Arquivo da categoria: Mitos e Lendas

O mito é uma narrativa na qual aparecem seres e acontecimentos imaginários, que simbolizam forças da natureza, aspectos da vida humana, etc. A lenda é uma narração escrita ou oral, de caráter maravilhoso, na qual os fatos históricos são deformados pela imaginação popular ou pela imaginação poética.

Mit. – A PAIXÃO DE CUPIDO POR PSIQUE

Recontado por Lu Dias Carvalho

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Psique era tão bela que se tornou conhecida não apenas no reino de seu pai, mas em muitos outros. Nem Vênus, a deusa da beleza, era capaz de suplantá-la em formosura, o que lhe trouxe muitos dissabores. Ao ver seus altares abandonados, pois todos os homens só tinham olhos e voz para a formosa virgem mortal, a deusa, na sua vaidade, pensou logo em punir a moça, que não tinha nenhuma culpa pela beleza que lhe fora dada, nem de os mortais terem-na menosprezado. Mas nem por isso ficou impune.

Vênus pediu a seu filho Cupido para vingá-la, fazendo com que Psique ficasse apaixonada por um indigno ser mortal. O deus do amor entrou no quarto da jovem, enquanto ela dormia, e derramou em seus lábios algumas gotas de água amarga, roçando-a com a ponta de sua seta. A moça acordou, mas não viu o deus, pois esse se encontrava invisível. Ele, contudo, viu-a e sentiu-se tão embriagado com sua beleza, que terminou se ferindo com a própria seta. Imediatamente, ele derramou sobre seus cabelos as gotas de água da alegria, para consertar o mal que lhe fizera, sem se dar conta de seu ferimento.

Embora continuasse linda como sempre, e admirada por todos os homens, nenhum deles pedia a mão de Psique em casamento, deixando-a cada vez mais triste e solitária. Seus pais, por essa razão, consultaram o oráculo de Apolo, que lhes disse que ela seria desposada por um ser imortal, um monstro que morava no alto da montanha. E assim foi a donzela levada para o local, ao encontro do esposo. Ali havia um palácio majestoso, sua futura morada. Foi informada pelos servos invisíveis de que seu marido chegaria durante a noite escura e partiria antes do amanhecer, de modo que ela nunca poderia vê-lo. E assim aconteceu.

Embora tivesse vontade de ver seu esposo, Psique continha sua curiosidade. Solitária, pediu-lhe consentimento para receber a visita de suas duas irmãs. Essas, ao ali chegarem, aguçaram ainda mais a sua curiosidade, dizendo-lhe que seu marido era uma terrível serpente, que iria devorá-la depois. Ela deveria, portanto, esconder uma lâmpada e uma faca afiada, a fim de decepar sua cabeça, enquanto dormisse. E assim agiu a ingênua esposa. Mas o que viu foi o mais encantador dos deuses alados. Para sua infelicidade, uma gota de óleo da lâmpada caiu sobre ele, acordando-o. Sem dizer nada, o belo deus saiu voando. Ao tentar segui-lo, Psique caiu da janela. Ele voltou apenas para lhe dizer que seu castigo seria o de abandoná-la para sempre, pois o amor e a desconfiança não sobreviveriam juntos. A seguir, o castelo e tudo o mais desapareceu, e a mulher viu-se sozinha no meio de um campo.

Psique entrou em profunda comoção, andando noite e dia à procura do esposo amado. E foi assim que chegou a um templo, onde o milho em espigas e grãos, assim como os instrumentos da ceifa, encontrava-se em grande desordem. Arrumou tudo direitinho. A dona do templo era a deusa Ceres, que se compadeceu do sofrimento da jovem mulher. Aconselhou Psique para que fosse até Vênus, pedir-lhe perdão, pois, ao vê-la tão humilde, a deusa poderia devolver seu marido. Assim fez a mortal, mas Vênus, para testá-la impôs-lhe algumas terríveis tarefas.

