Autoria de Lu Dias Carvalho
Eu diria que a luz é a própria alma da cor. Sem luz, a cor não vive. Minha pesquisa tem sido exatamente a de estabelecer uma ordem para a cor, a cor material de nossos tubos de tinta que a luz engendra. Sem luz, as formas não têm vida porque suas cores não as definem suficientemente. Percebemos primeiro a luz, em seguida a cor. (Raoul Dufy)
O pintor francês Raoul Dufy (1877-1953) nasceu em Havre, importante porto no norte francês. Apesar de pobre, sua família era muito unida, alegre e sensível à arte. Seu pai, gerente de uma loja de metais, era um talentoso músico. Ele alegava que as crianças precisavam ouvir música para lembrarem-se das melodias do céu. A musicalidade, herdada de sua família, mostrar-se-ia nas linhas sinuosas, vibrantes e líricas de seu trabalho. Dufy era o único filho numa família de cinco irmãs.
No jardim da casa do menino Dufy havia um pombal, sendo por isso que suas primeiras pinturas infantis trazem o desenho de pombos. Antes mesmo de completar sete anos de idade, seus desenhos já chamavam a atenção. Seu pai estimulava seu talento, presenteando-o com aquarelas. Não que o visse como um pintor, mas imaginava que a arte pudesse lhe servir de passatempo, quando os negócios não estivessem indo bem. Como excelente aluno em línguas, Dufy foi trabalhar com o amigo do pai, Luthy, um grande importador de café, em Harvre, com o objetivo de ajudar a família. Mas à noite, com a permissão do pai, frequentava a Escola de Belas-Artes, sendo aluno do professor Charles Lhuillier, que dedicava muita atenção aos alunos pobres. Naquele ambiente fez amizade com o colega Emile Othon Friesz, vindo os dois a alugarem um quartinho.
Dufy e seu colega Friesz, aos domingos, pintavam ou andavam pelas ruas da cidade em busca de cenas interessantes para pintar, chegando até o interior rochoso da Normandia. Também visitavam museus próximos, em Rouen e arredores. Hábil no desenho, Dufy era capaz de, com poucos traços, o que viria a ser uma característica de seu estilo, captar os elementos. Mas aquela extrema facilidade não o agradava, o que o levou a amarrar a mão direita, e usar a esquerda para desenhar, tornando-se ambidestro. Ele gostava de pintar ouvindo música.
Friesz ganhou uma pequena bolsa de estudos da prefeitura de Harvre, para estudar em Paris. E três anos depois, Dufy também foi contemplado com a mesma bolsa, indo os dois companheiros morar num modesto ateliê. Na capital francesa, os dois estudantes continuaram visitando museus e galerias, sendo que essas últimas já expunham, em suas vitrines, telas impressionistas. Diante desse novo mundo de contemplação, Dufy abandonou a escola tradicional, com seu ensinamento acadêmico. Achava que tinha muito mais a aprender com os quadros de Van Gogh, Cézanne, Gauguin, Degas, etc, de que com as aulas teóricas.
Dufy tomou como referencial estético a pintura de Pissarro e Monet, mestres do Impressionismo, a obra de Giorgione, vista no Louvre, e as paisagens de Claude Lorrain. Tornou-se amigo de Maurice Delcourte e de Derthe Weill, dona de uma pequena galeria, onde vendia trabalhos de pintores talentosos ainda desconhecidos. Ela foi a responsável por promover a primeira exposição individual do artista. Inicialmente ele foi um pintor impressionista, mas, ao travar contato com as obras de Matisse, tornou-se fauvista.
Raoul Dufy veio a encantar-se com o trabalho de Matisse, sensibilizado com o milagre de imaginação que o artista introduziu no desenho e na cor. Em razão disso, passou a pintar ao ar livre. Ao seu fascínio por Matisse agregou-se o por Cézanne, que rezava que “a pintura precisa ter estrutura orgânica e, que o volume ultrapassa a impressão da cor, por mais lírica que seja”. Ele foi até Estaque, onde esteve Cézanne, e aprendeu a purificar seus meios de expressão. Mas com as mudanças em sua pintura, Dufy passou a vender menos, com as portas das galerias fechadas para ele, tendo que viver com a escassa contribuição da família. Ele não se sentiu envergonhado com suas roupas gastas e nem com os sapatos forrados com jornal. A sua pobreza não o levou a promiscuir-se com uma arte meramente comercial. Enfrentou-a com dignidade. Passou a trabalhar com a gravura em madeira, trabalho também invendável.
O contato com o poeta Guillaume Apollinaire, que lhe pediu para ilustrar o livro “Bestiaire”, impediu que Dufy caísse na miséria. A nova técnica de ilustração, usada pelo pintor, rendeu-lhe grande sucesso. Acabou sendo convidado por um industrial de Lyon, para montar um atelier e criar desenhos para estamparias em tecidos, por uma considerável soma. Passou a trabalhar com um químico especialista em colorantes e anilinas. Foi exatamente nessa época que ele propôs a equação: cor = luz.
O pintor, vivendo numa cidade banhada pelo mar, gostava de pintar temas relativos a ele: marinhas, regatas, portos, banhistas em maiô, etc. Também pintou monumentos, corridas de cavalos, paradas militares, concertos de pequenas bandas do interior, figuras hieráticas, naturezas-mortas, cerâmicas, etc. Ilustrou livros, fez cenografia para balé e desenhos para tapeçarias, a exemplo de “O Lindo Estio” e “O Nascimento de Vênus”. A Exposição Universal de Paris, em 1937, apresentou 250 quadros do artista, num total de 600 metros quadrados, que compunham um painel dedicado à eletricidade, tendo maravilhado os visitantes e tido hoje como sua obra-prima.
Dufy participou de importantes exposições nos Estados Unidos, e ganhou o Prêmio Internacional da Pintura, em 1952, na Bienal de Veneza. Foi chamado de “o artista da alegria” ou de “pintor da vida moderna”. Mas a artrite, que passou a deformar seus dedos, fez com que ele diminuísse sua produção. Além de pintor foi também desenhista, gravador, ilustrador de livros, desenhista cénico, um designer de móveis, e um planejador de espaços públicos. Morreu do coração aos 76 anos de idade. É lembrado como o pintor das cores alegres.
Fontes de pesquisa
Gênios da Pintura/ Abril Cultural
https://theartstack.com/artist/raoul-dufy/terrace-cafe
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