Arquivo da categoria: Flagrantes da Vida Real

Casos do cotidiano

VOCÊ SE CONSIDERA UMA PESSOA HONESTA?

Autoria de Beto Pimentel

              capeta    anjo

Outro dia, acabara de fazer compra num dos estabelecimentos de um grande supermercado, instalado na minha cidade. Passei o carrinho pelo caixa, paguei a conta e dirigi-me à saída, quando um funcionário muito solícito conferiu as mercadorias com a nota fiscal e me liberou a saída.

Ao chegar ao carro, quando comecei a descarregar as mercadorias no porta-malas, percebi que dentro de uma das caixas estavam sete caixas de uma deliciosa água de coco, 330 ml, do  tipo longa vida.  Engraçado, pensei com os meus botões, só comprei seis unidades desse produto e não sete. Conferi a quantidade com a nota fiscal.  Realmente, só comprara seis. O caixa e o conferente não perceberam o erro. E agora? Foi quando, no meu ouvido, senti uma voz sussurrando:

– Não seja bobo! E só uma caixinha de valor irrisório (R$ 2,40). Imagina só! O dono do supermercado já incorporou essas e outras perdas no preço final do produto. Além disso, trata-se de uma multinacional riquíssima.

Mas de repente, outra voz também soprou no outro ouvido:

– Você é o cara! Sempre condena qualquer tipo de desonestidade, principalmente nos políticos, e agora precisa demonstrar que pratica o que defende. Não importa se for uma caixinha de água de copo ou algo de maior valor. Não tenha preguiça. Volte lá e devolva a caixa ou pague a diferença.

Embora muito atrasado para o trabalho, decidi voltar ao caixa e pagar a diferença.  Chegando ao balcão de atendimento, fui recebido por uma moça bastante atenciosa, acompanhada pela gerente.

– Bom dia.

– Bom dia, senhor. Posso ajudá-lo?

– Sim. Acontece que, ao descarregar as mercadorias, que comprei há poucos minutos, no carro percebi que em vez de seis, levei sete caixas de água de coco com 330 ml.

Imediatamente, a gerente, dirigindo-se à atendente pediu.

– Pode pegar a nota fiscal e devolver o dinheiro ao cliente.

Atônito, tentei explicar novamente o ocorrido.

– Não. Eu estou aqui para pagar uma caixa que levei a mais. Observe na nota fiscal que só paguei seis caixas.

Silêncio geral. É inexplicável a expressão delas me encarando. Será que elas pensaram estar à frente de um ET? Sem nada falar, tirei uma nota de um real e outra de dois da carteira e paguei a moça.

– O senhor não tem trocado? Uma moeda de dez centavos?  Estou sem troco no momento.

Nesse instante, a gerente que estava nos observando, interveio:

– Eu estou autorizando você cobrar só dois reais. Este cliente é honesto.

(1)   Clip Art do MS OFFICE – MS.

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RELÓGIO PARA QUÊ?

Autoria de Alfredo Domingos

relógio 1

 Diariamente, faço caminhada. É muito bom! Além do proveito para a saúde, vale como  terapia, longe dos consultórios apertados, refrigerados e repletos de assuntos delicados. Meu trajeto é feito pelas ruas da vizinhança. São arborizadas, agradáveis, propícias à atividade. Já conheço alguns vizinhos, caminhantes ou não, porteiros, ambulantes, jornaleiros, o resto mais. Carrego o celular, que me oferece música e a hora certa. O relógio de pulso também me acompanha. Fica mais fácil consultá-lo do que retirar o celular do bolso para saber da hora.

Outro dia, esqueci em casa tudo de que preciso. “Cabeça de vento”, como diria a minha mãe! Mas aceitei o desafio. Fui caminhando e curtindo.  Quando precisasse situar-me no tempo, perguntaria a alguém. Pois é, veio, então, o momento. Avistei um perfeito atleta aproximando-se. Passadas vigorosas, alto, fortão, boné vermelho da Ferrari, grandes óculos escuros espelhados, tênis turbinados e alaranjados, fones de ouvido e para completar um vistoso relógio dourado, daquele tipo usado pelo famoso apresentador das tardes de domingo. “Ô, loco, meu!”

