Autoria de Lu Dias Carvalho
O retábulo acima foi encomendado ao monge Fra Angelico, em 1437, pelo comerciante Cosimo de Medici, o mais influente de Florença. Quando o retábulo foi pintado, embora não se encontrasse entre os santos inclusos na Bíblia, São Nicolau gozava de grande popularidade entre o povo, tendo sua fama se iniciado no Império Bizantino. Eram-lhe atribuídos vários milagres e atos piedosos. Sua notoriedade era tamanha que até o ano de 1500, mais de 2000 monumentos foram erguidos em sua honra apenas na França, Holanda e Alemanha. Mas, embora gozasse de tanta devoção, jamais foi oficialmente canonizado.
São Nicolau é patrono dos comerciantes e dos marinheiros, como se apresenta na composição acima. E o dia 6 de dezembro é dedicado a ele. É interessante notar que antes mesmo do espalhamento do Cristianismo, as tempestades de inverno no mar Mediterrâneo, que se iniciavam nessa mesma época do ano, já traziam muito medo aos navegantes que se valiam de forças sobrenaturais para vencer o medo. Era extremamente perigoso para aqueles que se aventuravam a navegar por ali. Na Antiguidade, pedia-se proteção a Poseidon e a Netuno, mas, com a chegada do Cristianismo, S. Nicolau tomou o lugar dos deuses pagãos. O que não se podia era ficar sem proteção, tamanho eram os perigos que aguardavam os navegadores.
Na composição em evidência, S. Nicolau é apresentado duas vezes, sendo uma no céu, protegendo e guiando os sobreviventes de uma embarcação que singra entre águas revoltas e escuras, e na terra, onde se encontra à direita, com um manto verde e uma auréola que o distingue dos demais personagens. Aqui, ele agradece ao capitão que doou um pouco de seus grãos. Na verdade, trata-se de dois milagres (ou lendas) atribuídos ao santo.
À esquerda do retábulo, Fra Angelico ilustrou a lenda que fala da salvação dos marinheiros pelo santo, assim que foi invocado. O navio encontrava-se à deriva, perdido em meio às águas revoltas, sendo impulsionado em direção a uma encosta rochosa, enquanto um monstro marinho emerge a cabeça das águas turbulentas. S. Nicolau fez com que o vento soprasse e empurrasse a vela à ré, afastando a embarcação dos rochedos.
À direita do retábulo, o monge pintor ilustra a lenda que fala que o santo se dirigiu ao porto para pedir aos marinheiros que lhe dessem 100 medidas de trigo de cada navio, para alimentar a população que morria de fome. Os marinheiros recusaram, dizendo: “Padre, nós não ousaríamos fazê-lo, pois o grão foi medido em Alexandria e nós devemos entregá-lo nos celeiros reais.” Ao que o santo retrucou: “Façam o que eu lhes digo e eu juro pelo poder de Deus de que não haveis de sofrer nenhuma perda perante o medidor do imperador.” Assim aconteceu, além de S. Nicolau ter multiplicado os grãos que ganhara, sendo suficiente para alimentar a população de Myra por dois anos, e ainda doou sementes usadas para semear.
A composição presta uma homenagem ao santo, à navegação e ao comércio. Navios e mercadores ocupam um grande espaço no quadro.
S. Nicolau e o capitão, postados frente a frente, possuem a mesma estatura. As figuras são detalhadamente trabalhadas, enquanto as montanhas e as casas são bem simplificadas.
Cosimo de Medice provavelmente encontra-se no grupo dos homens, que oram ajoelhados dentro da embarcação, na primeira lenda, pois ele sempre se vestia com uma túnica vermelha simples e chapéu preto.
Ao retratar as duas lendas, Fra Angelico separa os dois cenários com uma cordilheira, mas a união do céu e mar traz ao observador a impressão de que as duas cenas acontecem ao mesmo tempo. Na Idade Média era muito comum representar vários episódios numa mesma pintura. O essencial era a mensagem a ser transmitida, de modo que o lugar e o tempo não tinham importância.
São Nicolau de Mira, também conhecido como São Nicolau de Bari, é o santo padroeiro da Rússia, da Grécia e da Noruega. É o patrono dos guardas noturnos na Armênia e dos coroinhas na cidade de Bari, na Itália, onde estariam sepultados seus restos. É também o patrono das crianças, padroeiro dos mercadores, comerciantes principalmente de milho e trigo, carregadores, moleiros, padeiros, e cervejeiros.
Sobre São Nicolau, bispo de Mira (Lícia) no século IV, existem um grande número de relatos e histórias, mas é difícil distinguir as autênticas das abundantes lendas que germinaram sobre este santo muito popular, cuja imagem foi tardiamente relacionada e transformada no ícone do Natal chamado de Papai Noel. É chamado de Santa Claus ou St. Nicholas na maior parte dos países da língua anglófona.
Curiosidade:
Retábulo – escultura, entalhe ou obra de pintura que adornava o altar de uma igreja, durante a Idade Média. Os primeiros eram adornados com figuras esculpidas ou com ouro e só mais tarde é que as pinturas se tornaram um lugar-comum. Os retábulos pintados podiam consistir numa só pintura ou em vários painéis. Muitas vezes erguiam-se atrás do próprio altar ou estavam montados ao fundo do altar.
Ficha técnica
Artista: Fra Angelico
Ano: 1437
Dimensões: 34 x 60 cm
Localização: Pinacoteca Vaticana
Fontes de pesquisa
Los secretos de las obras de arte/ Taschen
Wikipédia
1000 obras-primas da pintua europeia/ Könemann
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Ótimo!
Maria Vitória
Fico feliz que tenha gostado do artigo.
Temos muitos outros grandes mestres da pintura.
E outros mais virão.
Continue conosco.
Abraços,
Lu