Autoria de Lu Dias Carvalho
Caravaggio é o mestre das trevas. Ele as entreabre somente o suficiente para não diminuir seu trágico e viril pessimismo. Tudo nesta tela ocorre como uma evidência inconsciente de que cada um cumpre a sua tarefa. A desolação reside no acontecimento puro e simples. E o santo, bom modelo conhecido na via Margutta, já fincado à cruz, exibe um olhar calmo, consciente, de herói laico moderno. (Roberto Longhi)
Relatam certas fontes antigas que a primeira versão da Crucificação de São Pedro, pintura que mostra o martírio do santo, feita para a a Capela de Tibério Cerasi, foi recusada, tendo Caravaggio que substituí-la, mas nunca não foi encontrada a primeira versão da pintura, se é que algum dia existiu.
O artista apresenta São Pedro como um velho camponês já pregado à cruz, com os três carrascos tentando colocá-la de pé. O santo levanta a cabeça, que se destaca no fundo escuro. Seus pés, tendo bem visíveis os dois pregos neles fincados, encontram-se numa posição mais alta, na extremidade esquerda da tela, captando o olhar do observador, ressetido com a brutalidade dos carrascos e com a candura emanada do santo. A resignação do mártir dá-lhe uma aura de santidade diante de tamanho sofrimento.
Os três homens rudes, malvestidos e descalços, aparentando cansaço diante do empenho extremado, tentam concluir a ação. Eles sentem dificuldades em levantar a cruz. Seus esforços são visíveis. Nenhum deles mostra o rosto, o que os identifica como pessoas sem destaque, que ali estão apenas para levar a cabo uma incumbência certamente remunerada. Um deles está de costas para o observador, apoiado numa pá, que se encontra no chão, perto da roupa de São Pedro, no lado direito da tela, enquanto seu ombro esquerdo sustenta a cruz, funcionando como um apoio, na tentativa de erguê-la.
O homem de pé, também de costas para o observador, segura a corda com as duas mãos, apoiando-a no meio das costas. O corpo arqueado denota o seu grande esforço físico. O modo como o terceiro homem abraça os pés de São Pedro, no intuito de ajudar os dois companheiros a levantarem a cruz, mostra proximidade para com a vítima e, ao mesmo tempo, indiferença.
Os três verdugos, extremamente impessoais, parecem alheios ao sofrimento de São Pedro, como se ali estivessem apenas para cumprir um trabalho qualquer, sem questionarem se o que fazem é correto ou não.
Não se vê a presença de sangue na tela, apesar dos pregos fincados nas mãos e nos pés do santo. Também não existem testemunhas presentes à crucificação, a não ser o sentimento de compaixão que toma conta do observador.
Caravaggio, como é do seu estilo, limita-se ao uso do essencial. Além da cruz, onde se encontra São Pedro, a composição, elaborada na diagonal, forma com seus personagens uma segunda cruz. Observem a foto menor, acima, para entenderem melhor.
São Pedro, cujo modelo foi encontrado na rua pelo artista, apresenta-se velho, porém forte, com o rosto marcado pelas rugas e pelo sofrimento. Não há revolta em seu semblante, mas aceitação. Observem que os três homens tentam levantar a cruz, deixando São Pedro de cabeça para baixo. Dizem que o próprio santo pediu para ser crucificado de cabeça para baixo, pois não queria imitar seu mestre Jesus Cristo.
Ficha técnica:
Artista: Caravaggio
Ano: 1601
Tipo: Óleo sobre tela
Dimensões: 230 cm × 175 cm
Localização: Santa Maria del Popolo, Roma
Fontes de pesquisa:
Grandes mestres da pintura/ Coleção Folha
Grandes mestres/ Abril Coleções
A história da arte/ E. H. Gombrich
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