O primeiro encargo seria o de separar toneladas de grãos de diferentes cereais, numa noite. Cupido, consternado, pediu às formiguinhas para fazerem tal serviço. Mas Vênus viu ali uma obra do filho, ficando ainda mais aborrecida. Exigiu que Psique fosse ao bosque buscar um pouco de lã brilhante dos carneiros. O rio-deus, através dos juncos, alertou-a para só apanhar a lã de ouro, quando o sol do meio-dia levasse os animais para a sombra, horário em que estariam calmos. Mais uma tarefa vencida. Vênus também não acreditou que fosse obra de Psique. Pôs-lhe nas mãos uma caixa, que deveria ser entregue a Prosérpina, nas sombras dos infernos, para que ali botasse um pouco de sua beleza,  sob a alegação de que a dela havia esmaecido um pouco, com a doença do filho.

Vendo-se totalmente perdida, Psique resolveu dar  fim à própria vida, pulando do alto de uma torre. Mas uma voz convenceu-a a prosseguir até o reino de Plutão, dando-lhe todas as dicas de como passar por Cérbero, o cão de três cabeças, e a persuadir Ceronte, o barqueiro, a atravessá-la no rio negro. Mas uma coisa jamais deveria fazer: abrir a caixa. E assim tudo aconteceu, exceto no que se refere à caixa. A jovem ainda não havia aprendido a lição sobre o excesso de curiosidade, pois queria tirar dali um pouco da beleza divina, para botar em suas faces, e agradar o marido que a abandonara.

Ao abrir a caixa, Psique deparou-se apenas com o terrível sono estígio, que a envolveu, jogando-a no caminho, como um zumbi, que não sabia para onde se dirigir. Nesse ínterim, Cupido, já restabelecido do ferimento, conseguiu sair da prisão em que se encontrava, e foi atrás de Psique. Retirou o sono de seu corpo, prendeu-o de novo na caixa, e partiu para o palácio de Júpiter, pedindo-lhe que se empenhasse em favor dele e de sua amada. O deus dos deuses convenceu Vênus a aceitar a nora e pediu ao deus Mercúrio para levar Psique à assembleia dos deuses, onde ela tomaria uma taça de ambrosia, tornando-se imortal. E assim aconteceu. Cupido e Psique estavam finalmente unidos. Dessa união nasceu a filhinha Prazer.

Nota: Cupido e Psique, obra de François Gerard

Fontes de Pesquisa
Mitologia/ Thomas Bulfinch
Mitologia/ LM

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Mit. – PIGMALEÃO E SUA PAIXÃO POR GALATEIA

Recontado por Lu Dias Carvalho

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Igual a certos homens que só vivem à cata de mulheres fisicamente esmeradas, ainda que modeladas pelo silicone, Pigmaleão só achava imperfeições nas fêmeas humanas que encontrava pela vida. Nenhuma delas era do seu gosto ou servia a seu contentamento. Nelas encontrava os mais diferentes vícios e defeitos. Seu senso de perfeccionismo era tal, que o moçoilo acabou abraçando a vida de solteirão. Se o mundo não o presenteava com a mulher de seus sonhos, preferia a solidão da solteirice e ponto final. Era também um homem muito temente aos deuses, nutrindo um grande encantamento por Vênus, a deusa da beleza. E era no feitio dela o seu sonho de ter uma mulher. Mas entre deuses e humanos havia uma grande distância. Com ele não tinha essa de que “quando não tem o que se quer, ama o que se tem.”.

