RENASCIMENTO E REFORMA PROTESTANTE (Aula nº 58)

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Autoria de Lu Dias Carvalho

O Renascimento continuava a todo vapor na Itália, exercendo influências nos mais diversos campos. Entretanto, nos países setentrionais (Alemanha, Países Baixos e Inglaterra) as coisas andavam bem complicadas para os artistas. Enquanto os mestres do sul europeu aprendiam a lidar com as novas descobertas, os artistas do norte defrontavam-se com um problema de extrema gravidade para eles: se a pintura podia e devia existir. Mas o que aconteceu com a arte, sobretudo a pictórica e a escultórica, no norte europeu, tão rico em artífices? A cisão religiosa que tanto abalou as estruturas da arte nos países citados tinha um nome: Reforma. Mais uma vez a religião deixava seu real campo de trabalho para se intrometer em outras searas.

O fato é que como acontece em todas as comunhões — em meio aos adeptos do protestantismo existiam os extremistas que se opunham à existência de pinturas ou estátuas, principalmente nas igrejas, sob a alegação de que se tratava de idolatria. E mais, os protestantes extremados censuravam até mesmo as decorações alegres nas casas. E essas, quando permitidas em “teoria”, o tipo de construções, assim como o clima local, era impróprio para grandes afrescos decorativos, à maneira daqueles com os quais a nobreza italiana ornamentava seus palácios.

Os artistas de terras protestantes — em razão do rigor religioso — viram cair por terra a sua mais importante fonte de renda: a pintura de retábulos. Restava-lhes tão somente a ilustração de livros (objetos acessíveis a um número limitado de pessoas) e a pintura de retratos, o que era insuficiente para garantir-lhes uma vida decente, possibilitando-os a viver da profissão escolhida. Não foram poucos aqueles que abandonaram seu país em busca de ventos mais libertários, onde pudessem trabalhar mais livremente.

O Renascimento no norte europeu estava ligado a sentimentos nacionalistas e religiosos que acabaram por desaguar na Reforma que, por sua vez, dividiu o mundo cristão em duas partes: católico e protestante. O início da Reforma é geralmente estipulado em 1517 (século XVI), quando Martinho Lutero (1483-1546) — crítico da Igreja Cristã de então — passou a pregar contra seus excessos. Era um ferrenho opositor do preceito de que se podia ganhar a salvação eterna praticando rituais e comprando indulgências, uma espécie de passagem para o Céu. Se Martinho Lutero aos nossos dias voltasse, certamente faria uma nova reforma, ao ver que tudo aquilo que condenava, encontra-se a todo vapor em meio àqueles que se dizem profetas de seus ensinamentos (venda de grãos de feijão, de óleo e sal ungidos, de espadas milagrosas, etc, e os mais bizarros rituais em nome da prosperidade). O rompimento total entre católicos e protestantes aconteceu por volta de 1521.

O humanismo alemão também foi impactado pela Reforma, perdendo grande parte de seu vigor, uma vez que os novos líderes religiosos, embora estimassem a eloquência, a poesia, a habilidade retórica e os conhecimentos clássicos, não o via como um fim em si, mas tão somente como um meio de ocupação dos cristãos protestantes. Em consequência de tantas mudanças bruscas, os primeiros humanistas alemães deixaram de lado o interesse por estudos que vinham fazendo, a exemplo da cabala, do ocultismo e do neoplatonismo. As escolas e as universidades protestantes passaram a só ensinar os textos clássicos tidos como “seguros”, ou seja, aqueles que eram convenientes aos novos mandantes. A arte literária tornou-se predominantemente religiosa. Vemos aqui uma prova de que a história da humanidade é cíclica, pois novamente a religião passa a comandar os caminhos do homem na arte.

Os Países Baixos protestantes tornaram-se independentes nos anos finais do século XVI. O estudo dos clássicos centralizou-se na Universidade de Leiden, onde ainda era possível encontrar tolerância religiosa e abertura intelectual. Muitos eruditos por ali passaram, como foi o caso de Lipsius (1547-1606), dono da obra-prima conhecida como Annales de Tácito. Assim como o teólogo e filósofo humanista Erasmo de Roterdã (1466-1536) —  tido como o mais importante humanista do norte europeu — que correspondeu com humanistas e eruditos da Europa.