Ao cruzarmos um pelo outro, perguntei sem querer atrapalhar o exercício:

 – Companheiro, diga as horas, por favor.

A resposta deixou-me boquiaberto. Foi deste jeito:

– Não posso. Este relógio não marca hora.

O quê?! Pensei, mas não falei que não acreditava.

Um relógio serve para muitas coisas, nós sabemos, porém, o mínimo que ele faz, o essencial mesmo, é indicar a hora presente. Registrar o tempo que nos envolve. Mostrar o momento de sair, chegar, correr, estudar, pedir “help”, comer, tomar remédio, etc., etc. O homem trazia tantos apetrechos engenhosos, que imaginei ser facílima a minha pergunta. Ou será que o amigo se ligava em várias coisas grandíssimas que o simples passar dos ponteiros não tinha a menor relevância? Será?

Em decorrência, só sei que até desisti de continuar na caminhada. “Enfiei a viola no saco” e voltei quietinho para casa, vexado! Assimilei que o problema havia sido meu – que abuso da minha parte interpelar altiva figura.

 Finalmente, perguntei-me querendo apoio:

– Relógio para quê?

(*) Imagem copiada de www.relogioserelogios.com.br

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SOU COCOOCA, VOVÔ!

Autoria de Ana Lúcia Timótheo

MANOS

 Ele podia ter seus 3 aninhos. Lindo, ruivo, mais parecia um querubim. Ficava com o avô paterno enquanto sua mãe ia trabalhar. Era uma festa. Muito espaço, quintal enorme, casinha de cachorro, galinheiro. Noooossa! Quanta coisa a descobrir…

 Numa de suas façanhas, subiu numa parte elevada do quintal, perto da casinha de cachorro e prendeu-se sozinho. Empacou.

 O avô, embaixo, vendo-o aflito, dizia:

 – Pula que vovô te pega!

 Pular? Quem disse? Cadê coragem?

 E o avô continuava a pedir para ele pular. E nada. Até que, já meio impaciente, gritou:

 – Você é homem ou é cocoroca, menino?!

 E a vozinha, pura, honesta e inocente respondeu:

 – Sou cocooca vovô!

 Fatos que a gente nunca mais esquece.

Nota: Imagem copiada de http://rosepetals.blogs.sapo.pt/arquivo/CARINHO.BMP

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UM PIRÃO DE GULA E TRAIÇÃO

Autoria de Lu Dias Carvalho

arrocfei

Meu amigo Samuel, nome fictício, pôs-se ontem a se lembrar de certas passagens de sua vida. E, como senti que ele estava tão para baixo quanto o céu plúmbeo daquela tarde, fiz-me toda ouvidos. Dentre as muitas histórias, uma me deixou em frangalhos.

Estava ele com sete anos de idade, quando o pai luxurioso caiu de amores por uma sirigaita, abandonando a esposa e uma penca de cinco filhos. Sua mãe, revoltada, ruminava vergonha e ódio por todos os poros. Já havia visitado pomba-gira, tranca-ruas e seu séqüito. E, nesse nefasto dia, estava recebendo a visita de uma cartomante de muita fama e valia nas redondezas, em coisas do coração.

A pitonisa chegara cedo à sua casa, pronta para filar a bóia da pobre mulher de coração esfacelado, mas ainda lutando para trazer o sujeito de seu sofrimento de volta. A egrégia visita foi a primeira a servir o prato no fogão à lenha. A mãe, vitimada pelo desamor, fez um prato para cada filho, recusando-se a comer.

Samuel, sempre bom de garfo, acabou de comer primeiro de que a insigne ledora de cartas. Como a comida, feita no capricho para agradar a dona do destino da mãe, estivesse uma gostosura, ele pediu humildemente:

– Mãe, eu quero mais!

Sua mãe fez ouvidos moucos, dando o pedido por não feito, preocupada em agradar aquela que pensava dona de seu destino. Bom seria para o coitadinho, se a história parasse por aqui. Mas não, o pior estaria por vir.

