Arquivo da categoria: Estilos da Arte

A Arte possui vários estilos ou tendências, cada um com uma filosofia ou objetivo comum, seguido por um grupo de artistas durante um certo período de tempo. Eles são classificados separadamente pelos historiadores de arte para facilitar o entendimento.

Weyden – DEPOSIÇÃO DA CRUZ

Autoria de Lu Dias Carvalho

(Clique na gravura para ampliá-la.)

A intensidade das expressões em suas obras dá aos temas tradicionais uma nova realidade. (Margaret Whinney)

A composição intitulada Deposição da Cruz ou Descida da Cruz é um dos trabalhos mais famosos de Rogier van der Weyden, considerado uma obra-prima da pintura antiga dos Países Baixos. Por muito pouco o mundo não perdeu esta maravilha que, ao ser enviada à Espanha pela regente húngara Maria, quase pereceu num naufrágio. Esta obra — pintada para a capela de Crossbowmen de Louvin — mostra o auge da maturidade artística de Van der Weyden.

A Deposição da Cruz é a parte central de um tríptico, cujos painéis laterais, uma vez separados, acabaram se perdendo com o tempo. A obra foi encomendada pela Guilda dos Arqueiros de São Jorge em Louvain, na atual Bélgica. Nos cantos do quadro o pintor adicionou arcos (bestas) — estruturas decorativas em homenagem aos arqueiros que a encomendaram. Assim como as esculturas contemporâneas, ela é disposta teatralmente. Um exíguo espaço abriga dez figuras esculturais, comprimidas, sendo três no centro, quatro à esquerda e três à direita, impedindo o aprofundamento do cenário arquitetônico.

A obra possui forma retangular, sendo que no centro está um saliente (ressalto) na parte superior, onde se encontra o jovem na escada, responsável por ajudar a descer o corpo de Cristo. A composição com tema religioso tem um fundo liso de ouro — elemento típico da arte gótica — que simboliza a eternidade e o próprio divino. As figuras que pendem da esquerda para a direita parecem esculturas multicoloridas. As paredes são responsáveis por enclausurar o palco do acontecimento. O chão é de pedra e nele crescem algumas plantinhas floridas.

A cena pintada por Van der Weyden em que o corpo de Cristo é retirado da cruz é carregada de intensa emoção e realismo, com os personagens profundamente consternados, ocupando um reduzido espaço sem profundidade, o que ressalta mais ainda o sofrimento das nove figuras presentes à deposição de Cristo. Há em toda a pintura um perfeito equilíbrio advindo da simetria das figuras e da profunda expressão dos rostos dos personagens, como os olhos avermelhados e as lágrimas que escorrem pelo rosto de alguns deles.

Van der Weyden mostra diversas expressões de dor diante do corpo do Cristo crucificado. Elas  vão desde o desespero de Maria Madalena, com as mãos contorcidas, à extrema direita, ao sofrimento silencioso dos santos que ajudam a segurar o corpo de Jesus. Juntas no espaço e no sofrimento as personagens repassam a ideia de que vivem um momento dramático em razão de tão grande perda. A postura plácida dos anciãos contrasta com a dos demais personagens.

As cores apresentadas na composição são fortes, evidenciando a simbologia medieval que acentua o clima de tragicidade. São João Evangelista — segurando a Mãe de Cristo em seu desmaio — veste um manto rubro que simboliza a Paixão de Cristo. Por sua vez, o azul das vestes da Virgem simboliza a perseverança da Fé. O branco do tecido que envolve sua cabeça, representa a pureza e a inocência. Os trajes luxuosos de Nicodemos — segurando os pés de Jesus — simbolizam a fugacidade do luxo e da pompa dos dominadores da terra, diante da caveira e dos ossos dispersos — o fim de todo homem.

