Arquivo da categoria: Ditos Populares

A sabedoria popular está presente em todas as línguas, sendo expressa através de várias maneiras: provérbios, adágios, sentenças, aforismos, parêmias, apotegmas, anexins, rifões, ditos e ditados populares.

QUEM PUXA AOS SEUS NÃO DEGENERA

Autoria de Alfredo Domingos gandhi1345

A explicação genética confirma que saímos aos nossos. Os cabelos louros são do avô. Os olhos azuis são do pai. A estatura alta vem da parte do outro avô. E por aí seguem as comparações. Tudo bem, mas não me agarro à gênese! Quero tergiversar. Voar com as ideias dos tipos:

– Paulinho é tão desaforado quanto a mãe!
– João é tão organizado quanto o pai!
– Marina é cômica do mesmo jeito que é a irmã mais velha!

São estas algumas das exclamações que a família e amigos apontam como referências, fazendo tudo para que a semelhança seja reconhecida e festejada. Outras similitudes vêm das profissões:

– Ele é professor como o pai.
– Ela é médica e tem a mesma especialidade da mãe.
– Júnior herdou o pendor artístico do pai. Está cursando teatro. Faz caras e bocas da mesma forma.
– Leninha costura divinamente! Confecciona vestidos de noiva tal qual a mãe nos bons tempos.
–Tocar bem piano é dom da família inteira.

Está bem! As pessoas divagam buscando coerência, tentando atrelar uma coisa à outra.  Precisamos justificar de um tudo, fazer o quê? Porém, não degenerar porque puxamos a quem nos gerou, ou está conosco vai além. Considero mais relevantes o exemplo e o ensinamento que são passados. Entendo que a convivência sadia pode salvar alguém. Pode dar rumo ao desgovernado.

A validade do provérbio está no sentido de aproveitar as boas lições, realizar o bom combate, estar atento às dicas importantes. Não importam parentesco, cor da pele, sinais físicos, ofício e demais coincidências. Releva refletir sobre o proveito que conseguimos obter e em consequência fortalecer as nossas vidas.

Nota: Artesanato do Vale do Jequitinhonha

Views: 0

O BAMBAMBÃ DO PEDAÇO

Autoria de Lu Dias Carvalho

bambã

 Zeca de Sá Quelé achava-se o bambambã da cidade desde o dia em que as moças do lugar resolveram elegê-lo o rapaz mais garboso do pedaço. Tomando o título como um passaporte para os embelecos amorosos, Zeca transformou-se literalmente num “pegador”, um machão. O fraco do moço eram as garotas de fora, às quais chamava de “sangue novo”. Não dava bolas para as conterrâneas que morriam de amores pelo mancebo que se achava a última bolacha do pacote. Desprezava todas.

Foi numa festa para comemorar a inauguração de uma agência bancária que Zeca enrabichou-se pela visitante Samantha com “th”, como ela deixava bem claro, com seus cabelos dourados despencando-lhe pelas costas, os lábios carnudos breados de carmim e um longo pescoço, sempre cingido por um exótico xale de seda vermelha. Os dois dançaram, bem grudadinhos, a noite inteira, trocando beijos e amassos.

A cidadezinha de Zeca no que perdia em tamanho ganhava em língua, de modo que mal o dia amanhecera, espalhando o cheiro de café coado pelo ar, o nome do moçoilo já andava de boca em boca, ou melhor, de porta em porta, pois de acordo com o costume local as pessoas ficavam nas calçadas de manhã e à tardinha, perto das portas, mexericando sobre o que sabiam e o que supunham ser verdade. O assunto que rolava de ponta a ponta do lugar era que Zeca estava de namoro com um travesti.

Dois dias depois, com a certeza de que fora enganado pelo “sangue novo”, e não mais aguentando as alfinetadas das línguas ferinas e o desprezo das donzelas, até então relegadas ao segundo plano, o bambambã caliente, fazendo-se de morto, pegou o ônibus para São Paulo, com a desculpa de que fora convidado para ser modelo. Dizem as más línguas que há mais de oito anos não volta à cidade natal.

A expressão “bambambã” veio do quimbundo (língua da família banta, falada em Angola pelos ambundos). Significa exímio, bom no que faz. A repetição da palavra (bamba, bamba) acabou transformando em bambambã. “Lá em casa todo mundo é bamba, todo mundo bebe, todo mundo samba…“.

