Arquivo da categoria: Depoimentos/Saúde Mental

Depoimentos de portadores de Transtornos Mentais.

TRANSTORNOS MENTAIS E EXTREMISMO RELIGIOSO

Autoria de Ster Nascimento*

      

Ah, se eu tivesse encontrado este cantinho há mais tempo!

Sofri boa parte da minha vida com a ansiedade. Há 6 anos travo uma luta intensa com a síndrome do pânico (SP). Venho de uma família religiosa que sempre atribuiu meus problemas à “falta de Deus” e às  “coisas espirituais”. Mal sabiam eles, que foi essa criação exageradamente religiosa que engatilhou a maioria das minhas crises. Medo do “mal”, de não estar “protegida por Deus”, de “perder a minha alma”, de “coisas sobrenaturais”. Lembro-me de que, por quase um ano, quando me encontrava na pior fase do pânico, quando via uma igreja, cruzava a rua, com medo de passar por perto. Até hoje, quando estou dentro de um templo religioso, sinto minhas mãos suarem e a pressão cair, e fico alarmada o tempo inteiro. E quando alguém lê ou fala algo referente ao sobrenatural, pronto! O gatilho é acionado, e a crise começa imediatamente.

É inacreditável como nos tornamos prisioneiros de nossa mente em razão de nossos tabus. Mais triste ainda é o fato de a maioria das pessoas não entender nada sobre o assunto. E, por desconhecerem-no ou por preconceito, acabam nos fazendo sentir piores do que nos encontramos. Isso me levou a demorar muito para começar o tratamento psiquiátrico. Eu sentia  medo de não ser compreendida. Medo de ser algo puramente espiritual, medo de estar desagradando tanto a Deus, a ponto de o mal estar sempre me rondando. Mas graças a esse mesmo Deus, que me fez compreender que Ele age através das pessoas, dos médicos e também dos medicamentos, encontrei alguém com o mesmo quadro que eu. Alguém que também foi criado com uma religiosidade conservadora e extremista, e que trazia sequelas como a minha, ou seja, o medo extremo do “mal” e as tão persistentes e desesperadoras crises de pânico! Essa pessoa esclareceu-me sobre o tratamento psiquiátrico, e como isso mudou sua vida.

Encontro-me no começo do meu tratamento! Ainda sofrendo o gostinho dos efeitos adversos. Sei que todos os antidepressivos trazem-nos. Às vezes tudo piora e os pensamentos ruins intensificam. A ansiedade parece ficar pior. Mas eu não ligo! Juro que não! Eu só não quero ter mais “medo”. Eu passo por qualquer coisa, para conseguir dobrar os meus joelhos e agradecer a Deus, sem o medo doentio que ainda me acomete. Quero poder entrar na casa dEle, sem desespero, imaginando que algo ruim possa me acontecer. Com o resto terei paciência. Eu só não aguento mais carregar este MEDO que me apavora e aprisiona.

*Dona do blog Desventuras de uma Cacheada

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SER POP É FUNDAMENTAL!

 Autoria de Ana Maria Mallmann

Tenho 25 anos. Comecei a sofrer de TAG há quatro anos, depois do término de um relacionamento abusivo. No mesmo ano consegui melhorar sozinha, pois comecei a faculdade, fiz novas amizades e deixei as memórias daquele relacionamento traumático para trás. Porém, eu sou uma pessoa muito contida e sensível, e, com o passar do tempo, foram surgindo problemas familiares e emocionais. Fui absorvendo tudo até que, em novembro do ano passado, a ansiedade voltou como um tsunami na minha vida, trazendo junto consigo a síndrome do pânico (SP). Desde aquele mês até abril deste ano sofri quatro ataques de pânico. Um foi em casa, outro numa festa de casamento, e os outros dois no ônibus e no trem, a caminho da faculdade. Foi simplesmente horrível! Fiquei, durante duas semanas, trancada em casa, e extremamente preocupada, porque adorava estudar, passear com a família e os amigos. Eu, que viajava sozinha e nunca tinha problema com lugares cheios de gente, daquele momento em diante, só de ir à esquina da minha casa já entrava em pânico. Ao entrar num supermercado, na sala de aula cheia de colegas ou num restaurante, eu já queria sair correndo, desesperada.

