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Gênero literário popular

O APOSENTADO E SEU CASAMENTO COA CABRA (I)

Autoria de Janduhi Dantas

apoca

Eu hoje tive a certeza
que este mundo está perdido:
há pouco vi na Internet
e fiquei estarrecido
um velho querendo ser
de uma cabra marido.

Cinco minutos de fama
é tudo o que o povo quer
para aparecer nas mídias
nêgo topa o que vier
não é que o velho quer mesmo
fazer da cabra mulher?

Este caso é verdadeiro
apesar de ser jocoso
saiu no saite do Standard
um jornal inglês famoso
não é humor de cordel
nem estória de Trancoso.

Não pense o leitor que falo
o inglês, não falo não
li o caso no Yahoo
que fez a propagação
prum cordel, lendo a matéria
veio logo a inspiração.

Sobre o caso acontecido
me botei a pesquisar
tava a notícia n’O Dia
noutros jornais pude olhar
“Homem vai casar com cabra”
no Google é bem fácil achar.

Fui ver por jornais no Google
se era verdade ou não
num logo vi a manchete
que trouxe a confirmação:
“Brasileiro vai casar
com cabra de estimação”.

O senhor Aparecido
um pedreiro aposentado
morador de Jundiaí
qu’é de São Paulo encostado
está com uma cabrita
de casamento marcado.

A notícia é verdadeira
nem sei se alguém acredita
o senhor aposentado
vai casar com a cabrita
a quem ele mesmo pôs
o nome de Carmelita.

Se sentindo solitário
não tendo com quem deitar
(já se deu mal com mulher
e não quer mais se estressar!)
bem tranquilo, decidiu
com a cabra se casar.

De 74 anos
(a reportagem dizia)
não está atrás de sexo
não vai haver zoofilia
ele garante pros filhos
só quer mesmo companhia.

Do senhor Aparecido
é o quinto casamento
viúvo, seus oito filhos
lhe deram consentimento
pra casar-se com a cabra
e viver sem fingimento.

Uma neta de vinte anos
e um bisneto de três
que moram junto com o velho
concordam com o qu’ele fez
e a chegada da Vó Cabra
aguardam pro próximo mês.

Do velho a casa é pequena
mas ninguém faz alarido:
a neta e o bisneto dormem
em um quartinho espremido
Carmelita vai dormir
na cama, com seu marido.

Disse o velho à reportagem
por que quer a união
com a cabra Carmelita
a sua grande paixão:
– Ela não sabe ir pro shopping
e lá torrar meu tostão.

– Casando com ela eu faço
melhor negócio da vida:
eu vou gastar muito pouco
com capim, sua comida
inda tem outra vantagem:
de mim nunca ela engravida.

– Posso gastar mais um pouco
pra cabra comprando milho
mas a despesa é pequena
pra mim não tem empecilho
Deus me livre de mulher
me dar trabalho com filho!

AS 4 ÓRFÃS DE PORTUGAL (3ª Parte)

Autoria de João Melquiades da Silva

4orf

O coronel levantou-se,
chegou se para Maria
disse: sou eu seu criado,
enquanto a moça dizia:
trago este bilhetinho
para vossa senhoria.

O bilhete lhe explicava,
honradíssimo coronel,
dê a esta mocinha
o valor deste papel,
porém, pese-o na balança,
até chegar no fiel.

O coronel inda riu-se,
dizendo ora muito bem,
isto não é precisão
que se ocupa ninguém,
o peso deste papel
só pesa igual um vintém.

O coronel pegou o bilhete,
pôs na balança um tostão,
mas foi botando dinheiro
como quem pega algodão,
a concha do bilhetinho
só pesava para o chão.

O coronel botou todo
o ouro que possuía,
botou o dinheiro de papel
que a balança não cabia,
a concha do bilhetinho
mais pesada não subia.

