Autoria de Reinaldo Azevedo*
Quanto mais o presidente Jair Bolsonaro grita, mais revela a sua incapacidade de realizar aquilo com que nos ameaça: desfechar um golpe de estado. É claro que seu comportamento nesta quinta (27/05/2020) foi execrável. Em que democracia do mundo o chefe do Poder Executivo, seja exercido por um presidente, seja por um primeiro-ministro, se refere ao Poder Judiciário naqueles termos? Não existe. Faz mal ao país. Cria tensões internas e prejudica sua imagem no mundo, o que afasta investimentos. Golpe? Não! Não haverá.
Mas especulemos sobre tal cenário para dar relevo à sandice. Então vamos lá: os senhores oficiais-generais botam seus tanques na rua, seus aviões nos ares e decretam um bloqueio marítimo. Soldados invadem emissoras de televisão e rádio e as redações de jornais e portais. Blindados cercam o Congresso Nacional e o Supremo, e ordens de prisão são expedidas para os 11 ministros do tribunal e os presidentes das respectivas Casas Legislativas (Câmara e Senado).
Nos Estados, suponho, os respectivos comandantes das Polícias Militares, aderindo ao golpe com suas tropas, teriam de dar voz de prisão, numa primeira conta, a pelo menos 18 governadores. Enquanto isso, o general Eduardo Pazuello, ministro da Saúde, num esforço de guerra — ou de golpe — converteria o setor metalúrgico à produção de contêineres frigoríficos para juntar os cadáveres da Covid-19 com os da resistência à quartelada. O Zero Um, o Zero Dois e Zero Três se dedicariam a redigir os atos institucionais.
O que diria o mundo? Bem, de imediato, o Brasil seria expulso do Mercosul, com a Argentina fechando as suas fronteiras, cessaria todo o comércio com a União Europeia, e Donald Trump pouco poderia fazer pelo “Capitão” porque teria de enfrentar o Congresso dos EUA. O Brasil seria uma ilha de coronavírus cercada de generais por todos os lados, a bater continência para um capitão golpista. O dólar escalaria o Everest, as empresas com ação em Bolsa iriam para o vinagre e as elites empresarial e financeira que hoje toleram Bolsonaro lhe dariam um pé no traseiro. Quantos dias — não meses — duraria a aventura? Poucos. Terminariam todos na cadeia.
Sem contar que o Exército, na hipótese de topar a quartelada, teria de dar um golpe também na Aeronáutica e na Marinha, que estão voando e navegando para Bolsonaro. Há, sim, radicais e porras-loucas entre os militares, como há entre civis, mas essa é uma conversa de insanos. Quando o general Fernando Azevedo e Silva, ministro da Defesa, simula a ordem unida com os desvarios do capitão, dá a ele a ilusão de que um golpe seria possível, o que o leva a radicalizar o discurso.
Digo, e muitos não gostarão de ler, que o golpe seria o caminho mais curto para Bolsonaro ser espirrado do poder. Só não é desejável porque pessoas morreriam, ficaríamos ainda mais pobres e levaríamos algumas décadas para nos levantar do opróbrio internacional. Agora vamos ao Bolsonaro às portas do Alvorada:
“Acabou, porra! Me desculpem o desabafo. Acabou! Não dá para admitir mais atitudes de certas pessoas individuais, tomando de forma quase que pessoal certas ações.”
Estava se referindo, claro, ao Poder Judiciário, como se, a partir de agora, o Supremo não mais tivesse autonomia para tomar decisões.
Qual é a verdade? Todas as vezes em que ele tentou ultrapassar a linha da legalidade, é bom que fique claro, foi, sim, tolhido pelo tribunal. Daí o seu rancor. Quanto vale o seu “acabou, porra”? Uma nota de R$ 3. Os ministros podem, se quiserem, endurecer ainda mais o jogo? Podem. Por que não o fazem? Porque gera tensão interna que reflete nos indicadores da economia e podem tornar ainda mais ineficiente um governo já sofrível, o que faz ainda mais difícil a vida dos pobres.
O faniquito de Bolsonaro é o faniquito da impotência.
*Colunista do UOL
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Concordo com as palavras de Reinaldo Azevedo. Atualmente no Brasil não existe nenhum espaço para “golpe militar”, já que aconteceu após 1964 outros tipos de golpes, que gosto de nomeá-los de “golpes brancos”. Podemos citar alguns como: mortes de Juscelino Kubitschek, Ulisses Guimarães, Eduardo Campos, Teori Zavascki e impeachment de Collor e Dilma.
Só no caso de segurança nacional é que se implanta um golpe militar e é nisso que o governo aposta – incentivando confrontos ideológicos –, entretanto o governo será o primeiro a sofrer as consequências. As forças armadas estão de olho em Bolsonaro e não irão assumir o ônus de um governo desarticulado, sem crédito no exterior e em decadência econômica e social. O que salvam são as reservas cambiais deixadas pelos governos de Lula, Dilma e Temer. Os militares já receberam seu quinhão e o que vier de agora em diante é lucro, por exemplo, a queda do presidente e a ascensão do Mourão. Existe também o legado do golpe de 1964, do qual até hoje sofremos as consequências econômica, política e social.
Realmente este texto do jornalista Reinaldo Azevedo veio a calhar, explica com muita lucidez as consequências de um golpe de estado ou na verdade um auto golpe no Brasil na atual conjuntura.
Vivemos ainda com a sombra do golpe de 64 que provocou muitas mortes,torturas restrição de liberdade e repressão generalizada. Naquela época havia um inimigo imaginário que era o comunismo e, com o apoio da mídia, religiões, sociedade e establishment,criou-se um ambiente favorável à ruptura estabelecida nesse período, mas hoje a situação é completamente diferente de 1964, não há um inimigo que possa colocar o país e as Forças Armadas em alerta e também não há uma convulsão social que possa comprometer a ordem.
O que a gente vê é um governo totalmente despreparado que não sabe como conduzir o navio num momento de turbulências em mares revoltos em virtude do ambiente de crise institucional, econômica e de saúde. Encontra-se numa situação complexa em virtude de investigações feitas pelo Supremo Tribunal Federal sobre corrupção e crimes de fake news promovidos por seus apoiadores e familiares.
O mandatário da presidência está sendo investigado também pela suposta interferência na polícia federal. Temos que aguardar as investigações para averiguar a veracidade dos fatos e esperamos que os culpados sejam punidos no rigor da lei. Por outro lado o governo atual está sendo governado por uma parcela muito ampla de militares. É bom ressaltar que quando esses oficiais tiram a farda e abraçam os cargos, tornam-se civis,lembrando que há muitos militares da reserva atuando no governo.
Não podemos nos esquecer de que está escrito na Constituição que as Forcas Armadas são instituição de Estado e não de governo. Elas não podem participar do governo. Qualquer militar que entra num governo democrático, simbolicamente se transforma em civil.
Na democracia existem três pilares básicos: Legislativo, Judiciário e Executivo e devem conviver em harmonia. E nenhum deles deve ter armas justamente para não atacar um ao outro. As armas devem ser as regras da Constituição. Então não adianta espernear com arroubos e blefes porque não há ambiente para golpe militar, vivemos no século vinte e um e, se houvesse não se sustentaria por muito tempo, provocaria crises em todas as esferas e todos perderiam, como bem explica Reinaldo Azevedo.
Muito bom!
Sabe que vejo “O é da coisa” quase todos os dias? E quando não vejo às 18h, vejo mais tarde.
Beijo