Autoria de Lu Dias Carvalho
A beleza da morte é que ela nos desnuda completamente. A morte obriga a pessoa a ser ela mesma, a aceitar-se como é. Já vi muitos religiosos aflitos diante da morte, porque a espiritualidade deles era pregada, mas não vivida. Por outro lado, vejo ateus que morrem muito bem. Convictos de que tudo acabou. Eles sentem que fizeram tudo o que podiam, que gozaram a vida e ela foi muito boa. Quando a pessoa sente que a vida teve um sentido, ela morre bem. Não importa se acredita em Deus ou não. Quem vive bem, morre bem. (Dr. Franklin Santana Santos)
O homem fraco teme a morte, o desgraçado a chama, o valente a procura. Só o sensato a espera. (Benjamin Franklin)
Entrou em vigor em nosso país O Novo Código de Ética Médica que estabelece normas sobre situações clínicas até então cheias de controvérsias. E, se há um campo, em que a ética deve ser vista com muito rigor, este é, sem dúvida, a área médica, que lida com a vida humana.
Embora muitas religiões sejam pródigas em afirmar que somente Deus pode decidir sobre o nascimento e a morte do homem, a prática não funciona bem assim. Deixando de lado a violência, a fome (fruto das desigualdades sociais), a pena de morte, as guerras e tantas outras mazelas que ceifam vidas, a medicina possui poderes tanto para prolongar, quanto para abreviar a permanência humana na Terra.
Dentre as normas do Novo Código de Ética Médica, uma delas estabelece que nas situações clínicas irreversíveis e terminais, em que procedimentos cirúrgicos e terapêuticos configurem-se desnecessários, servindo apenas para aumentar o sofrimento do doente, o médico deve evitá-los, concentrando-se em oferecer todos os cuidados paliativos que atenuem a dor do paciente. Tal prática é chamada de ortotanásia.
O professor e geriatra brasileiro, Franklin Santana Santos, é um dos principais estudiosos da ortotanásia no país. Segundo ele, além de aliviar a dor física do doente é também necessário respeitar suas necessidades espirituais ou existenciais. Segundo Santos, os médicos encontravam muitas dificuldades em lidar com pacientes terminais, com medo de incorrerem em risco de processos por parte do Conselho Regional de Medicina. Agora, o profissional que optar por não entubar um paciente em estado terminal, com chance zero de cura, não corre risco de ser processado, pois a prática da ortotanásia (que ainda não foi aprovada por uma lei) está amparada pelo novo código como uma atitude ética.
Os procedimentos respaldados pela ortotanásia devem ser vistos com muito rigor, pois, se provada a má fé do profissional, ele será acusado de omissão de socorro, eutanásia (prática, sem amparo legal, pela qual se busca abreviar, sem dor ou sofrimento, a vida de um doente reconhecidamente incurável) ou assassinato e, portanto, sujeito a todas as penalidades da lei. Portanto, a família deverá, mais do que nunca, receber todas as informações possíveis, inclusive de outros médicos, para que não se sinta depois, responsável pela morte de alguém querido.
Também não podemos nos esquecer de que, apesar do belo juramento feito pelos médicos, quando se formam, a realidade é bem outra. Ninguém em sã consciência pode negar que os pacientes ricos são bem melhor tratados, muitas vezes passando por cirurgias desnecessárias, pois constituem um filão de “prosperidade” para os hospitais particulares, que hoje trabalham visando o lucro em primeiro lugar. Por isso, o risco da prática de eutanásia será muito maior com pacientes pobres do SUS. Olho vivo!
As fronteiras entre a ortotanásia e a eutanásia precisam ser bem delimitadas. Segundo o doutor Santos, por exemplo, se um paciente foi diagnosticado recentemente com câncer e tem a perspectiva de viver várias semanas ou meses, em caso de uma parada cardíaca ele deve ser reanimado, recebendo todos os recursos tecnológicos, que vão lhe dar melhor qualidade de vida, no tempo que ainda lhe resta. Mas, se o doente já estiver em fase terminal, com metástase no cérebro e no pulmão, ele não deve ser reanimado. Se o profissional reanimá-lo estará cometendo distanásia (usando todos os meios para prolongar a vida do paciente à custa do sofrimento dele).
