Autoria do Prof. Pierre Santos
… E vi os sete anjos, que estavam diante de Deus com suas trombetas…
De tudo quanto li com relação ao tema e à maneira como tudo então aconteceu, fiquei entendendo que coisa alguma tem sido tão mal interpretada ao longo da história, do que a idéia e o sentido de ‘apocalipse’ continente em livro à parte e incluído no final do Livro dos Evangelhos. Devido às tresloucadas interpretações, aos equívocos e aos erros dos primeiros tempos, que remanesceram ao longo da história e até em nossa atualidade, em grande escala, ainda permanecem, ficou no subconsciente coletivo a ideia de que o apocalipse está ligado a terríveis acontecimentos catastróficos, a coisas bem ruins para o mundo e a humanidade, ao fim de tudo, ao ‘Armagedom’ e ao assustador ‘Juízo Final’ que nos espera, a todos nós pobres mortais, como se não tivéssemos um julgamento particular.
Outras religiões, por motivos e motivações muito próximas, também creem nisto e falam sobre a possibilidade dessas calamidades astronomicamente ameaçadoras e, todas elas, incluindo a cristã, sem má fé e sem maldade alguma, têm se aproveitado das terrificantes conotações das ideias de fim de mundo para manterem seus adeptos coesos e contritos, em face dos princípios religiosos, tendo como trunfo o temor às profecias – o que é bastante compreensível, a julgar pela sinceridade dos dirigentes religiosos, também eles desde sempre envolvidos no subconsciente coletivo referido, acreditando e apegando-se ao lado terrível das profecias, que desde então vem se espalhando.
Vejamos, pois, porque e como tudo isso se desenvolveu. Encarregaram-se de passar à posteridade os ensinamentos do Filho de Deus aqueles quatro textos escolhidos e arrolados no Canon bíblico, por uma comissão composta por autoridades eclesiásticas da época. Seus autores foram chamados Evangelistas, ou seja, escritores dos Evangelhos. Não nos esqueçamos de que inúmeros outros textos chegaram também àquela comissão, mas foram descartados por falta de completude ou por interpretações equivocadas.
Aqueles escritores selecionados elaboraram seus textos, obviamente, de acordo com a idiossincrasia de cada um, sabendo-se que este elemento de caracterização da personalidade de cada um dos seres humanos varia de pessoa para pessoa. Ora, Mateus era todo emoção e conseguia passar em seus textos a mesma expectativa emocional com que ouvia as pregações do Mestre. Marcos era todo objetividade e, embora nunca tivesse se encontrado com Jesus, procurava ouvir de seus apóstolos, com os quais fizera camaradagem e ajudava em suas catequeses, bem como de quaisquer outras pessoas, que com Ele se tivessem privado, todas as palavras proferidas nos sermões em seus mínimos detalhes, sem deixar que nada lhe escapasse, tudo registrando depois em seu evangelho, pormenorizadamente, pelo que escreveu o mais longo e completo dos textos escolhidos. Lucas era todo cérebro e se esforçava por temperar com a sua cultura todas as parábolas que saiam da boca de Jesus. Diferentemente deles, João era todo coração e revestia as palavras de Cristo com intensidade e eloquência, verve e imaginação, chegando não raro à impetuosidade.
Afinal, o que realmente significaria a palavra Apocalipse?
Se formos procurar seu sentido primevo, verificaremos que ela provém da preposição grega … (Apo, que significa a ser tirado, conjugado com o substantivo neutro … (calipsis, que significa véu, como a palavra … (calumna, que também significa véu e de onde deriva). Neste passo, se levantar o véu dá-nos a ideia de mostrar, revelar, apocalipse significa pura e simplesmente revelação. Então, pergunta-se: revelação de que? Revelação das palavras de Cristo. Numa fecunda sequência de sermões, Jesus revelou aos homens, que o ouviam, seus conceitos e preceitos. Portanto, naquelas palavras proferidas durante suas andanças está contida toda a revelação que o Mestre queria passar ao ser humano, a fim de fazê-lo melhor e mais próximo de Deus, pois os cumprimentos dos preceitos era a única maneira de se salvar a alma, os quais, para ser simplista, estão resumidos nos Dez Mandamentos.
Nos primórdios do Cristianismo, a grande preocupação e imenso temor dos religiosos era a probabilidade de as palavras do Filho de Deus virem a cair no esquecimento. Quem as ouviu do Senhor, dificilmente as esqueceria; mas quem as ouvia de quem as tenha ouvido, podia não guardá-las com a mesma facilidade. Agora, quem as ouvia em terceira, quarta, quinta mão, já as recebia de maneira confusa e talvez deturpada: ir-se-iam empalidecendo cada vez mais a cor e a sonoridade das palavras ditas, como até mesmo a exatidão de seu sentido. Por isto, pediu-se a quem as tivesse ouvido e para tanto tivesse condição, para pô-las por escrito. Desta maneira nasceram os evangelhos. São João foi o autor de um deles, mais exatamente do quarto, e de três famosas epístolas endereçadas à cristandade em geral, além de ter sido o autor do texto sobre o apocalipse de Cristo, ou seja, sua revelação.
Nota: Leonardo da Vinci, Santa Ceia, afresco no refeitório do Convento de Santa Maria Della Grazie, em Milão.
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