Ele arredou o dinheiro,
e passou-se com o papel,
a concha do bilhetinho
subiu e mostrou o fiel,
era a honra da donzela
que valia o coronel.

O coronel disse: moça,
você é misteriosa,
qual é a sua oração
na vida religiosa?
Este bilhete foi feito
por uma mão poderosa.

Coronel, a minha mãe
de criação me ensinava
S. Antonio é meu padrinho,
e a ele me entregava,
eu tomava bênção ao santo,
a noite quando rezava.

Então a senhora diga-me
quem fez este bilhetinho,
se foi feito em casa
pela mão de algum vizinho,
ou então se é milagre
que nasceu de seu padrinho.

Coronel, eu esta noite
de casa não havia saído
no oitão de uma igreja,
um padre desconhecido
mandou-lhe este bilhetinho,
conforme vem dirigido

O coronel baixou vista,
e disse quando pensou:
então, o bilhete foi
Santo Antonio quem mandou
pra senhora casar comigo
como o santo me contou.

A senhora, uma mocinha
que vive em pobreza,
mas sua honra pesou
mais que a minha riqueza,
no dia que nós casarmos
somos iguais por natureza.

Desde aí o coronel
tomou conta de Maria,
convidou os seus amigos,
casou-se no outro dia,
mandou ver as duas órfãs
para sua companhia.

AS 4 ÓRFÃS DE PORTUGAL (2ª Parte)

Autoria de João Melquíades da Silva

4orf

A noite está muita escura,
porém, a moça seguia
no oitão de uma igreja,
um vulto lhe aparecia;
o vulto era um padre,
pegou na mão de Maria

O padre disse: filhinha
esta hora, aonde vais?
O que é que tu procuras,
que daqui não passas mais,
volta que tuas irmãs
ficaram chorando atrás.

Padre, porque sou pobre,
uma orfã desvalida,
abandonei minhas irmãs
para salvar minha vida;
eu vou procurar um homem
que me dê roupa e comida.

Porquanto a minha pobreza,
faz vergonha eu lhe contar,
todo dia em nossa casa
não tem que se almoçar;
há tempo que eu não janto,
eu vou dormir sem cear.

O padre disse: filhinha,
tu precisas de caridade,
então me diz se conheces
na alta sociedade,
qual e o homem solteiro
mais rico desta cidade.

Tem o coronel Paulino
que é um moço solteiro,
negociante na praça,
capitalista e banqueiro;
o governo deve a ele
grande soma de dinheiro.

O Padre tirou um lápis,
num papel pôs-se a escrever,
dirigindo um bilhetinho
de acordo o seu saber,
para o coronel Paulino
esta questão resolver.

O padre disse: filhinha,
volta e vai descansar,
por hoje lhe passa a fome,
não precisa mais cear,
porque a sua pobreza
agora vai se acabar.

Quando o dia amanhecer,
vá o bilhete entregar
ao coronel Paulino,
a quem eu mando levar;
espera pela resposta
que ele tem que te dar.

Maria voltou a casa,
conforme o padre dizia;
as Irmãs abriram a porta,
disseram entra Maria;
se abraçaram todas três
chorando de alegria.

Quando o dia amanheceu,
Maria, no mesmo tino,
foi levar o bilhetinho
ao coronel Paulino,
para saber da resposta,
qual será o seu destino.

No armazém do Paulino,
estavam negociando
uma secção dos mais ricos
sobre negócio tratado,
e viram aquela mocinha
que vinha se aproximando.

Os homens se combinavam,
cada qual o mais ladino;
Maria interrogou-os,
com seu termo feminino,
quem é aqui dos senhores
o grande coronel Paulino?

AS 4 ÓRFÃS DE PORTUGAL (1ª Parte)

Autoria de João Melquiades da Silva

4orf

Na capital de Lisboa,
havia uma união
de quatro donzelas órfãs,
sem pai sem mãe irmão,
servindo a moça mais velha
como mãe de criação.

