Autoria de Lu Dias Carvalho
O Egito de Cleópatra e dos grandes faraós não é conhecido apenas por suas pirâmides e por sua cultura milenar, mas também pela comunidade dos zabbalin (zabbaleen no inglês), que possui muitos pontos em comum com a vida dos dalits indianos:
- dividem espaço com os animais nas ruelas;
- mulheres e crianças andam descalças;
- vestem mulambos;
- a maioria não gosta de ser fotografada ou de dar entrevista;
- permanecem quase invisíveis e independentes do governo;
- não confiam nas autoridades;
- sentem-se isolados;
- vivem numa pobreza absoluta;
- não se sentem parte da cidade.
Próxima às pirâmides de Gesé, encontra-se a Cidade do Lixo, brutal não apenas pelas imagens que propicia aos olhos dos visitantes, como pelo bodum repugnante que dela exala. Ali são depositadas sete toneladas de lixo diariamente. E é nesse lugar que vivem os zabbalin, minoria cristã (cristãos cópticos) de um país, onde 90% da população são de muçulmanos. Essa gente, cerca de 30 mil habitantes, vive exclusivamente como coletores do lixo produzido pelos habitantes da cidade do Cairo, coabitando com naturalidade ao lado de moscas, ratos e outros bichos. Os zabbalin já se integraram tanto com o lixo da população do Cairo, que os dejetos invadem suas moradas, sem que eles pareçam incomodados.
Como muitos sabem, o consumo da carne de porco é vedado aos muçulmanos, o que nada tem a ver com os cristãos. No entanto, em abril de 2009, o presidente egípcio ordenou o sacrifício de todos os porcos do país (cerca de 350 mil), alguns enterrados vivos, numa crueldade extrema, com a desculpa de que eles disseminavam a gripe suína, mesmo com o desmentido da OMS. Tal fato levou os zabbalin a entrarem em conflito com o governo egípcio. Tomaram tal medida como uma provocação religiosa aos cristãos.
Os porcos eram parceiros dos zabbalin no trato com o lixo. Eles eram encarregados de comer os restos orgânicos recolhidos pela comunidade. Sem os porcos, o povo zabbalin teve os seus problemas aumentados, pois não consegue eliminar todo o lixo orgânico, o que pode trazer problemas seriíssimos de saúde para aquela população.
Para que os leitores possam avaliar a situação da comunidade dos zabbalin, ela é responsável por 60% do lixo produzido na cidade do Cairo, maior cidade egípcia, mas não recebe um centavo por parte do governo. A sobrevivência dessa gente se dá através da venda, principalmente de plástico e papelão para as fábricas de reciclagem.
Na Cidade do Lixo, todos participam da coleta, desde crianças a idosos. Segundo a reportagem de Carta Capital, normalmente, os homens fazem a coleta e as mulheres e crianças são responsáveis pela seleção. E, na maioria das famílias, apenas o filho mais velho vai à escola. Os outros trabalham o tempo todo, junto aos pais.
Este sistema cruel começou no final da década de 40, quando os camponeses migraram para o Cairo em busca de empregos. Na falta desses, passaram a trabalhar com o lixo. Eles reaproveitam cerca de 90% do lixo despejado ali. E a cidade só faz aumentá-lo.
Os zabbalin, além de serem parte de uma minoria miserável e por isso mesmo discriminados, ainda são vistos com nojo pela população muçulmana, por fazerem aquilo que o islamismo considera intolerável:
- criar porcos e consumir sua carne;
- ter contato direto com a matéria orgânica;
- não observar os costumes islâmicos.
A comunidade dos zabbalin é de grande importância para a cidade do Cairo, que cresce explosivamente no Egito. Deveria contar com toda a atenção possível do governo e da população local. Além de não receber nenhum valor pecuniário por parte das autoridades públicas, tampouco contam com qualquer forma de benefício (escola, saúde, etc). Ao contrário, são esquecidos e desprezados.
Nota: Imagem copiada de http://noticias.r7.com
Fonte de pesquisa:
CartaCapital nº 573
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