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Assuntos diversos

A Rev. dos Bichos (10) – A BATALHA DO ESTÁBULO

Autoria de Lu Dias Carvalho

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Corria à boca pequena as notícias dos feitos ocorridos na Granja do Solar, que se passara a chamar Granja dos Bichos. Napoleão e Bola de Neve ordenaram aos pombos e demais pássaros, que propagassem as boas novas entre os animais, inclusive, ensinassem-lhes o hino da vitoriosa Revolução. O velho Jones já havia advertido os vizinhos para o que lhe acontecera, mas ninguém lhe dera o devido crédito. Achavam que os animais não dariam contar de gerir a granja, e logo estariam guerreando entre si. Porém, aos poucos, começaram a perceber que a água não estava para peixe. Seria melhor tomar algumas providências.

Os granjeiros Pilkington e Frederick, que antes viviam trocando farpas, resolveram se unir. Começaram com os boatos perversos, coisa comum aos homens. A Granja do Solar era um campo de tortura. Os animais eram torturados com ferraduras em brasas. As fêmeas prostituíam-se, pertencendo a uns e a outros. O canibalismo era uma prática recorrente e etc. Mas, para azar deles, bicho algum acreditou naquelas lorotas. Ao contrário, aquele lugar deveria ser um paraíso sem a presença do Homem.

Os animais ao derredor da Granja dos Bichos começaram a se revoltar contra seus donos: os bois rebelavam-se, as ovelhas botavam as cercas abaixo, as vacas derrubavam os baldes cheios de leite, os cavalos refugavam, e mais, o hino da Revolução era cantado por todos, mesmo tendo como castigo as chicotadas do dono. Mas quem poderia calar os melros, os pombos e, até mesmo os sinos? E foi por essa e outras que Jones comandou uma invasão à sua antiga granja. Haveria de botar os usurpadores para correrem. Eles só não esperavam que os animais estivessem preparados para o confronto.

E assim se deu a batalha sob a chefia de Bola de Neve:

Primeira linha de ataque – os pombos voaram sobre a cabeça dos homens, defecando sobre elas; os gansos, aproveitando a confusão, avançaram usando seus bicos.

Segunda linha de ataque – Maricota, Benjamim e as ovelhas, com Bola de Neve à frente, foram para cima dos agressores, usando todas as armas pessoais: mordidas, cabeçadas e coices. Os bichos recuaram como estratégia.

Terceira linha de ataque – ao entrarem no pátio da granja, os agressores foram surpreendidos. Os cavalos, as vacas e parte dos porcos surgiram de trás do estábulo, impedindo que eles saíssem, desfechando a parte mais violenta da batalha.

Totalmente em pânico, os homens só queriam deixar a granja. Não mais aguentavam tantas chifradas, mordidas, bicadas, cabeçadas e arranhaduras. E assim, bateram vergonhosamente em retirada, deixando morta apenas uma ovelha.

A batalha recebeu o nome de “Batalha do Estábulo”. Bola de Neve e Sansão foram condecorados com a medalha “Herói Animal, Primeira Classe”. A ovelha que caiu em combate recebeu a medalha “Herói Animal, Segunda Classe”.

Mas a história ainda não acaba por aqui.

(*) Imagem copiada de blogs.estadao.com.br

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A Rev. dos Bichos (9) – INTIMIDAÇÃO X PRIVILÉGIO

Autoria de Lu Dias Carvalho

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Não sei se o leitor ainda se lembra, mas ao se apossarem da granja do senhor Jones, os bichos tiveram que ordenhar as vacas, cujos úberes estavam prestes a explodir. Cinco baldes de leite fresquinho e espumante passaram por suas tetas. Os porcos foram os responsáveis por guardar o produto. Mas nenhum dos bichos ficara sabendo que fim levara aquele leite e tampouco os demais baldes de leite retirados das vacas diariamente. Assim como não sabiam o porquê de os porcos guardarem as maçãs maduras, jogadas na grama pelo vento.