Agilizei para buscar ajuda profissional. Meu neurologista/psicopatologista me diagnosticou com SP (Síndrome do Pânico) e Agorafobia (medo mórbido de encontrar-se em lugares públicos e grandes espaços descobertos, de onde é difícil ou embaraçoso sair) e, para o meu tratamento, ele receitou o Escilex, sendo cinco mg na primeira semana, aumentando para 10 mg a partir da segunda. Nas duas primeiras semanas eu acordava sentindo um aperto no peito e muito ansiosa. Tive dores de cabeça, diarreia, boca seca, muita sonolência, e não sentia prazer em nada e, por isso, passava o dia inteiro jogada no sofá ou na cama, sentindo-me angustiada e muito desanimada, achando que isso nunca iria passar. Se não fosse pelo fato de ter descoberto este cantinho, logo no início, eu teria desistido do meu tratamento!

Encontrei aqui neste espaço tantas pessoas passando exatamente pelo que eu estava sentindo, que eu lia os comentários como se fossem meus, e lia as respostas como se fossem para mim. Isso me deu muita força e me senti acolhida. Dói muito saber que há tantas pessoas sofrendo de TAG, SP, depressão, muitas delas se sentindo extremamente sozinhas, tomando atitudes drásticas para acabar com o sofrimento, mas, ao mesmo tempo, sinto muita esperança, ao ver que existem pessoas bondosas, empáticas e pacientes como a Lu, a quem sou muito grata por ter criado este cantinho, um alento para mim, que me sentia muito sozinha, pois as pessoas à minha volta não entendiam direito o que eu sentia, não dando muita importância ao meu problema. Além disso, ela me deu coragem para ultrapassar aquela fase tenebrosa do início do tratamento. Um conselho, palavras consoladoras de alguém que sente ou sentiu as mesmas coisas que a gente, tudo isso é fundamental para seguir adiante.

Hoje está fazendo exatamente um mês que comecei meu tratamento. As reações adversas desapareceram, não estou 100%, pois cada dia ainda é uma luta para sair de casa, mas, quando chego, sinto-me aliviada, animada e mais otimista por ter conseguido pegar um transporte público, ter voltado às aulas e, aos poucos, ir recuperando meus estudos e a minha vida social. Meu conselho para cada um daqueles que se sentem vítimas de transtornos mentais é que procure um médico que lhe passe segurança e que escute atentamente tudo aquilo que você tem para falar. Quando a vontade de desistir for grande, respire fundo e venha para este cantinho. Ser POP (paciente, otimista e persistente) é fundamental!

Um abraço com carinho para todos, em especial para você, querida Lu!

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VENCENDO A DEPRESSÃO

Autoria de Larissa Fernandes

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Há cerca de um mês atrás, eu escrevi aqui neste blog, em uma situação parecida com a de muitos companheiros com problemas mentais, que ora vivem momentos difíceis. Tinha muitas dúvidas e inseguranças quanto ao medicamento. Acabara de começar o tratamento, encontrando-me no início da segunda semana, mas receosa de não ver resultados positivos, e de que os efeitos colaterais não passassem. Hoje estou no 36º dia de tratamento e, se pudesse, ajudaria de alguma forma os que estão começando o tratamento, ainda receosos e inseguros, sofrendo com aqueles difíceis primeiros dias. O que posso fazer é repetir as palavras da Lu, que me ajudaram muito: sejam persistentes, otimistas e pacientes. Os resultados bons virão!

As duas primeiras semanas foram realmente difíceis. Iniciei meu tratamento por conta de depressão, embora, há alguns meses atrás, tivesse tido pânico também. Já havia passado pela Síndrome do Pânico, mas nada foi tão terrível quanto a depressão. Quando dei início ao tratamento com remédios, já mal saía da cama pra comer ou fazer qualquer outra coisa. Minha vida era dormir e desejar não estar viva. Tive muito medo de suicídio, ideia que esteve na minha cabeça por alguns dias, e foi completamente apavorante. Na ocasião busquei amigos de confiança e me abri com eles, pedindo ajuda. Um deles, em especial, foi muito acolhedor e recomendou-me tentar os remédios. Mas sempre tive muita resistência a eles, pois não gostava da ideia de ter meu estado de humor regulado por uma substância química, que não saberia precisar em que outros aspectos do meu sistema nervoso atuariam. Tinha pavor de depender de medicamentos, mas vi que, na situação em que me encontrava, ou me entregava a eles, ou não saberia dizer o que seria de mim. Poderia nem estar viva hoje.