A Polônia foi outro país do norte europeu que teve comportamento igual ao dos Países Baixos. Recebeu refugiados religiosos, não importando a denominação, assim como permaneceu aberto às novas ideias. Ali, a astronomia distinguiu-se entre todos os ramos do conhecimento, sendo capaz de desafiar os dogmas teológicos legados pela Idade Média, tendo no astrônomo e matemático polonês Nicolau Copérnico (1473-1543) sua maior figura. Foi responsável por desenvolver a teoria heliocêntrica do Sistema Solar, jogando por terra a crença de que o Sol gravitava em torno da Terra, o que abalou os ensinamentos dos teólogos que em seus argumentos religiosos citavam a imobilidade da Terra.

O Renascimento do norte europeu, além de ter sido influenciado pela erudição dos mestres italianos, também teve suas próprias características, como o fato de mostrar-se mais voltado para os temas religiosos e de piedade pessoal, enquanto italiano cobria os mais diferentes campos. Se o humanismo do norte buscava a grandiosidade da criação de Deus, vendo o homem como um ser insignificante e sem nenhum mérito, o italiano via o homem como capaz de melhorar a si próprio, capacidade essa que podia vir de uma preparação e educação adequadas. A corte de Rodolfo II em Praga serviu de refúgio para artistas, eruditos e cientistas que discordavam das novas diretrizes eclesiásticas, impedindo, assim, outro conflito religioso.

Exercício
1. O que aconteceu aos artistas após a Reforma no norte europeu?
2. Como a Reforma impactou o humanismo?
3.Qual foi a importância de Nicolau Copérnico?

Fontes de pesquisa
A história da arte/ E. H. Gombrich
Renascimento/ Nicholas Mann

8 comentaram em “RENASCIMENTO E REFORMA PROTESTANTE (Aula nº 58)

  1. Marinalva Autor do post

    Lu
    Martinho Lutero buscava coibir os desmandos da Igreja da época. Ousou desafiar muitos dogmas e defendeu as escrituras. Ousou desafiar poderosos. Um simples monge contraria pessoas que, desde tempos imemoriais falavam por Deus e pelo Estado. Ele os desafiou, humilde, convicto, em um momento divisor de águas na história do mundo. Não tenho perspectivas boas para o futuro da humanidade. Todos continuamos caminhando sem rumo. Um caminho para a nossa autodestruição.

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    1. LuDiasBH Autor do post

      Marinalva

      Imagine se Martinho Lutero voltasse hoje e visse o que os seus seguidores fazem com aquilo que lhe era mais importante: apenas a fé. Hoje as Igrejas Protestantes em sua maioria têm se transformado em grandes empresas, cujo objetivo principal é o lucro. Elas estão arrecadando horrores. Seus dirigentes têm vida de nababos. A fé não passa de um slogan para a arrecadação de dinheiro.

      Abraços,

      Lu

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  2. Antônio Costa

    Lu

    No contexto histórico-cultural as associações religiosas, apesar dos percalços, tiveram um papel importante para impedir a selvageria que habita em cada um, através do temor. Por outro lado, as Igrejas foram guardiãs e patrocinaram bastante a arte. Daí o equilíbrio que deve nortear a análise histórica. É bem verdade que vivemos hoje um novo contexto histórico onde o oportunismo e manipulação se somam. Na realidade a história da humanidade é construida com enlaces e rompimentos, cada um colhendo pelas escolhas feitas.