O corpo sem vida de Cristo — amparado por José de Arimateia — está postado bem à frente do observador. Ele é o centro da composição. Apesar das cinco chagas  e da coroa que lhe perfura a cabeça, o corpo de Jesus é formoso. José de Arimateia segura-lhe o tronco, enquanto Nicodemos segura-lhe os pés. As áreas vermelhas presentes nas roupas de alguns personagens, além de serem simbólicas dão destaque às chagas de Jesus. O branco do lençol de linho com que José de Arimateia e Nicodemos envolvem o corpo do Mestre contrasta com a sua pele marmórea.

São João Evangelista — a quem Jesus pediu para tomar conta de sua mãe — está inclinado para a frente na tentativa de amparar a Virgem em seu desmaio. De seu rosto escorrem lágrimas. Seu sofrimento é visível, embora contido, pois tem que repassar forças para Maria — a mãe do crucificado — que passa por uma extrema agonia emocional ao ver seu filho morto sob tamanha tortura. Sua pele tem a mesma cor pálida do filho. Ambos estão na mesma posição de abandono. Atrás de São João Evangelista está Maria, mulher de Cléofas — um dos discípulos de Jesus. A mulher de verde não é identificada, sendo provavelmente uma das seguidoras de Cristo. Embora a Bíblia não registre nada sobre isso, era comum adicionar três ou quatro Marias na Crucificação de Cristo.

O homem que se encontra atrás de Nicodemos é um dos seguidores de Cristo. Ele traz na mão direita um pote de unguento. Recostada nele se encontra Maria Madalena, dobrada numa grande contorção em razão da dor extremada que sente ao ver o Mestre morto. Ela usa um cinto que simboliza a virgindade e a pureza. O cinturão está alinhado com os pés de Cristo e a cabeça da Virgem. Sobre a escada que conduz à cruz espremida no centro da composição está o criado, cuja cabeça não é visível em sua totalidade. Ele traz na mão direita os pregos retirados das mãos de Cristo, enquanto com a esquerda segura seu braço inerte.

Van der Weyden fez diversas correspondências na pintura: o movimento do corpo de Cristo assemelha-se ao da Virgem, assim como sua mão esquerda corresponde à  direita de Maria e  sua mão direita corresponde à esquerda dela. Assim, Maria aparece na mesma posição de seu filho, significando que ela sofre  a mesma dor pela qual ele passou. Por sua vez, a posição de São João Evangelista numa ponta do quadro é similar à de Maria Madalena na outra. A presença de um crânio no lado inferior esquerdo da composição — entre Maria e São João — tem a finalidade de reforçar o objetivo pelo qual Cristo se imolou — remir o pecado original cometido por Adão e Eva que simbolizam toda a humanidade.

A Deposição da Cruz é uma obra que tem sido muito copiada ao longo dos tempos. Ela domina a pintura flamenga do século XV, sendo muito difundida na Espanha e objeto de inumeráveis cópias. Já na década de 1430 teve uma réplica feita por um pintor desconhecido para a capela de uma família de Lovaina, na igreja de São Pedro e que se encontra hoje no Museu Stedelijk de Lovaina. Vale a pena ampliar a figura acima (clicando nela) e observar os detalhes das roupas e adornos dos personagens, sobretudo o véu de Maria Madalena e seu cinto.

Ficha técnica:
Ano: c. 1435

Técnica: óleo sobre madeira
Dimensões: 220 x 262 cm
Localização: Museo del Prado, Madrid, Espanha

Fontes de pesquisa:
501 grandes artistas/ Sextante

Gênios da pintura/ Abril Cultural
A história da arte/ E.H. Gombrich
Enciclopédia dos Museus/ Mirador
Gótico/ Taschen
Tudo sobre arte/ Sextante
Arte em detalhes/ Publifolha

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CRISTO PANTOCRATOR

Autoria de Lu Dias Carvalho

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A palavra Pantocrator é de origem grega e significa “Todo Poderoso”, “Onipotente” ou “o Rei de Todos”. Ela também possui variante com acento gráfico no segundo “a”: pantocrátor. Provém de pan (tudo ou todo) e krátos (alto, em cima e, daí, governo, poder). O Cristo Pantocrator, acima representado, trata-se de um gigantesco mosaico do período bizantino que se encontra localizado na abside principal, acima do altar-mor da Basílica Ortodoxa de Monreale, na Sicília, Itália, podendo ser assim analisado:

  • Cristo traz os braços abertos, num largo gesto, que segue a forma da abside, como se recebesse o observador. A auréola ortodoxa com uma cruz no meio, simbolizando a Paixão de Cristo, demonstra a sua grandiosidade como rei espiritual e juiz supremo do Céu e da Terra.
  • A arte bizantina observava com rigor a simetria e a hierarquia. Logo abaixo da imagem de Cristo Pantocrator está a Virgem Maria com o Menino Jesus e à sua direita encontra-se o Arcanjo Gabriel e à esquerda o Arcanjo Miguel. Ao lado de cada arcanjo estão seis apóstolos. Abaixo, estão quatorze santos, sendo sete de cada lado da janela.
  • À esquerda e à direita da cabeça de Cristo encontra-se o Cristograma (monograma) que significa “Jesus Cristo”. As barras vistas acima dessas letras (IC e XC) são um símbolo que indica a divindade do nome.
  • As imagens do Cristo Pantocrator sempre trazem esta expressão séria e meio triste. Embora abra os braços para os fiéis, seus olhos não estão direcionados a eles e sim voltados para cima, ou seja, direcionados ao reino espiritual.
  • Cristo traz na mão esquerda o Evangelho, aberto em João 8:12: “Eu sou a luz do mundo; quem me segue não andará em trevas.” A luminosidade dos mosaicos de ouro ao redor de Cristo reafirma o fato de que Ele é a luz do mundo.
  • A mão direita de Cristo está levantada, na mesma altura da esquerda, num gesto de bênção, muito comum em muitos ícones do Cristo Pantocrator, encontrados na Igreja Ortodoxa tradicional.
  • A postura dos dedos de Cristo expressam as letras gregas “I, C, X, C”, formando o Cristograma “ICXC (Jesus Cristo). Este gestual ainda é usado nos dias de hoje por padres da Igreja Ortodoxa Oriental.

Ficha Técnica
Autor: Artistas desconhecidos
Ano: 1180 – 1190
Técnica: Mosaico
Tamanho: 7m x 13m
Localização: Basílica Monreale, Sicília, Itália

Fontes de pesquisa:
Tudo sobre arte/ Sextante
A história da arte/ E.H. Gombrich
Wikipédia

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O LIVRO DOS MORTOS DO ESCRIBA ANI

Autoria de Lu Dias Carvalho

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Nota: Antes de ler este texto, o leitor deverá conhecer o artigo O LIVRO DOS MORTOS, postado anteriormente, para melhor entendimento do tema. Clique nas figuras para ampliá-las.

O egiptólogo Sir E. A. Wallis Budge comprou em 1880, em Luxor, um rolo de papiro de 23,79 m de comprimento x 38 cm de largura, chamado de Livro dos Mortos do escriba Ani, que se encontrava dividido em 37 fragmentos. O papiro calculado em 3.000 anos de existência era cobre claro ao se desenrolar, mas escurecia assim que entrava em contato com a luz. Retrata o julgamento do escriba Ani no mundo dos mortos. Conheçamos um pouquinho sobre ele.

Ani viveu em torno de 1300 a.C., em Tebas, capital do Reino do Nilo, logo após o reinado do faraó Tutankamón. Pertencia à classe dos ricos funcionários e, por isso, podia comprar o seu Livro dos Mortos na época em que viveu.