Views: 1

O APRENDIZ DE FEITICEIRO

Autoria de Lu Dias Carvalho

   mendigo12mendigo1

A expressão aprendiz de feiticeiro refere-se a uma pessoa que desencadeia forças e depois se vê incapaz de controlá-las, ou seja, não dá conta do recado. Tal expressão nasceu de uma fábula do escritor alemão Goethe, uma das mais brilhantes figuras da literatura alemã e do Romantismo francês, que conta o seguinte:

O mestre em feitiçaria ensinou a um novo aluno algumas palavras cabalísticas secretas, mas o pupilo, sem a presença do professor, resolveu testá-las por conta própria, de modo que ordenou a um cabo de vassoura que fosse ao rio buscar um balde de água para ele tomar um banho. E prontamente foi obedecido, só que não conseguia fazer parar o cabo de vassoura que parecia estar com todo o gás. Ele ia ao rio e voltava trazendo água. Se fosse gente poderia ser dito que estava com fogo no rabo ou com o diabo no corpo. Gente ou não o fato é que o cabo de vassoura parecia fora de si.

O aluno curioso passou a ficar desesperado, sem saber que medida tomar para conter tanta água. Então, partiu o cabo de vassoura ao meio, pensando quebrar as pernas do eficiente operário, mas o tiro acabou saindo pela culatra. Em vez de um cabo de vassoura, agora eram dois a  trazerem-lhe água. Desesperado, o aluno começou a cortar os cabos, pensando estar a cortar-lhes as pernas. Quanto mais os dividia em pedaços, mais os ajudantes multiplicavam-se. O aprendiz já estava se afogando debaixo daquele mundaréu de água, quando foi salvo pelo gongo com a chegada do feiticeiro que botou um fim naquela bizarra situação.

Na vida real existem muitos aprendizes de feiticeiro que não entendem de determinados assuntos, mas botam o nariz em tudo, na maioria das vezes sem serem chamados. E acabam dando com os burros n’água, pois não é mais possível voltar atrás.

Views: 2

SALVO PELO GONGO

Autoria de Lu Dias Carvalhotina1

Conta-se que antigamente na Europa, por causa do pouco espaço para enterrar os mortos, abriam-se os caixões e retiravam os ossos que eram depositados em ossuários, ficando o túmulo para o próximo defunto, fato que também vem acontecendo nos dias de hoje em razão do aumento da população e da escassez de espaço para os cemitérios, contudo não há o perigo que rondava as pessoas naqueles tempos.

Naquela época, a medicina nem mesmo engatinhava, talvez balbuciasse, o que levava ao túmulo muitos vivos com catalepsia, mas tido como mortos. De modo que, ao se abrir o caixão para a retirada dos ossos, a tampa encontrava-se toda arranhada pelo lado de dentro, o que indicava que aquela pobre vítima fora enterrada viva e que tentara se livrar inutilmente dos obstáculos que a impediam de voltar ao mundo dos vivos. E para matar no ninho o problema, uma atitude foi tomada. Nasceu a ideia de socorrer os mortos/vivos, pois ninguém queria carregar nas costas o peso de enterrar alguém vivinho da silva. E a coisa estava ficando feia com o aumento das vítimas.

Uma ideia foi posta em prática. Ao se fechar o caixão, uma tira de pano ou uma corda era amarrada ao pulso do falecido, passada através de um buraco feito no ataúde e atada a um sino que ficava do lado de fora da cova. Após o enterro uma pessoa ficava postada ao lado do túmulo, mantendo guarda durante dias de modo que, caso o suposto morto viesse a acordar, os gestos agoniados de seu braço badalariam o sino e ele seria retirado do local. Não é de se estranhar que a vítima caísse dura no chão, ao ver o buraco em que literalmente se metera, sem a sua vontade. Quando acontecia de alguém tocar o sino, dizia-se que foi “Saved by bell”, o que na tradução para o português ficou como “Salvo pelo gongo”.

Ainda bem que nos dias de hoje ser “Salvo pelo gongo” não mais alude a tal fato, mas a ser tirado de uma enrascada em que se estava prestes a cair. Mas posso imaginar que nos rincões que ainda carecem de médicos, tal situação ainda possa acontecer, pois não é fácil diagnosticar a catalepsia. Existe outra explicação para o surgimento da expressão “Salvo pelo gongo” que alguns acham ter nascido no século 17, em Londres, Inglaterra, quando um guarda do palácio de Windsor foi pego dormindo em serviço.  Ele se defendeu dizendo que até ouvira o sino da igreja bater 13 vezes durante a noite, sendo portanto, “save by the bell” (salvo pelo gongo). Escolha a que achar melhor.

