ÍNDIA – O CÓDIGO DE MANU

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Autoria de Lu Dias Carvalho

codman

O Código de Manu situa-se, aproximadamente, no ano 1000 a. C.. Foi escrito em sânscrito e é tido como a legislação mais antiga da Índia. Mas quem foi Manu? Manu foi um personagem mítico, considerado “Filho de Brahma e Pai dos Homens”. Os hindus possuíam quatro livros sagrados, os chamados Livros Sagrados dos Vedas, sendo que o Código de Manu era o mais antigo, dividindo-se em Religião, Moral e Leis Civis.

Na verdade, os idealizadores do Código de Manu julgavam que a coação e o castigo eram essenciais para se evitar o caos produzido na sociedade, advindo da decadência moral humana. Havia nele uma estreita correlação entre o direito e os dispositivos sacerdotais, os problemas de culto e as conveniências de castas. Trocando em miúdos, a aplicação do direito dizia respeito à casta do sujeito e à sua condição social. E, como não poderia deixar de ser, a mulher encontrava-se em extrema desvantagem, numa condição de completa passividade e submissão dentro de tal Código, sendo tratada como objeto a ser manobrado e julgado pelo homem.

As leis de Manu são tidas por muitos legisladores como a primeira organização geral da sociedade, debaixo do manto religioso e político, embora privilegiassem as castas superiores, sobretudo a dos brâmanes. Aquele, que pertencesse à classe média ou inferior, era nele duramente penalizado. À casta dos brâmanes, que era formada pelos sacerdotes, foi dado o comando social. Quanto maior fosse a condição social da pessoa, maior seria o seu quinhão e vice-versa. Como vemos, a religião (brâmanes) ficava acima da lei (o rei). Basta ler um de seus artigos para compreender o poder que exerciam dentro da sociedade:

“Se um homem achasse um tesouro, deveria ter dele apenas 10% ou 6%, conforme a casta a que pertencesse. Se fosse um brâmane, teria todo o tesouro e, se fosse o rei, apenas 50%.”

No Código de Manu há uma série de ideias sobre valores tais como “verdade/justiça/ respeito”. Contudo, os castigos infligidos variavam de acordo com a credibilidade dos testemunhos, que por sua vez variavam de acordo com as castas. A título de exemplo podemos citar algumas leis embutidas no Código:

  • Somente homens dignos de confiança e isentos de cobiça podem ser escolhidos para testemunhas de fatos levados a juízo, sendo tal missão vedada para as castas inferiores.

Nos seus artigos 471 e 472, havia autorização para o conúbio (ligação da esposa com um cunhado ou com outro parente), desde que o reprodutor a procurasse discretamente, à noite. Como diríamos no ocidente: Na calada da noite!

Segundo legisladores e historiadores, o Código de Manu não teve a importância do Código de Hamurabi (antiga Mesopotâmia) ou do Código Mosaico (de Moisés), apenas foi um marco na evolução da cultura jurídica. Nele, a testemunha valia segundo sua posição social. A mulher só podia depor nos processos contra outras mulheres, ou quando não houvesse nenhum outro tipo de prova. O Código de Manu era considerado como o código mais rigoroso em relação à mulher, em todos os tempos. Observem:

  • Mulheres devem prestar testemunho para as mulheres.
  • Uma mulher está sob a guarda de seu pai durante a infância, sob a guarda do seu marido durante a juventude, sob a guarda de seus filhos em sua velhice; ela não deve jamais conduzir-se à sua vontade.

Os crimes de injúria eram apurados e punidos de forma rigorosa e cruel: língua cortada, estilete de ferro em brasa, óleo fervendo pela boca e pagamento de multa.  Mas, como sempre, variando de acordo com a posição social do indivíduo. Se fosse um infeliz pertencente às castas inferiores ou intocáveis, assim rezava:

 Art. 264 – Que o rei lhe faça derramar óleo fervente na boca e na orelha, se ele tiver a imprudência de dar conselhos aos brâmanes relativamente a seu dever.
Art. 263 – Se eles os designar por seus nomes e por suas classes de maneira ultrajosa, um estilete de ferro de dez dedos de comprimento será enterrado fervendo em sua boca.

Contudo, se o ultrajante fosse uma pessoa de classe alta, apenas uma multa era aplicada. O Código de Manu já distinguia o furto do roubo, assim:

Art. 324 – A ação de tirar uma coisa por violência, às vistas do proprietário, é roubo; em sua ausência é furto, do mesmo modo o que se nega ter recebido.

Diante dos crimes de furto, o rei podia tomar uma das medidas:

  • a detenção
  • os ferros
  • as diversas penas corporais.