Uma semana antes de iniciar o tratamento com o antidepressivo, iniciei também análise. Iniciei o tratamento com a dose de 10 mg, que é a dosagem que mantenho até agora. Os seis primeiros dias foram, de fato, difíceis. Tive a ansiedade e os sintomas da depressão acentuados, mas nada que não pudesse suportar com um pouco de esforço. Já tinha começado tratamento, em outra ocasião, com sertralina, mas não suportei os efeitos adversos do remédio. A reação do oxalato de escitalopram, para mim, foi muito mais leve. Nessa primeira semana também tive náuseas e diarreia, além de um sono monstruoso, chegando a dormir 18 horas por dia, na primeira semana.

Os efeitos colaterais duraram até por volta do 14º dia. A partir daí as náuseas desapareceram, o sono e a ansiedade paradoxal diminuíram bastante. Os primeiros efeitos bons (uma calma e a volta do sentimento de bem-estar, de alegria), apareceram por volta do décimo dia. Eu não sentia nenhum sentimento bom havia alguns meses. Só sentia pesar, medo, tristeza, muita angústia e uma sensação ruim de enxergar o mundo de um jeito estranho, como se estivesse vivendo em um filme. Por volta do décimo dia, eu me peguei sentindo bem em alguns momentos do dia. Acho que os efeitos bons foram se estabelecer mesmo por volta do 20º dia.

Eu me tornei outra pessoa nesses vinte dias de tratamento. Voltei a ser uns 70% do que era antes dessa doença, que nos transforma em outra pessoa e torna o mundo uma coisa horrível, insuportável, modificando nossos sentimentos e pensamentos. A depressão transforma-nos naquilo que não somos. E hoje posso dizer que, embora não me sinta ainda 100% como era antes, eu me sinto muitíssimo melhor, “normal”. Claro que a tristeza ainda existe, ainda sinto raiva, angústia, ansiedade, mas isso, na medida certa, são coisas normais que acontecem a qualquer pessoa. Sinto que estava em um buraco escuro e que o remédio foi fundamental pra me dar forças pra chegar até a sua saída. Compreendi que o medicamento não muda a vida da gente, sozinho. Ele faz um trabalho importantíssimo, e que realmente faz muita diferença pra quem sente os efeitos da depressão, da ansiedade, da Síndrome do Pânico, da TAG, ou do TOC, etc. Ele nos estabiliza emocionalmente para podermos conseguir pensar sobre as coisas da nossa vida, nossos conflitos, e podermos mudar objetivamente as coisas que nos causam mal.

Quanto aos efeitos colaterais, sobre os quais vejo muitos relatos no blog, compartilho com todos, que também aconteceram comigo. Não tive diminuição da libido, acho que até aumentou um pouco. Acredito que a baixa da libido estivesse muito ligada também à depressão. Mas tenho mais dificuldade de chegar ao orgasmo, não chega a ser anorgasmia, mas está um pouco mais difícil. Ainda sinto um sono meio incômodo no decorrer do dia, o que talvez me leve a mudar o horário do remédio para a noite, e uma dor de cabeça leve, que começa no pescoço, quase diariamente, mas nada muito incômodo. De resto, só tenho a dizer para os que estão sofrendo com essa coisa horrível, que nos trazem os transtornos mentais, é que busquem ajuda, pois o tratamento existe. É fundamental operar mudanças de hábitos em nossa vida, uma terapia ou a análise também é importante. E para aqueles que temem os antidepressivos, como era o meu caso, o que posso dizer é não tenham medo. Sejam pacientes e confiem, pois os resultados virão. Dias bons voltarão, acompanhados de alegria e vontade de viver.

Muito obrigada, Lu, pelas palavras, quando estive aqui no início do tratamento. E parabéns por este espaço de acolhimento para tanta gente vítima desse sofrimento terrível e desumano que é a depressão, o pânico, etc. Um beijo a todos, e acreditem que dias melhores virão! Levem o tratamento a sério!

Nota: Melancolia, obra do pintor francês Louis Jean-Fraçois Lagrenée

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DEPRESSÃO – ESPERANÇA, AINDA QUE TARDIA!

Autoria de Celina Telma Hohmann

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Ganhei o dia!
Em minhas eternas buscas pelo tão sonhado sossego mental, que, diga-se, parece algo tão inatingível quanto viver eternamente, eis que descubro este blog e, opa, descubro algo ótimo, fácil, gostoso de ler e com uma descrição que por si só nos faz ter uma melhora, enquanto o lemos! Desnecessário dizer que quem busca informações sobre medicamentos, o faz porque necessita do bendito, mas sempre fica a dúvida, e hoje, diferentemente do passado, onde o médico prescrevia, comprávamos e só descobríamos se servia exatamente ao nosso problema após ler o que descrevia a bula, contamos com a bênção da internet.