Análise do primeiro fragmento (ilustração acima)

  • O escriba real encontra-se adentrando no mundo dos mortos. Apresenta-se ligeiramente inclinado em atitude de respeito. O braço direito apoiado ao peito é sinal de humildade diante dos juízes. A sala, onde são julgadas as ações do escriba no mundo dos vivos, é chamada de sala da justiça plena.
  • Tutu, a esposa de Ani, dança atrás dele (provavelmente morreu antes dele e o acompanha num trecho da jornada). Ela carrega na mão direita um instrumento de metal com que acompanhava as canções do templo, onde era sacerdotisa. Marido e esposa usam roupas de festa e perucas cerimoniais enroladas e trançadas.
  • Uma grande balança encontra-se no centro da composição e, na parte superior, encontram-se os senhores da justiça que reinam sobre a balança. São quarenta e dois juízes, correspondendo às quarenta e duas províncias do Egito.
  • O deus Anúbis (com a cabeça preta de chacal) ajoelha-se sob o braço direito da balança em que pesa o coração do escriba, tendo uma pluma de avestruz como contrapeso. Para os egípcios, o coração era a essência do homem e, por isso, não era necessário pesar a pessoa inteira.
  • Acima do braço esquerdo da balança encontra-se um uma frase de magia, chamada Fórmula para que o coração não se rebele contra o falecido no mundo dos mortos.
  • Um macaco de cócoras sobre o suporte de sustentação da balança olha para o Thoth, deus da escrita e da matemática e monitoriza o funcionamento da balança a partir do topo de sustentação dos braços, para que não haja erros.
  • Atrás do deus Thoth está o devorador de almas e de corpos, Ahmut, esperando o resultado do julgamento. Se o coração de Ani for mais pesado que a pluma de avestruz significa que sua vida não foi justa e, portanto, será entregue ao monstro que devorará seu coração e ele não mais existirá, ou seja, não mais encarnará.
  • Três divindades de baixa patente encontram-se abaixo do braço esquerdo da balança. São elas Shai (o deus do destino) e as deusas Meretseger e Renenutet (uma ao lado da outra). As duas são também deusas do destino, portanto, podem livrar Ani de suas culpas diante do tribunal dos juízes.
  • Ao lado das duas deusas, sobre o túmulo branco, está a alma de Ani que tem a forma de um homem com cabeça de pássaro. Ela está atenta ao ritual da balança que definirá o seu destino.
  • Acima de Shai está a pedra (bloco retangular em que as mulheres egípcias se ajoelhavam) do nascimento de Ani e sobre ela a cabeça da deusa Meretseger mais uma vez representada.
  • Maat, a deusa da justiça e da verdade, é simbolizada pela pluma de avestruz que repousa em um dos pratos da balança. O coração de Ani deve ser tão leve quanto o símbolo da ordem divina.
  • Thoth, o deus dos escribas, de pé atrás de Anúbis, traz na mão esquerda uma paleta de cavidade para tinta e na direita a pena. Anota na parede o resultado da balança, usando uma pena de cana de junco. O julgamento só terá validade após ser escrito.

Análise do segundo fragmento (ilustração acima)

  • Como Ani é absolvido pelos juízes, pois está em harmonia com a ordem divina, é conduzido pelo deus Hórus (com cabeça de falcão) até uma mesa onde se encontram diversas oferendas: bolos, carnes e frutas. Ao fundo encontram-se recipientes de bebidas (vinho ou cerveja).
  • De joelhos Ani oferta tais presentes ao deus Osíris, o Senhor do Mundo dos Mortos.
  • Osíris encontra-se sentado em uma embarcação, dentro de um majestoso tabernáculo de madeira (onde os deuses eram levados em procissões nos dias festivos). Atrás de Osíris estão as deusas Ísis e Néftis.
  • O Senhor da Eternidade leva nas mãos os distintivos do poder: o cajado, o flagelo e o cetro. Sobre a cabeça carrega uma coroa branca, em forma de mitra e duas penas de avestruz.
  • O Livro dos Mortos do Escriba Ani é tido como um dos mais famosos papiros já encontrados, tanto pelo seu tamanho quanto pelas representações gráficas das diferentes fases do julgamento que acontece no mundo dos mortos e por ser um dos mais completos. Encontra-se no Museu Britânico.