E assim viveu o exímio escultor por muito tempo, até que a vontade de ter uma companheira bateu forte no seu coração desiludido. Se não tinha a que buscava, executá-la-ia com as suas próprias mãos, ainda que não pudesse transmitir-lhe o sopro da vida. E assim passou o dito, dias e dias a fio, sozinho na sua oficina, trabalhando numa magnífica peça de marfim. E dali ia brotando uma estátua estonteante, à qual nenhuma mulher igualaria em sua lindeza. Antes mesmo de dar o polimento final, Pigmaleão já se encontrava perdido de amores por sua obra. Acordava no meio da noite para vislumbrar aquela belezura. Quanto mais a olhava, mais cria que fosse uma jovem em carne e osso. Chegava até a acariciá-la para ter certeza de que não era humana. Mas, com o tempo, sua cachola foi perdendo a lucidez, talvez pela falta disso e daquilo, a ponto de presenteá-la com pedras, aves, flores, contas de âmbar e coisa e tal. Já num estágio mais agudo de debilidade mental, ou de falta mesmo, vestiu sua estátua com uma bela túnica e cobriu-a de reluzentes joias e chamou-a de Galateia. E mais, levou-a para seu leito e tratou-a como esposa, embora seu corpo continuasse duro como sempre. Coitado!

De uma feita, numa festa dedicada à deusa Vênus,  da qual era devoto, ante o altar dos deuses Pigmaleão fez o seu ardente pedido:

– Deuses poderosos, que governais a vida dos pobres humanos, vede o sofrimento em que me encontro, e dai-me como esposa uma mulher semelhante à minha virgem de marfim.

Vênus, que ali se encontrava, sabia, contudo, que ele queria como esposa a sua própria obra, mas que tivera vergonha de fazer tal pedido. E se aquele era seu dia festivo, já tendo inclusive recebido vários sacrifícios humanos, flores e incensos, achou por bem fazer a vontade do artista, seu fiel seguidor, sem que ele de nada desconfiasse.

Mal terminaram os rituais festivos, Pigmaleão voltou apressado para casa, louco para tomar nos braços sua deusa de marfim. E lá se encontrava ela quietinha no leito do casal. Deitou-se a seu lado e começou a beijar-lhe os lábios ardorosamente. Sentiu o calor desses, mas imaginou que sua paixão estava esvaindo para a loucura. Quanto mais a beijava, mais quentes os lábios e o corpo ficavam. Estava pirado totalmente – pensava ele. E ainda assim continuava a acariciá-la nos lugares mais recônditos, que se mostravam mais macios ainda. Seu corpo parecia responder às suas carícias, exalando o néctar dos apaixonados. Somente após a junção do fálus ereto com a taça molhada pelo desejo, Pigmaleão tomou consciência de que sua criação, com o poder de sua amada Vênus, havia transformado-se em mulher. E que mulher! Da união entre Galateia e Pigmaleão nasceu Pafos, que deu nome à cidade consagrada à deusa Vênus.

Nota: Pigmalião e Galatéia (1886), obra de Ernest Normand

Fontes de Pesquisa
Mitologia/ Thomas Bulfinch
Mitologia/ LM

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Mit. – GLAUCO, SILA E A FEITICEIRA DIRCE

Recontado por Lu Dias Carvalho

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O jovem Glauco pescava todos os dias. Normalmente voltava para casa com pesadas fieiras de peixe. Certa vez, depois de ter apanhado a cota de peixes do dia, notou que esses, até então jogados na relva, começaram a voltar à vida e, subitamente, todos pularam na água ao mesmo tempo. Perplexo com a situação, chegou a imaginar que fosse a erva usada para apanhá-los ou a ação de algum deus.

Para tirar suas dúvidas, Glauco colocou algumas folhas da erva usada na própria boca. Imediatamente sentiu-se excitado por uma vontade incontida de cair na água. Não mais aguentando refrear seu desejo, pulou nas águas, mergulhando profundamente. Bem no fundo, moravam os deuses da água (Oceano e Tétis), que o receberam carinhosamente, sendo, inclusive, retirado de si qualquer vestígio de humanidade, transformando-o num ser imortal. Agora, não seria mais necessário dedicar-se à pesca.