Mas neste mundo de meu Deus não há nada, feito por bichos ou por homens, que fique oculto por muito tempo. Mais cedo ou mais tarde, as coisas acabam sendo reveladas de uma forma ou de outra. Como se desse um caráter de integridade aos fatos, os porcos acharam por bem enviar Garganta, o porco trombeta, para explicar a que fim destinavam-se o leite e as maçãs, antes que os outros bichos pudessem se rebelar. Nada como uma boa explicação para acalmar os ânimos, ainda que ela esteja abarrotada de injustiças. E, se vem acompanhada de amedrontamento e recheada de uma boa dose de terrorismo, o tiro torna-se certeiro. Assim começou Garganta:

– Camaradas, nós somos os usuários do leite e das maçãs. É sabido que muitos de nós, os porcos, nem ao menos somos chegados a tais alimentos, mas temos um dever para com a nossa gente: protegê-la, fazendo prosperar nossa granja e nos armando contra as ameaças externas. Como é de conhecimento de todos, nós somos trabalhadores intelectuais, portanto, responsáveis pela vitória de nossa organização. Estamos sempre a gastar energia mental, pensando dia e noite no que é melhor para todos. Pesquisas mostram que leite e maçãs são de suma importância para a mente e para a saúde dos porcos. Portanto, nós precisamos de tais produtos, não por sentimento de egoísmo ou privilégio, mas, para termos força e sabedoria para proteger todos vocês, dando-lhes a vida digna e honrada que merecem. Se não estivermos preparados, o senhor Jones voltará com seus peões. E tenho a certeza de que nenhum de vocês gostaria de passar por aquela vida de novo.

Era fato que nenhum dos animais gostaria de rever o opressor, que por anos e anos fizera deles escravos. E, se isso era um perigo possível de acontecer, que os porcos, seus defensores, comessem todas as maças produzidas na granja e todo o leite retirado das vacas.

Confesso que, ao ouvir essa parte da história, fiquei pensando nos governantes humanos de meus país, que justificam seus altíssimos salários e gastos pessoais, dos mais variados tipos, com a desculpa de que precisam disso e daquilo, para governarem com honestidade. E se apossam das riquezas do povo de nosso país com a verborragia de que está a proteger sua gente, enquanto, na verdade, os reais trabalhadores vivem com salários minguados. Tais homens e mulheres especulam com o dinheiro público, dizendo que estão trabalhando em prol do Estado ou da Nação. Será que os porcos estavam caminhando para se tornarem humanos? Que péssimo destino!

Fonte de pesquisa:
A Revolução dos Bichos/ George Orwell

Nota: Imagem copiada de lagcast.com.br 

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A Rev. dos Bichos (8) – A EDUCAÇÃO E O PODER

Autoria de Lu Dias Carvalho

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Dentre os comitês criados na Granja dos Animais estava o que se encarregava de ensinar os bichos a ler e a escrever que, por sinal, seguia com muito sucesso para alguns. Podemos assim definir o sucesso ou o fracasso dos mesmos:

Os porcos, que já liam e escreviam muito bem, ocupavam o topo da pirâmide do saber. E, quanto mais dominavam a leitura, mais conhecimentos e mais poder agregavam a si. Eram olhados pelos outros animais com muita admiração e com visível respeito, de modo que tudo que faziam jamais era questionado, ao contrário, eram prontamente obedecidos.

Os cachorros, por sua vez, após aprenderem a ler modicamente, não mais se interessaram pelo aprendizado, bastando-lhes apenas dominar a leitura dos Sete Mandamentos. Para que ficar quebrando a cabeça com coisas desnecessárias – inquiriam eles – se já existiam os porcos que sabiam de tudo? Bastava-lhes apenas ler os mandamentos dos bichos para repassá-los a outros. O resto ficava por conta dos inteligentes suínos, seus camaradas intelectuais, que somente trabalhavam para o bem de todos, sem pensar em si.

Bejamim, embora soubesse ler tão bem quanto os porcos, não se importava com isso e, portanto, não exercitava a sua faculdade. Talvez isso se devesse à idade, uma vez que era o animal mais velho da granja. Todos sabem que a idade traz para alguns certo desencanto com a vida, um não saber o porquê de se fazer isso ou aquilo, enquanto outros tornam-se ainda mais ávidos pelo poder, como se fosse uma forma de se apegar à existência que escapa-lhes pelos dedos. O mesmo paradoxo humano também se encontrava em meio aos bichos da granja.