Fonte de pesquisa:
Los Secretos de las obras de arte/ Taschen

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O LIVRO DOS MORTOS

Autoria de Lu Dias Carvalho teo123

Grande parte das múmias egípcias encontradas trazia entre as pernas rolos de papiro com ensinamentos (feitiços, fórmulas mágicas, orações, hinos e litanias do Antigo Egito) e ilustrações que tinham por finalidade guiar o falecido  pelo mundo dos mortos de modo a passar, sem grandes dificuldades, da escuridão para a luz. Tais orientações foram nomeadas pelos egípcios como o Livro da Saída para o Dia ou Livro da Chegada à Luz.

No século XIX os ladrões de túmulos, saqueadores de tumbas em busca de riquezas, deram a esses exóticos rolos de papiro o nome de Livro dos Mortos que na verdade não se tratava de um livro na exatidão da palavra, mas de escritos e ilustrações feitos em papiros ou mostrados nas paredes das câmaras mortuárias. Outra informação interessante é o fato de que jamais tais ensinamentos foram encontrados juntos, mas fragmentados em inúmeros papiros e nos corredores e paredes das câmaras mortuárias. Os textos que fazem parte hoje do Livro dos Mortos não são de autoria de uma só pessoa e tampouco pertencem à mesma época.

A princípio os textos que norteavam os passos do falecido para a vida pós-morte eram pintados nas paredes da câmera mortuária oculta da pirâmide, sendo de exclusividade dos reis e nobres. Posteriormente é que, com o uso do papiro, o direito estendeu-se aos funcionários mais ricos do Estado. Só bem mais tarde, a busca pela imortalidade tornou-se um direito de todos. Assim, todo egípcio piedoso tratava de ter o seu Livro dos Mortos que não apenas versava sobre os perigos encontrados no mundo do além, como também ensinava a maneira de contorná-los. Portanto, obter um Livro dos Mortos tornou-se uma grande preocupação daquela gente. Era possível encomendá-lo ou já adquiri-lo pronto para ser usado, sendo necessário apenas colocar o nome do dono. Como podemos observar, nem mesmo os reis estavam isentos de passar pelo julgamento do tribunal de Osíris. Neste ponto, todos se igualavam.

Consta do Livro dos Mortos 200 fórmulas mágicas (192 delas já foram identificadas e catalogadas por arqueólogos e historiadores) que ajudariam o falecido na sua jornada, se ele as pronunciasse no momento certo, é claro. Diante do tribunal dos mortos, devia recitar a sentença de número 125, onde se encontrava a “confissão negativa”:

Eu não fiz injustiça a nenhum ser humano.
Eu não maltratei nenhum animal.
Não retirei as águas transbordadas (do Nilo) na época das enchentes, etc.

Segundo estudiosos, a origem dos Dez Mandamentos está no Livro dos Mortos e na cultura egípcia que muito influenciou a Bíblia. É bom que nos lembremos de que o Egito era a pátria de Moisés, portanto, nada mais natural que tenha sido influenciado por sua cultura religiosa. As ilustrações do Livro dos Mortos também eram de suma importância para o defunto, pois, a representação de um ser vivo ou a de um objeto carregava as mesmas qualidades inseridas nesse. Assim, as estatuetas dos servos, por exemplo, permitiam que esses continuassem a servir o amo na vida após a morte.

Segundo a crença egípcia, aquele que não fosse absolvido pelo tribunal de juízes caía sob as garras de Ahmit (monstro que era uma mistura de vários animais perigosos), devorador de corpos e de almas. Se ele devorasse o coração do morto, esse sofreria uma segunda morte e deixaria de existir para sempre. Tendo, assim, a maior de todas as punições: a não reencarnação.

Os egípcios consideravam que o coração era o centro da personalidade, a morada do intelecto, a vontade e a consciência, a habitação das boas e más ações. Por isso, o momento mais temido e decisivo para o morto era a pesagem do coração, pois durante o julgamento, o seu próprio coração poderia se rebelar e testemunhar contra seu dono. Deve ser por isso que se diz que “o coração é terra que ninguém vai”. Mas, para evitar tal perigo, o Livro dos Mortos continha uma fórmula mágica denominada Fórmula para que o coração não se ponha contra o falecido no mundo dos mortos. Exemplo de um pequeno trecho da fórmula:

Meu coração, não te oponhas a mim no tribunal.
Não te mostres hostil a mim.
Não digas mentiras sobre mim na presença dos deuses, etc.

