NÃO SEI! SÓ SEI QUE FOI ASSIM… (Parte II)

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Autoria de Lu Dias Carvalho

   Os encontros entre Celestina e seu amante aconteciam ao cair do sol, dia sim e outro também. Mas, como o mundo é muito cruel com os amancebados, o pai do traído recuperou-se antes do tempo previsto, voltando o filho para casa bem antes do esperado. Em apuros, a esposa, irrequieta, tratou de fechar portas e janelas, sob o argumento de que queria ficar na maior intimidade com o seu maridinho, sem que nem mesmo o miado de seu gato ou os ganidos de seu cão os incomodasse.

  Que dureza de vida! No horário de sempre, o amante bateu na porta cerca de três vezes. Arrepios e medo. Celestina disse ao marido que poderia ser uma alma das trevas que escapara do Bosque do Silêncio, sendo preciso agir com cautela e sabedoria, pois uma alma penada jamais poderia ser enxotada, sob risco de revoltar-se e acabar com a vida do ofensor. Pediu-lhe que deixasse por sua conta o contato com o ser do além. Ela, então, recitou em voz alta:

    – Alma sarapantosa que vieste me sarapantar, volta com o teu pavio seco, e num outro dia venhas molhar. Aqui em casa não tem óleo, água ou qualquer outra coisa para te dar. Sigas em paz!

    A suposta alma sarapantosa foi-se embora, sabedora de que o mar ali não estava para peixes, enquanto o marido pôs-se a louvar a coragem de sua destemida mulher.

   As coisas teriam terminado por aí, se um íncubo, ao fazer uma vistoria pelas redondezas, não tivesse assistido a toda a cena. Desse dia em diante, Celestina passou a não ter mais sossego. Moradora que era do Bosque do Silêncio, a tal criatura, conhecida desde a Idade Média como sendo um demônio masculino que tinha relações sexuais com mulheres, não mais a deixou em paz, dela se apoderando como se fosse sua preciosa amante, noite após noite.

      A pobre mulher, quando em casa, não mais tinha aquela ardência amorosa de antes, exigindo a presença do corpo de seu marido. Seu assanhamento não mais habitava a cama do casal. Chegava em casa de manhã, após o serviço de porteira no Bosque do Silêncio, sempre entorpecida, maldisposta e desmilinguida.

  A única coisa que Celestina fazia ao voltar, era contar os sonhos eróticos que tivera, ao adormecer no serviço por alguns minutos. O coitado do marido, entusiasmava-se com os sonhos, mas não tardava a receber um chega para lá, sem entender necas de pitibiriba. Celestina se parecia com uma piedosa beata, alheia aos afagos amorosos do companheiro. Até o velho gato que lhe roçava as pernas causava-lhe repugnância.

       Preocupado com a falta de vitalidade da mulher, que parecia ter sido abduzida por um extraterrestre, o marido resolveu levá-la ao doutor da cidade vizinha, que disse ser coisas de hormônios em baixa, enchendo-a de pílulas. Passado o tempo de espera, conforme pedira o esculápio, o pobre homem não viu mudança alguma na postura de sua outrora assanhada Celestina. Os lençóis continuavam sem amassos. Tal como se deitavam, assim amanheciam, como se ambos fossem dois fervorosos penitentes.  

   Os sintomas da mulher continuavam os mesmos, ou melhor, sua energia vital parecia estar sendo drenada para o Bosque do Silêncio, pois se recusava a faltar um só dia no trabalho. Podia estar mazelenta do jeito que fosse, mas, mesmo se arrastando, rumava feliz para o seu rotineiro serviço. O que havia por lá de tão atrativo?

Obs.: Se corajoso fores, não percas o episódio III.

 

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