Autoria de Lu Dias Carvalho
Com frequência penso que a noite é mais viva e mais rica em cores do que durante o dia. Eu confesso não saber a razão, mas olhar as estrelas sempre me faz sonhar. Saio noite afora para pintar estrelas. (Van Gogh) (Van Gogh)
Neste quadro, quase síntese cósmica de toda uma busca humana e pictórica de Van Gogh, é como se astros, mundo, terra e céu girassem numa trepidante atmosfera, sob cuja proteção pintou um povoado que, a julgar por seu campanário, recorda mais os de sua meninice na Holanda do que as aldeias provençais. (Laura García Sánchez)
A noite esteve muito presente nas telas de Van Gogh, nos seus últimos anos de vida, como se ele buscasse algo além das estrelas. Anteriormente a esta tela fantástica, o artista pintou Terraço de Café na Praça do Fórum e também Noite Estrelada sobre o Ródano (ambos presentes no blog), tendo a noite como tema. O pintor tinha uma maneira peculiar de retratar a noite. Para superar o escuro, usava várias velas acesas na aba de seu chapéu, enquanto pintava, apesar do perigo de queimar-se.
Quando produziu Noite Estrelada, Van Gogh encontrava-se no sanatório, por vontade própria, há quase um mês. Durante um ano permaneceu no local, existindo contínuas oscilações em sua saúde. Apesar de muitas vezes aparentar tranquilidade e ternura em suas cartas ao irmão Theo, o artista convivia com profundas crises de depressão. A tela em ora em estudo é o resultado do agravamento de seu estado mental desequilibrado. O pintor estava à época com 37 anos de idade.
Van Gogh, ao optar por ficar num sanatório, ganhou regalias que não eram dispensadas aos outros companheiros do lugar. Era-lhe permitido deixar o lugar para pintar sempre que quisesse,. A princípio contentou-se com o ambiente em volta do sanatório, depois foi ganhando coragem e aventurando-se por lugares mais distantes. Gostava de observar o mundo do lado de fora, assim como a forma grotesca da vegetação e das rochas, de modo que as representava distorcidas e desfiguradas, tal e qual elas se mostravam. No entanto, o quadro intitulado Noite Estrelada foi pintado recorrendo à memória e à imaginação, antes de ganhar confiança e superar o distanciamento entre o mundo exterior e o sanatório.
Esta tela, segundo analistas da obra de Van Gogh, demonstra uma energia nunca vista em outra obra do pintor e possivelmente em toda a história da pintura. Karl Jaspers, filósofo e psiquiatra alemão, no seu estudo sobre Van Gogh, assim analisa: Os objetos, como coisas individuais, desaparecem para se converter em redemoinhos.
A olharmos para a tela Noite Estrelada, temos a sensação de que o pintor observava tudo de um ponto no alto, mas ele já não quer dizer nada, no sentido de perpetuar o que vê. É levado apenas a exprimir o que sente, ou o que se passa em sua alma conturbada. Seu incandescente e sinuoso cipreste parece querer atingir o céu, enquanto a lua explode-se em esplendor. À direita está um agrupamento de oliveiras, formando uma densa nuvem. As estrelas também ganham a posição de sóis. A cidadezinha parece insignificante lá embaixo, com um pouco de luz aqui e acolá. Apesar de frágil, só o pináculo da torre da igreja parece desafiar o céu. As aspirais de luz traduzem toda a energia do quadro, como se quisessem abraçar ou expulsar tudo que delas se aproximam.
Noite Estrelada é uma das mais belas visões já criadas do céu noturno. A estrutura da pintura é dinâmica, ondulada. O céu parece em movimento e a lua e as estrelas espalham seu brilho em forte amarelo. Se olharmos a pintura com intensidade, somos levados a sentir os movimentos que dela emanam, pois tudo ali parece ganhar vida. Alguns estudiosos veem nesses traços luminosos a representação da nossa Via Láctea.
Van Gogh entregava-se por inteiro a tudo que fazia, de forma que a força de sua compulsão criadora não era capaz de conter-se dentro de moldes preestabelecidos. Ao contrário, vergava-se à sua vontade. Dentro dele, como em Noite Estrelada, tudo era movimento e agitação. É possível sentir esse turbilhão que não se acalmava nunca, através de seus traços desinquietos e exasperados, acompanhando as marcas deixadas por seus pinceis e espátulas, apesar do tempo que nos separa dele.
Ficha técnica:
Data: 1889
Técnica: óleo sobre tela
Dimensões: 73 x 92 cm
Localização: Metropolitan Museum of Modern Art, Nova York, Estados Unidos
Fontes de pesquisa:
Mestres da Pintura/ Editora Abril
Grandes Mestres da Pintura/ Coleção Folha
Van Gogh/ Editora Taschen
Van Gogh/ Girassol
Para Entender a Arte/ Maria Carla Prette
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