Autoria de Lu Dias Carvalho
A ética consiste em pôr nossa liberdade a serviço da camaradagem vital que nos aparenta como semelhantes em desespero e alegria. […] A morte pode apagar o que somos, porém não o fato de que fomos e ainda estamos sendo. […] Afirmar alegremente a vida é dá-la por boa, embora isso não equivalha a considerar bom cada um dos episódios e fatores que incidentalmente participem dela. (Fernando Savater)
Ainda em tenra idade, a criança trava relacionamento com a morte. Mas essa ainda se mostra tão irreal e ficcionista como se fosse parte de suas histórias infantis, onde todos os personagens “maus”, seres humanos ou animais, morrem em razão de suas maldades. Como ela julga a si mesma, sua família e coleguinhas são pessoas do “bem”, portanto, a morte nunca irá rondá-los. É fato que vez ou outra a criança quer que alguém morra, mas apenas no sentido de “desaparecer” de perto de si e de deixá-la em paz durante algum tempo. Entretanto, o ser humano adulto vê a morte como uma realidade cada vez mais próxima, em cada ente familiar, colega, amigo ou conhecido que vai embora para sempre.
Ninguém tem a compreensão real do que é morrer, ainda que as religiões apregoem isso ou aquilo. Todo indivíduo sabe que vai morrer, contudo, nada conhece sobre a morte. E é esse paradoxo que envolve todos nós, acostumados que estamos com a Ciência que vem desvendando as mais complexas indagações. Excetuando a morte. Nossa caminhada ao encontro dela é inexorável. O caminhar diário em direção a ela, ciente de que nada interromperá esse destino, joga as pessoas numa desesperança latente. Algumas delas não aceitam a finitude como regra geral. Querem se conservar a todo custo, viver eternamente, criar exceções como sempre o fizeram ao longo da vida, ávidas por riqueza e poder, sem jamais se importar com os que estão nos degraus inferiores da pirâmide social.
Os indivíduos ganciosos pensam que encontram no acúmulo de bens um escudo contra a transitoriedade da vida. E passam a querer sempre mais, de modo que a “santa muerte” passe longe deles. Pensam que haverão de amedrontá-la. Negam para si que a aniquilação final não diz respeito a eles e aos seus. Ledo engano! O fim é o mesmo para todos: pó. Sempre o pó! Eles não sabem que não há nada como a ética para assegurar a nossa “imortalidade”, pois ela impede que nos transformemos em prisioneiros da morte, mas “semelhantes em desespero e alegria”, como argumenta o filósofo Fernando Savater.
Quanto mais prepotentes, avaras e torpes forem as pessoas, mais dificuldades terão em aceitar a morte, porque sempre se julgaram invulneráveisa tudo. Morrer sem desfrutar de tanta fortuna acumulada é uma injustiça – pensam elas. E esbravejam como se a morte fosse um de seus asseclas, partidários ou sequazes. A única maneira de contrapor a esta certeza latente de que se vai morrer um dia é viver da melhor maneira possível, a cada dia, apesar de todos os contratempos que possamos encontrar pelo caminho.
Viver mal é morrer duas vezes. Ainda que sejamos perseguidos pela nossa finitude, devemos procurar viver com satisfação, valorizando a nossa passagem por este planeta chamado Terra. Somente assim somos capazes de aliviar a nossa condição humana de seres finitos. Enquanto estamos vivos temos mais é que celebrar a vida, mas com a maior dignidade possível.
Nota: A Família Enferma, obra de Lasar Segall
Sugestão de leitura:
Desperta e Lê/ Fernando Savater
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Gostei muito, Lu!
Tem a ver com o transtorno de personalidade narcisista que tenho estudado. Vou colocar alguns trechos desse filósofo na tese que estou desenvolvendo.
Maura
Que bom encontrá-la aqui neste cantinho, bem distante da Índia (risos). Realmente tem tudo a ver com o transtorno de personalidade narcisista. Toca na ferida.
Eu gosto muito do filósofo moderno Fernando Savater. Eu tenho uma meia dúzia de livros dele. É uma pena que moremos distante, pois podería emprestar para você. Qual é o título de sua tese?
Beijos,
Lu
Um grande abraço,
Lu
“A revogação do princípio da boa-fé nas relações jurídicas das varas de família brasileiras.”
Maura
Muito interessante e bem-vinda a sua tese. No blog há um pouco do histórico da vida familiar na categoria denominada HISTÓRIA DA HUMANIDADE.
Desejo-lhe muito sucesso.
Abraços,
Lu