O imortal Glauco, em um de seus constantes passeios pelas águas, observou na praia uma linda jovem de nome Sila, protegida das ninfas da água. Ela procurava um local menos íngreme, onde pudesse entrar no rio. Mas ao notar a presença de Glauco, voltou, repentinamente, à procura de um local seguro, a fim de avaliar se era ele um deus ou um animal marinho. Quando esse lhe disse que era um deus, acima de Tritão e Proteu, ela se acalmou. A seguir, contou-lhe sua história de humano até transformar-se em deus. Porém, reclamou por não possuir o coração de Sila, por quem havia se apaixonado assim que a vira. Ela fugiu amedrontada diante de tais palavras.

Glauco, apaixonado, resolveu pedir ajuda à feiticeira Circe, que morava numa ilha, a mesma em que Ulisses havia desembarcado. E falou-lhe de seu grande amor por Sila, pedindo-lhe que usasse suas ervas para fazer com que a jovem retribuísse sua paixão. Mas o fato é que a feiticeira também se sentiu atraída pelo deus, e, portanto, aconselhou-o a gostar de quem dele gostasse, assim como ela. Deveria retribuir o desprezo de Sila com o mesmo desprezo recebido, devendo procurar alguém que também dele gostasse, pois não valia a pena sofrer por quem nos desmerecia.

Diante dos conselhos de Circe, Glauco reafirmou-lhe que jamais poderia deixar de amar Sila, deixando a deusa feiticeira indignada. Como não podia castigá-lo por ser ele um deus, e também por amá-lo, resolveu supliciar Sila. Mesmo os deuses, tomam sempre os pobres como vítimas e neles descontam suas decepções. Portanto, às plantas de poderoso veneno, Circe acrescentou feitiçarias e encantações, e partiu para a Sicília, em busca de Sila. E na baía, onde a jovem banhava-se, jogou a mistura venenosa, acompanhada de palavras mágicas.

Ao chegar ao lugar costumeiro, Silas enfiou-se na água, cobrindo-se até a cintura. Mas para seu horror, notou que havia uma ninhada de serpentes e monstros à sua volta. Ao tentar fugir deles, notava que continuavam perto dela. Por fim, observou que eram parte de si. E ali teve que permanecer, para sempre, como castigo. Revoltada, e com toda a razão, passou a devorar os marinheiros que dela se aproximavam, dentre eles seis companheiros de Ulisses. Os deuses transformaram-na em rochedo, tentando minimizar seu ódio. E ainda assim, o rochedo a que deu forma, continua a amedrontar os marinheiros que passam perto dele.

Nota: Glauco e Sila, pintura de Bartholomäus Spranger

Fontes de Pesquisa
Mitologia/ Thomas Bulfinch
Mitologia/ LM

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Mit. – PÃ, SIRINX E A FLAUTA

Recontado por Lu Dias Carvalho

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A ninfa Sirinx era muito amada pelos sátiros e espíritos que povoavam os bosques e florestas. Apesar do amor que lhe dedicavam muitos seres divinais, ela jamais havia se deixado seduzir por eles. Era fiel à Diana, deusa da caça, e sua seguidora. Estavam sempre juntas, e, quando vestidas com roupas de caçar, tornavam-se bastante semelhantes. Mas, enquanto Diana usava um arco de prata, Sirinx portava um de chifre, diferenciando o poder de cada uma.

Pã (Fauno ou Silvano), o deus dos bosques, dos campos, rebanhos e pastores, tinha por morada as grutas. Sua função era vagar pelos bosques, vales e montanhas, caçando ou dançando com as ninfas. Certo dia, ao encontrar Sirinx sozinha, passou a dirigir-lhe adulações, com um objetivo nada confessável. Quanto mais a ninfa corria, mais ele se sentia atraído por ela. Nas margens de determinado rio, ele a agarrou, enquanto a frágil criatura pedia socorro às ninfas do rio, que vieram prontamente ajudá-la. Pã abraçava-a ardorosamente, sem perceber que em seus braços estava um feixe de juncos.

