Autoria de Hella Andino
Sou casada com um bipolar e portador de HIV há treze anos.
No início deste ano, através de um depoimento que li, eu me identifiquei com a pessoa e comecei a notar que meu casamento não era tão perfeito como eu imaginava. De uma hora para outra comecei a perceber coisas que em minha ingenuidade, acreditava que eram feitas por amor, apenas provas de amor, e tudo em nome da nossa família. Eis minha história:
Conheci um rapaz e com um mês de namoro nós fomos morar juntos e eu logo engravidei do nosso primeiro filho, o que parecia um conto de fadas. Eu tinha a certeza que tinha encontrado o amor da minha vida. Com um ano de casados, ele descobriu ser portador de HIV. Eu não sabia ao certo nem o que era essa doença, mas o apoiei e ele, com um jeitinho todo amoroso, conseguiu me manipular e me convencer a fazermos sexo sem preservativo. Eu me sinto tão boba e ao mesmo tempo envergonhada com isso.
Engravidei do nosso segundo filho, ainda acreditando que vivia um conto de fadas, pois ele me fazia entender que era a “minha luz no fim do túnel”. Nesse período ele descobriu a bipolaridade. Sua infância foi bem difícil, tendo sua mãe se envolvido com drogas, ele foi torturado e houve a separação de seus pais. Porém, antes de me conhecer, ele também se envolveu com drogas.
Eu, como uma mulher apaixonada, certa de que meu casamento era feliz e perfeito, continuei apoiando-o em todos os sentidos. Os anos foram passando, cheio de proibições e eu sempre achando que era por amor, sendo uma boa esposa, cedendo e apoiando-o em tudo. Com 5 anos de relacionamento engravidei do meu terceiro filho. Na gravidez descobri que estava também com o vírus HIV. Sim, pessoal, ele me contaminou. Aí começaram também os episódios suicidas, as agressões psicológicas e o quebra-quebra de coisas em casa.
Neste ano, exatamente em fevereiro, como citei em cima, parece que eu acordei de um pesadelo, ao ler uma postagem sobre “agressão psicológica”. Percebi que aquilo que eu estava vivendo se tratava da mesma coisa.
Após uma briga sem motivos graves, como sempre ele fazia e depois me mandava embora, aceitei ir embora de verdade. Fui para a casa da minha mãe. Foram três dias de puro inferno. Ele me ligava e também ligava para todos da minha família. Não tive um minuto de paz, até que, muito pressionada pelas circunstâncias, pois ele não queria mais comer e falava em suicídio, resolvi voltar para não me sentir culpada, se algo acontecesse de ruim. Para ele tudo ficou normal.
Chegou a pandemia do Covid-19. Ele ficou e ainda e continua afastado do trabalho todos esses meses. Na semana passada entrou em mais um episódio de surto, alegando que eu não o amava e que faço tudo para ficar distante dele, ameaçando de novo se matar… Estou buscando ajuda psicológica, pois não sei mais o que fazer…. Só sei que não estou feliz e que esse amor é doentio e está acabando com a minha vida. Não posso viver mais assim!
Por favor, ajudem-me!
Ilustração: Mulher Chorando, 1947, obra de Candido Portinari
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Hella,
acredito que a contaminação pelo HIV tenha te paralisado em muitos aspectos. Insegurança! Medo!Acredito que você precisa, primeiro, garantir o seu tratamento e dos seus filhos, se for o caso. Resolvida essa parte (a mais importante), conduza-o também para o tratamento, físico é psicológico.
Só assim você poderá ter clareza para decidir o melhor para você, seus filhos e ele também.
Força! Torcendo muito por você.
Hella
Alguém já dizia que viver é um ato de coragem. Trocando em miúdos, todos nós passamos por altos e baixos em nossa vida. Se alguém disser o contrário estará mentindo descaradamente. Não há porque nos envergonharmos dos erros que cometemos ao longo de nossa vida. O importante é que aprendamos com eles. E essa aprendizagem é diária. Aquele que disser que não muda sua maneira de pensar e de agir é um tolo, um ignorante que sofrerá até o fim de seus dias.
Amiguinha, não foi só você que cometeu erros por ingenuidade. Todos nós fazemos isso sempre. Se eu listasse aqui os erros que já cometi, levando em conta a minha “boa fé” nas pessoas, daria para encher páginas e páginas. Mas esses erros me fizeram amadurecer, a olhar ao meu redor com olhos mais vigilantes e a ter uma postura mais crítica em relação às minhas tomadas de decisão. Ainda erro? Claro que sim! Apenas erro menos do que antes.
