Autoria de Lu Dias Carvalho
A agressividade dos cangaceiros, a postura hierática das rendeiras tecendo tramas delicadas com a musicalidade dos seus bilros, a combatividade do galo, a tristeza conformada dos retirantes, todos os temas de Aldemir Martins só poderiam ser interpretados adequadamente por traços severos, embora ágeis e livres, sem o sombreamento bonito e maneiroso dos que aprendem a desenhar na escola. E o seu desenho era duro (…) cheio de arestas cortantes como o mandacaru. (Edwaldo Pacote – jornalista baiano)
Aldemir Martins (1922-2006) nasceu em Ingazeiras, no Ceará. Seu pai, Miguel de Souza Martins, era responsável pela expansão das linhas férreas de seu Estado, enquanto a mãe era filha de índios, motivo de orgulho para o futuro pintor. Sua família era obrigada a mudar constantemente, em razão do serviço do pai. Miguel mudou-se para um município perto da capital, Fortaleza, onde seu filho deu início aos estudos no Colégio Militar. Sua habilidade para o desenhou não passou despercebida, sendo o menino escolhido com orientador artístico da turma. Do Colégio Militar, ele foi para o Ateneu de São José, onde se formou. A seguir, alistou-se no exército, onde permaneceu durante cinco anos, até o término da Segunda Guerra Mundial.
Ao desenhar o mapa aerofotogramétrico de Fortaleza, Aldemir obteve, por meio de concurso, o cargo de cabo-pintor, época em que se dedicou ao aperfeiçoamento da técnica de pintura e desenho. No tempo em que passou em Fortaleza, o artista fundou, juntamente com um grupo de artistas, dentre os quais se encontravam Mário Baratta, Barbosa Leite, João Maria Siqueira, Luís Delfino e Raimundo Campos, o Grupo Artys, que depois se tornou o Centro Cultural de Belas-Artes e a Sociedade Cearense de Artistas Plásticos (SCAP). Veio a trabalhar também como ilustrador em jornais cearenses, como O Unitário e Correio do Ceará. Foi nesse período que conheceu o intelectual paulista Paulo Emílio Salles Gomes que, além de comprar uma de suas obras, incentivou-o a buscar grandes centros.
Aldemir Martins acabou optando pela cidade do Rio de Janeiro, onde passou a usar temáticas brasileiras em suas obras, como paisagens, folclores e hábitos de seu Nordeste. Levava consigo 12 telas e 15 desenhos. Ali foi recebido pelo amigo pintor e conterrâneo Antônio Bandeira. Participou de exposições. No ano seguinte, foi para São Paulo, onde começou a trabalhar como ilustrador na imprensa paulista. A seguir faz sua primeira exposição individual, aos 20 anos de idade, composta de 10 pinturas e 15 desenhos, obras com a temática nordestina, com suas cores vivas e cruas, como explicava ele.
Em 1947, Aldemir Martins participou da exposição 19 Pintores, em que ganhou o terceiro lugar, tornando-se mais conhecido entre os artistas, que trabalhavam com a linguagem expressionista, no início do pós-guerra. Ainda nesse ano, Ademir participou de uma pequena mostra, Desenhistas Brasileiros, na cidade de Praga, atual República Tcheca. Em 1949, ele, que era um autodidata declarado, resolveu fazer o curso de história da arte, com a finalidade de atuar como monitor no museu do MASP. Seu álbum Cenas da Seca do Nordeste ganhou o prefácio da escritora cearense Rachel de Queiroz. Participou de inúmeras mostras e recebeu muitas premiações. Em 1956, na XXVIII Bienal de Veneza, recebeu seu mais importante prêmio: Premio della Presidenza de Consiglio dei Ministri, de melhor desenhista internacional. E, para completar, foi escolhido pelo júri da Galerie Rive Gauche, como o melhor desenhista das dez primeiras Bienais de Veneza do pós-guerra (1946-1966).
Depois de muitas viagens pelo Brasil, recebeu um convite para expor em Washington, EUA, onde ficou três meses. O Prêmio de Viagem ao Exterior levou-o a Roma, onde permaneceu dois anos. Viajou depois para a Inglaterra e a China, sempre aprimorando sua técnica e travando intercâmbio com outros artistas. Aldemir trabalhou também como ilustrador de obras literárias e desenhou painéis cenográficos e murais para inúmeros meios de comunicação, como o teatro e a televisão, editando diversos álbuns, conquistando vários prêmios. Também trabalhou junto à indústria de tecelagem e de embalagens, tornando-se muito conhecido, inclusive do público, deixando um riquíssimo legado, ao morrer com 84 anos, vitimado por um infarto.
Aldemir Martins era artista plástico, ilustrador, pintor e escultor autodidata, dono de uma personalidade generosa, sempre preocupado com as questões da arte e da identidade nacional, conhecido no país e no exterior. O artista foi um marco de extrema importância para a história da arte do Brasil.
Fonte de pesquisa
Aldemir Martins/ Coleção Folha de São Paulo
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