FELICIDADE X INFELICIDADE

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 Autoria de Lu Dias Carvalho

A felicidade e a infelicidade são mestras que a natureza usa para nos educar. (Stefan Klein)

Ao analisarmos a afirmação acima do filósofo e biofísico Stefan Klein, concluímos que se trata de uma grande verdade. Apesar de ser uma mestra indesejável, a infelicidade é sem dúvida a mais contundente, pois mexe com as entranhas de nosso ser. Ainda que seja pensamento comum o fato de que só se aprende com a dor, a felicidade é também uma mestra, uma vez que age como um incentivo ao predispor-nos a escolher aquilo que faz bem ao nosso corpo, direcionando o nosso comportamento. Contudo, enquanto a infelicidade chega sem ser convidada, a felicidade precisa ser conquistada dia a dia, incessantemente.

Essas duas incansáveis conselheiras fazem-se presentes por vias diferentes. A infelicidade exprime-se através do medo, da raiva, da tristeza, do arrependimento e de outros sentimentos que não nos são aprazíveis. Contudo, tem por objetivo proteger-nos dos perigos do mundo exterior e também de nossos próprios impulsos. A felicidade, por sua vez, manifesta-se através de sentimentos agradáveis e tem como meta condicionar-nos a buscar aquilo que sadiamente nos faz bem. O mais interessante é que até mesmo os animais estão programados – assim como os seres humanos – a agir da mesma forma. Observe como seu animalzinho doméstico aproxima-se de quem o acaricia e foge daquele que o aborrece ou maltrata. Contudo, a capacidade de prever situações é o diferencial entre humanos e bichos. Enquanto os segundos só aprendem através da experimentação, os primeiros não precisam vivenciar situações para obterem conclusões, podendo buscá-las em diferentes fontes.

O capitalismo selvagem – fruto de nosso tempo – repassa-nos a ilusão de que a felicidade é produto das circunstâncias, algo fortuito, impossível de ser conquistado. Noutras vezes tenta induzir-nos a pensar que quanto mais coisas e poder tivermos, mais felizes seremos. A verdade é bem outra e disso os gregos da Grécia antiga já tinham conhecimento. Eles relacionavam a felicidade a atitudes corretas. Aristóteles – filósofo grego que viveu antes de Cristo – já dizia: “A felicidade é consequência de uma atitude”, ou seja, de acordo com as possibilidades e oportunidades que nos são oferecidas, devemos buscar fazer sempre o melhor, pois é aí que se encontra o segredo do êxito e da ventura. Tampouco devemos colocar o nosso bem-estar nas mãos de quem quer que seja, uma vez que ninguém é responsável pela nossa infelicidade, senão nós mesmos. O controle de nossa vida está na mão de cada um de nós.

Voltando aos filósofos antigos, eles partiram da premissa de que “a felicidade é consequência de uma atitude” e chegaram a duas premissas:

  1. Se a felicidade é resultante da plena realização das possibilidades humanas, logo existirão regras de aplicação geral que podem ser usadas com o objetivo de obtê-la, uma vez que os seres humanos são semelhantes.
  2. Se levarmos tais regras em consideração, seremos capazes de aprender a ser felizes.

Assim, uma vez que o ser humano possui vontade própria, poderá trabalhar suas atitudes, a fim de escapulir da servidão de seus humores azedos e do ambiente – muitas vezes hostil – em que se encontra inserido. A felicidade não está atrelada à acumulação de bens, à posição social ou ao  poder, como alguns imaginam. Ela tampouco se resume a um mero prazer. A felicidade é um processo contínuo e permanente de realização de nossas possibilidades na busca, sobretudo, pelo nosso crescimento interior. É um estado de espírito que pode e deve ser trabalhado permanentemente. Poderemos começar freando os impulsos – esses senhores mandões tão presentes em nossa vida.

