Prof. Hermógenes
O Professor Hermógenes, um dos precursores da ioga no Brasil, escreveu mais de 30 livros sobre a saúde física e mental. Neste texto retirado de seu livro “Yoga para Nervosos”*, ele nos explica que o ser humano não é uma dualidade.
Quando o homem adoece, adoece todo. É um erro considerar uma gripe apenas um mal físico. A predisposição para resfriar tem causas tanto físicas como psíquicas, morais e até filosóficas. Os germes patogênicos não conseguem grandes êxitos quando assaltam uma pessoa bem nutrida, de moral forte, confiante em si mesma, entregue a Deus, que não tem tempo ocioso para ficar na cama. Hipocondríacos e histéricos, ao contrário, são criaturas doentes, fracas, vulneráveis, e exatamente o são por motivos psíquicos e até mesmo filosóficos. Creem mais na sua fraqueza e no poder das doenças do que no oposto, isto é, na imunidade e nas extraordinárias capacidades autoterapêuticas da mente e do organismo.
Todos reconhecem e as estatísticas confirmam a existência de sujeitos “azarados”, isto é, aqueles que, se um tijolo cai de um andaime é precisamente em sua cabeça. São pessoas predispostas a acidentes e marcadas pela fatalidade. Para tais indivíduos vale dizer que bateram com o carro ou fraturaram a perna num tombo de banheira graças a uma causa psíquica. A ciência psicossomática tem feito bons progressos no estudo da chamada “infortunística”. Freud, em sua psicopatologia da vida cotidiana, admitiu serem os conflitos interiores as causas dos acidentes diários. Ora, se moléstias infectocontagiosas e até acidentes (mesmo a agressão assassina) que em nada poderiam parecer dependentes do psiquismo e de nossas crenças filosóficas, frequentemente têm causa psíquica, que dizer da distonia neurovegetativa? Que dizer das dez mil roupagens dos distúrbios neuróticos?!
Um nervoso é um enfermo integral, como nenhum outro. Caiu doente em todos os planos de seu ser, não obstante serem mais nítidos seus sofrimentos físicos e psíquicos. O homem adoece todo, e seus males orgânicos têm causas nos níveis mais sutis de seu ser. Por isso, somente uma terapêutica integral pode, definitivamente, curar. Desde os primórdios da humanidade, a ciência de curar era psicossomática, isto é, não se cingia apenas a tratar do corpo. Os pajés, os feiticeiros, os xamãs de todas as tribos foram os precursores da moderna medicina psicossomática. Seus cerimoniais, amuletos, trabalhos de magia, tinham poder curador porque atuavam a partir do plano mais sutil e, por isto mesmo, mais poderoso: o psiquismo.
O tempo passou e a ciência médica atravessou, recentemente, uma fase em que se descuidou das causas sutis das enfermidades e dos estados psíquicos de seus doentes, concentrando- se em aliviar sintomas físicos e tratar do corpo ou parte dele. Mas veio a reação. Segundo Gomes de Araújo “A chamada Medicina Psicossomática surgiu efetivamente como uma reação compreensível, e por sinal salutar, àquela outra Medicina que, ainda no primeiro quartel deste século (séc. XX), obstinava-se em definir-se e apresentar-se como estrita examinadora ‘do corpo’, mantendo-se tenazmente esquecida, pelo menos na aparência, de que um corpo humano, estritamente observado como ‘corpo’, isto é, como coisa puramente física, só pode sê-lo depois da morte”.
A reação, ouso aventurar, precisa ampliar-se, completar-se. Enquanto a moderna medicina psicossomática vir o homem apenas em seus níveis mais densos — o físico e o psíquico — ainda estará tratando de um homem incompleto. O homem integral é visto pelas escolas hinduístas como formado por cinco koshas ou revestimentos, que vão se quintessenciando a partir do corpo físico até atingir o mais sutil, onde não há nada de material e concreto, formal e pessoal, que é o plano da mais pura bem-aventurança.
*Esse livro é encontrado em PDF no Google.
Nota: Mulher Doente, obra de Jan Steen
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