Arquivo da categoria: Ditos Populares

A sabedoria popular está presente em todas as línguas, sendo expressa através de várias maneiras: provérbios, adágios, sentenças, aforismos, parêmias, apotegmas, anexins, rifões, ditos e ditados populares.

É MAIS FÁCIL UM BOI VOAR…

Autoria de Lu Dias Carvalho

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Conta-se que São Tomás de Aquino, grande gênio filosófico e teológico, parecia às vezes viver no mundo da lua, tamanho era o seu desligamento das coisas terrenas. Certo dia, quando se encontrava em um de seus costumeiros alheamentos, um colega tentou lhe pregar uma peça, dizendo:

– Frei Tomás, corra aqui até a janela e veja lá fora um boi voando!

Tomás imediatamente levantou-se e foi até à janela atender o chamado do colega, que se dobrava de tanto rir. Como se não bastasse só o riso, ainda ironizou:

– Deixe de ser bobo, irmão, você já viu um boi voar?

Ao que Tomás de Aquino respondeu-lhe:

– Não! Mas achei que é muito mais fácil um boi voar do que um frade mentir.

Nota
O provérbio É mais fácil um boi voar do que… denota sempre a impossibilidade de que um determinado fato aconteça. Mas nos dias de hoje não tem sido muito fácil usá-lo, pois ficamos impressionados, abestalhados e perturbados com o que vemos acontecer, todos os dias, Brasil afora. Foi-se o tempo em que era mais fácil um boi voar. Olhem para o céu, caros leitores, e vejam como é grande a boiada a voar, tão paradoxais são os acontecimentos nas bandas de cá. Boi voar agora é fichinha!

 Fonte de pesquisa:
Provérbios e ditos populares / Pe. Paschoal Rangel

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CORRA DE ABRAÇO DE TAMANDUÁ

Postado por Lu Dias Carvalhotamand

“Avisa ao formigueiro/ vem aí tamanduá.”(Ivan Lins)

O tamanduá é um animal muito comum em terras brasileiras, sendo também conhecido pelo nome de tapi e jurumim. O bichinho tem verdadeira adoração por cupins e formigas. Talvez isso se deva ao fato de não possuir dentes para mastigar.

Por que esse nosso personagem foi entrar nesta história, sendo tão mal-afamado, a ponto de servir de exemplo para os humanos? É que esse falsinho, quando vê um inimigo, levanta-se nas patas traseiras e abre as dianteiras, como se fosse receber o crédulo indivíduo num caloroso abraço. Vendo tão efusiva demonstração de carinho, a vítima cai na esparrela, vindo a renegar a hora em que nasceu. O dissimulado abraça-a, é verdade, mas pressiona-a com seus braços e enfia-lhe nas costas suas enormes e afiadas unhas. Como é fingido e astucioso tal bichinho!

A maldade do falso amigo ainda é maior porque ele não degusta a sua presa, uma vez que lhe faltam dentes. O espertinho deixará que ela apodreça ali, passando a servir de isca para suas deliciosas formigas, as quais não tardará a papar. Portanto, meu caro leitor, fique com a orelha em pé com o exemplo que nos dá esse mamífero desdentado. Não confie em muitos abraços que anda recebendo por aí, achando-se o mais amado do pedaço. Olho vivo, camarada, pois há muita gente dando abraços de tamanduá.

Vixe! Olhem aí o tamanho do A!

 

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DE MÃO BEIJADA

Autoria de Lu Dias Carvalho

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É lamentável ver como as crianças e os jovens estão sendo criados nos dias de hoje, recebendo tudo de mão beijada. Os pais brasileiros já não põem, ou não conseguem colocar limites, tratando os filhos como se principezinhos e princesinhas fossem. Suas crianças não aceitam ouvir a palavra “não”, ou serem interrompidas no que fazem, numa inversão claríssima de valores, recebendo muito mais do que merecem, muitas vezes exigindo grandes sacrifícios de seus genitores que fazem da tripa coração, para atendê-las, esquecendo-se de que de pequenino que se torce o pepino. O que significa, segundo o historiador Luís da Câmara Cascudo, que “na infância é que se educa, eliminando os despropósitos juvenis, as exaltações temperamentais, as tendências bravias e dispensáveis”.

Tempos atrás, numa excursão a Foz do Iguaçu, tive o prazer de conhecer uma senhora alemã, morando no Brasil há oito anos que, ao ver uma criança de cinco anos dando birra de rolar no chão, falou-me como era a criação dos alemães. Disse-me, também, que muitos hotéis na Alemanha não gostam de receber casais brasileiros com filhos menores, porque a grande maioria deles é insuportável, não obedece aos pais e mexe em tudo, sem conhecer limites. Segundo ela, com sua permissividade, os pais brasileiros acabam não educando os filhos para o mundo, onde serão contrariados muito mais vezes do que atendidos.