Vitalina era a mais velha
e muito religiosa,
viviam de costuras
numa vida trabalhosa:
Isabel Francisca e Maria,
cada qual mais virtuosa.

Vitalina adoeceu;
vendo que não escapava,
chamou logo as três mocinhas
que em seu poder criava,
para lhes dar um conselho
que tanto necessitava.

Disse ela: minhas filhas
vocês vivam sem questão
satisfeitas com a sorte
trabalhando pelo pão;
nada tendo peçam esmola,
mais não deixe esta união.

No outro dia Vitalina
estava no necrotério,
mas levou palma e capela
para o chão do cemitério,
no símbolo da virgindade
de moça de critério.

As moças ficaram sós
por casa do acabamento,
ninguém lhes dava costuras
para ganharem o sustento;
começaram a passar fome
com pena e sofrimento.

Quando as moças não tinham
mais nada para vender,
eram três moças donzelas
que não tinham o que comer,
sem lamentarem a sorte,
jejuavam sem querer.

Lutando assim pela vida
com tanta dificuldade,
perseguida pelos homens
mas guardando a virgindade,
quem sofre com paciência
Deus manda felicidade.

A fome já era tanta
que as moças padeciam,
que botavam sal na água
por alimento bebiam,
e os homens sem caridade
a elas não protegiam.

Maria, uma das moças,
disse ainda não é assim,
se hei de morrer de fome,
aqui mesmo levar fim,
vou procurar pelo mundo,
quem tome conta de mim.

As outras duas pediram:
maninha, não vá embora,
vamos esperar mais tempo,
ninguém sai daqui agora,
ate chegar o socorro
de Deus ou nossa Senhora.

Maria disse: Manas,
eu já estou resolvida,
vou ver se encontro um homem
que me dê roupa e comida;
hoje à noite eu vou embora,
que não sou esmorecida.

Maria arrumou a roupa
e deixou anoitecer,
o pedido das irmãs
em nada quis atender;
se despediu com a noite
dizendo: vou me vender.

A TERRÍVEL HIST. DA PERNA CABELUDA (2ª Parte)

Autor: Guaipuan Vieira

percab

A Perna anda descalça
Vagando em noite escura
Tem um rastro muito grande
Que não é de criatura
Dizem até que um sapato
Na cidade ele procura.

Muitos fazem confusão
Aumentando mais o medo
Que a Perna também vaga
Quando o dia é muito cedo
Nas manhãs de sexta-feira
Zombando de seu segredo.

Em noite de lua cheia
Ela fica mais nervosa
Vaga na areia da praia
É muito mais perigosa
A razão é o sofrimento
Da tal vida desastrosa.

Circula todo o Nordeste
Promovendo temporada
Por onde passa o terror
Tem uma história contada
Nunca peça para vê
A Perna mais assombrada.

Percorre a periferia
Onde sente muita estima
O povão é seu chamego
Espécie de grande ima
Que através dessa gente
Mantém a fama de cima.

Não existe corajoso
Chamado desafiante
Pra enfrentar a essa Perna
Por ter jeito horripilante
Assim vara a madrugada
Cada vez mais triunfante.

E vagando estrada afora
Já provocou acidente
Pois fez carro abalroar
Pondo em risco muita gente
No aeroporto aeronave
Sair do pouso decente.

Da mesma forma já fez
Na lagoa, o pescador
Deixar o peixe na isca
E gritar: Nosso Senhor!
Daí – me força nestas pernas
Pra fugir deste terror.

Esta Perna Cabeluda
Bota mesmo pra quebrar
Até na santa igreja
Já andou a perturbar
Fez o padre e o sacristão
Vir à missa abandonar.

Fez mulher que trai marido
Mudar seu comportamento
Ser caseira e boa esposa
Religiosa ao contento
Da mesma forma o traído
Esquecer o sofrimento.