Ainda que a Ciência dê-nos a conhecer – cada vez mais – como funciona a nossa mente, a essência do pensamento da antiga filosofia no que tange à felicidade continua correta, embora alguns termos possam ter sido mudados, como por exemplo: aquilo que os antigos pensadores chamavam de “virtude” e de “realização plena do organismo” é conhecido hoje como “estado ideal do organismo” a ser conseguido. A neurobiologia (campo da biologia que trata do sistema nervoso nos seus aspectos morfológicos, funcionais e patológicos) deixa claro que os sentimentos positivos não são produtos do acaso ou frutos do destino, mas da maneira como encaramos o dia a dia, ou seja, do modo como vemos e vivemos a vida. Portanto, devemos persegui-los a fim de conquistar a felicidade plena.

Vejamos mais alguns pensamentos de Aristóteles sobre o assunto:

  • Cada um é feliz na medida em que faz e cumpre a sua missão. A felicidade só resulta do cultivo da virtude. A felicidade é para quem se basta a si próprio.
  • A felicidade não se encontra nos bens exteriores. Felicidade é ter algo o que fazer, ter algo a que amar e algo a que esperar…
  • Ninguém é dono da sua felicidade senão você mesmo, por isso, não entregue a sua alegria, a sua paz, a sua vida nas mãos de ninguém, absolutamente ninguém.
  • A felicidade é o sentido e o propósito da vida, o único objetivo e a finalidade da existência humana. A felicidade consiste em fazer o bem.

Fonte de pesquisa
A Fórmula da Felicidade/ Stefan Klein/ Editora Sextante

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8 comentaram em “FELICIDADE X INFELICIDADE

  1. Edward Chaddad

    Lu

    Este artigo é maravilhoso. Gostei muito. Agora, nas minhas reflexões sobre este texto, lembrei que já escrevi, aqui, em comentário, que:

    Deus concedeu ao ser humano a incrível capacidade dos sentidos. Podemos ver em colorido, o que é privilégio humano, a maravilha da natureza, florestas, lagos, mares, os animais, o pôr do sol, as estrelas, a lua. Podemos correr, respirar, sentir o odor das flores, ouvir músicas maravilhosos, mesmo o cantar dos pássaros, admirar pinturas, ler livros magníficos, saborear os alimentos. E o melhor de tudo: podemos pensar, aprender, raciocinar, criar, inovar, ter sentimentos. E o mais importante: podemos amar.”

    A vida nos dá coisas lindas e não podemos desperdiçar. Perceber isto, certamente, lega-nos a felicidade. Ser feliz é um estado de ânimo. É ver o mundo com sabedoria, aprendendo todo o dia, é claro. Assim, iremos perceber que nem todos contam com potencial completo, que, normalmente, todo ser humano possui. E, mesmo aquele que nasceu num berço de ouro, torna-se muito difícil enfrentar as tempestades da vida, períodos de sofrimento, mesmo a escassez dos sentidos, principalmente a exclusão física dos atributos do ser humano.

    Renito: ser feliz é um estado de ânimo. Temos que, em cada momento da vida, perceber que fazemos parte da humanidade, em que há alegria e tristezas, triunfos e insucessos, amor e ódio, mentira e verdade, vida e morte – uma série de antíteses inesgotáveis. Além disto tudo, há paradoxos que são mais profundos, para imaginar o que iremos enfrentar, como: a mão que nos afaga, hoje, é a que nos agride amanhã.

    Como reagir a tudo isto, para podermos ser felizes? O fato é que na vida, temos momentos de felicidade e de infelicidade. O importante para sermos felizes é enfrentar tudo com equilíbrio emocional e inteligência, compreendendo que a vida é feita de contrastes que atingem a todos. E por que não a nós também?

    Lembro-me de um texto feito pelo meu saudoso avô, João Baptista Pimentel, que, na sua mocidade, infelizmente, sofreu com um câncer na garganta e teve que extrair as cordas vocais. A sua expressão verbal era a sua alma. E, de repente, não podia mais falar. Só escrever. Aí foi o momento em que ele, com sua sabedoria, venceu, nascendo J.Triste, cognome do meu avô poeta. Ele escreveu centenas e centenas de poesias e textos, publicando-os no jornal semanário de Rio Claro/SP. Foi reconhecido naquela cidade que passou a chamá-lo de “Poeta de Rio Claro”. Ele continuou a ser feliz, com a família reunida ao seu entorno com muito carinho e amor. Um de seus textos, transcrevo aqui, para que perceba quanto difícil é alguém perder a capacidade de falar. Porém, ele venceu a deficiência, com muita força e galhardia, e continuou a ser feliz.