A senhora alemã tem toda a razão, quando diz que nossas crianças são voluntariosas e querem tudo de mão beijada. Já se foi o tempo em que um presente era dado pelo merecimento. Grande parte de nossas crianças não mais se contenta ou se alegra com nada, pois tudo vem com extrema facilidade. Alheias à realidade dos pais, ou a condição de pobreza em que vivem milhares de crianças no país, elas têm se tornado egoístas e totalmente indiferentes a outrem. É fato que não são as culpadas, pois estão sob a tutela dos pais que deveriam prepará-las para a vida.

A expressão mão beijada nasceu das antigas cerimônias de beija-mão, quando os súditos reverenciavam os poderosos, beijando-lhes as mãos. Mas os súditos, ou fiéis mais ricos, iam bem mais além do beija-mão. Para caírem nas boas graças dos figurões, presenteavam-nos com terras e outras benesses. Tais presentes eram dados de mão beijada, ou seja, sem nenhum ônus para o agraciado. O beija-mão é uma tradição em que se reverencia personalidades importantes, sendo praticada em várias culturas, desde tempos remotos. E em nossas terras… “Cala-te boca!”.

Ilustração: Registro da cerimônia do beija-mão na corte carioca de Dom João, um costume típico da monarquia portuguesa.

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CHEGA DE NHENHENHÉM!

Autoria de Lu Dias Carvalho

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Dizem alguns que o Criador deu-nos dois ouvidos para que ouvíssemos mais e uma boca para que falássemos menos. Mas não parece ser esta a compreensão da maioria das pessoas neste mundo de meu Deus, pois tudo é feito ao contrário: fala-se muito e não se ouve quase nada. Parece que nos encontramos cada vez mais surdos.

 Quem não conhece alguém que fala pelos cotovelos? Certo apresentador  televisivo de uma poderosa emissora, por exemplo, é extremamente mal-educado, pois nunca deixa seus entrevistados falarem. Ele corta o raciocínio das pessoas ou responde por elas. É um chato de galochas. Parece vendedor ambulante em meio a uma feira.

 Outro nhenhenhém insuportável vem dos funcionários de telemarketing. Como é duro aturar essa gente, embora eu compreenda que esteja fazendo o seu trabalho e aquilo é o seu ganha-pão. Soube que tais operadores devem observar duas regras básicas: serem rápidos e não darem muito tempo para a vítima pensar. Mas já me ensinarem um jeito de me livrar deles:

– Nhenhenhém… diz o operador em sua cantilena.

– Um momento, por favor! – deve sempre responder a vítima.

 A seguir, o ser torturado deixa o fone fora do gancho ou o celular sobre a mesa e aguarda uns dois a três minutinhos. Observará depois com alívio  que o chato evaporou-se, partindo em busca de uma nova vítima.

Para quem não conhece índios de perto, digo-lhes que são falantes por natureza. Quando juntos, haja ouvidos para aguentar tanto falatório. Contam alguns, portanto, que os portugueses quando cá estiveram, no século XVI, ficavam enlouquecidos com o parlatório de nossos irmãozinhos, os donos legítimos destas terras. E, como “nheen” significa “falar” em tupi, eles triplicaram o verbo: nhenhenhém = falar, falar e falar.

Há também uma explicação contrária para a origem desta expressão. Alguns historiadores contam que foram os índios que, por não entenderem aquele blablablá danado de esquisito dos portugueses, criticavam-nos por ficarem naquele nhenhenhém sem fim.

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LEI DE TALIÃO: OLHO POR OLHO…

Autoria de Lu Dias Carvalho

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O provérbio “Olho por olho, dente por dente” tem a ver com a Lei de talião, também conhecida como Pena de talião (Aurélio: Pena de talião. 1. Pena antiga pela qual se vingava o delito, infligindo ao delinquente o mesmo dano ou mal que ele praticara. 2. Aplicação ou imposição dessa pena. Também se diz apenas talião; sin. ger.: lei de talião, retaliação, talionato. — Atenção: escreve-se “talião” com minúscula, pois não é nome próprio).

Segundo a Lei de talião, se um crime é cometido, ele deve ser pago do mesmo modo que foi perpetrado. Também pode ser explicado com o provérbio popular “Quem com ferro fere, com ferro será ferido”. Contudo, a verdade não era bem esta, pois os endinheirados e poderosos não eram sujeitos a tal rigor.

