Historiando Zé Kéti – OPINIÃO

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Autoria de Lu Dias Carvalho

O moleque nasceu no morro e ali viveu até ser chamado para jogar no time do bairro. Um olheiro viu os dribles e os gols do menino e levou-o para um time renomado, que tinha até bandeira, camisa, chuteira e calção. Ali jogou muitas partidas, e fez gol olímpico e gol de placa, botando o time no topo da primeira divisão. Outro olheiro viu o rapazola, agora famoso e bem tratado, e levou-o para a seleção. O jovem fez misérias no campo de outras nações. Voltou do exterior gente fina, mas de sua gente não se esqueceu. Do aeroporto pegou um taxi e pediu que subisse o morro. E na casa da mãe jogou mochila e malas no chão. Foi festa no morro, com presentes para parentes e “derentes”, numa noite de muito samba e batucada.

O técnico da seleção mandou chamar o rapaz, e foi logo escrachando: “O que é isso, meu filho? Ao morro você não pertence mais. Já lhe reservei vaga no Glória, onde dará entrevistas à mídia, enobrecendo nossa seleção. Agora você é um novo homem, um heroico filho desta nação. Seu contrato vale ouro, já estamos a negociar seu passe para a Arábia Saudita”. O jovem atleta respondeu em alto e bom som: “Podem me prender/ Podem me bater/ Podem até deixar-me sem comer/ Que eu não mudo de opinião/ Daqui do morro/ Eu não saio não”.

O massagista, temeroso de que o esporte nacional perdesse aquele filão, enfiou a colher de pau na conversa e falou com arrogância ao desportista: “Se continuar com esta besteira de morar no morro, vai acabar logo esse seu vidão. Será trocado por outro, e irá lhe faltar água, carne e até mesmo o pão”. Porém, recebeu o troco: “Se não tem água/ Eu furo um poço/ Se não tem carne/ Eu compro um osso/ E ponho na sopa/ E deixa andar”.

O técnico retomou a conversa, falando isso e mais aquilo, e que todo o país iria criticar a situação de seu craque mais famoso, pois esse merecia acomodação na área nobre da cidade, onde poderia receber com garbo os amigos, imprensa e televisão, ou seja, toda a mídia nacional e internacional. Já com o saco cheio de tanta admoestação, o jogador mais renomado do Brasil foi logo rasgando o verbo: “Fale de mim quem quiser falar/ Aqui eu não pago aluguel/ Se eu morrer amanhã, seu doutor/ Estou pertinho do céu.”.

E os céus ouviram suas preces, pois um mês depois, o craque amanheceu morto! E todos que o viram, diziam que seu rosto estampava um largo sorriso, pois vivera assim como quis.

Obs.: Clique no link abaixo para ouvir:
OPINIÃO

Nota: Morro do Rio, obra de Candido Portinari.

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