Assim que a sibila saiu, deixando grande desconsolo ao dizer, que o traidor não voltaria tão cedo, a menos que se fizesse tal e tal trabalho, a mãe do Samuel pegou uma enorme bacia de alumínio e despejou nela toda a comida que havia nas panelas. E gritou

– Samuel, moleque guloso, venha aqui! Vai comer tudo, para aprender a ter educação na frente de visita.

A mãe enlouquecida colocou a bacia, cheia de comida até às bordas, no seu colo, enquanto ele tinha os olhos esbugalhados de surpresa e medo. Foi comendo, comendo, comendo, até perder a noção do que fazia, com arroz e feijão espalhando-se por todo lado. Poucas horas depois, começou a vomitar e a ter diarreia. O pequeno banheiro tornou-se fétido e o ar se encarregou de levar o cheiro para a pequena casa e o quarto, onde a mãe dormia meio ébria.

Sua mãe acordou com o mau cheiro e seu choro, e ficou mais colérica ainda, ao ver a sujeira do banheiro. Pegou o cinto que o marido infiel havia deixado em casa e começou a bater nele, talvez pensando que estivesse subjugando o traiçoeiro marido. Chegou até mesmo a chamá-lo pelo nome do pai.

Foi impossível conter o choro de Carlos, apesar dos quarenta e dois anos que o separavam de tal acontecimento. Penso que trazia aquela cena vívida em sua memória. Espero que suas lágrimas tenham lhe lavado a alma para sempre.

Ele me confessou antes de ir embora:

– Minha mãe morreu louca. Louca de amor por meu pai.

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UM GAROTINHO MUITO ESPECIAL

Autoria de Lu Dias Carvalho

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Ian é um garotinho falante, de cabelos dourados, rostinho redondo e olhos claros que captam tudo em derredor. Extremamente gentil e carinhoso, ainda nos seus cinco aninhos, pôs-se a me ensinar muitas coisas sobre a natureza e a vida, num português impecável para a sua idade, enquanto os adultos presentes entranhavam numa animada conversa. Ian e eu éramos carta fora do baralho na conversa, por isso, resolvemos, como Alice no País das Maravilhas, buscar o nosso próprio cantinho. E foi assim que recebi as mais sábias lições de minha vida, que ora tenho o prazer de dividir com meus leitores.