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    1. LuDiasBH Autor do post

      Antônio

      Houve um tempo em que eu acreditava que a religião era capaz de refrear a índole do homem, esquecendo-me de que elas eram compostas por esses mesmos homens. Em razão disso, não foram poucos os conflitos religiosos mundo afora através dos tempos, terminando por ceifar inúmeras vidas, tudo em nome de um ser supremo. No cuidado com o planeta, a religião politeísta mostrou-se muito mais comprometida, pois via o ser criador em tudo. Atualmente, os únicos países que saíram da tutela da religião foram os laicos, ainda assim é notória a intromissão no Estado por parte de religiões, como vemos no Brasil. Acredito que o contexto da educação do indivíduo diz muito mais do que blablabla da religião. No que diz respeito à arte, a religião cristã foi importante, mas a Reforma Protestante deixou os artistas em maus lençóis. Quanto a cada um colher aquilo que advém de suas escolhas é uma verdade inconteste.

      Abraços,

      Lu

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  3. Adevaldo R. de Souza

    Lu

    Realmente o extremismo provoca grande prejuízo ao desenvolvimento econômico e social dos povos. Atualmente em nosso país são vistas as consequências do fundamentalismo religioso na educação e na saúde. No Renascimento a cultura e a arte sofreram com a dita “Reforma Religiosa”. As ações condenadas pelos protestantes à época – “preceito de que se podia ganhar a salvação eterna praticando rituais e comprando indulgências, uma espécie de passagem para o Céu”, como descreve o texto – hoje são praticadas por líderes protestantes. Até onde vamos chegar?

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    1. LuDiasBH Autor do post

      Adevaldo

      É por isso que eu disse que, se Martinho Lutero voltasse aos dias de hoje, iria ficar indignado, amaldiçoando toda essa gente que reduziu os seus princípios a pó. O que fazem hoje, apenas como exemplo, Edir Macedo, Valdemiro Santiago e Silas Malafaia com seus adeptos em nome do protestantismo é hediondo. Segundo o pastor Jardel Fernandes em seu espaço no YouTube, o mundo evangélico movimentou cerca de dois bilhões de reais em 2018, através de empresas disfarçadas em Igrejas, ao falar sobre a prática de simonia. Ao nosso povo falta educação e em consequência discernimento, tornando-se presas fáceis desses lobos vorazes.

      Abraços,

      Lu

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  4. Hernando Martins

    Lu

    Como bem explicado no texto, a Reforma Protestante no no norte europeu, principalmente na Alemanha, Inglaterra e Países Baixos, teve um papel fundamental na divisão do cristianismo. Isso leva a uma influência brutal no comportamento das artes, principalmente a pictórica e a escultórica em virtude da simbologia expressada nessas modalidades. Haja vista que a visão luterana proibia qualquer tipo de representação de imagens e decorações de templos com simbologia de imagens sacras, e isso resultou num prejuízo gritante para os artistas, contribuindo para o empobrecimento das artes.

    A religião, quando se une à política, torna-se algo muito perigoso, porque na maioria das vezes as pessoas menos esclarecidas se deixam guiar cegamente por falsos profetas que têm apenas o intuito de ganhar dinheiro. Por isso, confundem as pessoas e dominam-as, fazendo-lhes uma lavagem cerebral. Acredito, que a única maneira de libertar-se de tudo isso é o conhecimento junto com a sabedoria. Assim, criam-se possibilidades de adquirir conceitos sobre a vida em todos os aspectos, libertando as pessoas de conceitos impostos que só trazem retrocesso ao ser humano.

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    1. LuDiasBH Autor do post

      Hernando

      Concordo totalmente com você sobre o disparate que é a união do Estado com a religião, como vemos nos países muçulmanos e outros mais. Os países laicos ou seculares são aqueles que mais progridem, pois não é facultado aos dirigentes religiosos intrometerem-se, por seu lado, o Estado não se intromete nas religiões, ou seja, é cada um no seu quadro. Ao Estado cabe capacitar o cidadão para que ele seja responsável para fazer as suas próprias escolhas em quaisquer que sejam os campos. À religião cabe a preocupação com a alma. Misturar alhos com bugalhos só dá tragédia. Realmente é lamentável que o Brasil que constitucionalmente é um país laico esteja se submetendo a líderes religiosos. O resultado é bem preocupante.

      Abraços,

      Lu

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