Quando vemos os profissionais de branco (médicos, enfermeiros, etc.) na sua lida nos hospitais com os mais diferentes tipos de doenças e doentes, ficamos impressionados com a facilidade com que transitam entre a vida e a morte. Mas as coisas não são como parecem. Pesquisas provam que eles também lidam mal com a morte e que possuem medo dela, assim como toda a sociedade, pois foram treinados para curar e não para apenas cuidar. Cada paciente que parte, não deixa de ser considerado um fracasso pelo profissional.
Segundo o doutor Santos, só para que tenhamos uma noção de como o médico não está preparado para a morte, das 181 faculdades de medicina do Brasil, apenas a Faculdade de Itajubá/MG tem na graduação a disciplina obrigatória de tanatologia (parte da medicina legal, que se ocupa da morte e dos problemas médico-legais com ela relacionados.). E, que é exatamente este medo de trazer a morte para a discussão, que atrapalha a expansão dos cuidados paliativos no Brasil, pois tais cuidados estão ligados diretamente à morte.
Ao contrário do Oriente, onde a morte natural é aceita com normalidade, nós ocidentais negamos a transitoriedade da vida. Somos parte de uma cultura pautada no prazer, no ter, na beleza e no poder. Achamo-nos capazes de estancar a fluidez de nossa existência. Dificilmente vemos na nossa sociedade um espaço para se discutir a nossa efemeridade. Mesmo as escolas postergam tal assunto, de modo que as crianças, ao perderem um ente querido, não associam a morte como parte da vida, o que lhes gera muitos traumas.
Há também sérias discussões para que se diga ou não ao doente sobre o seu estado de saúde. A maioria das famílias opta pelo silêncio. Ignora o fato de que as pessoas hoje são muito mais bem informadas sobre suas próprias doenças. A grande maioria dos médicos acha que o doente precisa saber de tudo, de modo a compartilhar sua angústia e, em muitos casos, resolver pendências de sua vida. Ele pode ter outras dores além das físicas, como sociais, psicológicas, existenciais, espirituais e buscar encontrar alívio para elas. Tanto o médico quanto a família precisam estar cientes disso, ajudando o paciente terminal.
Ao ser perguntado se existe a boa morte, doutor Santos toma como exemplo os estadunidenses, que enumeram as condições da boa morte:
- Não ter sofrimento.
- Estar rodeado pelas pessoas amadas.
- Ter autonomia e permitir que a doença siga seu curso sem interferências extraordinárias da ciência.
(*) Imagem copiada de http://pt.dreamstime.com/fotos-de-stock-royalty-free-menino-doente-em-uma-cama-de-hospital-image9590078
Fonte de pesquisa: Revista Época, 19 de abril de 2010
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Lu,
Como cristã, acredito que Deus pode interferir na vida e morte do homem, dependendo da experiência e ligação de cada um. É algo que só quem vive pode explicar. Jamais entenderemos se analisarmos numa condição humana de causa e efeito. Ainda amanhã o Fantástico mostrará uma experiência de um neurologista no limite da morte, vale a pena ver. A vida não pode ser explicada apenas no limite da nossa pequena compreensão, há muito mais neste universo, complexo e maravilhoso,onde somos quase nada, há um plano maior que rege tudo isto.
bjos
Karlla
Karla
Também penso como você.
Somos pequeninos demais diante da complexidade de nosso corpo, mente, espírito e, principalmente, dentro da complexidade do Universo.
O homem precisa sair de sua prepotência e olhar para a vida com mais humildade.
Ele acha que é o dono do mundo e que pode dominar tudo.
Basta um meteoro para nos enviar para fora do sistema solar.
Irei ver com muita atenção o programa de hoje.
Beijos,
Lu