 

Views: 29

CONVERSA MOLE PARA BOI DORMIR

Autoria de Lu Dias Carvalho lixo123

Meu avô Joaquim Valentim não era um homem letrado, pois pouco ou quase nada conhecia das letras, mas era extremamente sábio. Além disso, era incapaz de fazer mal a uma mosca. Era a ele que um bando de netos, curiosos e inquietos, recorria para entender melhor o mundo, já que os adultos achavam que pergunta de criança não devia ser levada em conta, sempre nos pedindo para sossegar o facho.

De uma feita, nós que só vivíamos a rodear nosso avô, captamos uma conversa sua com o seu compadre João Galocha. Ainda que estivéssemos envolvidos com nossas bolhinhas de sabão saindo dos talos de mamona e não déssemos qualquer importância à prosa dos dois, ao ouvirmos a expressão conversa mole para boi dormir, entremeada no bate-papo, a nossa bisbilhotice ganhou vida, criando as mais mirabolantes suposições. O que se deveria falar para que o boi dormisse? Será que tal fala também serviria para que cavalos, cachorros e gatos caíssem no sono?

Mal a visita saiu, pois não podíamos nos intrometer em conversa de gente grande, sob pena de ganhar um bom castigo, rodeamos apressados nosso avô em busca de uma explicação que matasse a nossa curiosidade. Queríamos saber que conversa era aquela que fazia boi dormir. Ele pegou sua caneca azul esmaltada com seu cafezinho cheiroso, assentou-se calmamente em sua cadeira de descanso, esperou que todos nós nos acomodássemos ao seu redor e pôs-se a explicar-nos, com uma paciência de Jó, como se fora ele o mais dedicado dos mestres:

– Meus filhos, sempre existiu e sempre existirá neste mundo de meu Deus gente que fala muito, mas que não se apura nada de sua prosa. Gosta de contar vantagem ou vem com desculpas esfarrapadas, ou com um lero-lero de fazer doer a cabeça, querendo engabelar as pessoas, levar vantagem em tudo. Gente assim não é verdadeira, ao contrário, é muito perigosa, pois é capaz de dar nó até em pingo d’água.

Meu primo Nandinho, querendo mais explicações, perguntou em sua candura:

Vô Valentim, por que não pode ser conversa mole para cachorro dormir?

Por que o boi, meu bom menino, foi sempre um animal muito importante na vida do homem. Por isso, ele se encontra presente em muitos expressões populares: boi de piranha; boi de presépio; boi manso, quando aperreado, remete; boi na linha; água que boi não bebe; um pé de boi – ele calmamente respondeu.

Neiva, uma das netas presentes no grupo, antes mesmo que nosso avô terminasse de dar sua resposta ao último indagador, atalhou apressada:

Por que se diz “dou um boi para entrar numa briga e uma boiada para não sair”?

Nosso avô pressentiu que aquela seria uma longa conversa em se tratando de criaturinhas tão curiosas, ávidas por conhecer os mistérios da língua popular. Respirou fundo, pediu para que alguém lhe trouxesse mais um café e continuou…

 

Views: 4

EM PAPOS DE ARANHA

Autoria de Lu Dias Carvalho

aran

Vivemos tempos de vacas magras. Não é recomendável abaixar a guarda, pois tudo pode acontecer num piscar de olhos. Deparamos com situações que nos fazem sentir na boca do leão ou em papos de aranha. Se correr o bicho pega e se ficar o bicho come. Parece que vivemos em guerra aberta contra o mundo, num mato sem cachorro. Somos obrigados a tomar decisões desafiadoras a todo o momento, a não ser que viremos caramujos ou ajamos como avestruzes.  Os acontecimentos ruins caem sobre nós como um rolo compressor. A bruxa parece estar solta. É realmente o fim da picada. Ainda assim, não podemos abandonar a luta, faz-se necessário aguentar o rojão, pois do contrário a vaca vai pro brejo. Botemos todos a boca no trombone!

Segundo alguns filólogos (estudiosos da língua), no que diz respeito à expressão que dá título a este texto,  o correto seria dizer “palpos” em vez de “papos”, pois as aranhas são possuidoras de palpos e não de papos. Contudo, o povo tem a sabedoria de simplificar ou mudar a língua, de modo que ela se adapte ao seu falar, optando sempre pela forma mais simples e mais fácil. Assim, o “L” foi suprimido, caiu fora do baralho. A maioria dos autores aceitam as duas expressões como corretas. Resta aos puristas ficar a ver navios, pois assim é e assim será. O fato é que o povo brasileiro encontra-se tanto em palpos de aranha quanto em papos de aranha, comendo o pão que o diabo amassou, a começar pela inflação que corrói seu bolso.

Views: 0