Quitéria, embora tivesse aprendido todo o alfabeto, sentia dificuldade em unir as letras na formação de palavras. A coitadinha passava as horas de repouso matutando, mas não lograva êxito na empreitada. Parecia ter um parafuso a menos na cachola. Teria sido o excesso de trabalho e a má alimentação de quando o senhor Jones era seu amo responsáveis por tal dificuldade? Ninguém mais do que ela e Sansão trabalhara naquela granja, sem falar nos muitos potrinhos que botara no mundo.

Sansão, mesmo muito esforçado, tinha sérias limitações em relação ao aprendizado intelectual, como se tivesse nascido para o trabalho pesado. Quando aprendia umas letras, esquecia-se das outras. Nunca fora capaz de memorizar o alfabeto todo. Mesmo assim, nos dias de lazer, passava horas a fio desenhando na areia, com a pata direita, as letras, apagando-as e recomeçando…

Maricota era capaz de ler melhor do que os cachorros. Lia, inclusive, à noite, pedaços de jornal encontrados no lixo, para os animais.

Mimosa era um caso à parte no seu desinteresse pelo saber. Após aprender as seis letras que compunham seu nome, deu por encerrada a sua aprendizagem. Ela o escrevia e o enfeitava com pedrinhas, flores e galhos, e ficava andando à volta, admirando-o. Mas o que esperar dos seres fúteis que só pensam em si como se fosse o centro do universo? Neste caso, não se trata de jogar pérolas aos porcos, porque esses eram os mais letrados da granja, mas de jogar pérolas à futilidade e à ignorância.

Alguns dos animais da granja não conseguiram aprender a ler, tais como galinhas, patos, ovelhas, entre outros. E pior, nem mesmo eram capazes de decorar os Sete Mandamentos que resumiam a filosofia da Animalismo. Problema de suma gravidade. Alguma coisa teria que ser feita.

Bola de Neve, preocupado com o fato de que alguns bichos não tivessem memorizado os Sete Mandamentos, achou por bem condensá-los em apenas um: “Quatro pernas bom, duas pernas ruim.”. Ele só não contava com a contestação das aves, pois sentiam que se encaixavam nas “duas pernas”.

A capacidade de dar o dito por não dito, ou de iludir os mais ingênuos, é um dos predicados de certos intelectuais. A capacidade de aceitação dos ingênuos e ignorantes possui a mesma dimensão dos primeiros. Assim, o não dito passa a ser o dito e tudo fica como Dantes no quartel de Abrantes. Dessa forma, Bola de Neve bolou uma explicação para acalmar o ânimo das aves:

– A asa de uma ave, camaradas, é um órgão de propulsão e não de manipulação. Deveria ser olhada mais como uma perna. O que distingue o Homem é a mão, o instrumento que perpetra toda a maldade.

Como não compreendessem muito bom a explanação do letrado Bola de Neve, e nem tivessem argumentos para se contraporem, as aves e os animais mais humildes e desprovidos de saber, tomaram como verdade absoluta as palavras do nobre colega.

Bola de Neve e Napoleão continuaram trocando farpas em relação à educação dos bichos. Enquanto o primeiro achava que adultos e jovens tinham direito ao saber, o segundo alegava que somente os jovens careciam de ser educados, pois papagaio velho não aprende a falar.

Nesse ínterim, Lulu e Ferrabrás pariram nove robustos cachorrinhos que foram imediatamente para as mãos de Napoleão, sob o argumento de que receberiam uma educação especial. Foram confinados num sótão, sendo esquecidos pelos demais bichos. O que viria a acontecer com eles ainda é uma incógnita.

 Fonte de pesquisa:
A Revolução dos Bichos/ George Orwell

(*) Imagem copiada de cinefilosconvergentes.blogspot.com

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A Rev. dos Bichos (7) – CONHECIMENTO É PODER

Autoria de Lu Dias Carvalho

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Ao expulsarem o senhor Jones e família da Granja do Solar, agora denominada Granja dos Animais, os bichos tiveram que tomar para si todo o trabalho.  O recolhimento do feno foi o primeiro da lista, contando eles com muitas dificuldades, pois, as ferramentas não se adequavam à estrutura corporal da bicharada.