Ao descobrir seu engano, o deus dos bosques deu um suspiro tão forte, que o ar entrou pela abertura dos juncos, produzindo uma sonoridade melodiosa, que muito o encantou. Ele então escolheu alguns juncos de tamanhos diversos, e com eles deu vida a um instrumento, ao qual deu o nome de Sirinx, em homenagem à ninfa que perseguira.

Pã, conhecido pelos romanos por Lupércio ou Lupercus, cujo corpo era composto por orelhas, chifres e pernas de bode, tinha grande paixão pela música, nunca se separando de sua flauta. Também era temido por aqueles que precisavam atravessar as florestas ou bosques no escuro da noite, sempre movidos pela fertilidade da imaginação, que os ensejava a pavores súbitos, sem nenhum motivo claro. E foi desse medo infundado que nasceu a palavra “pânico”.

Nota:  Pã e Sirinx, obra de Nicolas Poussin

Fontes de Pesquisa
Mitologia/ Thomas Bulfinch
Mitologia/ LM

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Mit. – FAETONTE, O FILHO DO SOL

Recontado por Lu Dias Carvalho

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O deus da luz, Apolo (Febo), divindade solar, e a ninfa Climene eram os pais de Faetonte, que se sentiu chateado ao saber que era filho de um deus, mas que vivia como um mortal comum. Exigiu que a mãe desse-lhe prova da divindade que carregava. Ela lhe jurou, dizendo que ele era realmente filho do Sol. E foi assim que o rapazinho partiu para a Índia, onde seu pai dava início a seu trajeto. Queria também ouvir a palavra dele sobre sua origem.

Ao encontrar o palácio do pai, situado numa alta montanha, cujas portas eram ornadas com os signos do zodíaco, Faetonte entrou e foi em direção ao genitor, que se encontrava num trono resplandecente de luz, rodeado por seus ajudantes: o Dia, o Mês, o Ano, as Horas, a Primavera, o Verão, o Outono e o Inverno. Meio cego, o rapazola pediu ao Sol que provasse que era mesmo seu pai. E esse, desconhecendo o ímpeto aventureiro do filho, ordenou-lhe que pedisse o que quisesse, como prova. A escolha do moleque recaiu sobre o carro de Apolo. Queria dirigi-lo por um dia. Mas esse era o único pedido que jamais deveria ter feito ao pai.

O Sol argumentou com o filho que dirigir seu carro flamejante era muito perigoso, pois demandava muita força e sabedoria, e que nenhum deus jamais ousara fazer aquilo. Além do mais, ele era mortal, podendo morrer nessa façanha. Queria que mudasse o pedido, uma vez que fora inconsequente na sua promessa. Mesmo depois de ouvir todas as explicações detalhadamente, o garoto encasquetou, não arredando pé. Nada restava a Febo, senão cumprir sua promessa, ainda que totalmente a contragosto.

Dentre os muitos conselhos, Faetonte foi avisado de que não deveria usar o chicote nos corcéis, pois eles sabiam o caminho a fazer. Deveria apenas contê-los, vez ou outra. Tudo lhe foi explicado com paciência, embora o garoto mostrasse-se cada vez mais apressado para dirigir o “brinquedo” e menos atencioso em ouvir as explicações. Ao subir no carro, não se lembrava da metade do que lhe dissera o Sol. Portanto, esse passeio pressagiava maus acontecimentos.

Os corcéis logo deram conta de que o condutor era outro, bem mais leve e sem comando. O carro era jogado de um lado para outro na imensidão do céu. O moleque começou a tremer de medo, sem saber onde se encontrava. Não se lembrava dos conselhos recebidos e tampouco do nome dos cavalos. Não mais aguentava segurar as rédeas. Houve momentos em que o carro do Sol ficou tão próximo à Terra, que seu calor pôs fogo nas plantações e florestas, ressecando os mares e rios, matando animais e gentes. Em suma, tudo embaixo do céu era um caos, tudo sofria profundas e dolorosas transformações.