O Código de Hamurabi traz os primeiros sinais da Lei de talião, aplicada na sociedade babilônica. Mas, como vimos, as penas não funcionavam tal e qual apregoava o código. Antes de impô-la, olhava-se primeiro qual era a classe social do criminoso e da vítima. Ou seja, para alguns era apenas olho pelo perdão, ou um dente por uma pequena multa. Não era fácil pertencer às classes menos favorecidas naqueles tempos e também não é fácil ser “parte do povo” nos dias de hoje. Tudo continua como dantes no quartel de Abrantes, apenas com uma vírgula aqui e outra ali.

Segundo alguns, a Lei de talião tinha como objetivo evitar que punições desmedidas fossem aplicadas em razão de um crime, sem levar em conta a sua gravidade, ou seja, sem levar em conta o princípio da reciprocidade. Tudo estaria nos conformes, se não se olhasse a classe social da vítima e a do réu. Podemos ver tal discrepância da referida lei em alguns artigos contidos no Código de Hamurabi:

Art. 195. Se um filho bater num pai, terá a sua mão cortada.
Art. 196. Se um homem destruiu o olho de outro homem, também terá o seu olho destruído.
Art. 200. Se um homem livre arrancou um dente de outro homem livre, também terá o seu dente arrancado.
Art. 209. Se um médico causou a morte de um escravo, ele deverá restituir um escravo semelhante ao que morreu.
Art. 229. Se um pedreiro não edificou direito uma casa e ela caiu, matando seu dono, ele será morto.
Art. 230. Se o pedreiro causou a morte do filho do dono da casa, o seu filho também será morto.
Art. 231. Se o pedreiro causou a morte do escravo do dono da casa, ele terá que ofertar um escravo semelhante ao dono.
Art. 232. Se o pedreiro ocasionou a perda de bens móveis, ele deverá repor tudo, além de reconstruir a casa com seus próprios recursos.
Art. 245. Se um homem alugou um boi e causou a sua morte por negligência, o proprietário receberá um boi de igual valor.

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DO TEMPO DO ONÇA

Autoria de Lu Dias Carvalho

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Dias atrás, fui com uma amiga tomar um chá na casa de sua avó. Era aniversário da falante senhora, com seus olhinhos vivos e brilhantes. Aos 96 anos de idade, ela ainda é bastante lúcida e ativa. Contou-me casos de sua mocidade e da paixão que nutriu por Getúlio Vargas, seu ídolo, assim como Kirk Douglas e John Wayne. Depois, levou-me até o porão da casa, onde baús, malas e caixas jazem esquecidos pelo tempo. Começou a abrir os mais importantes para ela e a contar-me casos referentes aos objetos que neles se encontravam. Foi uma viagem fantástica ao tempo do onça, pois ali estavam objetos pertencentes a três gerações: da avó, da mãe e dela.

É bom conversar com pessoas que viveram numa época desconhecida da nossa e que, por sua vez, sabem de histórias anteriores ao tempo em que viveram a sua mocidade. Há momentos em que temos a impressão de que se trata de um outro planeta, tamanhas são as mudanças, se comparadas, principalmente, às invenções tecnológicas dos dias de hoje. Lembro-me de meu avô que sempre começava seus casos referindo-se ao tempo do onça. Ele morreu, quando eu ainda era criança, mas, mesmo assim, as lembranças são muito fortes. Naqueles tempos em minha cabecinha ingênua eu imaginava que ele falava de uma época em que havia muitas onças espalhadas pelas ruas, cidades e matas. Só não entendia o porquê de ele não dizer no tempo das onças.

A expressão “do tempo do onça”, segundo contam, tem suas raízes em Luís Vahia Monteiro — governador e capitão geral da Capitania do Rio de Janeiro, entre 1725 e 1732. O homem era um velho militar com pecha de honesto, mas muito autoritário e extremamente ranheta. Reclamava de tudo e de todos nas cartas que escrevia ao rei português. O fato é que seu temperamento indócil acabou lhe trazendo o apelido de “Onça”. Ao ser tirado de seu cargo, passou a ser usado como sinônimo de coisa antiga, ultrapassada, em desuso. E foi aí que nasceu a expressão  “do tempo do Onça”, ou seja, referente ao período em que o “Onça” estava no comando. Há também quem afirme que a expressão esteja ligada a um outro “Onça”, certo chefe de polícia de Pernambuco que também viveu no século XVIII e foi apelidado de “Onça” em razão de sua coragem e temperamento violento.

— Nesta terra todos roubam; só eu não roubo — declaração feita em carta ao rei de Portugal por Luís Vahia Monteiro.

Segundo um amigo, estudioso das expressões idiomáticas, a expressão “do tempo do onça” tem significado semelhante a duas outras conhecidas por ele: “do tempo do ronca” e “do tempo de vovó mocinha”.

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