Bem, saí ontem da psiquiatra, meio que desconfiada, pela enésima vez, com uma nova prescrição, haja vista que outros medicamentos já não fazem efeito algum, se é que o fizeram em alguma fase. Foram sempre um apoio, jamais a solução! Já usei tantos ansiolíticos e que tais, que acredito, os laboratórios deveriam me dar um prêmio pelos gastos contínuos com medicação. Dos indutores do sono, passando pelos temíveis antidepressivos, que só aumentaram meu peso e, por consequência, meu sufoco, pois engordar é terrível, quando se foi sempre magra, e perceber que aquele inchaço é como o reflexo da nossa incapacidade de controle emocional.

Tenho uma vida que em hipótese alguma posso julgar ruim, mas mesmo assim, eis que a fortaleza por vezes se faz pó! Em verdade, pó é luxo, pois viro lixo em mais de um terço de minha doce existência. Ontem, obrigada por filha e irmã, fui novamente à psiquiatra, pois, juro, já nem desejo mais essas visitas que a mim parecem uma perda de tempo. Com tentativas de novas fórmulas, vem o desconforto, pouquíssimas vezes o equilíbrio que até vem, mas num delirante vaivém de melhora/não melhora/resolve e não resolve.

Dormir sempre foi o luxo que busquei na vida, e, por essas coisas que não se explicam, o que mais me faz falta é o tal sono. E, incrível, por vezes, transformo-me num animal hibernando… Durmo e durmo, mas, claro, nas horas mais impróprias, ou seja, quando o mundo está acordado e a vida pulsando… Meu boicote contra minha própria vontade de viver, conversar, ser feliz, ou algo próximo a isso.

Minha depressão é um terror! E sei, como é com todos que por desventura a sentem, ou sentiram. Vivenciam ou vivenciaram esse pavor, que a alguns é decorrência de um episódio, uma fase ruim, mas quem é depressivo desde a infância, torna-se, com o passar do tempo um desacreditado em si próprio. É o meu caso! Cheguei a casa – nem passei pela farmácia, pois sabia de antemão que o tal composto custa um pouquinho além do que eu tinha na bolsa – e somente hoje fui ler a tal prescrição. Descubro que é para o oxalato de escitalopram. Não conhecia, ou se o conhecia não havia, ainda, ingerido.

Bem, lá vai pesquisa e nessa, lá veio o blog e a doce aventura de lê-lo. Gostoso, agradável, brincalhão sem ser desrespeitoso, aliás, o desrespeito com a depressão deveria ter, também uma Lei que o colocasse entre os crimes contra a humanidade! Vou iniciar meu tratamento somente na segunda-feira, quando a grana estiver disponível. Então, acho que será na terça, pois a compra será à tarde. Serão7 dias com dosagem de 10 mg nos primeiros 7 dias, e a partir do 8º dia, 20 mg, pela manhã.

Estou esperançosa, pois, juro, por tanto tempo entupindo-me de remédios, porque, para ajudar, já passei por seis cirurgias renais. Sou fábrica de cálculos renais e daqueles resistentes, que não explodem, não quebram, não saem… E dê-lhe morfina, internações, cirurgias e outros incômodos, além do medo de que tudo volte. Por ora, com três últimas intervenções cirúrgicas no final do ano (quem disse que comigo a coisa funciona?) Nada! Sempre há intercorrências… Ainda a tal depressão sempre presente e eu tentando disfarçá-la, ou, por vezes, me afundando nela. Cheguei ao transtorno alimentar. Mais uma para somar! Odeio comida! Fujo dela, disfarço, como escondido para que não me cobrem e aí posso comer bem pouco, entre um engasgo e uma vontade de chutar o prato.

Eis-me! Por sorte, mas sorte mesmo, não sou explosiva – mas já fui – tenho uma fé que auxilia e um cansaço que dá pena. Não nasci assim e quero, preciso e mereço melhorar. Não sei ainda se a medicação surtirá os efeitos que espero, mas escrever é tão bom e descobrir o blog foi tão prazeroso que acho que o fulaninho escitalopram já deu sinais de que valerá a pena! Assim Seja! Não espero o milagre, pois esse, não pertence às fórmulas farmacológicas, mas espero que dessa vez dê certo. Cansei e quero um pouco de sossego, quero serotonina, adrenalina e paz! Mas a paz dos que estão vivos, não a paz dos zumbis!

Nota:  Melancolia, obra de Edvard Munch

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