  • Quem gosta dos animais não pode comer carne de nenhum deles, pois matar um animal é muita maldade, embora pernilongo a gente possa matar, porque ele pica as pessoas. O escorpião também pode matar, pois ele fica escondido em toda parte e é muito venenoso.
  • O piolho de cobra parece um ferrinho enferrujado, mas quando a gente mexe no ferrinho, fica parecendo uma lagarta, mas não é uma lagarta. O piolho de cobra não fica na cabeça da cobra, todo mundo precisa saber, para não fazer confusão. É preciso tomar muito cuidado, quando vir um bichinho desses, pois ele é muito mau.
  • A ararinha azul está acabando no nosso planeta. Quem tiver um animal em casa, tem que fechar todas as portas e janelas, para não pegarem o animalzinho e ele entrar em extinção. É preciso ter muito cuidado. Não adianta depois ficar chorando porque ele entrou em extinção.
  • Acreditem! Na Disney, onde foi quando era pequeno, eles vendem bichos em extinção: grilo, escorpião, mosca e abelha. Eles tinham um buraquinho na barriga. Deviam estar todos mortos, mas ele não tinha certeza.
  • Na sua casa, possui três cachorros: Filhinha, Neném e Elisinha. Seus cachorros adoram-no, menos a Neném que não gosta de carinho. Ela corre dele para não receber carinho. Mas a Filhinha adora cafuné. Ele não sabe se todas as pessoas tratam bem os animais, mas ele, Naldo (pai) e a Mamis (mãe) gostam muito: “A gente amamos os três cachorrinhos”. Um cãozinho seu foi atropelado. Ele não se lembra, se ele era menino ou menina. E outro morreu de doença que mata.
  • Os dinossauros estavam vivendo tanto que caiu uma pedra muito grande, alguns falam que era um meteoro que matou todos eles, mas ele não tem certeza disso. Nessa era, a gente… as pessoas moravam em cavernas. E, quando caiu a pedra, a Terra foi mudando, mudando e foi virando Terra de muitas e muitas pessoas. Mas os dinossauros nunca mais voltaram, porque eles ficaram em extinção, mas outros animais apareceram. É preciso protegê-los para que não aconteça o mesmo que aconteceu aos dinossauros. A Terra sem os animais seria muito feia e triste. Ninguém iria gostar.
  • Perto de sua escola ele viu homens cortando algumas árvores. Só sobraram uns círculos com umas bolinhas. É bem provável que eles estão cortando as árvores para fazer boliche, pois é com madeira que se faz boliche.
  • As pessoas que maltratam os animais e as plantas são pessoas más. Quando alguém arranca uma flor, a planta e a flor choram baixinho, mas ninguém escuta. Elas choram de verdade no coração. Quando a gente encontra um homem maltratando a natureza tem que falar assim: – Homem, vai embora daqui, senão a natureza vai acabar e a gente não vai ter árvores e bichos e tudo vai ficar muito triste.
  • A água é importante porque ela hidrata nosso corpo. A gente pode tomar pequena água, média água ou grande água, como quiser. Mas se ficar muito tempo sem tomar água, a gente morre e vai ficar num caixote. Ele descobriu isso num livro de múmia. E é tudo verdade!
  • Quando alguém joga lixo na rua ou na água, precisa chamar a polícia, pois o lixo causa muitas doenças. Tudo tem que ficar muito limpo.
  • Quem passa hidratante no corpo não fica velho, não deixa o sol queimar o corpo e não morre nunca. Por isso, ele tem um creme hidratante gigantesco, mas não pense que chega até o céu. Se você deixar de passar o creme um dia só não tem problema, mas não pode se esquecer de passar depois. Quando um creme acaba, já tem que ter outro para passar. Isso é muito importante, sabiam? O seu bisavô morreu, quando ele estava pequeno. Ele morreu porque não passou creme hidratante. Ele acha que agora ele mora no céu.

Depois de toda a explanação, Ian resolveu voltar às suas peripécias: correu pela grama, brincou com as duas cadelinhas, foi até o riacho e pôs seu igloo (feito de plástico) na cabeça, procurando um lugar propício. Mas nenhum lugar servia para ele se acomodar. Era na verdade um pequeno e sábio nômade, muito, mas muito fofo.

Nós, sempre que possível, devemos reservar um tempo para conversar com as crianças. Elas são capazes de nos revelar um mundo cheio de encantamento e sabedoria, na sua ingenuidade. Obrigada, pequeno Ian, por me ensinar coisas tão maravilhosas. Com certeza, não irei me esquecer do hidratante, pois não quero ficar velha nunca.

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PARÁGRAFOS DA VIDA

Autoria de Lu Dias Carvalho

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A mulher esquisita chegou com sua cara de cera e com seus olhos de jabuticabas grandes, como se carregasse na alma toda a candura do mundo. E, com jeito, nalgumas vezes, e, sem jeito em outras, foi fuçando a minha vida de cabo a rabo, sem que eu mesmo notasse o quanto me enredava com sua mascarada altivez. Entrou na minha casa, tomou do meu vinho e dormiu na minha cama. Até que um dia, ela sumiu, assim como chegou, graças a Deus.

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Eu sempre soube que ele era muito mais menina do que menino. E, não sei o porquê, sempre se esforçava para mostrar aquilo que não era. Eu ouvia suas histórias de conquistas amorosas em que João era Maria. Por dentro eu ria da sua tolice, pois tudo em derredor conspirava contra o forte masculino que ele pensava carregar. Certo dia, o seu feminino alcoolizou-se em demasia e botou o frágil masculino para correr. O mais interessante é que ele nunca soube disso e continua a brigar com as aparências, enquanto eu finjo que não sei o que sempre soube.