    “É DA VIDA

    Meu amigo, não desanime. Só aquele que tem sofrido mal físico e que já se acostumou com o sofrimento é que está habilitado a animar, dar conselhos e consolar a outrem, que também, fisicamente, começa a entrar para o rol dos sofredores neste mundo, nesta obra monumental e perfeita de Deus que, infelizmente, dá abrigo a uma humanidade imperfeita.

    O mal não é do mundo, mas sim dos homens que fingem, descaradamente, crer no poder do Criador Eterno, julgando ludibriá-lo.

    Mas você, meu amigo, é compreensivo, desprendido das coisas terrenas e crê em Deus e, por isso, encontra, facilmente, força moral suficiente para rebater o seu grande mal físico, resignando-se com a vontade divina, tendo a fé como esperança e esta como bálsamo mitigador.

    E o mal físico, por maior que seja, é sempre menor do que o moral. Dói-nos mais este, que é incurável, do que aquele que, conforme a sua natureza, quase sempre tem cura.

    E, por isso, meu amigo, você não deve se afligir, confiando sempre no poder de Deus, que é infinito e que lhe dará forças precisas para que possa resignar, aconteça o que acontecer.

    Mire-se neste espelho que sou eu…e então…

    Para alguns, a estadia na terra é curta e sem males, enquanto que para outros é longa e sofredora!

    Entretanto, quem não sofre…não vive. Por isso que o sofrimento, seja ele qual for – seja qual for a sua extensão – faz parte integrante da vida.”

    Autor – J.Triste ( João Baptista Pimentel )
    Publicado no livro Simplicidade ( 1957)”

    Responder
    1. LuDiasBH Autor do post

      Edward

      Seus comentários são sempre inestimáveis, pois trazem muita vivência e sabedoria. São muitos os leitores que os apreciam. Eu, como sabe, sou sua fã de carteirinha.

      O J. Triste era um homem de grande sabedoria, como deixa bem claro a sua obra. Gostaria de citar suas palavras:

      “O mal não é do mundo, mas sim dos homens que fingem, descaradamente, crer no poder do Criador Eterno, julgando ludibriá-lo.”

      Tolos que somos, costumamos dizer que o mundo é mau. Julgamos as consequências sem olhar as causas (causadores). Os homens são os senhores das ações e somente a eles pode ser direcionado todo e qualquer julgamento. Fome, seca, desmatamento, violência, injustiças… Tudo é fruto das ações humanas. Usam até o nome de Deus para justificar tanta maldade, como se Esse fosse o fiador, “querendo ludibriá-lo”, como pensava muito bem nosso poeta J. Triste. E não são poucos os ditos “religiosos” a darem vida ao mal que violenta o joga no caos o planeta Terra.

      Abraços,

      Lu

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  2. Rosa

    Lu

    Adorei o texto e os comentários. Todavia entendo que a grande dificuldade para a maioria das pessoas é encontrar ou descobrir o seu “propósito” de vida, como dizem os budistas e os espiritualistas. Como descobrir nossa missão na vida, qual o nosso papel. Já passei dos 50 anos e ainda me pergunto qual o meu real papel nesta existência. Não me considero uma pessoa infeliz, sou feliz do meu jeito, dentro das minhas condições, porém, já tive uma fase bastante infeliz na minha vida. Graças a muita terapia, a Deus e a mim mesmo, posso dizer que tenho momentos de contentamento. Não acredito que se possa ser feliz sempre, mas acredito que um estado de paz interior já é um caminho para se ser mais feliz.

    Obrigada pelo espaço; vamos todos continuar na luta para descobrir o nosso propósito de vida.