Para os crimes de roubo, recomendava-se o emprego de medidas mais drásticas, a critério do rei. Mais parece uma ironia a causa que levava à punição do crime por adultério, tamanho era o preconceito nele exposto, pois rezava o Código:

 É do adultério que nasce no mundo a mistura de classes.

O direito de primogenitura era bastante regulado. Baseava-se na crença de que a família não podia prescindir de um chefe. E o filho mais velho trazia essa garantia. E, para tanto, um hindu admitia a união entre sua esposa com o seu irmão (dele) ou parente:

Art. 517 – Mas o mais velho, quando ele é eminentemente virtuoso, pode tomar posse do patrimônio em totalidade e os outros irmãos devem viver sob sua tutela, como viviam sob a do pai.
Art. 518 – No momento de nascer o mais velho, antes mesmo que a criança tenha recebido os sacramentos, um homem se torna pai e paga a sua dívida para com os seus antepassados; o filho mais velho deve, pois, ter tudo.
Art. 519 – Dispõe que o nascimento do primeiro filho dá ao pai a imortalidade, sendo que:  os sábios consideram os outros filhos como nascidos do amor.
Art. 471 – Quando não se tem filhos, a progenitura que se deseja pode ser obtida pela união da esposa, convenientemente autorizada, com um irmão ou outro parente.

A Índia atual continua com um pé no Código de Manu e outro na modernidade. Com certeza, o primeiro continua a levar vantagem. Infelizmente!

Nota: Imagem copiada de http://www.tower.com/codigo-de-manu

Fonte de pesquisa
Código de Manu/ Editora Edipro

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19 comentaram em “ÍNDIA – O CÓDIGO DE MANU

    1. Lu Dias Carvalho Autor do post

      Volmer

      É um prazer contar com a sua presença e comentário neste espaço. Como pode observar, o meu blog é todo voltado para a cultura nos seus mais variados campos. Tem sido motivo de muita alegria vê-lo citado em vários livros escolares e revistas, inclusive com pedido de autorização para a publicação de textos. Agradeço-lhe muito a sua contribuição na divulgação deste espaço. Conte sempre comigo.

      Abraços,

      Lu Dias Carvalho

      Responder
        1. Lu Dias Carvalho Autor do post

          Volmer

          Você é muito gentil. Gostaria, sim, de compartilhar um texto sobre o meu livro. Como sabe, a cultura em nosso país precisa de muita ajuda, principalmente, nós, escritores “não renomados”. Ficaria muito grata. Vou lhe enviar por e-mail.

          Abraços,

          Lu Dias

    1. LuDiasBH Autor do post

      Gabriele

      Não entendi muito bem o que você está querendo. Vou lhe passar o que tenho.

      Abraços,

      Lu

      Responder
  1. Erenilda

    Olá estou escrevendo uma dissertação e gostaria que se fosse possível você enviasse a página que se refere às leis que desfavorecem a mulher.

    Obrigada

    Responder
    1. LuDiasBH Autor do post

      Erenilda

      Todas as informações bibliográficas estão logo abaixo do texto. Agradeço a sua visita e comentário.

      Abraços,

      Lu

      Responder
  2. Indira Moraes

    Olá, Lu.
    Estou escrevendo meu TCC sobre Direitos Humanos na Cultura Indiana.
    Ficaria muito grata se você pudesse conversar comigo. Um grande abraço!

    Responder
    1. LuDiasBH Autor do post

      Indira

      Eu tenho uma série de artigos sobre a cultura indiana aqui no blog, feitos através de pesquisas e em conversa com indianos.
      Irei lhe repassar via e-mail. E muito sucesso no seu TCC.

      Beijos,

      Lu

      Responder
    1. LuDiasBH Autor do post

      Bruno

      Eu comprei o meu na Livraria da Folha (Código de Manu/ Editora Edipro), na internet. Junto vem o de Hamurabi.
      Aqui no blog você encontrará vários assuntos sobre o Código de Manu, tais como (Ver JANELAS PARA O MUNDO):

      ÍNDIA – O CÓDIGO DE MANU
      ÍNDIA – O CÓDIGO DE MANU E A VOZ DO CORPO
      ÍNDIA – O CÓDIGO DE MANU E AS MULHERES
      ÍNDIA – O CÓDIGO DE MANU E O ADULTÉRIO
      ÍNDIA – O CÓDIGO DE MANU E OS BRÂMANES

      Obrigada por sua visita e comentário,

      Lu

      Responder
  3. Ramon Monteiro

    Sr. Arya,
    é compreensível que alguém que não conhece a cultura da Índia teça algumas colocações sob ótica puramente ocidental (e decadente). A índia é um repositório de sabedoria e toda a base da cultura dita europeia proveio desse fabuloso país. Conhecendo-se a história e filosofia da índia, percebe-se que daquela cultura milenar advirá a salvação do planeta. Namasté!