O que podemos constatar através do Livro dos Mortos é que, no Egito Antigo, a existência não findava com a morte. Cria-se na imortalidade da alma e num mundo espiritual. Através da reencarnação o homem poderia renascer e ganhar novas experiências. A morte não passava de uma espinhosa jornada que findaria com a salvação do falecido ou com a sua total destruição. Deixar de existir era o pior de todos os castigos. Daí a esperança de que o Livro dos Mortos conduzisse o morto até o paraíso, livrando-o de se transformar no nada, ainda que tivesse que ludibriar os juízes. Segundo a visão dos antigos egípcios, o Livro dos Mortos foi criado por Thoth, o deus dos escribas.

Fonte de pesquisa:
Los Secretos de las obras de arte/ Taschen

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Van Eyke – OS ESPONSAIS DOS ARNOLFINI

Autoria de LuDiasBH
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Tira as sandálias dos pés, porque o lugar em que estás é uma terra santa. (Êxodo)

Também conhecida como As Bodas de Arnolfini ou O Casal Arnolfini esta é uma das pinturas mais famosas e mais conhecidas de Jan van Eyke e um dos seus mais admiráveis trabalhos. Acredita-se que esta obra retrate Giovanni Arnolfini, um rico mercador italiano, e sua noiva Giovanna Cenami que se estabeleceram e prosperaram na cidade de Bruges (hoje Bélgica) entre 1420 e 1472. O quadro pode ter sido encomendado para celebrar o matrimônio do casal. Os estudiosos do assunto ainda não chegaram a uma conclusão final sobre as figuras retratadas, assim como a que cerimônia a cena refere-se, mas trataremos a obra como um casamento.

Para muitos, na pintura de Jan Van Eyck não apenas está registrada uma cerimônia de casamento, como traz uma visão das obrigações inerentes ao casamento naquela época em que homem e mulher detinham diferentes deveres. Enquanto Giovanni mostra-se altivo e indiferente, sua esposa inclina a cabeça em atitude de submissão. A postura dos esposos é extremamente cerimoniosa, bem propícia à solenidade da ocasião. O casal encontra-se de pé em seu quarto. A jovem mulher coloca sua mão direita aberta, com a palma virada para cima, sobre a mão esquerda do noivo que tem a mão direita erguida para prestar o juramento do matrimônio. No casamento cristão o ajuntamento das mãos do casal faz parte do ritual da união. O gesto das mãos encontra-se quase que no centro da composição. É importante observar que a curva que elas criam é também vista no candelabro, dando uma unidade à composição.

Embora o noivo ainda se encontre de chapéu e tabardo (antigo capote de mangas e capuz) com remates de pele de marta, já não usa mais os tamancos — retirados antes de entrar na casa. Tal gesto e a presença do cãozinho são tidos como sinais de fidelidade. Também se tirava os sapatos durante uma cerimônia religiosa. Enquanto as sandálias vermelhas de Giovanna estão perto da cama — posição indicativa de seu compromisso com o lar —, os tamancos do marido estão mais próximos do mundo externo, ou seja, na saída. Na época havia uma crença de que os pés descalços em contato com o chão tornavam a mulher mais fértil.

A mulher, cuja sombra projeta-se sobre a cama do casal, representa a domesticidade. À cabeceira de uma cadeira encontra-se uma estatueta de madeira, representação de Santa Margarida com um dragão aos pés — seu atributo —, sendo ela padroeira das parturientes. Giovanna aparenta estar grávida, embora a maneira de prender a saia no alto fosse moda naquela época. A presença da estatueta da santa poderia reforçar a impressão de que ela estivesse grávida, mas estudos comprovam que o casal nunca teve filhos. A santa representada tem a seu lado uma escova (espanador), podendo ser também Santa Marta — padroeira das donas de casa — que tem o mesmo objeto como atributo.

