiano cobria os mais diferentes campos. Se o humanismo do norte buscava a grandiosidade da criação de Deus, vendo o homem como um ser insignificante e sem nenhum mérito, o italiano via o homem como capaz de melhorar a si próprio, capacidade essa que podia vir de uma preparação e educação adequadas. A corte de Rodolfo II em Praga serviu de refúgio para artistas, eruditos e cientistas que discordavam das novas diretrizes eclesiásticas, impedindo, assim, outro conflito religioso.
Exercício
1. O que aconteceu aos artistas após a Reforma no norte europeu?
2. Como a Reforma impactou o humanismo?
3.Qual foi a importância de Nicolau Copérnico?
Fontes de pesquisa
A história da arte/ E. H. Gombrich
Renascimento/ Nicholas Mann