Autoria de Marguerite Yourcenar
Durante milênios o homem tem considerado o animal como propriedade sua, só que subsistia um estreito contato entre ambos.
E dizer que o amor aos animais é tão antigo quanto a raça humana. Milhares de testemunhos escritos ou falados, de obras de arte e de gestos visíveis dão prova disso. O camponês marroquino, que acaba de saber seu asno condenado à morte, certamente amava sua alimária, pois havia, durante semanas inteiras, derramado óleo de automóvel em suas longas orelhas cobertas de chagas, por julgá-lo mais eficaz, porquanto mais caro, que o óleo de oliva existente em abundância em sua pequena propriedade. A horrível necrose das orelhas apodrecera aos poucos todo o pobre animal, que já não tinha muito tempo de vida, mas que continuaria sua tarefa até o fim, pois o homem era pobre demais para admitir sacrificá-lo.
Também amava seu cavalo aquele rico avarento que levava a uma consulta grátis com famoso veterinário europeu o belo corcel de pelo grisalho, orgulho de seus dias de fausto, cujo mal se resumia enfim a uma alimentação inadequada. Amava seu cão o rústico português que levava nos braços todas as manhãs seu pastor alemão que partira a anca, para fazer-lhe companhia durante seu longo dia de jardinagem e que ele alimentava com restos de comida.
Amam os pássaros os velhos que vemos nos parques parisienses, alimentando pombos, e a quem criticamos sem razão, pois é graças a esse farfalhar de asas ao seu redor q amava os animais o autor do Eclesiastes, ao perguntar para onde ia a alma dos bichos; 1 Leonardo, libertando os pássaros prisioneiros num mercado de Florença, ou ainda a chinesa que há mil anos, encontrando num canto do pátio uma gaiola enorme com centenas de pardais (seu médico recomendara comer todos os dias miolos da ave ainda mornos), abre as grandes portas do viveiro, dizendo: “Quem sou eu para me preferir a esses bichinhos?” As opções que temos de tomar a cada instante, outros já tomaram antes de nós.
Nota: texto extraído do livro “O Tempo, Esse Grande Escultor”/ Edit. Nova Fronteira
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Lu,
quem não aguentou a emoção ao ler teu poema fui eu. Simplesmente lindo! Consegui sentir os momento, as lambidas, o esfregar da cabeça, aquele olhar que penetra em nossa alma.
Sim, nós temos o privilégio de dividir com eles uma alma. Eu sempre digo, não existe melhor terapia do que ter a companhia deles. Que nunca nos falte essa humanidade.
Beijo
“Quem nunca sentiu amor por um animal, tem a sua alma ainda adormecida.” Não sei quem disse isso, mas concordo plenamente.
Há alguns dias, retornei de um lugar chamado Nossa Senhora do Ó – PE. Lugar de muitos gatos e cães abandonados. Meu coração apertava ao vê-los remexendo no lixo. Comprei dois quilos de ração e para onde ia, levava distribuindo. Nessa minha incursão, afeiçoei-me em especial pela “Nega”, como era chamada uma jovem cadela de porte médio, com olhar desconfiado, como todos têm. Houve uma troca de confiança e amor, e a Nega passou a me acompanhar. Mas como moro no RS, e voltaria nos próximos dias, consegui negociar castração, custo zero, alguém para tomar conta e medicá-la, e um moleque, que me prometeu cuidá-la e me dar notícias sempre
Recebi um vídeo dela chorando no portão da casa onde fiquei, talvez esperando que eu aparecesse. Queria ter feito isso por todos. Eles nunca nos magoam. Como o mundo seria um lugar melhor, se os ditos “humanos” tivessem o sentimento deles.
Clara
Não contive as lágrimas após ler o seu comentário, pois o trato com animais comove-me muito. Tive igual acontecimento na praia, com uma cadela. Veja o poema abaixo que fiz para ela e o qual dedico a você, também sairá num livro de poemas que estou publicando agora no final do ano. E que Deus continue abençoando esse seu maravilhoso coração.
AMIGA FICOU PARA TRÁS…
Ainda sinto a sua língua áspera no meu
rosto, enchendo-me com beijos de afago;
o corpo enroscado às minhas pernas e os
olhos bebendo-me a alma em tragos.
Amiga corria pela areia branca da praia,
de volta ao seu costumeiro destino e eu,
com lágrimas a descer pela face, estava
de volta ao meu, deixando-a sozinha.
Ela – só um pontinho na areia branca.
Eu – um tosco borrão dentro do barco.
Ambas perdidas no tempo e no espaço,
salpicadas de gotas e pingos amargos.
A chuva escorria sobre ela lá fora e cá
dentro aguavam meu rosto gotas doídas.
Um sentimento de impotência e tristeza
invadia-me ao deixá-la pra trás na vida.
Ainda sinto seu corpo naquele banho.
Desajeitada, com uma carência franca,
queria fugir em meio às minhas pernas
que, rijas, sustinham-na pelas ancas.
Esfregava seu corpo de pelos dourados
coo meu sabonete cheiroso de lavanda,
cingindo-a numa cascata cheirosa duma
densa e reconfortante espuma branca.
Deitamo-nos ao sol diante do mar azul,
sob o olhar festivo de nossos vizinhos;
secamos nossos corpos encharcados sob
o farfalhar de um suave vento marinho.
Eu – explodindo de afeto.
Ela – carente de afeição.
Eu – acariciando seu corpo.
Ela – lambendo minha mão.
Antes de partir, roguei aos pescadores
que olhassem aquele serzinho solitário,
que caçava caranguejo com destreza
nas areias da praia, em seu desamparo.
Ainda sinto a ternura de seus carinhos,
a língua lambendo minhas pernas e pés,
e seus olhos famintos de amor nos meus.
Amiga, como foi difícil dizer-lhe Adeus!
Obs.: “Amiga” era uma cadelinha abandonada na praia que conviveu comigo durante 15 dias.