A presença da cama simboliza a continuidade da linhagem e do sobrenome e também a consumação do matrimônio, santificado pelos sacramentos. É também o lugar em que se adentra no mundo por ocasião do nascimento e dele se sai ao morrer. O vermelho das cortinas representa a paixão. Naquela época fazia parte dos costumes das famílias abastadas botar uma cama no salão — parte da casa onde eram recebidas as visitas. Normalmente era usada como assento, mas, após o parto, era comum a mãe receber ali, ao lado de seu bebê, a visita de parentes e amigos.

Giovanna não usa um vestido de noiva branco, pois tal costume só apareceu após a metade do século XIX. O verde de seu vestido elegante e luxuoso, com punhos de arminho, representa a fertilidade. Está também adornada com um colar, vários anéis e um cinto todo brocado em ouro. O luxo da vestimenta indica que a ocasião era muito especial.  Ela pousa como grávida para dar destaque ao ventre, tido à época como a mais bela parte do corpo, assim como os seios pequenos e rígidos.

Um rosário de contas de cristal e giesta encontra-se à direita do espelho. Naquela época era um presente importante que o noivo dava à futura esposa. O cristal simbolizava a pureza, enquanto as contas evidenciavam a virtude da noiva e o compromisso de permanecer sempre devota. O rosário e a giesta referem-se às virtudes cristãs de “ora et labore” (oração e trabalho). A moldura do espelho apresenta medalhões com cena da Paixão de Cristo.

As laranjas na iconografia cristã são representativas do fruto proibido do Jardim do Éden, relembrando o pecado da luxúria, sendo que o casamento cristão santifica os instintos pecaminosos da humanidade. No contexto da composição, elas são também um sinal de prosperidade, pois só as classes ricas podiam comprar frutas importadas, o que era negado às pobres. A luz que entra pela janela é suave e circunda as formas com delicadeza. A claridade desfaz-se lentamente em uma atmosfera tangível. O marco arquitetônico e o recurso do espelho ao fundo dão uma sensação de real profundidade.  Através da janela aberta é possível ver uma sebe. O noivo encontra-se ao pé da janela, pois o homem simboliza a ligação entre o casal e o mundo exterior.

Um lustre de metal de sete braços pende do teto com uma única vela acesa. Representa a presença de Deus onipresente que testemunhou o casamento, o que tornava desnecessárias as testemunhas terrenas. O leitor deve estar se sentindo confuso com a ausência de um sacerdote, uma vez que se tratava de um casamento cristão. No século XV o casamento era o único dos sacramentos que não exigia a presença de um sacerdote ou de testemunhas. Podia ser realizado em qualquer ambiente. Eram os próprios nubentes responsáveis pelo matrimônio. Cabia aos noivos apenas a tarefa de ir à igreja juntos e, no dia seguinte, revelavam publicamente o casório. Mas nem isso era obrigatório.

 A presença de testemunhas no casamento só era necessária quando envolvia um casal com fortuna. Elas testemunhavam o contrato de casamento que dizia respeito aos bens dos cônjuges e tinha que ser assinado por duas testemunhas. Na composição o homem segura a mão da mulher com a sua mão esquerda, quando o normal seria a direita. Isso denota que a esposa vinha de classe social baixa, devendo abrir mão de seus direitos na herança. Pela presença das duas testemunhas no espelho (uma de azul e outra de vermelho) deduz-se que a pintura realmente registra uma cerimônia de casamento. Há também a hipótese de que uma das testemunhas seja um clérigo.

A presença do cãozinho quebra um pouco a sisudez da cena. É impossível não observar a maestria com que seu pelo foi pintado. Ele representa o amor simples, o bem-estar e a fidelidade. Em destaque na composição encontra-se, numa caligrafia gótica, a inscrição em latim “Johannes de Eyke fruit hic” (Jan van Eyke esteve aqui). O que nos induz a acreditar que o pintor ali se encontrava, testemunhando e registrando o ato solene que uniu o casal.