    Responder
    1. LuDiasBH Autor do post

      Ramon

      É um grande prazer recebê-lo aqui neste espaço.
      Como imagino que o senhor Arya, indiano, não vá responder o seu comentário, pois alguns não voltam mais aos comentários feitos, não o deixarei sem uma resposta. Certo?

      Como você escreve, fica parecendo que a Índia em um paraíso na Terra, o que não é verdade. Os problemas do povo indiano são seríssimos e ignorá-los é uma maneira de fazer com que persistam.

      Aqui você vai travar contato com indianos, que levantam os problemas do país, com jornalistas brasileiros que ali viveram mais de uma dezena de anos, tendo escrito livros, e com a Sandra Bose, do blog Indiagestão, casada com um indiano, vive na Índia há muitos e muitos anos e lá possui um blog em língua portuguesa. Portanto, a ótica sob a qual é vista aquele país não é puramente ocidental.

      Você poderia ignorar a tragédia das águas do Ganges, tendo o próprio governo indiano procurado alertar seu povo sobre sua contaminação e poluição? A situação dos dalits (intocáveis) pode ficar obscurecida? O casteísmo não continua sendo um atraso para o país? Os chamados homens santos (denunciados pelo próprio governo indiano num alerta aos turistas) não estão misturados a foragidos, doentes mentais e trapaceiros? Os yogues não compram hoje até ilha na Escócia e travam uma violenta briga entre si?
      A corrupção indiana é tida como uma das maiores do mundo.

      Não tenho a menor dúvida de que a humanidade deve muito à Índia, assim com à Grécia e à Roma antiga, e, indo mais longe, aos habitantes da Mesopotâmia. Mas o mundo hoje é outro. E nós falamos do mundo atual, da Índia da bomba atômica, em guerra com os muçulmanos, do desenvolvimento tecnológico, da briga pela Caximira, da busca pelo poderio econômico…

      Realmente é uma pena que o homem venha se materializando tanto, através dos tempos, seja na Índia, na China, no Japão… ou em qualquer outro lugar do mundo. Convido-o a ler, neste blog, uma sessão chamada JANELAS PARA O MUNDO (Ver abaixo do painel), com vários artigos sobre a Índia… E também o blog INDIAGESTÃO (ver no Google), escrito in loco, com notícias diárias daquele país.

      Agradeço-lhe a visita.
      Este blog está sempre de braços abertos para você.

      Grande abraço,

      Lu

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  4. Pingback: ÍNDIA – DALITS INICIAM A REVANCHE | VÍRUS DA ARTE & CIA.

  5. jose carvalho

    Muito cruel esse código, assim seria difícil conviver na sociedade indiana, pois o ser humano não tinha piedade.

    Responder
    1. LuDiasBH Autor do post

      JC

      Não dá nem para acreditar que o ser humano pudesse chegar a tanta crueldade.
      Mas o nazismo foi tão cruel como aquela gente.
      E a crueldade continuou com a escravidão, com as guerras…
      O homem, no seu lado mau, é o pior dos animais.

      Abraços,

      Lu

      Responder
      1. Arya Sangama Das Dvs

        Na verdade não vejo diferença de como a sociedade moderna está hoje. Filho matando pai, pai estuprando filha, igreja roubando os fiéis em nome de DEUS, os políticos livres roubando milhões e seus filhos atropelando com suas ferraris ,e o pobre preso porque roubou pra comer, crianças fazendo curso sonoro-auditivo de bandido ao ouvirem músicas que fazem apologia ao crime, destruição do planeta e dos seres viventes neles sem nenhuma discriminação.

        Responder
        1. LuDiasBH Autor do post

          Arya

          É um grande prazer recebê-lo neste blog.
          Seja sempre bem-vindo!

          Você tem toda a razão quando levanta as barbaridades da sociedade moderna, principalmente em relação à grande mãe Terra.

          A diferença é que no Código de Manu, os castigos estavam voltados apenas para os escravos e para as mulheres, enquanto as castas ricas passavam impunes. E só elas roubavam, ditavam as leis e eram consideradas perfeitas.

          Hoje, ainda que vivamos numa sociedade injusta, o mundo não mais funciona assim. Lutamos contra a barbárie e a denunciamos, sendo muitas vezes ouvidos.

          Sou uma brava defensora da natureza e dos animais (não como carne), conforme poderá ver nos links preferidos deste blog. Amo a mãe Terra acima de tudo. Faço deste blog uma trincheira de minha luta. E o convido para me ajudar.

          Pelo que pude concluir, você é indiano vivendo no Brasil. Muito legal o seu português!
          Ainda ontem estava lendo sobre a Índia e a Caxemira. Que situação crítica!

          Mais uma vez, obrigada por sua participação.

          Abraços,

          Lu

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