    Abraços

    Responder
    1. LuDiasBH Autor do post

      Rosa

      Quando nos encontramos no Ensino Médio é que as indagações sobre o nosso futuro são aflitivas, pois nossa vida descortina-se à frente com quase todas as suas páginas em branco. Se fazemos uma faculdade ou ingressamos diretamente no trabalho, essas preocupações são ainda consistentes. Mesmo nessa fase, precisamos aprender a viver um dia de cada vez, da melhor forma possível, pois o que acontece no futuro nada mais é do que uma projeção do “hoje”. Para mim, o “agora” é o meu propósito de vida. É no presente que me encontro, que trabalho minha maneira de ser, de lidar com as pessoas e de enxergar o mundo como um todo. O meu “amanhã” nada mais será do que o reflexo do que sou hoje, ainda que outras variáveis possam coexistir, mas, se me preparar bem hoje, saberei lidar com elas. Todos podem ter, sim, um propósito de vida, mas devem começar inserindo-o no seu dia a dia. Fora disso não passará de um “ideal”.

      Rosa, penso que nossa missão é viver cada dia o melhor possível, buscando crescer mental e espiritualmente. Os budistas trabalham muito com o “agora”. Sou uma fã fervorosa desta religião que vejo como “filosofia de vida”. Nunca carreguei “missão” no meu fardo. Ser bom, generoso, pacífico, ecológico, atuante junto às causas sociais… já é uma grande “missão” num país tão desumano quanto o nosso. A felicidade nada mais do que um estado de espírito e, para encontrá-lo, precisamos trabalhar a maneira de ser e lidar com o mundo. Fora disso não há felicidade que se sustente, ainda que você seja a pessoa mais poderosa e rica do mundo.

      É assim que tento viver cada dia, ainda que tropece aqui e acolá.

      Um grande beijo,

      Lu

      Responder
    1. LuDiasBH Autor do post

      Cristiane

      Foi muito bom receber notícias suas, pois estava preocupada com o seu sumiço. Saber que se encontra bem traz-me muita alegria.

      Beijos,

      Lu

      Responder
  3. Hernando Martins

    Querida Lu,

    A felicidade x infelicidade e um tema bastante discutido desde os primórdios na Grécia antiga e muito mais ainda nos tempos atuais. Acredito que felicidade é o estado de satisfação em que vivemos, por isso, é crucial que tenhamos muita certeza nos nossos objetivos e metas verificando sempre se são realmente verdadeiros e justos.

    É muito importante estarmos atentos às propagandas fantasiosas do capitalismo que criam um modelo de felicidade ancorado em acúmulo de bens e capitais para satisfazer o ego. E o pior, a padronização humana é um mecanismo utilizado pelo sistema como forma de manipular as pessoas a consumirem seus produtos compulsivamente através do inconsciente coletivo.

    É notório salientar que não existe uma fórmula de felicidade generalizada, cada um tem seu universo de vontades e satisfações, o segredo é conseguir remover as fantasias impostas pelo sistema institucional que rege a vida das pessoas de modo que sejamos possamos únicos no nosso contexto de vida, tirando as amarras impostas que nos impedem de voar livremente em busca da liberdade de pensamento e de conscientização do nosso eu interior.

    A plenitude da felicidade só pode ser alcançada se formos verdadeiros, quebrando paradigmas estabelecidos pelas instituições que determinam as normas estabelecidas, por isso se diz que um determinado comportamento é normal e outro e anormal. A cultura estabelece que tudo aquilo que contraria as normas estabelecidas pelo homem é considerado anormal. Muitas das vezes essas normas são formas de controle econtraditórias.

    A infelicidade é o outro lado da moeda de que todos tentam fugir, mas infelizmente é a realidade vivida pela maioria da população do planeta. A escassez e o excesso de riqueza são ingredientes nefastos para promover o caos, porque viver requer ter o necessário de recursos materiais e espirituais para suprir a existência humana e estabelecer certo equilíbrio, porque a insatisfação gera o conflito e este a patologia.

    Abraços

    Responder
    1. LuDiasBH Autor do post

      Hernando

      O seu comentário é tão completo, abrangendo todo o pensamento contextual, que só me resta dizer que muito enriqueceu o meu escrito, ao adicionar suas ideias claras e precisas. Concordo plenamente com tudo o que disse. Gostaria de destacar:

      “A escassez e o excesso de riqueza são ingredientes nefastos para promover o caos, porque viver requer ter o necessário de recursos materiais e espirituais para suprir a existência humana e estabelecer certo equilíbrio, porque a insatisfação gera o conflito e este a patologia.”

      Abraços,

      Lu

      Responder

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