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O rapaz donairoso era extremamente seguro de si. Tinha certeza de sua beleza e da simpatia que despertava nas garotas. Mas sua segurança só durou até o dia em que a esposa escolhida plantou-lhe dois chifres nos cabelos de ébano. Feitos os arranjos do separa ou não separa, optou o casal por prosseguir a união amargamente golpeada, optando para o sobrenatural para explicar a continuidade da relação. A família do dito, que adorava comentar a vida dos outros, virou uma ostra. Enquanto isso, o segredo tão bem guardado, vai correndo de boca a boca.

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Ela nunca se deu conta de que o tempo passava para todos os seres viventes. Imaginava que seria jovem para todo o sempre. Seu sonho era se casar com um caminhoneiro e viajar pelo mundo, mesmo tendo que atravessar o Pacífico e o Atlântico. Desfez-se do marido, botou os filhos no mundo e se embelecou com um cowboy sem cavalo ou boi. Hoje, vive plantada onde nasceu, olhando a vida passar.

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Aquela carinha fina manchada de micose escondia muito mais do que humildade. Carregava um esforço danado para subir na vida. Lia e lia nas horas vagas e nas horas ocupadas também. Ele sempre contou com meu apoio e carinho. E assim foi o mocinho subindo degrau por degrau. E subiu tanto (muito mais em sua imaginação), que nem me conhece mais, tamanha ficou a distância entre os degraus de sua escada e os da minha.

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Ela queria um marido rico, bonito e doutor. Quando o candidato tinha uma das qualidades, faltava-lhe as outras duas. E se tinha as duas, faltava-lhe mais uma. Enquanto esperava, ela foi ficando sozinha e terrivelmente azeda. Mas continua esperando o milagre de encontrar seu três em um. Bom seria, se isso acontecesse, pelo menos, os que vivem em seu derredor estariam salvos de seu azedume.

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A falsa mulher nasceu híbrida de galega e ruiva, com seus cabelos da cor de coisa nenhuma, tamanha era a mistura de tintas que nele carregava. Abri-lhe a minha casa por quase dois anos, enquanto tratava o seu mais novo rebento. Mas ela, por fora era bela viola e por dentro pão bolorento. Matou-me as amizades mais queridas, enquanto seu filho curou-se por completo. Graças a Deus!

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Ele já nasceu ególatra. Sua palavra principal era “eu”. Sempre dominava a conversa, com um monólogo transvestido de diálogo. E, se lhe opunham ou falavam mais do que julgava necessário, logo soltava o comuníssimo “quer discutir comigo…?”. Ele sabia tudo de tudo, ou melhor, pensava que sabia. Nunca teve a família próxima em alta estima, mas tinha uma grande afeição pelos de fora. Ofertava-lhes as fibras do coração. Até que um dia, cansada de tanta verborragia, eu me emudeci para deixá-lo falando sozinho.

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Aquela mulher era uma doidivanas, percebi isso logo que nos conhecemos, pois no primeiro encontro eu já sabia tudo sobre sua vida. Mesmo assim, fomos tocando uma suposta amizade, onde eu estava sempre com um pé atrás. Os seus parafusos soltos faziam-na trocar alhos por bugalhos. Não sei como conseguiu aquela arte medonha de inverter a compreensão de tudo que via ou ouvia. Ela fazia parte de um mundo em que pessoas e coisas funcionavam ao contrário. Um dia, cansei-me dela e pus os dois pés atrás.

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Eu sempre o achei parecido com um pombo, com seu peito estufado e com o topete sempre emplumado. E, por bizarra coincidência, era exatamente o perfil de sua personalidade. Homem dito representante de Deus na Terra mais parecia o mensageiro da estupidez e da arrogância. E foi assim que matei a minha fé na Igreja, qualquer que seja ela, embora continue amando os pombos.

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A velha senhora continuava louca por cristais, gente rica e diplomada. Cansava os ouvidos falar com ela, pois era sempre a mesma ladainha. O seu pequeno porte escondia o tamanho de sua ambição. E bem maior do que tudo isso era o tamanho da língua, que sempre se esquecia de que era coberta por telhado de vidro. Certo dia, cansada de ouvir tanta asneira, chutei o pau da barraca. Hoje ela me conserva na sua peçonha, dentro de um dos seus apetrechos de cristal. Gracias!

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