Fez cabra namorador
Esquecer o pé de muro
O farrista voltar cedo
Prevenindo mais seguro
Com medo de vê a Perna
E passar por tal apuro.

Mas a Perna é vaidosa
Tem paixão e boemia
Visita festas de roque
Em clubes da burguesia
Também gosta de seresta
E da boa churrascaria.

Tudo isso ela freqüenta
Numa forma mais oculta
Observa o ser humano
Talvez fazendo consulta
Mas depois desta visita
Fazer mal é que resulta.

Dizem que é a besta-fera
Que já se encontra presente
Circulando este planeta
Cada vez mais decadente
Onde o ódio e a violência
Se vê muito mais crescente.

São sinais do fim da era
A tristeza é mais aflita
Aparições e desastres
É algo que multiplica
A peste afronta o planeta
Na terra a paz desabita.

Pois rezar é que nos resta
Pra livrarmos da aflição
Mas que haja com firmeza
Santo Deus no coração
Ao contrário nós seremos
Vítimas da tribulação.

A TERRÍVEL HIST. DA PERNA CABELUDA (1ª Parte)

Autor: Guaipuan Vieira

percab

Santo Deus Onipotente
Venho rogar vossa ajuda
Pra afastar assombração
De todo mal nos acuda
Principal desse fantasma
Que é a Perna Cabeluda.

É um bicho horripilante
Que na noite entra em ação
Tem dois metros de altura
E pula como cancão
No joelho tem um olho
Acesso que nem tição.

O nariz é bem pontudo
Além da boca rasgada
As prezas são dum felino
Língua com a ponta cortada
Tem barbicha que nem bode
Cada unha é envergada.

Faz um barulho medonho
Como chocalho de cobra
É o rangido dos dentes
Da energia que sobra
Limpa o nariz com a língua
Dança fazendo manobra.

Ainda tem no calcanhar
Um afinado esporão
Cuja cor avermelhada
Reluzente a um medalhão
No tornozelo uma gola
Como estivera em prisão.

Na canela tem um chifre
Com uma luz bem na ponta
Uma espécie de lanterna
Pra andar por onde afronta
Fazer vítima onde passa
Que já se perdeu a conta.

Tem enorme cabeleira
No lugar que foi cortado
Que sacode sobre a perna
Girando de lado em lado
De jaguar são as orelhas
E há pelo aveludado.

Pense então na coisa feia
Multiplique o seu pensar
Pois é assim que a coisa
Anda em noite de luar
E também na escuridão
Pra poder se ocultar.

Quem já viu conta que a perna
Chega mansa e de repente
Cisca o chão e fala coisas
Que não há um ser vivente
Pra decifre a linguagem
Que repassa no presente.

E depois dessa contenda
Dá um assovio fino
À noite entra em silencio
Como ordena seu destino
Até o galo no poleiro
Esquece o sagrado tino.

Por onde passa o vivente
Fica imobilizado
Falta as pernas pra correr
É um momento aperreado
Só pra vê que neste mundo
Tudo um pouco é encontrado.

Muitos contam que a origem
Vem duma história passada
Dum acidente de ônibus
Em região povoada
Pra bandas do Piauí
Curva do “S” chamada.

Dois ônibus da Marimbá
Do Piauí essa empresa
Se chocaram nessa curva
Que foi a maior tristeza
Não escapou um cristão
Só de pensar dá fraqueza.

Uma vítima teve a perna
De seu corpo decepada
Dizem que ela criou vida
Num monstro foi transformada
Na mata ficou vagando
Procurando sua estrada.

Antes de achar caminho
Pra sua nova paragem
Em todo aquela região
Ficou fazendo visagem
Assombrando caçador
E vaqueiro de coragem.

Pois chegou no Ceará
Seguindo um caminhoneiro
Que vinha pra Canindé
Só conduzindo romeiro
Depois foi a Fortaleza
Promover o seu desterro.