Todas as dificuldades inerentes aos trabalhos na Granja dos Animais foram resolvidas com a engenhosidade dos porcos, tidos como os animais mais inteligentes. E, como os mais preparados intelectualmente precisam estar à frente de tudo, em tese, os porcos não podiam botar mãos à obra, digo, pés, uma vez que tinham que dirigir e supervisionar o trabalho feito por todos os outros. Que tarefa cansativa é mandar e mandar! Aposto que eles desejavam estar lá, com a mão na massa, digo, no feno. Será?

Nenhum animal escapulia do trabalho na granja. Os cavalos, como conheciam cada cantinho do lugar, tomaram para si a tarefa mais pesada. Patos e galinhas iam e viam com pequeninos feixes de feno presos no bico, sem desperdiçar um só talinho. Nenhum dos animais abocanhou aquilo que não lhe era devido, de modo que foi a maior safra de feno que a granja já tivera, deixando os bichos alegres com tanta fartura. Tudo agora era produzido por eles e para eles, sem intermediários ou sonegadores. E ainda tinham tempo para o divertimento.

Sansão, o cavalo, era um exemplo para todos. Com seus músculos rijos, ele sempre fora muito trabalhador, mas agora fazia o serviço de três, tão entusiasmado que estava com a nova situação. Nem percebia que o trabalho mais pesado ficava sempre para ele. Chegou a pedir aos galos que o acordassem meia hora mais cedo para, nesse tempo, fazer trabalho voluntário. Mesmo quando estava caindo de cansaço, murmurava seu lema: “Trabalharei mais ainda!”. Nunca vivera uma situação de tanta paz junto aos companheiros. Não mais havia mordidas, ciúmes, discórdias e outras coisas tão desagradáveis, mas corriqueiras nos tempos do senhor Jones. Agora, era preciso manter o progresso e a paz.

A vida dos bichos é bem parecida com a dos homens. Tanto lá como cá, existem sempre os omissos e os espertalhões que querem sempre encarapitar-se no ombro dos ingênuos. Minha mãe já dizia que “Cacunda de bobo é poleiro de esperto”. De modo que Mimosa, a égua, estava sempre arranjando desculpas para não trabalhar, assim como o gato que dava uma de perdido, só aparecendo na hora das refeições ou ao final do trabalho. Enquanto Bejamim, o burro, continuava o mesmo de antes, fazia sempre a sua parte, mas sem se interessar pelos trabalhos extras. Parecia não carregar muito contentamento com a vida.

Na Granja dos Animais não se trabalhava durante os domingos, dia dedicado ao hasteamento da bandeira: uma toalha verde de mesa, pintada com um chifre e uma ferradura no centro. A seguir vinha a Reunião, sempre dirigida pelos porcos, onde eram planejadas as ações da semana seguinte. Bola de Neve e Napoleão eram sempre os mais aguerridos e combativos, embora um estivesse sempre se contrapondo ao outro.

Os porcos, como os mais inteligentes, é bom que se diga, definiram que o depósito de ferramentas passaria a ser a sede da direção, composta por eles mesmos, onde os animais aprenderiam a ler e escrever mecânica, carpintaria e outras artes necessárias, através dos livros retirados da casa-grande. E assim, foram formados os mais diversos comitês, sendo que um deles tinha por finalidade domesticar as criaturas selvagens, que acabou não logrando êxito, pois, apesar do palavrório, pardal algum tinha coragem de se assentar perto de um gato.

Será que a inteligência dos porcos seria o único referencial para levar avante A Revolução dos Bichos?