A Terra, horrorizada com tanta aniquilação, pediu ajuda ao grande deus Júpiter. Lembrou-lhe que Atlas não mais estava aguentando segurá-la no espaço. E se o mar, o céu e a terra fossem dizimados, tudo voltaria ao Caos de antes. Não era justo que não fosse ele a acabar com tudo, mas um moleque mortal. Se ainda tencionava salvá-la que fosse breve, pois a catástrofe total estava a caminho.

Júpiter conclamou todos os deuses para salvarem o que ainda restava da Terra. Ele trovejou e arremessou um raio contra o rapazola imprudente. Ao acertá-lo, tirou-o de dentro do carro, e ele caiu com os cabelos pegando fogo, como se fosse uma estrela cadente. O rio Eridano abriu os braços para receber seu corpo sem vida, refrescando-o. E as Helíadas, suas irmãs, enquanto choravam, foram transformadas em choupos, à beira dos rios. E suas lágrimas, ao tocarem a água, viraram âmbar.

Nota: ilustra o texto a pintura Apolo em seu Carro, de Luca Giordano

Fontes de Pesquisa
Mitologia/ Thomas Bulfinch
Mitologia/ LM

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Mit. – A VINGANÇA DA DEUSA DIANA

Recontado por Lu Dias Carvalho

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Andava Actéon, filho do rei Cadmo, a caçar com um grupo de amigos, como se nada mais tivesse a fazer. Já haviam feito uma cruel matança de animais, por mero divertimento. O sangue escorria das redes e das setas, fazendo poças no chão da floresta. A agonia dos animais não tocava o coração daqueles homens insaciáveis. Cansado, o príncipe convocou seus amigos para descansarem. Voltariam no dia seguinte para dar continuidade à matança.

Diana, a deusa virgem da lua e da caça, encontrava-se em seus domínios com suas ninfas, onde havia uma bela gruta, próxima a um riacho de águas límpidas. A deusa cuidava de seu asseio corporal, ajudada pelas companheiras. A uma das ninfas entregou o dardo e a aljava, enquanto outras cuidavam de despojá-la de suas vestes, de levar-lhe água para o banho e pentear-lhe os cabelos. Tudo transcorria na mais perfeita harmonia, quando Actéon, desgarrado dos companheiros, foi parar exatamente ali, à entrada da gruta. As ninfas, surpresas e amedrontadas, correram em alvoroço, tentando cobrir o corpo nu de Diana, com os próprios corpos. Sem as setas à mão, visivelmente indignada, a deusa perpetrou sua vingança, transformando o atrevido num cervo, para que não contasse a ninguém o que vira.

O bonachão filho do rei Cadmo, embora transformado em bicho, carregava a consciência de sua transformação. Não sabia que medidas tomar. Amedrontava-o a ideia de voltar para o palácio e também a de ficar escondido no bosque. Enquanto estava ali a cismar-se, voltou à realidade com o latido da matilha a seu encalço. Desesperado, subia e descia desfiladeiros, cortando-se nos rochedos, com sangue a escorrer-lhe pelo corpo. Sentia na pele exatamente aquilo que viviam os animais caçados por ele e seus amigos, companheiros de farra. E pior, os cães eram açodados por eles. Dando-se por vencido, caiu por terra, com a matilha sobre ele, despedaçando-o, enquanto seus companheiros festejavam. Alguns deles gritavam por seu nome, para que viesse fazer parte da festa. E ali mesmo, Actéon expeliu seu último alento de vida. Diana sentiu-se vingada.

Nota: Diana e Actéon, obra de Ticiano

Fontes de Pesquisa
Mitologia/ Thomas Bulfinch
Mitologia/ LM

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