Analisando seu marido, ele é digno de compaixão, pois a bipolaridade é uma doença mental que judia muito de seu portador. É duro não termos controle sobre nossos próprios atos. Basta ver uma pessoa sob o efeito do álcool (bêbada) para ver como ela faz coisas das quais se arrepende depois, pois naquele momento perdeu o controle de si mesma. Agora imagine alguém bipolar, vivendo sob o controle de uma mão opressora no seu cérebro e que o torna um escravo, um mamulengo… Não tenha raiva da pessoa dele e nem imagine que todos os seus gestos de amor foram frutos de sua doença. Os bipolares também amam, apesar de suas crises. Tenho a certeza de que ele ama sua família, só que de um jeito doentio, que foge à normalidade, pois é uma pessoa doente. E quando diz que cometerá suicídio, pode acreditar nisso, sim, pois entre os portadores de bipolaridade encontra-se o maior número de pessoas que cometem tal ato.
Hella, o que eu disse acima não quer dizer que seja obrigada a conviver com ele. Nada disso! Quis apenas reafirmar que ele é um homem doente. Se achar que não está dando mais conta de manejar o barco (pois conviver com um bipolar não é fácil), exija que ele faça tratamento ou você pula fora, pois a vida dele sem a medicação necessária seria um inferno para você e seus filhos. Mas faça isso com serenidade, sem excessos, sem se vitimizar, sem o envolvimento de terceiros para que não se ponha em risco e também seus filhos.
Amiguinha, aprendi que quando aceitamos um fato, buscando compreendê-lo o melhor possível, nosso sofrimento ameniza. Saber que seu marido é uma pessoa doente, manipulada pela bipolaridade, fará com que não sinta raiva, mas compaixão por ele. Não ponha em cheque seus momentos de amor com a família. Não julgue se isso ou aquilo foi fruto de manipulação. Não menospreze seus momentos de felicidade com ele. Eles existiram, sim. O bipolar não é uma pessoa má, mas alguém manejado por uma doença que ainda não é curável, mas pode ser amenizada com tratamento. Em suma – é uma vítima do descontrole cerebral. Se pensar assim, desenvolverá por ele um sentimento de grande piedade e não haverá raiva dentro de si. Em consequência, sofrerá menos, pois o que nos leva ao sofrimento é o nosso modo, muitas vezes egoísta, ao não aceitar a doença mental do outro, achando que tudo não passa de fricote ou maldade. Só quem tem uma doença mental pode avaliar quão grande é o sofrimento da vítima (sou uma depressiva crônica que vive sob o efeito do antidepressivo).
Hella, busque ajuda e siga as orientações recebidas, mas, sobretudo, não deixe de amar quem não tem o real controle de si (e que ama sua família à sua maneira) ainda que não venha a viver com essa pessoa. Assim agindo, seu equilíbrio voltará, possibilitando que tome as medidas necessárias. Quanto ao HIV, continue fazendo o tratamento.
Conte sempre com a gente aqui neste espaço! Continue nos dando notícias suas.
Abraços,
Lu
Hella
A tomada de consciência sobre algo que nos prejudica é o primeiro passo. As mudanças virão com acompanhamento médico, psicológico e muita perseverança. Siga em frente com coragem e verá a luz no final do túnel verdadeiramente. Estou torcendo por você.
Hella
Alguns pontos sobre os quais vale a pena refletir:
1. A sua felicidade depende de suas próprias escolhas e decisões.
2. A análise do outro passa pela escolhas convenientes e/ou omissas que ele faz.
3. A cumplicidade por ingenuidade, desconhecimento é um preço pago que deve ser aprendido para que não se repita ou continue.
4. Os apêndices (filhos) são consequências a pesar mais na mãe, ou no mais consciente e responsável dos cônjuges, e devem ser levados a sério para não sofrerem sérias consequências no futuro.
5. Torna-se imperativa a busca de um novo caminho para você e seus filhos.
6. A carga que carrega (marido) em razão do suposto amor é insuficiente, apenas potencializará os problemas futuros.
7. Busque os direitos de sobrevivência para você e seus filhos.
8. Busque a via legal que certamente preservará todos os seus direitos.
9. Tenha novos compromissos de vida: consigo mesma e com seus filhos.
Hella, a busca de novos horizontes irá ajudá-la a esquecer este passado destrutivo! Colhemos o fruto de nossas escolhas, mas devemos buscar sementes e chão novo para novos plantios.
Estou torcendo por você!
Antônio
Querida Hella
Sinto muito pelo que está passando e me solidarizo com a sua dor. Procure se fortalecer psicologicamente, busque apoio da sua família, dos amigos, e siga se cuidando!Não ceda às chantagens emocionais dele. Sei que é muito difícil, doloroso, mas não temos poder sobre o outro. Não somos responsáveis pelos atos de uma outra pessoa.
Seu marido também precisa de ajuda, mas primeiro ele precisa querer e aceitar essa ajuda. A bipolaridade requer acompanhamento psiquiátrico e psicológico constantes. E a partir de agora, olhe para você, cuide-se e pense no que você realmente merece. Eu tenho certeza de que você merece ser feliz.
Sinta-se abraçada e acolhida!