 Fonte de pesquisa:
A Revolução dos Bichos/ George Orwell

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A Rev. dos Bichos (6) – OS 7 MANDAMENTOS DO ANIMALISMO

Autoria de Lu Dias Carvalho

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As revoluções costumam acontecer quando menos se espera. É certo que muitos sinais são vistos aqui e acolá, mas quem escraviza, inebriado pelo poder e sustentado pelas forças das armas, jamais imagina que algo lhe possa acontecer. Mas, como diz um velho ditado popular “Quem bate esquece, mas quem apanha, jamais.”. E é assim que os grandes ditadores são enxotados do cargo que ocupam, ainda que dure mais tempo do que os oprimidos esperam. Levando em conta que ver os opressores caídos é o que esperam os opressos, nada como a impermanência de nosso existir. E foi assim que se iniciou A Revolução dos Bichos da Granja do Solar.

Jones, embora fosse um patrão cruel, era hábil naquilo que fazia. Mas, em razão dos problemas inerentes à vida humana, aos quais todos estamos sujeitos, acabara perdendo muito dinheiro, motivo que o levou a se descambar para a bebida, pois não é qualquer indivíduo que tem força moral para não sucumbir à perda do vil metal que hipnotiza a maioria dos seres humanos. Assim, o granjeiro assava dias e dias bebendo, acompanhado por Moisés, o corvo de estimação, que ia comendo as cascas de pão molhadas na cerveja. Os peões, vendo o mau exemplo do patrão, pouco ou nada se importavam com a granja. Os animais estavam a passar fome, em consequência do acabrunhamento moral e bebedeira do dono. Como sempre acontece, os inocentes acabam pagando o pato.

Certo dia, Jones voltou mais bêbado da cidade do que de costume, trocando as pernas num cai aqui ou cai acolá, com o corpo e o espírito ávidos por uma cama. Os ajudantes, por sua vez, estavam a caçar lebres, sem ao menos terem alimentado os animais. E foi aí que a vaca foi para o brejo, ou seja, que o patrão levou a pior. Revoltada, uma das vacas, cujo nome não me foi dado a conhecer, arrebentou a porta de onde ficavam os alimentos e pôs-se a comer com os outros animais. Jones, que conseguiu se levantar a duras penas, e seus peões que tinham acabado de chegar, como castigo, começaram a chicotear os bichos, sem dó ou piedade, sem compreenderem que a fome pode transformar os conceitos morais e éticos de um homem ou de um bicho. Revoltados, os animais pressentiram que era preciso tomar uma decisão naquele instante, antes que fossem comida de chicote, embora continuassem famintos. Assim, puseram-se a revidar os maus-tratos de todas as formas que podiam: coices, chifradas, dentadas, unhadas, bicadas e coisa e tal. Surpresos, desorientados e machucados, os agressores saíram correndo, tendo a bicharada atrás. Os últimos a desertarem foram a mulher de Jones e o corvo Moisés, que sempre se julgou membro da família.

A Granja do Solar passou a pertencer somente aos animais, ora livres do jugo humano. Era preciso, portanto, eliminar os apetrechos malditos da servidão. Aproveitaram então para jogar freios, argolas de nariz, correntes de cachorro, facas de castrar porcos e cordeiros, tudo no fundo do poço, enquanto rédeas, cabrestos,  antolhos,  relhos,  bornais e até mesmo as fitas de Mimosa eram queimados na fogueira feita no pátio, pois, todos os animais deveriam andar nus e livres como nasceram, sem temer sol ou chuva, frio ou calor.

Napoleão e Bola de Neve, os dois porcos que assumiram o comando após a morte do Major, chamaram os camaradas para um novo encontro. Contaram-lhes que tinham aprendido a ler e escrever, depois de encontrarem no lixo uma cartilha dos filhos de Jones. E que, portanto, iriam escrever em uma das paredes da granja, agora Granja dos Animais, os sete mandamentos do Animalismo, que em hipótese alguma poderiam ser desobedecidos, para o bem de todos os bichos:

  1. Qualquer coisa que ande sobre duas pernas é inimigo.
  2. Qualquer coisa que ande sobre quatro pernas, ou tenha asas, é amigo.
  3. Nenhum animal usará roupas.
  4. Nenhum animal dormirá em cama.
  5. Nenhum animal beberá álcool.
  6. Nenhum animal matará outro animal.
  7. Todos os animais são iguais.