Atualmente fala-se que a cerimônia apresentada pode ter sido feita para trazer fertilidade para Giovanna, já que o casal não tivera filhos, e uma vez que esse tipo de cerimônia era muito usado naqueles tempos, com tal objetivo. Os que defendem tal corrente ancoram-se nas gárgulas sorridentes, atrás do casal, num banco. Elas simbolizariam o mal que paira sobre ele, sendo a causa do castigo pela vida adúltera que levava Giovanni Arnolfini. Elas são características do período gótico.

Esta composição de Van Eike, apesar de ter sido feita na Idade Média, quando a pintura limitava-se a uma mera representação fisionômica, encanta sobretudo pela capacidade especial na apresentação das texturas de superfície: a madeira dos tamancos e do assoalho, o corte do arminho sobre o casaco do noivo e os reflexos no espelho. O pintor trabalha na obra com uma vasta gama de tons de tinta a óleo. Cria grandes áreas de cores vivas (roupas de cama vermelhas e as vestes da mulher em verde e azul) em contraste com cores escuras. Este quadro surgiu num inventário, cem anos depois de ser pintado pelo artista.

Denotam a riqueza do casal:

  • laranjas caras e importadas;
  • tapete anatoliano luxuoso ao lado da cama;
  • opulência da mobília;
  • uso de joias;
  • roupas caras feitas de bons tecidos.

Obs.: Complete o estudo desta obra acessando: Van Eyke – O ESPELHO E AS CONTRADIÇÕES

Ficha técnica:
Artista: Jan van Eyke
Ano: 1434
Dimensões: 82 x 60 cm
Material: Óleo sobre tábua de carvalho
Localização: National Gallery, Londres

Fontes de pesquisa:
– Os pintores mais influentes…/ Editora Girassol
– História da Arte/ E.H. Gombrich
– Tudo sobre a Arte/ Editora Sextante
– 1000 obras primas…/ Könemann
– Arte em detalhes/ Publifolha
– Los secretos de las obras de arte/ Taschen

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Monet – REGATAS EM ARGENTEUIL

Autoria de Lu Dias Carvalho

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Monet dedicou muitas pinturas aos barcos a vela. E Regatas em Argenteuil é uma das obras-primas do Impressionismo. É também muito famosa pelo modo espontâneo com que o pintor dispõe as cores na tela. As pinceladas são largas e, em alguns pontos, umas são sobrepostas às outras

Monet emprega no quadro pares de cores complementares: verde e vermelho, azul e laranja. Ele emprega cores puras e mistas, frias e quentes, em alternância, o que dá à obra uma grande luminosidade. O branco e o vermelho encontram-se no azul do céu, no azul do rio e no verde da margem. O artista capta a cena de um ângulo mais fechado, como se estivesse bem próximo dela.

Este quadro foi pintado de dentro do barco ateliê do pintor, ancorado perto das margens de Petit-Gennviliers, perto de Argenteuil. À direita encontram-se casas do lugar e, à esquerda, ao fundo, vê-se vagamente a ponte de Argenteuil. Na água aparecem os reflexos dos barcos a vela, oscilando no Sena, que variam conforme o tamanho.

O céu, as casas e as árvores também se encontram refletidas na água. Para representar os reflexos do céu, o pintor usou pinceladas de um azul mais escuro. Casas, barcos, vegetação e personagens, com suas sombras coloridas, parecem tremular na água com uma intensidade quase real. Compõem o cenário os homens conduzindo seus barcos e uma mulher com sombrinha. Também tenho a impressão de que existe uma segunda mulher próxima a uma árvore.

Ficha técnica:
Ano: 1872
Técnica: óleo sobre tela
Dimensões: 48 x 75 cm
Localização: Museu d`Orsay, Paris, França

Fontes de pesquisa:
Claude Monet/ Coleção Folha
Grandes Mestres da Pintura/ Editora Abril
Monet/ Editora Taschen
Monet/ Editora Girassol

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