Autoria de Alfredo Domingos
Um sábado de chuva, após o retumbante cozido de Mariinha, estávamos, meu amigo e eu, a caminho dos braços de Morfeu, procurando cama pra encostar, quando foi trazida a ideia de enveredarmos pelas trilhas dos ditados, das expressões e dos provérbios. O tempo passaria sem lerdeza. Topamos. Cada um de nós dizia o seu e dava a explicação. Ficou animado. Colhi nos meus botões a pérola: “ficar a ver navios”. Tive que de pronto oferecer interpretação. Pensei um pouco e revelei até duas:
A expressão vem de Portugal. O rei, Dom Sebastião, morreu na batalha de Alcácer-Quibir em 1578, e seu corpo nunca foi encontrado. A morte causou uma grande crise sucessória. O trono ficou vago. Em consequência houve a anexação de Portugal à Espanha, de 1580 a 1640. O orgulho e a dignidade dos lusitanos clamavam por resgate. O povo português sonhava com a volta do monarca. Assim, com frequência, havia visitas ao Alto de Santa Catarina, em Lisboa, para observar o mar, à espera do retorno do rei. Como ele não voltou, o povo, em vão, “ficava a ver navios”.
Outra explicação, a qual cabe dar crédito, é que as mulheres ficavam aguardando a volta dos maridos, que tinham zarpado com as embarcações, nas grandes navegações portuguesas. Depois de muito tempo, as coitadas colocavam-se a espiar os navios que chegavam ao porto, para reverem seus amores, o que ocorria quase sempre sem sucesso. Então surgiu a expressão: “ficar a ver navios”. Ou seja, esperar por algo que não se realizava.
Atualmente, a expressão é usada no sentido de ser ludibriado, enganado. É tomada para realçar a decepção e a ausência de pessoas e de sentimentos. Para o emprego que não veio, uma nota de reprovação, o dinheiro negado, a empresa que faliu, e tantas outras coisas, exclama-se tristemente na representação da perda, seja ela qual for, “fiquei a ver navios”.
Diga-se de passagem, há mais expressões com o mesmo significado. Recordei-me de duas espetaculares. Querem dizer que, em síntese, nada aconteceu. Os sujeitos, por conseguinte, ficaram a “ver navios”. São um pouco esquecidas, puxadas para a comicidade, mas cheias de representatividade. São elas: “patavina” e “neres de pitibiriba”. Para entendimento de como são empregadas, o povo utiliza mais ou menos destes jeitos: sem que para ele acontecesse patavina do que estava combinado; e ela contentou-se em receber neres de pitibiriba em troca dos favores realizados.
Fontes de consulta: Dicas de Português- Sérgio Nogueira e www.significados.com.br
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