Após escreverem na parede os princípios da doutrina, os porcos foram ordenhar as vacas que já se encontravam incomodadas com seus úberes cheios. Cinco baldes de leite foram tirados, mas não foi explicado o que seria feito com eles. Enquanto Napoleão resolvia o que fazer com o leite, os demais animais rumaram para o campo para a colheita do feno. Agora seriam senhores de si, donos de suas próprias ações, trabalhando em conjunto para fazerem a granja prosperar. Mas seriam os bichos capazes de levar a revolução adiante? Isso é o que veremos nos próximos capítulos da história.

Fonte de pesquisa:
A Revolução dos Bichos/ George Orwell

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A Rev. dos Bichos (5) – A MONTANHA DE AÇÚCAR

Autoria de Lu Dias Carvalho

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No texto passado, eu lhes contei que dentre os animais da Granja do Solar encontrava-se Moisés, o corvo de estimação da família do senhor Jones que sequer teve interesse em comparecer à reunião convocada pelo Major. Mas ele tinha motivos para isso: não queria que o seu “status quo” mudasse. Mas a vida é assim mesmo, pois, sempre existirão aqueles que lutam de unhas e dentes para que as coisas não mudem para todos, com medo de que possam perder o lugar privilegiado que ocupam e se tornem um igual. Tais indivíduos habitam, sobretudo, no mundo da política, onde deitam e rolam. Moisés era, portanto, alguém que vestia a camisa do patrão, ainda que visse o quanto seus companheiros de granja eram escravizados. Mas aquilo não lhe doía a consciência, embaçada que estava pela posição ocupada junto ao dono, não deixando de receber, de certa forma, os respingos do poder. E tais migalhas já lhe inflavam o ego que aguardava por mais, muito mais. O que lhe importava os outros bichos? Afinal, para ele, cada um consegue o que merece. Velha cantilena dos que estão por cima.

Embora não fosse político, Moisés sabia que se a revolução proposta pelo Major a seus companheiros desse certo, ele passaria a ser apenas um deles, sem as deferências que lhe eram dadas até então. E como é difícil abrir mão dessa atenção que traz o poder! O único meio para lutar contra algo que poderia mudar drasticamente sua vida, embora fosse melhorar a de todos, seria espalhar uma mentira. Era certo que alguns bichos não acreditariam, mas existem sempre aqueles que não se informam sobre a veracidade dos fatos, e não apenas abraçam a mentira, mas a repassam como se verdade fosse. Portanto, iria remexer nas ideias e de lá tirar algo que pudesse mudar o rumo dos acontecimentos. Não poderia ficar de asas cruzadas, esperando as coisas acontecerem. E há muito ouvira falar que o mundo era dos espertos. E, até provar em contrário, ele era um deles.

Moisés, o espião mexeriqueiro e ladino, que só ficava contando potocas, sem jamais fazer coisa alguma, teve um plano, ainda que estrambótico: começou a espalhar que após a morte, os bichos iam para um lugar fantástico, onde se encontrava uma Montanha de Açúcar. Tal lugar situava-se num certo canto do céu, logo depois das nuvens. Ali não havia os dias da semana, mas somente o domingo. Tudo era permanente: campos floridos, bolos de linhaça, torrões de açúcar e coisa e tal. E, como pensara, alguns ingênuos caíram na sua parolagem, tendo os porcos que suar o focinho para convencê-los de que aquilo era mentira. Trocando em miúdos, ele queria dizer que não importava o sofrimento terreno, pois o céu maravilhoso compensaria os animais por tudo. Que lutar aqui na Terra seria perda de tempo. O melhor seria deixar as coisas como estavam, aguardando apenas o prêmio eterno.

Moisés, se nos dias de hoje vivesse, estaria habilitado a dirigir muitas seitas religiosas, cujos mandachuvas vivem no bem bom, enquanto aconselham seus fiéis a aceitarem a miserabilidade e todas as injustiças do mundo, isso quando não lhes tiram tudo, enquanto aguardam os louros da eternidade. Por que não viver bem aqui e lá?

Façamos uma reflexão sobre os tais “especiais”, que pululam em todos os terreiros, enquanto aguardamos um novo capítulo.

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