Autoria de Matheus Silva
Minha história é um pouquinho complicada.
Tenho 20 anos e sou estudante de medicina. Quando criança, na casa de meus parentes, tinha o apelido de “Geladeira”, pois não conseguia ficar parado, indo olhar a cozinha de cinco em cinco minutos. Eu cresci e com 11 anos comecei a me sentir triste e angustiado com o passar do dia, mesmo em períodos de férias. Descobri que tinha hipotireoidismo e em questão de alguns meses a depressão foi corrigida. Quando fui para o Ensino Médio, a fama de disciplina rígida da minha escola fez-me sofrer muito por antecipação nas primeiras semanas, perdendo noites a fio simplesmente por medo, mesmo tendo notas muito boas. Essas cessaram com o passar do curso.
Quando passei no vestibular, eu me mudei para outra cidade para fazer o curso com que sempre sonhei. Nas primeiras semanas sofri muito, mesmo já tendo ficado longe dos meus pais e lidado de certa forma bem com isso. Com o passar do tempo, eu me adaptei, porém, as manias de inquietação sempre permaneceram. Um litro de café na minha mão não durava mais que alguns minutos. Não conseguia comer como as outras pessoas, sempre muito rápido e compulsivamente (hoje já consegui manter meu peso e corpo em boa forma com academia e exercícios físicos). Além disso, qualquer prova em meu calendário já era motivo para virar a noite estudando, preocupado com o resultado, seguido de alguns dias de preocupação com a espera das notas.
Nos dias normais eu não me sentia triste, mas sentia que faltava aquele brilho e motivação que algumas pessoas trazem, já que tinha dificuldades para fazer amigos e falar em público, bem como motivação para ir a festas e interagir-me com pessoas (embora eu ficasse confortável nessa situação). Não demorou muito tempo e eu comecei a fumar maconha, o que me ajudou no sono, mas como um meu amigo disse, estava apenas colocando meus problemas debaixo do tapete, não estava a resolvê-los. Após cinco meses usando maconha todos os dias, resolvi dar um basta, parei e, quando retornei pra casa em um feriado, fui a um psiquiatra para tentar resolver isso.
O psiquiatra receitou-me escitalopram na primeira semana. Quando retornei para casa comecei a utilizar o genérico (a greve dos caminhoneiros zerou o estoque da marca que ele havia pedido). A primeira semana foi muito boa, lembro-me de que falei pro meu pai que “nunca estive tão bem na minha vida”, afinal, após sofrer muito, consegui passar em uma monitoria, ganhar bolsa da faculdade, além de ter pais maravilhosos que sempre me ajudaram. Na semana seguinte fui a uma festa em que bebi muito, coincidindo com o período em que aumentei a dosagem do antidepressivo, conforme prescrição do psiquiatra. Após três dias dessa mudança, caíram sobre mim efeitos colaterais terríveis que me fizeram perder pelo menos duas noites de sono seguidas. O psiquiatra acabou me receitando Alprazolam. Pensei: não quero isso pra minha vida, mais remédios e agora um tarja preta (tudo isso em meio a angústia, calafrios, inquietação, sudorese, turvidez na visão, taquicardia e palpitação). Parei com o escitalopram após mais ou menos 10 a 12 dias de uso.
Os sintomas melhoraram, porém nunca retornei a ser a pessoa de antes. Perdi motivação e sono. A angústia e a ansiedade continuaram e fiquei assim até o início dessa semana (fiquei um mês e meio nesse marasmo, sentindo em grau mais leve os mesmos efeitos do medicamento), quando resolvi retornar à medicação. Hoje é o terceiro dia. Durante o dia sinto-me um pouco melhor, mas à noite a angústia e o nó na garganta insistem em retornar de maneira mais severa. Ainda não sinto motivação para fazer as coisas. Amanhã vamos viajar para aproveitar um pouco as férias, tomara que isso me ajude a ocupar minha cabeça.
À vezes eu penso que entrei em uma enrascada, pois afinal eu não era tão triste assim, como minha mãe dizia eu era só “um pouco ansioso”. Isso me consome muito e me esgota. Passo boa parte do dia pensando, até o momento que chega a noite. Às vezes choro. No momento em que escrevo isto está de dia e sinto-me um pouco mais controlado, mas na certeza de que à noite vou sofrer, à medida que o sol vai embora (tomo Donarem, às vezes, para dormir melhor, mas ainda acordo muito cedo com o coração palpitando). Marquei com outro psiquiatra, desta vez na cidade em que estudo, para a qual vou retornar em três semanas. Espero ate lá estar me sentindo melhor.
Nota: O Enigma sem Fim, obra de Salvador Dalí
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