Autoria do Prof. Rodolpho Caniato
É com grande satisfação que faço a abertura do livro Historiando Fábulas da escritora Lu Dias Carvalho, grande militante das letras e das artes. É notável a sensibilidade da autora para “sintonizar” as diversas “frequências” em que as palavras “guardam” suas “mensagens”. Em seu livro “Historiando Fábulas”, o leitor irá encontrar significados nunca dantes “navegados” nas fábulas dos grandes mestres do gênero, recontadas por ela numa linguagem transposta para o nosso tempo — sempre acrescentando algo de novo.
É curioso como através de tantos séculos chegaram até nós e continuam vivas aquelas “clássicas” fábulas, como as atribuídas a Esopo — o grego do Séc. VI a.C. — ou as de Fedro — o romano contemporâneo de Tibério e de Nero — e até mesmo as “novas” de La Fontaine — o francês contemporâneo de Isaac Newton (Séc. X VII) e protegido do “delfim” de França —, mesmo essas clássicas aqui ganham um gosto novo e diferente. Há nestas um ingrediente de “causo”, uma mineirice que as torna mais gostosas; mais adequadas para serem desfrutadas ao pé do nosso fogão a lenha e do café com bolo de milho ou pão de queijo.
A fábula está entre as mais ancestrais das artes humanas. Talvez tão velha quanto os primeiros mitos de origem de nossa própria espécie. É certamente a mais velha das formas de literatura. Contar histórias deve ter precedido a mais remota literatura escrita. A fábula poderia ser tomada como uma das manifestações que distinguem a espécie humana das demais que habitam o nosso planetinha Terra. É uma atividade autenti- camente “humana”, manifestação dos “valores” que o homem descobriu ou criou. Antes da fábula, só o episó- dio do “espelho”, ou melhor, do reflexo na água, pode ter sido mais ancestral e significativo.
Durante milênios o homem pode ter visto sua imagem refletida na água sem se dar conta de que “aquele sou eu”. Esse “momento” do reconhecimento de si próprio deve ter sido a grande “virada” da espécie: o início, o “pecado original”. O “esse sou eu” visto de “fora”, deve ter mudado os indivíduos em sua visão de si mesmos e a dos “outros”. Talvez tenha a ver com isso a ideia de “pecado original”, a capacidade de olhar para si próprio, visto de “fora”: o refletir sobre si mesmo — afinal essa é uma das pretensões e objetivo da fábula na sua moral.
Outro aspecto curioso relacionado às fabulas é que, tanto quanto sabemos em nossa cultura ocidental, elas fazem sua aparição formal com Esopo — no Séc. V a.C. —, embora sua origem mais remota seja — já naqueles dias — atribuída a assírios e babilônios. É desse mesmo cenário e nesse mesmo tempo que a civilização grega parece herdar e começar a organizar e incrementar a herança de assírios e babilônios nos conhecimentos de astronomia. Esopo, Pitágoras e Anaxágoras estão muito próximos nesse cenário e no tempo, além de viverem logo depois de Anaximandro — o explicador dos eclipses. O que fica evidente é que tanto na fábula, Esopo, quanto na astronomia, Anaximandro, são e se dizem herdeiros da cultura mesopotâmica de assírios e babilônios.
Uma das heranças babilônicas mais importantes e mais remotas para a astronomia é a descoberta do “caminho” aparente do Sol e dos planetas por uma estreita faixa do céu a que se chamou de eclíptica. Essa faixa foi dividida — ainda pelos babilônios — em doze partes iguais e a cada uma delas foi dado o nome de uma figura mítica, sugerida pela configuração das estrelas naquele lugar. Essa figura mítica é quase sempre a de algum animal. É quase inevitável, portanto, a associação de uma remota origem comum entre a fábula e a astronomia. Com La Fontaine — companheiro de Racine e de Rabelais — “FABLES”, na forma de poesia, atinge o mais alto grau de prestígio na literatura. Ainda contribuiu para o grande prestígio da fábula o fato de aquela grande edição — dedicada ao jovem Delphim Luis X IV — ter sido decorada com as belas gravuras de Oudry, o pintor da corte da França.
Enfim, desde origens tão remotas as fábulas representam importante forma de expressão, de sabedoria e de preceitos de moral que se materializaram em episódios de fácil entendimento, envolvendo animais para que os homens sintam-se “a salvo”. Essas assumem cores, valores e sabores peculiares nos diferentes meios e culturas. Neste caso — o de nossa mineiríssima autora Lu Dias Carvalho —, elas representam contribuição para uma gostosa leitura, juntando aos preceitos de moral vários sabores novos e bem brasileiros, além de tornar ainda mais popular este gênero fantástico da literatura.
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